Única fotografia conhecida em que aparece uma das paradas (a Terceira Parada). Foi durante a revolução de 1924. (Revista da Semana, 1924)
Quem conhece o bairro da Quarta Parada, na capital paulista, talvez não imagine de onde veio o nome. Bem, veio do fato de ter existido uma parada do trem da Central na esquina da linha com a avenida Álvaro Ramos - esquina hoje murada, ou seja, de carro e, mesmo a pé, ninguém pode continuar seguindo por essa avenida de um lado para outros dos trilhos, hoje utilizado pela linha da CPTM.
Bom, se existia a Quarta Parada, devem pelo menos ter existido a Primeira, a Segunda e a Terceira Paradas. E talvez outras além. E desde quando? Até quando? As respostas não são nada simples de serem obtidas. Há muitas dúvidas no ar.
Primeiro, essas paradas foram criadas ainda no tempo da E. F. do Norte (ou E. F. São Paulo-Rio), ferrovia que construiu a linha e a entregou no ano de 1875. Em 1891, a E. F. Central do Brasil adquiriu a empresa, que estava à beira da falência. Nessa época e desde 1877, para se ir de São Paulo ao Rio de Janeiro de trem havia de se fazer uma baldeação na estação de Cachoeira Paulista - afinal, a bitola da linha da E. F. do Norte era métrica e a da Central era larga (1m60).
Mapa de 1897
As paradas teriam sido criadas pela empresa paulista em 1886? Neste ano, a E. F. do Norte iniciou o serviço de trens de subúrbio que, nessa época, ligavam a estação do Norte (mais tarde Roosevelt, hoje Braz de novo, "engolida" pelas estações Braz da antiga Santos-Jundiaí e Braz do metrô) à estação da Penha. Esta última ficava na rua Coronel Rodovalho, no início da ladeira, e já foi desativada há muito tempo, junto com o rabicho de linha que saía da linha principal na altura da estação de Guaiaúna - depois Carlos de Campos e hoje desativada.
Mapa de 1905.Não encontrei, no entanto, referência a essas paradas - seis, na verdade, nomeadas "Primeira Parada" a "Sexta Parada".
Nota: em 1908, a Central do Brasil terminou de fazer a ampliação da bitola da linha da antiga E. F. do Norte para bitola larga e, com isto, acabou a baldeação no meio da linha. Os trens de suburbios da Penha saiam da estação do Norte pela mesma linha da ferrovia para o Rio e entravam por um curto ramal na altura da estação de Guaiaúna e seguiam até a rua Coronel Rodovalho, onde estava a estação da Penha. Tiveram eles a bitola ampliada também nessa época? Ou isto, ou passou a haver baldeação na saída do ramal? Ou, outra possibilidade, a bitola métrica da linha principal teria sido mantida por um tempo para não precisarem ampliar também aquele trecho para bitola larga?
O fato é que os trens da Penha continuaram circulando até 1915.
Um ano antes, em 1914, a Central passou a correr outro trem de subúrbio, de Roosevelt até a estação de Mogi das Cruzes, trajeto que continua da mesma forma até hoje, mas com os trens da CPTM. E as paradas? Sim, como visto acima.
Outra pergunta para a qual não houve resposta foi: as seis paradas continuaram a embarcar e desembarcar passageiros, nos novos trens de subúrbio que agora não entravam mais para a Penha?
Mapa de 1913.
O último mapa de São Paulo que ainda indicava os locais das paradas foi o mapa do ano de 1924. A Quarta Parada, que deu nome ao bairro, acabou tornando-se uma estação no início dos anos 1930, e mudou o nome nos anos 1940 para Clemente Falcão, que foi desativada em 1981 e demolida.
A Sexta Parada, na esquina da rua Antonio de Barros e pouco antes do início da variante de Poá (que começou a funcionar com passageiros no ano de 1934) virou a estação de Sebastião Gualberto (ou Engenheiro Gualberto) até ser desativada em 2000 e desmanchada.
Mapa de 1914.
As outras desapareceram. Onde estavam elas? (notar que o nome das ruas varia com o mapa) Bom, o mapa de 1897 mostrava apenas a quarta (na esquina da av. Álvaro Ramos), a quinta (na esquina da rua Tuiuti) e a sexta (na esquina da rua Antonio de Barros). As três primeiras não eram mostradas. Já não funcionavam? No mapa de 1905, aparecem da segunda à sexta paradas: a segunda na rua do Hipódromo, a terceira na rua Siqueira Bueno, a quarta na Álvaro Ramos, a quinta na Tuiuti e a sexta na Antonio de Barros. Como se vê, apareciam as duas primeiras paradas, A primeira nunca aparecia. Por que? Seria a primeira parada a própria estação do Braz?
Mapa de 1924.
Já no mapa de 1913, a primeira parada aparece finalmente, mas está no local do que em 1905 era a segunda parada: na rua do Hipódromo. A segunda aparece na rua Lopes Coutinho; a terceira e a quarta aparecem no mesmos locais anteriores; a quinta e a sexta não apareciam, pois o mapa terminava antes delas. No mapa de 1914, as paradas tinham a mesma localização do mapa de 1905 e a segunda parada volta a ter seu lugar, onde, em 1913, era a primeira parada. Erros dos mapas ou realmente tentativa de mudança de locais? Nos mapas de 1916 e de 1922, não há menção a parada alguma.
Bem, finalmente, o último mapa em que se localiza estas paradas é o de 1924. No entanto, ele mostra apenas duas delas - a terceira e a sexta - e a terceira está no lugar da quarta parada e não no seu local dos mapas anteriores, na esquina da Siqueira Bueno. Erro? Provável. E também é possível que somente estas duas paradas ainda estivessem ativas - apesar, foram estas duas as únicas que sobreviveram por se tornarem estações, como já dito. No mapa de 1930, não aparece nenhuma indicação das paradas, e nem nos mapas seguintes, até hoje.
Como teriam sido estas paradas? É incrível, mas a única fotografia conhecida de uma delas - a terceira parada, na esquina com a Alvaro Ramos - é uma foto tomada durante a Revolução de 1924, onde aparece, junto a ela, uma plataforma com cobertura e postes de trilhos, uma locomotiva derrubada pelos revoltosos.
Ainda havia dúvidas se a estação Engenheiro Gualberto, que ficava no cruzamento da linha Rio-Mogy das Cruzes com a rua Antonio de Barros substituiu a Quinta ou a Sexta Parada? Isto foi resolvido quando achei uma reportagem de 1931 que anunciava a abertura da Quarta e da Quinta Parada no dia 15 de novembro. A localização da Sexta Parada sempre foi mostrada como na sendo na Antonio de Barros,mas havia discussçoes de que a Sexta Parada nunca havia existido e que a Engenheiro Gualberto teria sido a sucessora da Quinta e não da Sexta Parada. O que houve foi que a Quinta Parada original, aquela da rua Vilela, havia sido desativada antes disto. Por isto, a Sexta passou a ser a Quinta, simplesmente para ordenar os números.
Outra questão: as paradas foram implantadas pela ferrovia entre 1875 (ano de abertura da linha do Norte) e 1886 (ano de abertura ds linha Norte-Penha), ou neste ano de 1886, ou ainda depois disto? De qualquer forma, a primeira referência a qualquer uma destas paradas foi por mim encontrada no ano de 1891 na imprensa paulista.
É uma história de muitas lacunas e poucas certezas, estas das paradas da Central do Brasil em São Paulo. Há quem afirme, por exemplo, que as estações de Carlos de Campos, ex-Guaiaúna, e de Artur Alvim, ambas já desativadas em 2000, teriam originalmente sido conhecidas como sétima e oitava paradas. Jamais encontrei qualquer prova destes nomes alternativos. Estas duas estações citadas foram abertas, respectivamente, em 1894 e 1921.
Nota: Texto modificado em 05/05/2020 pelo autor.