sexta-feira, 24 de março de 2023

KÖNIGSBERG E KALININGRADO: UM CONTO DE FADAS (1866-2023)

De Cracovia, Polonia, a Kaliningrado, hoje, são 758 km - mais ou menos como ir de São Paulo ao rio Paraná, em Presidente Epitácio

Já falei sobre o assunto que discorro abaixo pelo menos duas vezes neste blog. Eventualmente, por um motivo ou outro, a cidade de Königsberg, hoje um enclave russo espremido entre a Polônia e a Lituânia tendo o mar Báltico como paisagem. Hoje essa cidade tem um nome russo, como seria esperado: Kaliningrado.

Com muita história, mas hoje relegada a uma posição sem grandes participações na política europeia e sem grandes aventuras desde o já longínquo ano de 1947, Kaliningrado foi tomada pela Rússia, na época a URSS, após o acordo de limites para a Alemanha e outros países por ali localizados).

Uma das histórias quem contava era meu saudoso pai, Ernesto Giesbrecht. Ele queria visitar a cidade, mas conseguir vistos para lá, mesmo depois da Segunda Guerra Mundial, era praticamente impossível.

Em 1980, meu pai esteve em Berlim Ocidental, a trabalho, por poucos dias. Nesta cidade, ele visitou também um suposto parente afastado nosso, com o mesmo sobrenome, para tentar saber algo sobre a família. Foi muito bem recebido, mas, informações concretas, nenhuma.

Voltando a Königsberg nesta narrativa, (quase) nada sei sobre a velha cidade. Sei onde fica, sei que o sabio Immanuelk Kant nasceu e viveu na cidade há cerca de 200 anos e que os Giesbrecht têm uma longa linhagem de antepassados meus na cidade. Mas não parecem pessoas abastadas nessa época. 

Nada sei sobre eles, a não ser que em 1866, August Giesbrecht tiveram um filho de nome Wilhelm Giesbrecht, que teria sido batizado pelo Imperador Alemão (Kaiser) na época. Há, porém, histórias (verdadeiras?) de batizados coletivos com o Imperador eram comuns. Quando teria sido este batizado? Seu nome seria uma homenagem ao Imperador (Wilhelm I) ?

Ele, que foi meu bisavô, chegou ao Rio de Janeiro com 18 anos de idade e sozinho, ao que tudo indica.

Wilhelm tinha dois irmãos, um menino e uma menina. Não há notícias de que eles tenham vindo ao Brasil, ou que Wilhelm tenha voltado em album momento para a Prússia.

A vida continuou. Há um intervalo de onze anos entre sua chegada ao Brasil em 1884 e seu casamento, em Diamantina, em 1893. Parece (com muitas ressalvas e dúvidas) que ele teria utilizado estes seis anos para viajar para a Argentina para estudar engenharia. Voltando para o Brasil, conseguiu o primeiro emprego em 1889 (segundo seu próprio currículo) para trabalhar na construção de uma ferrovia em Mimas Gerais. Depois, teve o primeiro filho no que é hoje a cidade de Jaguariúna, perto de Campinas, SP. Trabalhou depois numa série de empreendimentos, construiu e projetou ferrovias e rodovias. Era considerado um bom engenheiro, com a alcunha de "O engenheiro alemão" e teve nove filhos e filhas. É considerado hoje um dos fundadores da cidade de Jaguariúna. Morreu em 1957, com 91 anos, em Governador Valadares, estado em que trabalhou por muito mais tempo que nas outras regiões brasileiras.

Há alguns anos, contei a história acima, sem grande detalhes, ao meu genro italiano, o Alberto.

Alberto mora hoje com minha filha e meu neto em Florença, Itália. Tempos depois. num jantar com colegas de trabalho em Cracóvia, Polônia, falavam sobre Kaliningrado, cidade a 750 km dali. Num determinado instante, Alberto contou que filho (meu  neto) era tetraneto de um prussiano de Königsberg. Os poloneses questionaram como uma mistura dessas podia acontecer. E começaram a falar da cidade, que, conheciam. É claro que Alberto contou a linha de descendência, passando pelo fato de seu sogro (eu) ser o pai brasileiro de seu filho italiano.

E daí? Na verdade, e daí, nada - ninguém se conhecia realmente ali nem eram parentes entre si. Königsberg, Brasil, São Paulo, tantos lugares, tanto tempo, tanta mudança, tanta história, histórias de uma história... e eu, que também gostaria de conhecer Kaliningrado, cidade que hoje nem polonesa é, e meu pai nunca chegamos a realizar nosso desejo. Hoje, naquele grupo jantando num restaurante, a história inesperada lembrava um conto de fadas.

terça-feira, 21 de março de 2023

Cuiabá, MT: O VLT DO BURACO (2014-2023)

 


Entulho em algum ponto do ex-futuro VLT com parte da linha já instalada. Foto Midia News/O Globo em marlo de 2023.

Matéria transcrita de Mídia News (via RF - Revista Ferroviária na data de hoje, 21 de março de 2023) mostra mais um prejuízo, já quase bilionário, em um projeto para o VLT que virou BRT e até hoje não está pronto - Veículo Leve Sobre Trilhos, para ligar as cidades de Cuiabá, MT, e Várzea Grande, ambas no, MT.

Tente entender a história de (muito) dinheiro, no mínimo, mal administrado, um projeto se arrasta já há pelo menos 13 anos

Empresas do VLT podem ter que devolver R$ 830 mi por danos

MidiaNews – As empresas C. R. Almeida S/A Engenharia de Obras, Santa Barbara Construções S/A, CAF Brasil Indústria e Comércio AS, Magna Engenharia e ASTEP Engenharia Ltda, que compõem o Consórcio VLT, respondem na Justiça por danos morais e materiais e podem ter que devolver aos cofres públicos R$ 830 milhões, por não entregarem a obra do modal.

A ação é movida pelo Estado de Mato Grosso, após a confirmação da rescisão definitiva do contrato, por parte do Tribunal de Justiça de Mato Grosso e Superior Tribunal de Justiça (STJ), e pela decisão de retomar a obra do BRT, que era o transporte escolhido para operar entre Várzea Grande e Cuiabá. 

O processo tramita desde dezembro de 2020 e cobra o ressarcimento de R$ 676,8 milhões pelos danos materiais em razão dos pagamentos ao consórcio para a obra que nunca foi entregue; outros R$ 147,7 milhões por danos morais coletivos; e mais a recomposição de R$ 6,4 milhões que o Estado gastou na contratação de consultorias técnicas para proporem uma solução ao Veículo Leve sobre Trilhos. Além disso, a ação pede que o consórcio arque com taxas, juros e multas dos contratos de financiamento feitos para custear a obra.

Na ação, o Governo do Estado contabiliza as obras que foram entregues e estão sendo utilizadas pela população, como viadutos e trincheira.

Na avaliação da Procuradoria Geral do Estado (PGE), o Estado tem direito a “satisfação das perdas e danos”, pois o objeto contratado se tornou inútil justamente pela demora e descumprimento do contrato. 

“Era obrigação da contratada entregar o Veículo Leve sobre Trilhos instalado e funcionando antes do evento Copa do Mundo 2014, ocorrido no Brasil (com 4 jogos em Cuiabá) no período de 12 de junho a 13 de julho de 2014. Todavia, passado o evento esportivo, não se desincumbiu de suas obrigações, notadamente diante dos sucessivos atrasos na obra e, principalmente, pela deflagração da Operação Descarrilho pela Polícia Federal, decorrente de uma investigação sobre esquemas de pagamentos indevidos efetuados pelo Consórcio VLT a membros da alta cúpula do Governo Estadual, confirmada na delação premiada do ex-Governador do Estado Silval Barbosa. É direito do Autor, portanto, ver-se ressarcido de todos os prejuízos experimentados pela inexecução da obra, notadamente porque grande parte dos materiais e algumas obras entregues não serão de nenhuma utilidade para o Estado, agora que, por fatos supervenientes, devidamente comprovados, decidiu-se por não retomar a execução do VLT”, pontuou a PGE, no processo.

Corrupção

Em 2017, o ex-governador Silval Barbosa firmou delação premiada e revelou que todo o processo de escolha e contratação do Consórcio VLT foi feito envolvendo propina.

O ex-governador deu detalhes da negociata ao Ministério Público Federal (MPF) e afirmou que, a princípio, a opção tecnicamente aprovada seria implantar o BRT, que custaria R$ 450 milhões na época.

Porém, posteriormente, ficou decidido por escolher o VLT, que custaria mais de R$ 1,4 bilhão, mediante recebimento de propina do Consórcio VLT na compra dos vagões, orçados em R$ 600 milhões.

Presidente da CAF

Segundo Silval, o ex-secretário da Secopa Mauricio Guimarães, ficou encarregado de procurar um dos diretores da empresa para acertar os “retornos”. Neste encontro, segundo Silval, ficou definido que a CAF pagaria a título de propina o valor de R$ 18 milhões.

“Que não foi feito acerto em euros e o declarante [Silval] nega que tenha sido acertada propina no montante de oito milhões de euros; Que além do diretor acima citado, cujo nome do declarante não se recorda, o pagamento de propina foi tratado posteriormente com o presidente da CAF Brasil Renato de Souza Meireles e Agenor Marinho Contente Filho, diretor-geral, sendo que ambos conversavam com o declarante e Mauricio sobre os valores devidos de retorno”, diz trecho do depoimento de Silval.

“Que foram realizadas várias reuniões com os representantes da CAF (as reuniões ocorreram em Cuiabá, em Brasília e em São Paulo), para tratar do pagamento dos retornos, cujo valor foi objeto de negociação, tendo ficado a cargo dos dois executivos arrumar um jeito de realizar os pagamentos”, relatou Silval ao MPF.

Fonte: https://www.midianews.com.br/politica/empresas-do-vlt-podem-ter-que-devolver-r-830-mi-por-danos/441305

quarta-feira, 8 de março de 2023

E. F. CAMPOS DO JORDÃO: MAIS (E NÃO MÁS) NOTÍCIAS (2023)

 
                                      

A estação de Campos do Jordão em 1980

Segundo o site da Band, o Governo do Estado de São Paulo qualificou a retomada do projeto de concessão da Estrada de Ferro de Campos do Jordão (EFCJ). Nele estão incluídos a linha férrea, estação e ativos imobiliários. O anúncio foi feito em 28 de fevereiro último pelo governador Tarcísio de Freitas.

O investimento previsto de R$ 160 milhões será aplicado na modernização e reforma da estrada eletrificada, considerando trilhos, embarcações e outros equipamentos.

A linha férrea tem 47 quilômetros de trilhos, que contam com oito serviços ferroviários: Trem de Subúrbio, Trem Turístico de Piracuama, Trem do Mirante, Bonde Turístico, Bonde Turístico Urbano, Maria Fumaça, Trens Temáticos de Turismo e Trem de Serra. Eles atendem as cidades de Pindamonhangaba, Santo Antônio do Pinhal e Campos do Jordão. 

A linha tem seis estações: Pindamonhangaba, Expedicionária, Piracuama, Eugênio Lefévre, Abernéssia e Emílio Ribas, além de diversas paradas e estribos ao longo de sua extensão.

Depois de um desastre com mortes ocorrido há mais de seis anos no trecho da serra (em 4 de novembro de 2016), a linha vinha operando apenas com os bondes turísticos urbanos, na cidade de Campos de Jordão. O trecho da serra estava desativado e em estado de abandono e até o trecho de subúrbios de Pindamonhangaba, que atendia diversas paradas, depois de ter continuado o funcionamento por algum tempo, parou, com a quarentena da Covid-19 (no início desta e não voltou a operar).

Agora, com um governador que aprecia e vê necessidade em trens de passageiros, talvez as providências realmente sejam tomadas.

Fontes: https://www.band.uol.com.br/band-vale/noticias/estrada-de-ferro-campos-do-jordao-16586182 e https://blogdogiesbrecht.blogspot.com/2023/03/e-f-campos-do-jordao-mais-e-nao-mas.html 


sexta-feira, 3 de março de 2023

A ESTAÇÃO DE BAIRRO ALEGRE (2011-2023)

                                
                         A estação de Bairro Alegre em 2023 - jornal O Município

Em fevereiro de 2011, doze anos atrás, aqui neste mesmo blog, publiquei um artigo sobre esta ex-estação da Cia. Mogiana de Estradas de Ferro.

Eu falava então sobre o abandono das antigas e desativadas estações ferroviárias em São Paulo e no Brasil. No caso, era a estação de Bairro Alegre, no município de São João da Boa Vista e que atendeu aos passageiros e cargas de 1910 a 1976, quando foi desativada pela FEPASA.

Os anos se passaram e a estação foi se deteriorando. Pelo ramal, ainda hoje passam trens praticamente todos os dias, com cargas proveniente da estação de Bauxita, já em Minas Gerais. Quando acabar o minério de alumínio ali, acaba o tráfego no ramal - e o próprio ramal.

Será que a prefeitura da cidade não acompanha o processo de deterioração deste prédio, bem típico das estações da Mogiana das duas primeiras décadas do século passado? Não sei, realmente, se este prédio pertence à Prefeitura, desativada que foi já há muitos anos. 

Será que a população do bairro não se importa com o que está acontecendo? E sem apoio dos vizinhos, não haverá muito o que se fazer para evitar que o local se transforme numa praça sem qualquer vestígio de lembranças do que um dia foi uma estação que embarcou e desembarcou milhares de passageiros nestes 112 anos que por ali passaram desde que ela foi entregue ao serviço da velha ferrovia.

Até 2022, o prédio pertencia à União. Existe algum processo de tombamento do imóvel para evitar que o prédio caia de uma vez? É bom correr com o restauro do edifício, ele não vai aguentar muito ali, à beira da rodovia que liga Aguaí a Poços de Caldas e cercado cada dia com mais mato.

Ontem, um jornal da cidade retratou a estação de Bairro Alegre. Agora vai?

Postagem de 22/02/2011: https://blogdogiesbrecht.blogspot.com/search?q=bairro+alegre 

A estação e sua história: http://www.estacoesferroviarias.com.br/b/balegre.htm


sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

MORTE NA FERROVIA (1923)

Em notícia de 11/3/1923, o jornal O Estado de S. Paulo publicou a morte de um senhor, próxima à estação de Viradouro - comunicado da época, quando esta ferrovia ainda era um ramal pertencente à então ainda existente, Cia. Ferroviária São Paulo-Goiaz.

Três anos mais tarde e o trecho em que estava a estação citada foi comprada pela Cia. Paulista de Estradas de Ferro. Em 1923, a estação de Viradouro (extinta nos anos 1960) ainda estava num ramal da EFSP-GO.

História à parte, o infeliz italiano que estava a andar ou a atravessar a linha foi apanhado pela locomotiva, matando-o.

Ele trabalhava numa colônia ali perto, de nome Água Limpa e tinha 50 anos de idade. Deixou uma viúva e diversos filhos. 

Minhas condolências ao Signore Pedro Montagnara, morto há cem anos num acidente no meio do nada. Eram 8 da noite. Já deveria estar escuro... bem escuro. Será que a locomotiva estava com o farol desligado? Os trilhos não existem mais na região. Haveria alguma cruz perdida por ali, fincada no solo?

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

JUÓ BANANERE (1923)




O engenheiro Alexandre Ribeiro Marcondes Machado era também poeta e jornalista. Viveu nos anos 1920 em São Paulo em meio a uma multidão de imigrantes italianos e criou para si um pseudônimo - Juó Bananére - para seus escritos no jornal satírico Diário do Baixo Piques.

Um de seus versos, criados no idioma chamado por muitos da época como "idioma macarrônico", era uma mistura do italiano com o português falados na cidade de São Paulo por algumas pessoa, algo que hoje talvez pudéssemos comparar com o já famoso "portunhol", falado por diversos turistas brasileiros que visitam principalmente a Argentina, o Paraguay e o Uruguay na esperança de se comunicar com seus habitantes que nos olham com olhos espantados...

No texto publicado no Diário acima citado, o satirizado era meu avô Sud Mennucci.

Num recorte de papel que sobreviveu cem anos, parte no acervo de Sud quanto no meu, Sud aparece como "Sub" Mennucci e seu rosto era a cabeça do boneco que parecia discursar como cabo eleitoral de alguém, enquanto uma senhora parecia observá-lo com alguma ressalva...

O que chamou minha atenção era que meu avô, nesse distante ano de 1923, tinha um problema sério: sua filha estava internada no hospital Santa Catarina e minha avó Maria era a sua acompanhante de quarto. Eles na época residiam em Piracicaaba, onde meu avô era delegado regional de ensino, o que fazia com que ele tivesse viajar muito entre as duas cidades. E o casal não tinha moradia na Capital.

Onde teriam eles morado nesse período? (Astarté, a filha, acabaria infelizmente falecendo no inicio de 1924). Hotel? Casa de amigos ou parentes? Nunca tive a resposta para isto...

Por outro lado, a maior presença dele em São Paulo abriria mais caminhos para outros interesses dele. E, bem sabemos, críticas vieram quando sua presença tornou-se mais constante. Daí uma provável sátíra no recorte. 

Sud detestava ser chamado de "italianinho", apelido dos imigrantes italianos na época. E Baixo Piques  era um local específico na região do largo do Piques, local que não existe mais desde os anos 1930 e que se localizava mais ou menos onde hoje está o viaduto das Bandeiras, no começo da atual rua Santo Antonio, junto ao famoso Bixiga, hoje o bairro paulistano da Bela Vista.

Finalmente, eu não sei italiano suficiente para tentar entender muito do que está escrito no curioso  recorte.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

TRENS METROPOLITANOS DO RIO GRANDE DO NORTE

Em São José do Mipibu, agora ponta de linha na linha Sul da CBTU/Natal, o povo aguarda pelo primeiro trem em quarenta anos, com a ferrovia passando no mesmo nível das ruas. Não há proteção de via. Mas o povo certamente não se importa. Com educação, tudo se resolve. 

Verdade seja dita, o Brasil é enorme, muito mais do que a gente acredita que seja. 

Eu, que nasci em São Paulo, Capital, e não viajei pouco nestes meus setenta anos, já visitei os Estados Unidos, o Canadá e diversos países da Europa, não conheço todos os Estados do Brasil. As regiões que menos conheço são a Nordeste e a Norte do país.

Um dos Estados dos quais não conheço presencialmente nenhum local, é o Rio Grande do Norte.

Nas últimas semanas, no entanto, tenho estudado geograficamente as ferrovias deste Estado tão afastado daqui (ou nós é que estamos longe dele?). Também me embrenhei na história dos últimos 120 anos do Estado potiguar.

O Rio Grande do Norte teve ferrovias, sim, e desde 1906. Foi crescendo, entretanto, lentamente sua rede, até que, nos anos 1960, essa expansão cessou e começou o processo de abandono de suas linhas. Até aí, nenhuma grande novidade: essa retração existiu no país inteiro.

Em 1982, os trens de passageiros, que ligavam o Estado à Paraíba e também a Pernambuco, deixaram de ter trens de passaageiros e o movimento de carga, que era pequeno, desapareceu nos últimos anos do século XX.

No mesmo ano, 1982, em que os trens para os Estados vizinhos acabaram, surgiu, das entranhas da RFFSA, uma outra empresa para operar trens metropolitanos no Brasil: a Companhia Brasileira de trens urbanos, cuja sigla era (e ainda é) CBTU.

Em São Paulo, por exemplo, a CBTU passou a operar as linhas de subúrbio da E. F. Santos a Jundiaí  também a E. F. Cantral do Brasil. A CBTU tomou conta das linhas de diversos Estados também.

Voltando ao RN, duas linhas passaram a operar esss trens, substituindo os que já circulavam, com alguns percalços, as linhas Sul (Natal a Parnamirim e a Norte (Natal a Ceará-Mirim). Não eram as linhas em todo os trechos anteriores: Parnamirim a Nova Cruz e Ceará-Mirim a Macau e Oscar Nelson ficaram de fora. Ao contrário do que s esperava, no entando, a eletrificação do trecho jamais foi implantada e os trens diesel foram mantidos, com locomotivas do tipo IRFA.

Durante este período de 1982 a hoje, houve a criação de diversas estações intermediárias nas duas linhas, sendo que a linha Sul atual sofreu recentemente uma expansão, com os trens, agora novos, com aspecto mais moderno e confortável, chegando até a estação de São José do Mipibu, retornando à cidade depois de 40 anos. As estações que foram construídas para atender ao trecho são bem mais confortáveis, embora muitas sejam bastante pequenas.

Enfim, o governo potiguar parece que relmente se importa com o transporte por trens. É clro que, comparando-e o qu há lá com o que é hoje a CPTM aqui em São Paulo, que opera os modais e estações gigantescas, nem sempre, talvez, necessárias. Mas mostra que o governo potiguar se importa com a mobilidade do povo, o que não é tão frequente nos dias de hoje.

O Estado é relativamente pequeno e a população, em consequência, não muito grande, mas vem-me a pergunta: será que um dia o trem retornará a Macau e a Nova Cruz para atender ao povo de duas das maiores cidades de lá?

Agradeço ao João Rodrigues Lanza e também ao João Santos, este do exceleente blog Cronicas Tapuienses, que me forneceram muitas informações sobre o Estado e suas ferrovias.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

OS DRAMAS DO TREM PARIS-LONDRES (2023)

 

                              

Transcrito do Jornal O Globo, via Revista Ferroviária, em Notícias da Imprensa, 6/2/2023:

Para uma geração, o trem de alta velocidade Eurostar que cruza o fundo do Canal da Mancha foi o retrato elegante e engenhoso de um novo nível de proximidade entre o Reino Unido e a Europa; agora, porém, ele corre o risco de se tornar o símbolo das tensões geradas pela separação via Brexit.

Até dois anos atrás, era possível apenas exibir o passaporte para uma inspeção rápida, mas desde 2021, depois da cisão, o passageiro britânico que vai ou vem precisa carimbar o documento. Enquanto a pandemia mantinha as viagens em um nível mínimo, o tempo mais longo exigido pela operação não fazia muita diferença, mas de uns meses para cá, com o aumento no volume de usuários, as filas – e a espera – ficaram mais longas.

A solução encontrada pela Eurostar foi limitar o número de pessoas nos trens, preferindo assim deixar centenas de assentos vagos em algumas linhas em vez de correr o risco dos atrasos gerados pela verificação. Naqueles que normalmente levariam até 900 passageiros, a capacidade foi reduzida para 600. A medida entrou em vigor há alguns meses, mas só começou a chamar a atenção de verdade na última semana, quando foi anunciada pelos meios de comunicação britânicos.

Embora os efeitos do Brexit na economia britânica ainda sejam objeto de estudos e debates, algumas consequências concretas já estão ficando claras. De fato, para os críticos, o problema com a Eurostar é apenas mais uma prova exasperante de que o país jamais deveria ter saído do bloco.

“Todo dia se apresentam, das mais variadas formas, provas de que o Brexit está deixando o país mais pobre, mais fraco, menos eficiente e menos respeitado no mundo. Foi o maior ato de autoflagelação nacional até hoje, e só começaremos a nos recuperar quando admitirmos isso”, escreveu Alastair Campbell, antigo assessor do ex-primeiro-ministro Tony Blair, no Twitter.

Em meados de 2022, quando as longas filas de veranistas aguardavam a verificação dos documentos no porto de Dover para poder embarcar nas balsas que cruzam o canal, as autoridades britânicas culparam os franceses pela demora, acusando-os de não reforçar o pessoal do controle alfandegário. O ministro dos transportes francês, Clément Beaune, rebateu: “A França não é responsável pelo Brexit.”

Mark Smith, ex-chefe de estação e fundador de um site que dá dicas de viagens férreas aos britânicos, conta que foi um dos primeiros a andar no trem que faz o percurso entre Paris e Londres, lançado pela Eurostar em 1994.

– No começo, ele saía da estação Waterloo, mas em 2007 mudaram para o terminal de St. Pancras, novinho em folha. O lançamento teve até champanhe, e foi considerado prenúncio de uma nova proximidade entre os dois países, mesmo com a empresa servindo outras cidades europeias, tipo Amsterdã e Bruxelas – diz. – A verdade é que seus terminais foram projetados para uma Europa aberta, onde o viajante pode se movimentar sem dificuldade entre um país e outro. Dava para fazer Londres-Paris em duas horas e 15 minutos, por exemplo. Não é um sistema para situações de limitações, cortinas de ferro e tal. Não funciona com Brexit porque, por definição, o movimento criou uma barreira entre a França e o Reino Unido bem no meio do canal.

Os cidadãos da União Europeia podem se movimentar livremente de um Estado-membro para outro e ali permanecer indefinidamente, mas quem vem de outras partes do mundo, incluindo agora o Reino Unido, tem prazo de permanência. Como resultado, a polícia alfandegária francesa tem de carimbar o passaporte dos britânicos – que representam cerca de 40% do movimento da empresa – na ida e na volta, para mostrar quando entraram no bloco e quando voltaram para casa. O Reino Unido ainda não impôs exigência semelhante aos europeus que pegam o trem, o que lhes facilita um pouco a viagem.

Por e-mail, um representante da Eurostar diz que os atrasos e as limitações de capacidade são consequência da falta de agentes e de espaço para a expansão da infraestrutura alfandegária em seus terminais, principalmente na estação de St. Pancras em Londres e na Gare Du Nord em Paris.

O governo francês informa que, entre 2020 e 2021, colocou mais 15 agentes no terminal da Eurostar na estação parisiense para agilizar a verificação, mas não revela se fez o mesmo do lado londrino. Segundo Matthieu Ellerbach, assessor do Ministério do Interior francês, a polícia de fronteira francesa está “inteiramente mobilizada” para enfrentar os picos de fluxo, e novos oficiais assumirão a tarefa nos próximos meses.

A Eurostar revela que está trabalhando na instalação de estações de checagem de passaporte mais automatizadas, mas no momento atual o nível máximo de capacidade entre as estações está 30% abaixo do nível de 2019; mesmo com a ocupação integral de todas as cabines, hoje St. Pancras consegue processar 1.500 passageiros por hora, no máximo, 700 a menos do que em 2019.

–Estamos a par dos problemas e em contato constante com a Eurostar e as autoridades francesas, que estão trabalhando para garantir a agilização do processo – explica o representante do governo britânico.

Os passageiros da Eurostar com passaporte da União Europeia, da Islândia, de Liechtenstein, da Noruega e da Suíça geralmente só precisam apresentá-lo nas catracas eletrônicas, em um processo normalmente ágil. Até o Brexit, os britânicos faziam o mesmo, com os oficiais verificando apenas a data de validade e se pertencia à pessoa que o portava. Desde janeiro de 2021, porém, eles ficaram obrigados a fazer um controle mais minucioso, inclusive carimbando o documento.

No início da pandemia, quando os lucros da Eurostar caíram 95%, a empresa suspendeu o serviço para duas estações menores no sudeste da Inglaterra, entre Londres e o canal; agora a demanda se recuperou e já está entre 75% e 80% do volume pré-Covid, mas, ainda assim, o serviço dessas duas unidades não será reativado.

Em carta ao comitê parlamentar britânico para justificar a decisão, Jacques Damas, CEO da companhia na época, disse que a reabertura só agravaria a situação, já que tiraria agentes de Londres para atuar em unidades menores.

– É somente graças ao fato de a Eurostar manter o limite de capacidade dos trens e ter reduzido significativamente os horários em relação aos de 2019 que não há filas diárias em Londres semelhantes àquelas nos portos do canal – comentou, referindo-se aos engarrafamentos de passageiros e de carga nos portos britânicos pós-Brexit. – Essa é uma situação que tem consequências comerciais óbvias e não é sustentável em médio e longo prazo, mas a consequência imediata é que atualmente não temos condições de atender à alta demanda na rota que liga as duas capitais.

Fonte: https://oglobo.globo.com/boa-viagem/noticia/2023/02/como-o-brexit-transformou-a-viagem-de-trem-entre-londres-e-paris-num-longo-tunel-de-burocracia.ghtml




terça-feira, 31 de janeiro de 2023

DO JEITO QUE VAI - RODOANEL DE SP (TRAMO NORTE) E MONOTRILHO (2023)


O texto desta postagem foi extraído da Revista Ferroviária a partir de uma notícia do G1 (link ao pé desta página). Minha intenção é propalar a situação ao maior número de pessoas possível. Do jeito que vai, quando esstas obras estiverem prontas, já serão insuficientes para atender ao número de usuários. O texto é de 31/01/2023.

TCE aponta 261 obras atrasadas e 501 paralisadas em SP; contratos somam mais de R$ 19 bilhões 

Rodoanel em São Paulo

O relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE) aponta que São Paulo tem quase 700 obras paradas ou atrasadas. 

Na lista estão, entre muitas outras obras, a do Monotrilho, na capital paulista, e do Rodoanel, na Grande São Paulo. O Rodoanel Norte chegou ao bairro de Perus há cerca de cinco anos e parou. Os primeiros túneis estão inacabados e bloqueados pelo mato.

Segundo mostrou o SP2, o caminho é intransitável, tem pistas abertas na mata com áreas verdes cortadas por esqueletos de viadutos. No único trecho com asfalto, no limite entre a capital e Guarulhos, a parte da pista cedeu.

As áreas debaixo dos viadutos viraram depósito de lixo, entulho e resíduos de fábricas. O progresso parou para quem mora perto da obra.

“É um dinheiro público, é um descaso total. Quanto foi gasto aqui?”, disse o morador Emerson Rocha.

As obras consumiram R$ 3,9 bilhões.

A última tentativa de retomar as obras foi no ano passado. Um leilão chegou a ser marcado em abril para a contratação de um consórcio que consiga transformar trechos do asfalto abandonados em uma estrada. Mas o processo acabou adiado. Agora, o governo do estado marcou uma nova data para o leilão: 14 de março.

Monotrilho

Outra obra atrasada há mais de oito anos, a linha 17-Ouro do Monotrilho, também consumiu dinheiro público nos últimos dez anos e ainda não transportou nenhum passageiro.

O Tribunal de Contas do Estado diz que São Paulo tem 261 obras atrasadas e 501 obras paralisadas. Contratos que somam R$ 19,8 bilhões.

Entre os principais motivos para os atrasos aparecem descumprimento dos contratos, falhas técnicas descobertas depois da licitação, descumprimento de especificações e prazos e atraso do repasse de verbas pelo governo federal.

Fonte: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2023/01/30/tce-aponta-261-obras-atrasadas-e-501-paralisadas-em-sp-contratos-somam-mais-de-r-19-bilhoes.ghtml

domingo, 29 de janeiro de 2023

RANCHARIA COM X (1935)

Acima: O telegrama de agradecimento que Sud recebeu em São Paulo, em 1935. Notar que a cidade ainda se chamava Ranxaria, não era erro de português. O que não estava correto era o sobrenome dele, que era escrito Mennucci e não Menucci.
 
O município de Rancharia foi criado em 1935, na região da Alta Sorocabana, no Estado de São Paulo. Um dos defensores deste acontecimento foi meu avô, Sud Mennucci.

Não diretamente. Na verdade, Sud era um dos principais integrantes da Comissão de Redivisão dos Municípios do Brasil, criada por Getúlio Vargas ainda no seu tempo de Governo Provisório, em 1931. Esta comissão existiu em todos os Estados de União naquela época.

Não tenho detalhes sobre as comissões de outros estados, a não ser por uma série de novos municípios e redefinição de fronteiras interestaduais em todos eles, com maior ou menor eficiência nas decisões.

Em São Paulo, pelo menos, cada caso era estudado individualmente, e as informações da Comissão viam tanto desta como por como por sugestão e pedidos de políticos e dos próprios municípios.

A Comissão somente seria desfeita por volta de 1935, com a criação de novos municípios como também pela extinção de alguns (Santo Amaro, hoje um grande bairro de São Paulo, foi incorporado pelo município da Capital - São Paulo - nessa época).

Um dos municípios criados pela Comissão foi o de Rancharia - na época, ainda escrito com "X" no lugar do atual "ch" do nome da cidade. Assim como algumas outras cidades, os políticos e habitantes do novo município enviaram um telegrama para Sud, na data de 14 de julho de 1935, nove dias depois da emancipação. O posto telegráfico era na estação da Sorocabana, como mostra o documento.

Depois da Reforma Ortográfica de 1943, o nome Ranxaria passou a ser escrito definitivamente como Rancharia.

sábado, 21 de janeiro de 2023

NAVEGAÇÃO FLUVIAL NO RIO MOGI GUAÇU (1886)

Jornal A Provincia de S. Paulo, 21/12/1886

Em 1886 a Companhia Paulista de Estradas de Ferro inaugurou o trecho final de sua linha de navegação que já estava instalada desde 1885 a partir da estação ferroviária e portuária de Porto Ferreira. No dia do evento, haveria oferta na venda de sal, na época, artigo caro no interior do Brasil, como mostrou o anúncio acima reproduzido.

Agora passariam a funcionar mais três portos, todos instalados às margens do rio Mogi-Guaçu.

Outros mais deveriam ser construídos nos anos seguintes. Porém, decisões posteriores na ferrovia, agora chamada de ramal de Descalvado e que havia chegado a esta cidade em 1882, mudariam tudo na região.

Outro ramal foi aberto saindo da estação ferroviária de Pirassununga para ser logo prolongado até Santa Cruz das Palmeiras, o que deveria acontecer no início de 1893. Com efeito, em 1886 já havia seis quilômetros de linha operando até Cachoeira de Emas, estação e porto no rio Mogi-Guaçu.

Os negócios da Companhia Mogiana, que também atuava na região norte do rio, estavam sendo afetados pelas modificações da via fluvial da Paulista. A estação de Baldeação, na linha da Mogiana, ficava a um quilômetro apenas da estação final do ramal de Santa Cruz das Palmeiras, em Santa Veridiana.

A rixa entre as duas empresas pelo direito de uso (zona privilegiada) durou até um acordo entre elas, que se deu somente em 1914. 

Em 1903, a linha fluvial entre Porto Ferreira e Pontal foi desativada, obviamente porque o transporte por vapores era mais barato. Em 1893, a Paulista estendeu sua linha-tronco até Jaboticabal. Entre 1910 e 1913, a Mogiana construiu um ramal férreo entre São Simão e Ribeirão Preto. Em 1913, a estação de Baldeação foi aberta, passando a atender às duas ferrovias. Era o resultado da corrida pelo transporte de café por toda a região de Ribeirão Preto.

Todas estas modificações não estavam previstas anteriormente. A história mostrou que a Paulista venceu sua briga contra a Mogiana. Mas que diferença faz tudo isto hoje em dia? Tudo o que foi tratado entre 1880 e 1914 foi destruído pefa FEPASA, sucessora das duas ferrovias citadas, nos anos 1970. É evidente que houve muitos mais detalhes do que foi escrito acima. Mas ficou claro que o gatilho modificador da situação foi a implantação de uma linha de navegação entre as então novíssimas cidades de Porto Ferreira e Pontal, há 136 anos.

domingo, 15 de janeiro de 2023

GUERRAS E PREVISÕES (1914-2023)

A Guerra de 1914 começava e estava na segunda página do jornal O Estado de S. Paulo de 29 de julho. Durante os próximos quatro anos, passaria para a primeira página, pois a situação era pior do que se pensava

Meu avô Sud Mennucci, do qual falei tantas vezes neste blog, já em 1914 escrevia para alguns jornais do interior paulista e dava seus "pitacos". Em novembro de 1914 (data escrita a lápis por ele mesmo no recorte do artigo de jornal já publicado, sem citar o dia, sem citar o nome do jornal que o publicou, sem assinar o nome dele próprio, já que neste artigo ele usou um de seus pseudônimos: Saul Maia. O artigo possivelmente foi publicado no Jornal de Piracicaba, onde ele tinha nascido e estudado, para o qual já havia anos o fazia.

Nesse mês, ele era professor primário no Grupo Escolar da cidade de Porto Ferreira e tinha 24 anos de idade. Ele se casaria lá mesmo em 1917. O Grupo levou o nome dele trinta anos depois. Ele já era jornalista, profissão que abraçou em definitivo depois de mudar-se para São Paulo em 1925.

O que me chamou a atenção foi a forma dramática como o artigo foi escrito..Seria isto somente porque a guerra (a Guerra Mundial de 1914-18, ainda em seu início então) deixava-o receoso? Lembremo-nos que, nessa época, escrevíamos de forma realmente mais... digamos, dramática. Ou, pelo menos, é o que os filmes que retratam essa época fazem.

Hoje em dia, já no século XXI, mesmo com uma guerra perigosa e de certa forma impensável cento e dez anos depois (a invasão da Ucrânia pela Rússia), os incontáveis artigos que a mídia escreve em jornais, acrescidos de uma chuva de veículos, como a televisão, telefones celulares, facebook, instagram, whatsup, podcasts, i-tube, blogs, videoconferences, notícias ao vivo e muitos mais chegam cheios e saem de opiniões, palpites... 

Queremos ver realmente previsões? Ou queremos ver fatos?

Vamos conferir o que Sud escreveu no primeiro trecho do primeiro artigo, intitulado: "À margem da Guerra - Um problema insolúvel - I - O ensaio que, hoje, inicio não passa de considerações vadias de um espírito vagabundo à cata de distrações para encher as vinte e quatro horas maçantes que formam os insuportáveis dias do jornalismo moderno, tão cheio de tolices e profecias"...

Este primeiro parágrafo retrata algo, entretanto, que parece ter sobrevivido aos anos que se passaram desde então, ou seja, há uma tendência a dar (e receber) opiniões e palpites sobre o rumo que os fatos vão tomando, ou seja, "tão cheio de tolices e profecias"... repetindo a frase de 1914. Já no primeiro parágrafo, Sud criticava a si mesmo.

Naquela época, como hoje, devemos pautar nossos planos para o futuro baseados nas provisões de uma mídia presunçosa e tendenciosa que passsa a regular nossa vida?

Quanto ao artigo em si, não vou transcrevê-lo. Afinal, cento e nove anos depois, já sabemos como essa guerra acabou e quais foram suas consequências.

 

segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

AS COISAS NÃO MUDARAM (1912)


Na foto acima, tomada na estação de trem em Avaré, Estado de São Paulo em 1912, pela revista Illustração Paulista, estão  "secretários de Estado" (não dizem quais, nem eu fui procurar). Quantos e quais eram eles?

Eu poderia apostar que há mais pessoas comuns da cidade que nada têm a ver com os secretários, mas não posso provar. Eram eles "papagaios de pirata", curiosos, parentes, esperando, muitas vezes, para uma boca-livre enquanto a condução não chegava - quando havia. De acordo com a legenda, eles estavam esperando alguns carros - na época, a probabilidade de serem carroças, tílburis ou similares era muito maior do que serem automóveis, certamente raríssimos, se é que os havia, em Avaré.

Enquanto isso,

A estação, nesse tempo, estava situada no limite da zona urbana, por onde passava a ferrovia. Essa estação cederia lugar para uma muito maior e de estilo moderno nos anos 1950, quando a linha da Sorocabana foi mudada para o sul da cidade, quando ali ainda era zona rural. 

Agora, eram novos tempos, cidades maiores, estações mais distantes do centro e os políticos andavam - ainda andam - de automóveis caros, com motoristas, e vêm direto da Capital já com eles, os famosos "chapas brancas". De trem - desde os anos 1940 no máximo, ninguém quer mais saber. 

E, não muito tempo depois, nem se quisessem, pois os trens de e para o interior paulista desapareceram. E como de ônibus político não anda, não há mais onde quem queira fazer o papel de povo. 






sábado, 7 de janeiro de 2023

AS COISAS MUDARAM (1884)


Lendo velhas notícias de jornais na Internet (como faço quase todos os dias), encontrei mais uma bem interessante no já distante ano de 1884 (até meu bisavô alemão já havia imigrado para o Brasil, com 18 anos), deparei-me com esta, mostrada acima, no jornal "O Pharol" da cidade de Juiz de Fora, MG.
Seria ela verdadeira? Afinal, citavam-na como extraída de um jornal francês, sem citar data alguma, nem o nome do tal jornal que a publicou.

Possivelmente, transcreveram-na para mostrar o duplo sentido da frase que o tal alfaiate anunciou. 

Era ali que era mais barato fazer roupas, posto que os preços da concorrência seriam sempre mais caros e porisso estes eram ladrões, ou o fato de que o anunciante dizer-se mais barato torná-lo-ia o mais barato dos ladrões?

Enquanto isto, fiquei analisando o texto em português antigo. Estou longe de ser um conhecedor da velha língua que vigorava em 1884, mas conheço algumas das palavras que se escreviam de outra forma então.

"Pharol", no lugar de "farol", mostra o "ph", sempre com som de "f" em diversas palavras, como "pharmacia" ou mesmo em meu nome (Ralph). Contudo, ainda existiam diversas palavras com os famosos "phs", o "f" era largamente usado. Nas reformas ortográficas de 1911 e de 1942, o "ph" sumiu. Curiosamente, nasci em 1951 e meu nome foi registrado como Ralph. A desculpa de meus pais? Ralph escreia-se assim, pois em inglês se escrevia assim. Também. Mas, em alemão, geralmente é Ralf. Ficou assim mesmo.

E o "venhão"? Vários textos que li dos anos 1870, 80 ou 90 escreviam o tempo plural do verbo referindo-se à terceira pessoa dessa forma. Ou seja, em vez de "venhão", "venham". Porém, outros o grafavam como é hoje. Permitia-se as duas formas, então? Não sei. É estranho, não? Afinal, o som dessas palavras parecem-se com o "ão", mas temos que escrevê-las com o "am".

Finalmente, o "á", que também aparece no texto do jornal de Juiz de Fora, era nessa época o famoso "a" craseado. Escrevia-se com acento agudo, mesmo. Hoje, temos de escrever "á", com agento grave. O antigo deixou de existir em 1942.

E para acabar de vez, no anúncio não apareciam em nenhum lugar palavras com duplas consoantes, como "ll", "mm" ou outras que tinham de ser escritas desse jeito (que, aliás, se escrevia "geito"). Elas eram bastante comuns. Cavallo, estrela, Anna... havia muitas.

Mesmo assim, fizeram reformas demais, em minha opinião, desnecessárias num país em que muitas pessoas ainda são analfabetas.

terça-feira, 3 de janeiro de 2023

TRANSNORDESTINA, UM RALO DE DINHEIRO (2023)

ACIMA: Mapa das linhas da Transnordestinas em 2012 (Revista Ferroviária)

A Transnordestina, antiga CFN – Companhia Ferroviária do Nordeste (quando foi privatizada, recebeu este nome) eram várias ferrovias na década de 1990 com muito pouca atividade e que eram patrimônio da antiga RFFSA (Rede Ferroviária Federal) que deveriam, de uma forma ou de outra, beneficiar o tráfego de cargas ligando as atividades já existentes ou não, de várias regiões do Nordeste brasileiro.

O leilão de privatização ocorreu no final dos anos 1990 e quem ganhou a concessão foi o empresário Benjamin Steinbruch, que rapidamente trocou o nome da rede para CFN, agregando uma região do Piauí, com fontes de produção de soja, milho e algodão e de gesso do município de Araripina, este em Pernambuco. Para isto, utilizar-se-ia de dois portos: Pecém, no Ceará e próximo a Fortaleza e Suape, em Pernambuco e próximo a Recife.

Piauí (Parnaíba) ficou de fora, bem como o Maranhão (com o porto de Parnaíba) e São Luís, que já era atendido pela ferrovia dos Carajás)
Vinte e seis anos depois, foram eliminados vários trechos ferroviários já existentes.

O Rio Grande do Norte teve sua rede ferroviária abandonada, apenas sobrevivendo, para trens metropolitanos da região de Natal, que haviam sido formados ainda nos tempos da RFFSA. O mesmo aconteceu com a linha em Alagoas, onde ainda há trens metropolitanos ligando Maceió a Lourenço de Albuquerque.

Na Paraíba, os trens cargueiros que circulavam entre Campina Grande e Fortaleza, passando por Missão Velha, no Ceará e vindos do agreste pernambucano, circularam até uns dez anos atrás e foram cortados também.

Não nos esqueçamos das antigas linhas que ligavam Recife a Alagoas e Recife a Salgueiro, onde aguardou anos esperando a continuação para o sul do Ceará. Pelo menos, boa parte (mas não tudo) das linhas mais próximas a Recife foram mantidas como trens metropolitanos (Cabo, Jaboatão), embora tenham passado por diversas modificações de traçado.

A linha do interior do Piauí (ligando o porto de Parnaíba a Teresina) foi totalmente abandonada. Porém, o trem metropolitano de Teresina ocupou um pequeno trecho de linha na cidade.

Tudo isso, sem entrar em maiores detalhes, levou ao abandono a maior parte das ferrovias do interior do Nordeste.

Toda a atividade das linhas cargueiras hoje existentes no Nordeste ainda o são nas ferrovias do tempo da RFFSA. Desde a privatização pouquíssimos trechos ferroviários foram construídos pela Transnordestina, nome que passou a designar a CFN após alguns tempos.

A verdade é que as notícias sobre ferrovia ou suas obras são pouco difundidos no Sul do país, principalmente pela imprensa.

A Transnordestina decidiu na última semana do ano de 2022 devolver ao poder concedente – o Governo Federal – o trecho pernambucano que levaria a ferrovia até Suape. Ou seja, o que seria a remodelação da antiga linha do Centro pernambucana, que ligava Recife a Salgueiro e que extinguiu seus trens de passageiros e cargueiros ainda na década de 1980, permanecendo abandonada desde então.

É claro que ninguém fala em trem de passageiros ali, hoje em dia. Por outro lado, o prolongamento dali até Eliseu Martins, no Piauí, onde jamais houve ferrovia, mas que hoje tem carga potencial, muda a figura, pois Salgueiro passa a ser ponto de bifurcação: com duas linhas saindo da estação, uma para o Piauí e outra para o porto cearense. Por uma linha, recebe material; por outra, envia para outro porto. Uma linha para Suape ficaria, pelo menos agora, sem tráfego.

Foi o jornal Valor Econômico que noticiou a mudança de planos, adiantando que a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional, do empresário Benjamin Steinbruck, controladora da Transnordestina) optou por executar, apenas, o trecho que ligará o Piauí até o porto cearense de Pecém, mas no prazo de sete anos. Repita-se: sete anos. Muito tempo para quem deveria ter entregue a ligação já há muito tempo. A obra já faz anos que foi iniciada, segundo o mesmo jornal.

Nos últimos anos, li algumas notícias que, como sói acontecer hoje em dia, davam conta de que já havia obras nos dois trajetos que partem de Salgueiro e também um terceiro, que era o que foi agora cancelado: os trilhos para Suape.

Para tirar Suape do caminho dos seus trilhos, a Transnordestina Logística celebrou com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) um aditivo contratual. 

Consequência do aditivo, a Ferrovia Transnordestina reduzirá sua extensão, que era de 1.700 Km, para 1.200 km. Ou seja, ela sairá de Eliseu Martins, no Piauí, e chegará a Pecém, passando por Salgueiro (PE), extinguindo o terceiro trecho de 500 Km entre Salgueiro e Suape. 

De acordo com o Valor, a direção da Transnordestina Logística concluiu que seria inviável, do ponto de vista econômico e financeiro, a construção e a operação do ramal pernambucano da ferrovia. Isto a levou a acertar com a ANTT o aditivo que permitirá o destravamento das obras, iniciadas há muitos anos. 

Trata-se de um projeto que, desde o seu início, enfrentou problemas. Por exemplo: desde 2017, está proibido o repasse de recursos públicos para o projeto da Transnordestina, de acordo com decisão tomada pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Essa proibição, todavia, está sendo suspensa como consequência do aditivo.

Mas já estão concluídos 55% da obra. 

De acordo, ainda, com o Valor, a Transnordestina finalizará este 2022 com a construção e a conclusão de 815 km, dos quais 215 km somente neste ano corrente. 

Bem, esta coluna pode informar que a decisão da CSN teve péssima repercussão em Pernambuco, mas está consolidando a intenção do Grupo CSN, liderado por Benjamin Steinbruck,de privilegiar o trecho de Eliseu Martins a Pecém, o que é muito bom para a economia do Ceará.

No porto cearense, a CSN tem planos de implantar não apenas um grande, moderno e sofisticado Centro de Recebimento e Distribuição de cargas sólidas e líquidas, para o que tem projeto de construção, inclusive, de um Terminal de Múltiplo Uso (TMUT) no porto do Pecém, em parceria com a CIPP S/A, a empresa que administra o seu Complexo Industrial e Portuário, da qual é sócia, com 30% do seu capital, a Autoridade do Porto de Roterdã.

Será em Pecém que a Transnordestina pretende centralizar suas operações de logística. O prazo de sete anos para a conclusão da obra de construção da ferrovia está adequado aos de início de operação dos primeiros projetos de geração de energia eólica offshore (dentro do mar cearense) que fornecerão energia limpa às grandes indústrias de produção de Hidrogênio Verde que se instalarão no futuro Hub do H2V de Pecém.

A cearense Construtora Marquise está executando as obras de implantação da Ferrovia Transnordestina no Ceará. Os trabalhos avançam obedientes ao cronograma estabelecido pela empresa contratante, que, por sua vez, se subordina ao calendário e aos valores das liberações dos recursos financeiros, o que é feito pela empresa controladora – a CSN. 

A Transnordestina tem tudo a ver com a ZPE do Ceará, com a Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP) e com os futuros projetos de produção do H2V, pois seus trens deverão transportar para destinos nacionais o Hidrogênio Verde que será produzido no Ceará.

Resumindo: com a Transnordestina, o futuro da economia cearense é ainda mais promissor. Perde Pernambuco. E perdem as fontes de materiais que acreditaram na linha para Suape. E quem responderá pelos prejuízos nas obras que já estavam sendo feitas na linha da qual agora não funcionará mais?

Fonte: Correio do Nordeste, 2 de janeiro de 2023. (Nota: o histórico sobre as linhas, primeira parte desta postagem, foi escrito por este blogueiro. A parte da notícia em si, foi transcrita com pouquíssimas mudanças, por este blogueiro.)