segunda-feira, 30 de julho de 2012

O RAMAL DE PIRACICABA, O VÔ SUD E A TIA ZIZINHA

A estação terminal de Piracicaba Paulista, assim chamada para diferenciá-la da estação da Sorocabana, que ficava mais para o centro da cidade. Era igual à estação de Jaú - a velha, do ramal - esta demolida em 1973.

Pois é, ontem, 29 de julho, foi o octagésimo aniversário do ramal de Piracicaba, construído pela Companhia Paulista de 1917 a 1922, hoje morto, mas não enterrado (pelo menos não totalmente). Ontem, eu li um escrito que o Leandro me mandou e pensei: "puxa, eu sabia disso, mas não me lembrei"! Grande coisa, né? Mas resolvi, com um dia de atraso, escrever algumas linhas sobre ele.

Acontece que Piracicaba foi uma das cidades do interior paulista que conheci ainda pequeno. O Tio Homero e a Tia Zizinha moravam lá e a gente - eu e meus pais - visitamo-los em 1962. Além disso, era a terra natal do vovô Sud, aquele que sempre falo nos meus escritos. Seus pais vieram de Lucca, Toscana, e foram direto para lá, onde meu bisavô Amedeo era marmorista. Dizem que o cemitério tem vários túmulos feitos por ele. Ele, que morreu em São Paulo e foi enterrado no Araçá, em 1930.

Nas minhas pesquisas sobre ferrovias Piracicaba foi uma das primeiras cidades que eu descobri ter tido estrada de ferro. Não somente uma, mas duas. A Ytuana chegou lá em 1877. Comprada pela Sorocabana, sempre foi considerado uma das piores linhas desta ferrovia. Foi por isso que a população da cidade - Piracicaba ocupava uma posição de destaque relativo muito maior do que ocupa hoje no Estado, no final do século XIX e início do XX - cortejava as ideias da Paulista para construir outro ramal para lá. Meu avô, que morou na cidade desde o nascimento em 1892 até 1910, quando saiu para ser professor (voltou a morar lá depois de 1921 a 1925), contava em suas cartas que, para visitar a cidade lá pelos idos de 1915, 1916, ia pela Paulista até Limeira e depois tomava ali um trolei para a cidade, pois não aguentava os trens da Soroca.

A primeira investida da Paulista para construir um novo ramal para lá foi em 1901. Não saiu, mas, em 1917, construíram uma linha que partia de Nova Odessa , da estação de Recanto, até a cidade de Santa Bárbara. E em 1922, chegaram, a 29 de julho, a Piracicaba, com bitola larga. Junto com o ramal de Descalvado, foi um dos dois ramais da Paulista com bitola larga de 1 metro e sessenta. A cidade teria bancado boa parte do investimento da empresa, assim como, anos mais tarde (1941), Jaú pagou para a Paulista para ter a linha-tronco oeste passando pela cidade, em vez de continuar sendo ponta de ramal de bitola métrica.

Meu avô guardou um exemplar da revista "Sala de Espera", editada na cidade, que trazia não somente as fotos da inauguração da estação e do primeiro trem de passageiros a chegar na cidade nessa data de oitenta anos atrás, como também publicou na revista o editorial desse número, onde falava sobre a abertura do ramal de 42 quilômetros. Esperançoso, ele falava dos planos futuros da Paulista, que incluíam chegar a Bauru com o ramal e comisso diminuir a distância de São Paulo e também dar uma alternativa para o tronco da Companhia. Mostrava mapas e tentava provar que havia sido um excelente investimento e que a cidade somente teria a ganhar com a nova linha.

Setenta anos depois, uma revista me pediu para escrever sobre a história das ferrovias e, no final, perguntou-me se eu teria algum artigo antigo que falasse sobre a abertura de alguma linha brasileira, Mas não aquelas que descreviam os convidados da festa e qual as bandinhas que tocaram na inauguração, mas mais do que isso - falasse sobre as vantagens de uma linha recém-aberta para a região. Não era fácil, mas aí, lembrei-me do ramal de Piracicaba, daquele editorial de meu avô: minha esposa Ana Maria comentouq eu "talvez ele tivesse escrito aquilo setenta anos antes para um dia resolver o problema de seu neto e da revista". Será?

Uma vez, conversando com tia Zizinha, que foi a última tia-avó minha a falecer - e olhe que eu tive mais de vinte - perguntei das suas lembranças de viagens pelo ramal. Como era morou algum tempo em São Paulo, era óbvio que ela foi e voltou a Piracicaba diversas vezes de trem. Ela não falou nada de muito interessante sobre a viagem em si, que descrevia como "muito bonita" e que se lembrava das paradas nas estações - Cillos, Santa Barbara, Caiubi, Tupi, Taquaral e Piracicaba - mas o relato valeu, pela enorme saudade que se esparramava de suas palavras. Pouco depois, ela faleceu.

Os oitenta anos do ramal de Piracicaba foram, na realidade, apenas cinquenta e dois - em 1976, os trens de passageiros foram desativados com protestos inúteis de seus usuários. As cargas pouco duraram. Os trilhos foram sendo cobertos com terra a partir do momento em que a FEPASA, sucessora da Paulista, deixou de (pelo menos) andar com seus carros de linha para o mato não crescer muito. Isto foi em 1998. A Ferroban, sua sucessora, jamais quis saber dos trilhos da linha. Hoje, parte enterrados, parte roubados, parte retirados sem autorização dos donos da malha (hoje, a chamada "inventariança da RFFSA"), estão ali como um monumento ao desperdício de dinheiro no Brasil. De suas seis estações, duas (Caiubi e Taquaral) foram demolidas. Uma está abandonada (Cillos) e as outras três têm diferentes funções. Todos belos prédios que mereceram sua preservação. Cillos não tem jeito. Longe de tudo, só lhe resta esperar desabar.

domingo, 29 de julho de 2012

UM ESTUDO SOBRE A MALHA FERROVIÁRIA DE JABOTICABAL

O município de Jaboticabal como era por volta de 1930

O declínio das ferrovias em São Paulo e no Brasil é fácil de ser verificado por quem estuda o assunto.

A estranha forma do município de Jaboticabal no início dos anos 1930 mostra a rede ferroviária que existia em toda a sua área, que, aliás, era bem maior do que é hoje. Foi bem maior antes disso - chegava a atingir o rio Paraná no início do século XX.

De toda a malha ferroviária de 1930, hoje nada sobra dentro do que é a área municipal de Jaboticabal hoje e, mesmo fora dele, somente a linha que vem de Guatapará acompanhando a margem direita do rio Mogi-Guaçu - e que dobra em Pitangueiras à esquerda, para em Bebedouro seguir para o norte até Colômbia - sobrevive hoje e é pouquíssimo utilizada.
O município de Jaboticabal como é hoje, estando todo ele concentrado no canto direito inferior da figura acima

Os dois mapas que aqui aparecem mostram as linhas que já foram abandonadas: a E. F. Monte Alto (findou operações em 1956), o ramal de Jaboticabal da Cia. Paulista (aparece no mapa antigo o trecho de Córrego Rico a Bebedouro), extinto em 1966/69, a São Paulo-Goiás, na época ramal de Nova Granada (no mapa, de Bebedouro até além de Monte Alto, desativada em 1969), a E. F. Jaboticabal (comprada mais tarde pela Paulista, tornou-se o ramal de Lusitânia, desativado em 1966) e a linha Taiuva-Taiassu, que era o trecho inicial da E. F. Oeste de São Paulo, que funcionou por pouquíssimos anos entre 1928 e 1932 e foi erradicada logo em seguida.

Notar também que a linha de Bebedouro a Colômbia já funcionava desde 1909 até Barretos e desde 1929 até Colômbia e não aparece no mapa antigo. Notar ainda que no mapa de 2012, extraído do Google Maps, nessa resolução a única linha ainda existente (citada acima, Guatapará-Pitangueiras-Bebedouro-Colômbia) nem sequer é tracejada nessa resolução.

sábado, 28 de julho de 2012

SÃO PAULO: EMPREGOS VS. DECADÊNCIA

Propaganda de prédio a ser construído em Higienópolis, bairro próximo ao centro de São Paulo, em 1944: a verticalização começava a sair do centro novo e do centro velho já nessa época (Folha da Manhã, 1944)

Este autor já escreveu sobre o excesso de construções e a falta de infraestrutura para sustentar as mudanças que elas causam em várias cidades do País. As que mais acompanho com esse problema são São Paulo, Barueri e Santana de Parnaíba.

Infelizmente, meu blog é lido por não mais do que 400 pessoas por dia - isto, considerando-se que todos as pessoas que aparecem como "acompanhantes" realmente se preocupem em ler o que escrevo - antes, todos os dias, hoje, cerca de três a quatro dias por semana, por absoluta falta de tempo.

Se fosse lido por muitas mais, se eu fosse um sujeito famoso, seria melhor, claro - e não somente para mim. É mais do que evidente que o problema a que me refiro hoje é realmente um problema e, por isso, deveria ser visto com mais calma pelos governantes.

Os três municípios citados pertencem à área metropolitana de São Paulo e, neles, a cada semana, aparecem mais e mais construções de edifícios com mais de 20 ou 30 andares, cada um deles com um a quatro apartamentos por andar. Ou mais, em alguns casos.

A infraestrutura das cidades - eletricidade, água, gás, trânsito gerado, sistemas viários, estacionamentos para automóveis, transporte público e outros menos cotados - não acompanha o aumento da concentração da população nessas novas moradias ou escritórios. Não é preciso ser engenheiro ou administrador para perceber isto.

Hoje no jornal está noticiada a construção de mais um prédio de mais de 30 andares na cidade de Santos. Discute-se (é uma reportagem sobre ele e não um anúncio de vendas) os problemas que ele ele deve causar e fala-se da revolta de diversos vizinhos. Há casas tombadas à sua volta, as ruas não darão conta e não há nenhuma previsão de aumento de área carroçável na área em que ele se localizará.

Também se comenta no mesmo jornal (O Estado de S. Paulo) a demolição de um quarteirão inteiro na Capital para a construção de mais um conjunto de edifícios. A primeira pergunta que sempre faço é: essas cidades precisam mesmo desses empreendimentos? A segunda: alguém nas prefeituras está realmente fazendo o que deveria fazer para compensar esse imenso aumento de afluxo de pessoas para esses quarteirões? Terceiro: por que as prefeituras ainda permitem essas construções? Não estaria mais do que na hora de se proibir por vários anos o aumento de área construída nas cidades que já estão saturadas, não somente pelo número de pessoas como pelo sistema viário jamais previsto para ter todos esses mosntrengos em volta (se São Paulo nunca teve planejamento algum, imagine Barueri, cheio de ruas estreitas e tortas: não há bairro algum com ruas quadriculadas, por exemplo).

Diversas pessoas contra-argumentarão dizendo que isso gera empregos. Ora, a reforma e restauro do que já existe, abandonado ou não, também gerará, sem aumentar a área construída de velhas casas, prédios, galpões, fábricas, etc. Pergunto: estamos condenados a destruir nossas cidades somente para gerar empregos? Lembrem-se que outra indústria, a automotiva, também gera uma grande quantidade de empregos, mas com isso o número de automóveis aumenta cada vez mais (a poluição atmosférica também) e não cabem mais nas ruas. Também devemos manter essa geração de empregos fazendo, por outro lado, o trânsito parar?

Meu Deus do céu, prefeitos e vereadores: chega de autorizar a construção de novos edifícios nas quatro cidades citadas aqui! Está na hora de proibir tudo isso por vários anos e de se fazer um estudo realmente sério sobre o que realmente queremos e podemos! Nem vou dizer que "antes que seja tarde"... porque já é tarde.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

TREM É TREM E METRÔ É METRÔ?

Trem na estação da Água Branca: trem ou metrô?

Hoje tomei o trem em Jurubatuba pela primeira vez na vida. Apesar de ter ido várias vezes até a frente dessa estação para fotografar ou somente de curiosidade, jamais havia embarcado ou desembarcado ali.

Para chegar nela, cheguei da forma mais inusitada possível: eu havia chegado de carro na empresa MWM, que fica exatamente entre a avenida das Nações Unidas e a linha da CPTM. O carro deu um problema quando fui estacionar. Chamei o guincho do seguro e mandei levar para a oficina. E fiz a minha reunião.

Na saída, perguntaram como eu iria para casa e eu respondi: "de trem, afinal, não posso desprestigiar o meu "hobby"... e eu sabia que a estação era bem perto. O que não sabia era que havia uma saída da empresa pelos fundos, exatamente na frente da estação. Saí por ali e entrei na estação.

Ali, tive de comprar passagem, pois a carga do meu bilhete único havia acabado e toda vez que eu tentei recarregar a máquina estava com problemas. Comprei a passagem e pegunteei para o bilheteiro se ali havia forma de eu tentar recarregá-lo. Ele disse que somente em algumas estações do metrô ou da São Paulo Transporte. Eu perguntei por que não ali e ele disse que ali era trem e não metrô.

Bom, primeiro, ambos usam o bilhete único. Segundo, respondi na lata: "pô, trem e metrô é a mesma coisa". A resposta do bilheteiro? "Não senhor. Trem é trem e metrô é metrô". Fantástico. Atualmente, para mim pelo menos, ambos são iguais. Metrô é apenas um nome que foi dado para o sistema que a Prefeitura de São Paulo criou e investiu nos anos 1970 com um nome diferente, pois naquela época os trens de subúrbio da FEPASA e da RFFSA eram tão ruins que se chamasse a linha Norte-Sul de trem ninguém usaria.

Se a resposta do bilheteiro fosse-me dada há quinze anos, eu até podia engolir. Não hoje. Isso é mau. Significa que há rivalidade entre as duas empresas (que hoje são do Estado) e que isso não deveria acontecer. Sei que é difícil eliminar isso dentro de duas empresas que, se não são a mesma, fazem a mesma coisa e nem concorrem - uma complementa a outra.

Viu, Sr. Jurandir Fernandes?

domingo, 22 de julho de 2012

AS ESQUECIDAS HISTÓRIAS DA ESTAÇÃO DE SANTA TEREZA, EM RIBEIRÃO PRETO

A estação de Santa Tereza na época de sua inauguração, em 1911

Quem passa hoje pelo contorno sul da cidade de Ribeirão Preto, vindo do oeste e presta atenção ao que existe em volta, vai ver que, no ponto onde a continuação da rua Caramuru (que vem da Vila Tibério e que percorre em grande parte aproximadamente o leito da antiga linha original da Mogiana), pode notar ao alto, à esquerda, um condomínio residencial de casas, dentro do qual, no alto da colina, está o prédio da antiga estação ferroviária de Santa Tereza.

Até o final de abril de 1964, esta era a última parada do trem de passageiros da Mogiana que vinha de Campinas, antes da estação central de Ribeirão Preto. Dali ele seguia ainda para Uberlândia e Araguari, além de possibiltar baldeações para outras linhas que seguiam para Sertãozinho, Franca e outras cidades.

Então, numa manhã de março de 1944, uma composição de carga descarrilou perto da estação de Santa Tereza. O trem rápido noturno que vinha de Campinas teve de ficar retido próximo à estação (antes ou depois? a reportagem da Folha da Manhã da época não diz). O trem rápido do dia seguinte atrasou, por isto, três horas - teve de seguir pelo ramal de Jataí, que fazia também o percurso entre São Simão e Ribeirão Preto, mas através de uma grande volta a oeste da linha principal - 120 km pelo ramal contra 57 km pelo tronco.

Já do trem que ficou retido, os passageiros tiveram de descer e seguir para outro ponto, onde tomaram outro trem para seguir para Ribeirão Preto.

Que ponto foi esse? A reportagem fala que "os passageiros tiveram de andar 1.500 metros para tomar a nova composição". Até onde eles andaram? Se estavam próximos a Santa Tereza, devem ter seguido para a estação de Silveira do Val, onde teriam tomado um trem no ramal. Porém, se estivessem adiante da estação (o descarrilamento poderia ter sido, por exemplo, entre as estações de Santa Tereza e de Ribeirão Preto, mais próximo desta), eles poderiam ter seguido para a estação central.

O fato é que deve ter sido uma longa noite para os passageiros já cansados. Santa Tereza ficava, na época, no meio do mato e no alto da colina. Sem iluminação, teriam de seguir mais facilmente pela linha como referencial. Até Silveira do Val, seria quase impossível, sem caminhos diretos e sem luz. Seguir para trás, para Vila Bonfim, não resolveria: o trem não poderia seguir em frente também.

Não houve mortos nem feridos e todos sobreviveram. São histórias do tempo em que se tinha a oportunidade de andar de trem pelo Brasil.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

A ERA DE OURO DOS CINEMAS EM SÃO PAULO

O primeiro dia do Cine Cruzeiro, na Vila Mariana - 28 de julho de 1943

Nos primeiros anos da década de 1940, em plena Guerra Mundial, diversos cinemas foram inaugurados em São Paulo. Cinemas "de rua", que hoje praticamente não existem mais. 90% ou mais dos cinemas estão hoje confinados dentro de shopping centers.

Vejamos o ano de 1943, em reportagens ou fotos de qualidade ruinzinha tomadas nos arquivos do jornal Folha da Manhã (hoje Folha de S. Paulo). Todos os que estão mostrados nesta postagem foram inaugurados nesse ano.

Para mim, o mais representativo foi o Cine Cruzeiro. Localizado na rua Domingos de Moraes, em frente ao Largo Ana Rosa, seu prédio ainda existe e hoje é totalmente ocupado por uma loja dos supermercados Pão de Açúcar. Eu jamais assisti a um filme nesse cinema, mas era um marco de "onde eu estava", na minha infância. Quando meus pais iam de carro para a casa de minha avó na Vila Mariana pela avenida Paulista, a passagem pelo Cruzeiro queria dizer que estávamos muito perto do destino.
O anúncio da inauguração do Cine Cruzeiro

No final dos anos 1960, no entanto, ele já era considerado um "pulgueiro". Deve ter fechado nos anos 1980, não sei bem. Havia um pulgueiro pior, mas era mais antigo: o Phenix, na esquina da Joaquim Távora com a Domingos de Moraes, prédio que não existe mais.

Outros cinemas inaugurados nesse ano foram: o Cine Piratininga, no Braz...
Abertura do Cine Piratininga

...o cine Ipiranga, na (já) avenida do mesmo nome, na cidade - o prédio ainda existe, mas está fechado.
Inauguração do Cine Ipiranga

Na rua Voluntários da Pátria, foi aberto o Cine Hollywood, um prédio que já desapareceu (segundo me disseram)...
Inauguração do Cine Hollywood, em Santana

...e o Cine Carlos Gomes (onde?).
Inauguração do Cine Carlos Gomes... não descobri onde era.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

NOTÍCIAS FERROVIÁRIAS

As últimas notícias sobre estradas de ferro que têm corrido nos jornais brasileiros nunca são grandes coisas.

As obras da Ferrovia Norte-Sul estão novamente paradas por ordem da Justiça. Há desvio de dinheiro e superfaturamento. Sempre a mesma coisa. Não se precisa parar uma obra necessária por causa disto e sim forçar a empresa que supostamente faz esse desvio de uma forma ou de outra a continuar o trabalho sob acompanhamento decente de um fiscal. No fim acertam-se as contas. Para baixo, claro, em relação à construtora.

As obras da Transnordestina estão avançando. Devagar, mas estão. Em compensação, sabe-se que a linha que deverá parar de vez com a entrega da Transnordestina pronta já está parada de vez. Falo da linha Recife-Missão Velha via Campina Grande, PB. O abandono e aterramento dos trilhos de trechos além de Campina Grande mostram que já não existe tráfego. Quanto a rpoveitar a linha para transporte de passageiros, já que ali não há mais carga, nisso ninguém pensa.

Nem trem turístico escapa. Ontem, em minha postagem, falei do abandono da obra de 2 quilômetros e meio de linha (vejam a ridícula metragem) para ligar a estação de Anhumas à praça Arautos da Paz em Campinas. Enquanto isso, em reportagem em Poços de Caldas, o governo (da União) diz que vai aplicar 500 milhões de reais em trens turísticos. Meu Deus, para que??? Usem esse dinheiro para implantar transporte de passageiros decente sobre trilhos e não dois ou três carrinhos de madeira puxados por uma maria-fumaça (o governo adora este termo) que não vai durar muito fazendo isso e somente nos finais de semana.

Enquanto isso, as obras de metrôs, de VLT e de trens metropolitanos seguem em marcha lenta pelos Estados. Em Fortaleza e em Salvador, a entrega dos projetos de dez, onze anos atrás, está sendo feita agora em distâncias ridículas de tão curtas. Curioso que nunca falta dinheiro para avenidas e para reduzir impostos de automóveis.

O mal deste país é que a indústria automobilística e de construção civil é que emprega muita gente e por isso é sempre favorecida. E são as duas que vão destruir de vez este País de Deus.

domingo, 15 de julho de 2012

POR QUE NÃO APOIO QUE GOVERNOS PONHAM DINHEIRO EM TRENS TURÍSTICOS

Foto: Elcio Alves

A notícia não é nova, mas vale a pena ser citada agora, quase quatro meses depois do fato. Até agora nada se modificou nessa situação. O artigo abaixo foi resumido por mim a partir do que foi escrito por Maria Teresa Costa e publicado no Correio Popular de Campinas, SP em 21 de março de 2012.

- Mais uma vez a extensão dos trilhos da locomotiva da estação Anhumas até a Praça Arautos da Paz é paralisada, deixando para trás uma obra inacabada e a indefinição se, algum dia, será retomada. A Prefeitura de Campinas rescindiu o contrato com a empresa que estava ali trabalhando e abrir nova licitação, enquanto busca uma forma de corrigir a sutiação. O que era para ser um incremento ao turismo, se tornou desperdício de dinheiro público, e entrou para a relação das ações travadas pela ineficiência da gestão pública.

Depois de anos de anúncios, a Prefeitura conseguiu recursos para o projeto com a Petrobras. As obras começaram em julho de 2010, mas o trabalho entregue continha erros que tornaram o serviço inviável, segundo a Prefeitura. A empresa que ganhou a licitação para a obra não conseguiu executar o projeto. Para a conclusão será necessário um aditamento de R$ 1,3 milhão, o que não está previsto na lei. O Tribunal de Contas da União aceitaria aditamentos por erros de projeto em no máximo 10%, enquanto o Tribunal de Contas do Estado tolera até 5%.

Os erros teriam ocorrido nos projetos de terraplanagem e drenagem superficial de água pluvial. Também previu-se fundações de 9 metros de profundidade no local onde a profundidade necessária seria de 18 metros. O projeto não previa, também, a construção de uma rotunda na Praça Arautos da Paz, para a locomotiva fazer o retorno. Até o momento, 17 pilares foram colocados, faltam sete.

Os problemas levaram a uma sindicância cuja investigação foi iniciada já no ano passado. A conclusão foi que o problema está no projeto da obra. A saída será tentar liberar verba da Caixa Econômica Federal, com pedido baseado no resultado da sindicância que apurou que o erro não foi da Prefeitura. O pedido está na Caixa.

Os recursos da Petrobras foram repassados à Associação Brasileira de Preservação Ferroviária (ABPF), responsável pela operação e administração da ferrovia histórica, que contratou o projeto da mesma empresa que projetou a extensão dos trilhos até a estação de Jaguariúna.

A extensão de 2,5 quilômetros estava prevista em R$ 3,37 milhões, com investimentos da Petrobras, do Ministério do Turismo e da Prefeitura. A ABPF lamentou a situação. A entidade contratou uma empresa para fazer o projeto executivo, orientada pela Prefeitura, que indicou a empresa e aprovou o projeto apresentado por ela e que também contratou a empresa de engenharia para o projeto das vigas.

A paralisação das obras será ruim, porque as longarinas — partes da estrutura da ponte — ficarão, talvez por anos, ocupando o pátio de manobras das locomotivas. a maioria a vapor, na estação de Anhumas, até que apareça quem compre a ideia da extensão dos trilhos.

Conclusão deste autor: um projeto e uma obra que deveriam ter sido bem simples (2 quilômetros e meio de trilhos) desperdiçam dinheiro por má administração de uma prefeitura que acaba, com isso, atrapalhando a vida também de uma entidade sem fins lucrativos como o é a ABPF - Associação Brasileira de Preservação Ferroviária, uma das poucas entidades sérias neste ramo no Brasil.

sábado, 14 de julho de 2012

PREVENDO O FUTURO

Outro dia uma amiga me enviou uma fotografia que mostrava o painel do automóvel DeLian (era assim que se escrevia?) do Michael J. Fox no segundo filme da série "Back to the Future" com a data que ele marcava quando chegava ao futuro: 11 de julho de 2012.

Era hoje! Ou melhor, era aquele dia - que foi a última quarta-feira. Porém, a situação era muito diferente da que o autor previa. Não haviam aqueles skates sem rodas que flutuavam no ar, nem aqueles cinemas que anunciavam filmes com os anúncios externos em animações em três dimensões. Muito menos eliminaram os advogados, o que fae com que o julgamento do "herói" fosse realizado no dia seguinte ao delito. E "otras cositas mas". Minha resposta foi: "quero meu dinheiro de volta, não acontece hoje nada disso".

E daí? E daí, nada! Como sempre, quando se prevê o futuro, acerta-se alguma coisa e erra-se quase tudo. Por que? Bom, não é tão difícil assim responder: a previsão do que vai acontecer sempre se baseia, por mais que o vidente tente fazer de outra forma, na situação atual. Ou seja: as tecnologias evoluem, mas o que as pessoas pensam não. Como isto realmente não acontece, ou seja, a mentalidade das pessoas e a forma de vida sempre se altera - e, hoje em dia, cada vez mais rápido - de forma a que qualquer previsão entra por linhas de tempo de possibilidades cada vez mais infinitas.

Vejamos velhas previsões. Dizem que Julio Verne acertou muitas das tecnologias futurísticas em seus livros, mas reparem: acertou alguns conceitos, pois as coisas em seu entorno pouco se alteravam. Os Jetsons, desenhados nos anos 1960, previram coisas engraçadas, mas que não aconteceram nos cinquenta anos seguintes: casas e não prédios suspensos em alturas enormes por um pilar central e carros voadores, comidas em pílulas, videofones (estes existem hoje, através dos celulares e computadores, mas quantas pessoas usam?). E, reparem - não havia computadores.

O mundo atual como o vivemos tem televisão, rádios, telefones fixos e móveis (celulares), automóveis, trens, ônibus, aviões e computadores. Se olharmos para trás, há cinquenta anos tudo isso já fazia parte de quem vivia uma vida "normal", exceto os telefones celulares e os computadores. Estes últimos, por sua vez, existiam, mas eram restritos a grandes empresas.

Recuemos cem anos - 1912 - e desde aí, sim, as mudanças foram muitas. Havia poucos telefones fixos e poucos automóveis; muitos trens. Porém, as distâncias já podiam ser percorridas em muito menos tempo do que cinquenta anos antes disso (1862).

Lembro-me de ter visto uma figura de previsão da cidade de Paris para 1950, desenhada por volta de 1890. Uma cidade cheia de fios em muitos postes, onde todos ainda se vestiam da mesma forma que em 1890 e havia o perigo de se tropeçar em fios, que cobriam toda a vista das sacadas das casas. Quem reclama da fiarada de São Paulo nos postes (fiação enterrada aqui exste em pouquíssimos bairros e ruas), fica com o consolo de que a Paris do futuro ano de 1950 tinha-os em quantidade muito maior.

Portanto, com a tecnologia evoluindo de forma cada vez mais rápida, com as ideias políticas alterando-se velozmente, a educação indo para o buraco e a criminalidade aumentando junto com a permissividade sexual, com as minorias reivindicando tantos direitos que os preconceitos tendem a aumentar cada vez mais em vez de diminuir, com as ideias de ecologia tentando modificar o mundo onde as pessoas não querem perder as facilidades conquistadas para "salvar o mundo" e os capitalistas não têm interesse nenhum em adotar as teorias "sustentáveis" pois isso significa muito mais gastos, podemos prever que é impossível prever a semana que vem, imaginem os próximos cinquenta anos.

Por isso, sigam meu conselho: não acreditem em previsão alguma de nada" Nem as catastrofistas, nem as de promessas de paraísos, nem em que absolutamente nada mudará. Apenas sentem e, se quiserem, façam suas apostas na bolsa de apostas de Londres, que aceita qualquer coisa. E espere para ganhar ou perder dinheiro daqui a alguns anos quando tudo se abrir para você.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

QUANDO O GOVERNADOR ANDAVA DE TREM

Fevereiro de 1943. Por algum motivo, o interventor no Estado de São Paulo (na época, regime do Estado Novo de Getúlio Vargas, não havia governadores, mas interventores federais nomeados pessoalmente pelo Presidente da República) resolveu visitar algumas cidades da Alta Sorocabana.

Ele foi de trem. Não era, realmente, surpresa: as estradas de rodagem nessa região eram péssimas - quando existiam. Mas a vantagem de se viajar de trem (no caso, a Sorocabana) era descer nas estações em bom estado e ser festejado pelo povo que nela se espremia, deixnado à sua frente os puxa-sacos políticos de cada cidade.

As cidades escolhidas para suas visitas foram, além de Sorocaba (logo no início da viagem), as que ficavam realmente na Alta Sorocabana, que na época não tinham nem quarenta anos de idade: Salto Grande, Pau D'Alho (hoje Ibirarema), Palmital e Ipauçu.

Pequenas, com população que rondava os 5 a 10 mil habitantes no máximo naquele tempo, verdadeiras usinas de poeira sem pavimentação de qualquer espécie, Fernando Costa pode ter sido o primeiro governador a visitar esses locais. A festa se dava principalmente pela curiosidade da população e dos próprios políticos em receber tão alta autoridade em suas minúsculas cidades.

E, também, numa região isoladíssima dos grande centros, era motivo de se ter algo diferente para fazer, não interessando aos populares se gostavam ou não do interventor. Já os prefeitos - vereadores não haviam no Estado Novo - eram sempre obrigados ao "beija-mão", pois eram nomeados também pessoalmente pelo interventor. Tudo era motivo para festa numa região de total tédio.

E a Sorocabana, de propriedade do Estado, era o meio de transporte para aquelas paragens, o único meio decente então, com todos os defeitos que pudesse então ter. No entanto, comparando-se com o que viria a se tornar setenta anos depois - ou seja, hoje - uma verdadeira maravilha, com trens de passageiros, hoje apenas uma saudade, e cargueiros indo e vindo para transportar praticamente toda a riqueza daquelas paragens e levar-lhes praticamente toda a subsistência.

Tal quase-monopólio já teria desaparecido vinte anos mais tarde, vitimados pelos automóveis, ônibus, caminhões e até aviões, que competiriam facilmente como abandono cada vez maior dos governos em relação às "velhas" e "obsoletas" ferrovias.

Da reportagem que trazemos (parte) no cabeçalho desta postagem, acima, publicada no jornal Folha da Manhã de 20 de fevereiro de 1943, extraímos pequenas frases, como: "...em Pau D'Alho o sr. interventor federal e os componentes de sua comitiva foram alvo de expressiva homenagem, sendo s. exa. cumprimentado na estação pelo sub-prefeito (...) Deixando a composição especial em que viaja, o sr. Fernando Costa"; "Às 21h 30, o trem especial deixava Sorocaba, prosseguindo o sr. interventor federal e sua comitiva sua viagem com destino à Alta Sorocabana"; "Palmital foi a cidade seguinte, visitada pelo sr. Fernando Costa e sua comitiva, às 10 h 35 o trem especial dava entrada na estação, onde já se encontravam os srs. (...)". "(Em Salto Grande) a chegada do trem especial que conduz o chefe do governo paulista se deu precisamente às 8 h 40, em meio das manifestações de júbilo da enorme massa popular que se comprimia na estação ferroviária local".

E por aí vai. Trem especial, estações ferroviárias cheias, chegas e partidas com horários... há quanto tempo não vemos isto nos jornais? Aliás, provavelmente a maior parte das pessoas vivas de hoje jamais tenham lido isto, pois trens metropolitanos não têm este tipo de coisa: a recepção de uma ou mais pessoas, importantes ou não. Nas estações da CPTM e do metrô, pessoas esperam pelos trens para embarcar; pessoas não esperam mais por pessoas para recepcionar; pessoas não estão lá para acenar para quem deixa a plataforma depois de embarcar...

quinta-feira, 12 de julho de 2012

LUGARES ESQUECIDOS: CARDOSO DE ALMEIDA EM RELATOS

O casarão em dezembro de 2010. Fotos minhas.

Os lugares esquecidos: esquecidos pela história, pelo tempo, pela vida.

Nas minhas peregrinações pelo interior do Estado de São Paulo, à procura de material para minha pesquisa sobre ferrovias, encontrei vilas ferroviárias e fazendas em situações de todos os tipos: cidades-fantasma, colônias de fazenda prestes a serem demolidas para se plantar cana, como se fossem salgar as edificações em ruínas tal quel se fez em Cartago mais de dois mil anos atrás. Não é fácil entender o motivo do abandono de pequenas construções que, com arquitetura na maioria das vezes muito simples, continuam a ser belas em suas ruínas, quando numa época em que várias pessoas não têm casa para morar ou terras para cuidar.

Um dos maiores crimes contra a humanidade cometidos no século XX é pouco percebido e comentado: o êxodo rural. Em 1930, 70% da população brasileira vivia nas áreas rurais. Hoje, 2012, esse número caiu para cerca de 20% ou até menos. Ninguém ganhou com isso, Pobreza e violência extrema nos centros urbanos são uma consequência desse êxodo que incha as cidades. Mesmo cidades pequenas, com menos de 10 mil habitantes estão sofrendo hoje com esses tristes fenômenos. Os governos, tanto o federal, como os estaduais e municipais fazem questão de fingir que isso não existe e em alguns casos até incentivam a migração para centros com maior densidade populacional.

Nos lugares esquecidos, locais que um dia já tiveram muito mais vida e esperança, a história se confunde. Vilas misturam-se com fazendas, fazendas com outras fazendas por divisões por motivos de herança ou venda de propriedades. Sua história é passível de inúmeros erros e de situações que se mesclam com outras, tornando tudo às vezes muito nebuloso.
A parte traseira do casarão em dezembro de 2010.

Um exemplo é Cardoso de Almeida, em Paraguaçu Paulista. A vila nasceu em 1915 com o nome de Caramuru, sendo no início apenas uma estação de trem da Sorocabana num lugar em que não havia nada. O nome foi logo alterado para Cardoso de Almeida. Em 2002, a estação foi demolida, sobrando o armazém e uma casa de turma. O lugar todo está abandonado. Não se vê ou ouve alma viva ou voz alguma. No local existe um enorme casarão, totalmente abandonado.

Paulo Leuzzi, neto de José Giorgi, construtor da Sorocabana e do casarão por volta de 1908, lembra que ela era a sede da Fazenda Pouso Alegre, dos Giorgi. Em 1924, o casarão foi tomado e incendiado pelos homens da Coluna Prestes que se retiravam de São Paulo após a expulsão pelas tropas governistas. A partir de Botucatu, roubaram e saquearam diversas estações e cidades até chegarem a Porto Epitácio, no rio Paraná. Desde então, José Giorgi, desiludido, abandonou a casa. Ainda pertence à família. No final de 2010, quando lá estive, uma parede estava no chão.

Fábio Vasconcelos ficou tão impressionado com o casarão que seu primeiro impulso foi se aventurar dentro dele. O casarão estava totalmente abandonado e até um velho Karmann-Ghia estava lá dentro. Pela sua imponência, imaginou que o local já havia sido bem movimentado. Somente depois de quase uma hora surgiu um senhor meio desconfiado, dizendo ser o dono do local. Ele confirmou a demolição da estação, disse que o casarão havia pertencido a seu avô e que havia sido atacado na Revolução de 24, tendo ficado abandonado desde então.

Douglas Razaboni soube que na casa de turma nascera um seu tio, Pedro Figueiredo, já falecido. Seu pai, João Figueiredo, fora ferroviário e outro tio viera a ser telegrafista da ferrovia. Um pouco antes da morte do tio, seus primos o levaram para Cardoso de Almeida, e ele te-lo-ia reconhecido como a casa de sua família.

José David de Castro afirma que Cardoso de Almeida pertencia à família de José Giorgi. Seu avô, David Ferreira de Castro, fora gerente (capataz) de 1924 até se aposentar em 1969, tendo ali um pequeno pedaço de terra. "Vivi aí todas as minhas férias de infância até meus 15 anos, em 1965. Residiam na fazenda, que ficava cerca de 500 metros atrás da estação: meu avô e avó, quatro de meus seis tios (muitos deles aí nascidos), além de primos e primas. Somente um morava em Assis nessa época, uma tia em Registro e meu pai que desde os 13 anos trabalhava na EFS, começando como telegrafista em Mairinque, depois São Roque e também algum tempo na Mairinque Santos, vindo depois para a ex-Ytuana onde se aposentou como chefe de movimento. Claro que evoco essa época com muitas saudades: caçadas, pescarias - existia aí um manancial que formava um lago bem pertinho de um pontilhão da linha da EFS, por onde os bois transitavam pelos pastos e muitas brincadeira de por pedras nas linhas para ver o trem passar por cima.

"Também era fantástico o embarque do gado. A boiada vinha para o piquete e o trem encostava de costas no travessão, onde o gado era embarcado nas gaiolas pela porta traseira delas. E eram muitas ou assim me parecia. Como o travessão era relativamente curto, algumas gaiolas ficavam na linha 2 e conforme as gaiolas iam lotando, havia um remanejamento entre as lotadas e vazias. E isso tomava bastante tempo. Quanto ao casarão, ele era a sede da fazenda mas realmente ninguém morava lá e já na época de minha infância, o aspecto era sombrio, meio cinza ou avermelhado sujo escuro, em quase que total abandono, pelo menos a mim assim o parecia. A parte de baixo (era um sobrado) era utilizada pelo meu avô como depósito de materiais da fazenda (enxadas, etc...).

"Curiosamente, nunca subi aqueles degraus nem nunca vi a casa por dentro. Mas recordo-me das grades de ferro fundido e todo trabalhado que cercava a escada e a varanda na parte de cima. A explicação para não conhecê-la é simples: meu avô era extremamente rígido e não permitia brincadeiras de criança naquele espaço.
A igreja e o coreto em dezembro de 2010

"Em algum momento ouvi comentários que a fazenda ia de Cardoso a Santa Lina, o que, se for confirmado, dá uma certa importância a ela. Somente meu avô e um tio moravam em Cardoso em casas de alvenaria (lado a lado, no final da única rua de terra, também a rua da sede da fazenda). As poucas outras casas da rua eram todas de madeira, cedidas pela EFS mediante pagamento. Eram todas iguais. Entre as primeiras casas de madeira e a sede da fazenda havia um bebedouro para os tropeiros que constantemente por lá passavam dessedentarem seus animais.

"Não sei se isso ainda existe ou se ficou algum vestígio disso. Sei que a igreja do local que não tinha padre fixo no local, nem um caminho definido, estava constantemente aberta e ficava mais ou menos 500 metros atrás da casa de meu avô cujo quintal não era pequeno. Lembro-me da criação de suínos e patos/gansos (estes tinham uma área alagada especial e também uma fonte, só para eles), do pomar (limite posterior da casa), da horta e do paiol, onde era armazenado o milho. As casas de meu tio e de meu avô eram separadas em parte por uma cerca de madeira em ripas e em parte por uma sebe, onde frutificavam carambolas e outras frutas silvestres - amoras e uvaias. No meio disso, um portão de madeira, que abrigava constantemente sob o arco, aquelas abelhas que pegam nos cabelos - as irapuás. Eu fui vítima delas algumas vezes, mesmo tomando as precauções necessárias.

"Meu avô, apesar de rígido, bronco e muitas vezes estúpido, nunca permitiu que derrubássemos aquela colméia. Ele tinha já nessa época um cuidado especial com a natureza. Em nossas caçadas, que eram permitidas, a recomendação era: não matem mais do podemos comer. As caçadas normalmente eram feitas em 5 pessoas: dois tios, meu pai, eu e um primo. Lembro-me da espingarda que era destinada para mim: uma Pipper Bayard. Não sei o calibre, mas era de cartucho. A caçada normal que eu podia acompanhar era de pássaros (normalmente nhambú e codorna) e sempre diurnas. As noturnas ou mais perigosas (capivara etc...) eu e o primo não tomávamos parte. Só ficávamos na expectativa.

"Os meses de férias eram de festa, já que todos apareciam por lá: meu pai, o tio de Assis com a família e a tia de Registro, também com a família. Também apareciam durante as noites as famílias das namoradas dos outros tios e ficava-se jogando truco até tarde da noite. Apesar de casas de alvenaria, existiam apensos de madeira. Na casa de minha avó, a cozinha era interna, mas com fogão de lenha. O pão era feito uma vez por semana na cozinha de fora de madeira que tinha além do fogão de lenha, um forno de barro e que tornava o pão delicioso. O bule de café de ágata verde era mantido o dia inteiro no fogão, para quem chegasse, não importando se fosse ou não da família. O café era torrado e moído na fazenda.

"O arroz era separado em peneiras de palha, onde com o atrito de jogá-lo constantemente para cima, perdia a casca, que era constantemente assoprada, idem para o amendoim. E isso (assoprar) também era uma de nossas (netos) atribuições. Outras atribuições: salgar (sal grosso) o couro do porco abatido e pendurá-los em trapézios que ficavam em cima do fogão do apenso de fora. Além de salgados eram defumados.

"Mais outras: ajudar na confecção do sabão (soda cáustica - isso não era exatamente nossa, gordura de porco e cinzas do fogão), desempalhar o milho e aguar no final da tarde a horta. O restante do dia era ocupado com brincadeiras, caçadas ou pescarias, ou até mesmo colheita de guabiroba. Para quem não conhece, muito semelhante à jaboticaba, porém verde e sabor peculiar. Quando gelada, era ótima. Isso em memórias. Hoje não saberia dizer que gosto tem. Só que os dias naqueles tempos eram compridos. Fazíamos tudo, felizes e divertidos, sem imaginar o quanto a vida mudaria. O quanto hoje esses dias passam rápidos, sem termos a sensação de termos feito algo produtivo. A vida acelerou por demais."

terça-feira, 10 de julho de 2012

O INTERIOR DA BAHIA EXISTE MESMO?

Estação de São Francisco, em Alagoinhas, interior da Bahia, em foto que tirei nessa viagem

Em janeiro de 2005, voltei de uma estada de uma semana e meio em Salvador e adjacências e escrevi uma mensagem para alguns amigos que também são "ferroviaristas". Já são sete anos desde então. Eu questionava a posição da imprensa baiana. O título da mensagem era o mesmo desta postagem de hoje.

"Estou de volta de uma semana em Salvador, aliás, 9 dias, dos quais trabalhei atendendo um casal de espanhóis e durante duas manhãs, eu me dediquei a visitar o interior mais próximo do Estado da Bahia e fotografar, claro, o que restou das estações ferroviárias da antiga Leste Brasileiro, hoje concessionado à FCA.

Não deu para andar no trem de suburbios da CBTU, Salvador-Paripe, infelizmente, pois embora o percurso seja muito bonito, costeando o mar na parte leste da Baía de Todos os Santos, hoje passa por locais pobres, que até 30-40 anos atrás eram áreas de casas de veraneio do pessoal mais abastado de Salvador.

Deu para sentir, também, que, para o povo de Salvador, o Estado da Bahia tem mais ou menos os seguintes limites: do Pelourinho para Itapoã, dali para as praias do norte, e depois, alguns enclaves das praias do litoral sul. O resto, Alagoinhas, Feira de Santana, Vitória da Conquista e outras cidades maiores e menores parece simplesmente não existir.

Também não parece existir nada ao norte do Mercado Modelo, na Cidade Baixa. Como a estação da Calçada, de onde partem os trens de subúrbio, fica a cerca de 2 quilômetros para o norte, atualmente ninguém se importa com ela e toda essa grande área costeira é hoje semi-abandonada.

Apesar disso, eu fui lá conferir e fotografar a fachada frontal e lateral. Não deu para entrar infelizmente, pois somente consegui alguma folga para isso no fim de semana e, meio vazio, o lugar fica barra pesada. E também seria provável que o pessoal da CBTU, que opera o trem, não me deixasse fotografar lá dentro.
Então, fiquem com as fotos da fachada mesmo.

Quanto ao interior, onde me meti fotografando, só mesmo indo até lá para ver, pois, no jornal, não aparece nada. Uma das exceções foi uma reportagem sobre o aeroporto da cidade de Barreiras, que fica não muito longe da divisa da Bahia com Goiás, que depois eu mando para vocês, já que alguns vão achar interessante. Da Bahia não aparece nada sobre o interior, apesar de o jornal de hoje, só para me desmentir, tenha publicado uma reportagem sobre cultura de café no município baiano de Luiz Eduardo Magalhães, que aliás é perto de Barreiras".

É até possível que quem me leia agora discorde do que notei há sete anos atrás e que outros achem que isso ocorre na maioria dos estados brasileiros. Não sei não. Na Bahia, pareceu-me notório.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

TRANSPORTE NA GRANDE SÃO PAULO É UMA GRANDE PIADA

Não é engraçado que a CPTM não queira prorrogar o horário de seus trens quando há jogos? Na noite do dia 4 de julho, o Palmeiras jogou contra o Coritiba no estádio de Barueri (a tal "Arena Barueri... antigamente estãdio era estádio, hoje é "arena"...), município no oeste da Grande São Paulo. A própria CPTM recomenda que quem queira ir de trem ao estádio use a estação Jardim Belval, uma depois da central de Barueri, e ande até o estádio. Realmente, ela é a estação mais próxima. Mesmo assim, não é tanto, deve dar pelo menos uns 20 minutos de caminhada.

O problema é que, para voltar, você pode perder o trem, a não ser que saia antes do final do jogo, que acaba às 23:45. Isto porque os trens deixam de circular entre meia noite e 5 da manhã. Puxa, não dá para prolongar o horário quando há jogo? É tanto problema assim? Não há jogos todos os dias, afinal...

A alternativa: ir de carro. Mas não espere conseguir estacioná-lo. Não há estsacionamentos pagos e as ruas são estreitas e tortuosas, além de se encherem de carros normalmente, imagine quando há jogos. É possível que você tenha de andar mais do que quando desce em Jardim Belval. Além disso, o trânsito fica caótico, pois o acesso por rua ao estádio é terrível, como todo o sistema viário de Barueri, que de planejado não tem nem sombra.

Vá de ônibus, então. O problema é que o ônibus enfrente o mesmo trânsito que os automóveis, táxis e o escambau. Só o trem não pega trânsito. Mas não funciona no final do jogo. Ah, qual é????

O mais provável é que a CPTM não queira os torcedores na volta, com derrota ou com vitória do time da casa - que, nesse caso, é o Palmeiras. Eles podem causar depredações no trem, de tão alegres com a vitória ou nervosos com a derrota. E como segurança pública em São Paulo não exiete, o melhor é parar o trem.

Meu Deus, faz sentido isso??

domingo, 8 de julho de 2012

O MUSEU DA VERGONHA NACIONAL

Entrada da estação de Três Corações

Na verdade, este é apenas um dos inúmeros Museus da Vergonha Nacional. Cada município brasileiro - cerca de 5.600 - deve ter pelo menos um deles, cobrindo as mais variadas facetas. Se algum não tiver... que se manifeste. As afirmações e as fotografias deste texto foram feitas por mim. As fotos, no dia 6/7/2012. O escrito, hoje.
Depósito de locomotivas e vagões e oficinas

No caso de Três Corações, o museu (que eu chamei de museu, mas lá tem apenas o título de "velhas oficinas da RMV ou da RFFSA, ou da Minas e Rio, como quiserem e dependendo da idade e do interesse de cada pessoa) se refere à ferrovia que passa pela cidade. Curioso: apesar do nome, a ferrovia funcionava entre os Estados de São Paulo e de Minas Gerais.
Plataformas de embarque de passageiros da estação de Três Corações

Uma delas foi construída em 1884 e ligava a cidade mineira à cidade de Cruzeiro, em São Paulo. Era a Estrada de Ferro Minas and Rio, de ingleses e inaugurada então com a presença de Sua Majestade o Imperador Dom Pedro II. Tempos de glória para a ferrovia e para a cidade.
Entrada das ofocinas: aberto, sempre. Lá no fundo, a ponte sobre o rio Verde.

Vinte e seis anos depois, a ferrovia já estava em dificuldades. Foi então adquirida pela Rede Sul Mineira, que em 1931 foi uma das formadoras da RMV - Rede Mineira de Viação. Em 1957 tornou-se parte da RFFSA, mantendo o nome, que em 1965 tornou-se V. F. Centro-Oeste e que em 1975 tornou-se parte de uma das divisões da RFFSA.
Carros de passageiros da RFFSA enferrujando ao tempo

Em 1996, já estava em condições tão ruins, depois de perder os trens de passageiros por volta de 1980 (uns dizem que acabaram em 1976, outros em 1983) e com volume de cargas tão desprezível que nem concessionada foi. Atualmente, é a ABPF que tem a concessão para nela rodar trens turísticos, que atualmente trafegam do túnel na divisa mineira-paulista com Passa-Quatro e de Soledade a São Lourenço, enquanto o trecho entre Passa-Quatro e São Lourenço está sendo recuperado pela mesma associação e o trecho final, Soledade-Três Corações, aguarda esperançoso pelo mesmo destino, estando em abandono total.
Vagões da RFFSA dentro do depósito

É este último trecho que chega a Três Corações. As oficinas estão neste trecho, entre a estação abandonada e a saída da outra linha, a que segue para Lavras, em atividade ininterrupta, mas com cada vez menos cargas a transportar. O trecho que segue para Varginha foi um prolongamento feito pela E. F. Muzambinho e aberto em 1892, tendo sido em 1908 incorporado pela Minas e Rio.
Trilhos do trecho Três Corações-Lavras nas ruas de Três Corações

Já o trecho que segue para Lavras foi aberto parcialmente em 1918 e finalizado em 1926. Ele sai do outro lado do rio Verde em relação à estação, de uma das pontas do triângulo que ali existe - da outra ponta sai a linha para Varginha, sendo que a terceira ponta fica na cabeceira da ponte. Esse traho até Lavras ainda segue funcionando, mas ao que tudo indica, apenas com as cargas do moinho Fertipar em Varginha.
Ponte metálica sobre o rio Verde. Do lado de lá, o triângulo

Entre a estação da cidade e a ponte sobre o rio Verde ficam as oficinas. Embora haja um portão que fecha sua entrada, ele parece que está sempre aberto, pois diversas pessoas cruzam a ponte para chegar à região da estação. O estado das oficinas é péssimo. Totalmente abandonados, o prédio à esquerda de quem segua para o rio é um depósito de vagões ainda com os logotipos da RFFSA que há muito não saem dali. Do lado de fora dele, entrando por outro desvio, antigos carros metálicos de passageiros com a pintura azul da RFFSA apodrecem ali miseravelmente há muitos anos. Não há ninguém por ali, exceto os transeuntes que cruzam a ponte. Do lado direito, um prédio já bastante depredado, provavelmente almoxarifado, está totalmente ao léu, sem ter aparentemente coisa alguma dentro dele e provavelmente servindo de abrigo noturno para mendigos e drogados.
Vista do triângulo. Ao fundo, a ponte sobre o rio; em primeiro plano, a linha principal. Para a esquerda e para a direita, dirigindo-se à ponte, os outros dois lados do triângulo

Pois é: se pegarmos a estação e seu pátio, estas sim fechados com portão, e o pátio das oficinas com a bela ponte metálica (e uma rua passando no meio dos dois complexos, rua esta que vem da ponte de automóveis sobre o mesmo rio), teremos o que chamo de o Museu da Vergonha Nacional - Seção Três Corações. Ali pode se ver claramente o que se faz e o que não se faz com o dinheiro do povo. Pelo menos, poderiam fazer uma reforma cosmética nos vagões e carros que ali estão, pintando-os com suas cores originais e restaurando pelo menos externamente os edifícios. Aí, sim, seria um museu - e talvez o termo "vergonha" pudesses ser amenizado.
Lomotiva 213 da antiga RMV

Resta, ainda, lembrar que, do lado de fora da estação, ao lado de sua entrada, está uma das locomotivas da antiga Rede Mineira de Viação, com uma cobertura tipo telhado sobre ela que pelo menos a faz envelhecer mais demoradamente.

sábado, 7 de julho de 2012

VARGINHA EM FOTOS

A linha no sentido da estação. Não há mais trens, mas há cenas bonitas com esta.

Minha visita a Varginha, MG, acabou hoje. às 14 horas estava já eu de volta em casa. Não consegui baixar as fotografias que tirei lá no meu laptop que levei para lá, somente agora o fiz em meu computador caseiro.
Como sempre, fotografo motivos ferroviários e construções e paisagens que me agradam. A estação, algumas casas, uma quase toda demolida, outra em reforma... ou talvez, infelizmente, demolição... algumas inteiras e bonitas.
Varginha, apesar de ser uma cidade mais do que centenária, não tem muitos prédios antigos. Por antigos, digo contruções até o início dos anos 1940 com estilos os quais aprecio. Há muitas outras que foram totalmente reformadas, ou muito descaracterizadas.
As que vi e mais me impressionaram foram o prédio do teatro municipal de nome Teatro Capitólio (de 1927) e dois outros que se situam em frente à antiga estação ferroviária.
Acima, local onde os trilhos entram no Moinho Sul Mineiro. Porém, trens não entram há anos e anos.

Fui até o final dos trilhos, após o Moinho Sul Mineiro. No ponto hoje cheio de mato, eles deixaram de seguir para Três Pontas e Jureia já desde o longínquo ano de 1966.
Uma ponte metálica sobre um córrego, já próximo da sua foz no rio Verde, também pôde ser fotografada de longe. Para a esquerda, a cidade. Para a direita, Três Corações. Esta ponte está próxima da antiga estação de Juriti.
E parte da cidade, vista de longe. Nessa foto, o topo da colina é o ponto mais alto da cidade e continuação da estrada de acesso que vem da Fernão Dias (para a direita). Para a esquerda, o centro.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

TRÊS CORAÇÕES, RUAS SATURADAS E TRILHOS


Rua de Três Corações com os trilhos e o trem da FCA em 2011. Foto Cassio Paulo Fernandes

A cidade de Três Corações, como Varginha, é cheia de subidas e descidas. Típica cidade do Sul de Minas nesse sentido. Terá os mesmos problemas de trânsito que Varginha terá. Não que já não os possuam; os congestionamentos, principalmente de manhã cedinho, hora do almoço e fim da tarde, já são uma realidade em cidades que têm por volta de cem mil habitantes cada uma.

Varginha tem um pouco mais disso; Três Corações, um pouco menos. Ambas têm ruas estreitas e poucas avenidas largas; as ruas com mais movimento são em sua maioria velhas estradas que davam acesso ã cidade original. Três Corações, que tem uma estátua de Pelé - que nasceu lá - no trevo da Fernão Dias com a estrada que vem de Varginha, tem, para piorar sua situação, um rio (o Verde) dividindo parte da cidade e uma linha de trem que percorre várias de suas ruas. Varginha também as tem, mas essa linha, além de estar inoperante nesse trecho, ainda percorre trechos de ruas muito curtos e situados numa área da cidade onde hoje o trânsito não é muito intenso.

Em Três Corações, os trens passam. Não muitos, mas existem. As locomotivas diesel da FCA ainda cruzam a cidade com cargueiros que vão para o município de Varginha, não muito além da divisa, para alcançar uma fábrica de fertilizantes. Não sei se há algum outro tipo de transporte de cargas cruzando Três Corações hoje, mas vi em minha visita de hoje que toda a linha na cidade (exceto a que liga a estação da cidade a Soledade de Minas, da antiga Minas e Rio) está com empedramento novo.

Há trilhos dos dois lados do rio Verde. Na margem  esquerda do rio, fica a estação ferroviária, fechada com portões sobre a linha. O prédio, aparentemente, está fechado e mal cuidado, mas seu pátio também tem os trilhos empedrados. Dela saem os trilhos que não são mais usados há mais de dez anos e que seguem para Soledade de Minas e Cruzeiro. Para o outro lado, saem para as oficinas (totalmente abandonadas e das quais falarei nos próximos dias) e para a ponte metálica sobre o rio Verde. Esta área também têm portões, mas eles estavam abertos (entre a oficina e a estação há uma rua) e pode-se entrar ali e cruzar o rio pela ponte dos trilhos, coisa que muita gente faz.

Na parte principal da cidade (à direita do rio), os trilhos, depois de cruzarem a ponte citada, abrem um triângulo. Para a esquerda, seguem para Varginha e é uma linha que tem quase cento e trinta anos. Para a direita, são da linha Três Corações-Lavras, bem mais recente: 1918. Para seguir para Lavras, foram usados leitos de ruas que certamente já existiam, pelo menos próximas à ponte.

A rua principal, que segue para o quartel do Exército, tem os trilhos do lado esquerdo da rua em leito de terra. Casas e prédios existem dos dois lados; para se entrar com o carro nas construções do lado dos trilhos, há de cruzá-los em nível. A linha está toda empedrada com pedras novas, o que significa que tem tráfego. Essas linhas estreitam o leito das ruas, que já são estreitas e têm de ser mantidas em mão única. No período em que estive hoje na cidade, tudo estava congestionado. Porém, nem se pode dizer que os trilhos são os causadores do estreitamento sozinhos; as outras tuas da cidade são mais estreitas ainda e não há trilhos.

Três Corações e Varginha não aguentarão mais a entrada de mais automóveis, caminhões e ônibus do que já têm hoje. Que usem suas linhas para transporte público, tirando pelo menos vários veículos de suas ruas? Vão fazer isso? A história recente diz que não. Espero estar enganado.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

VARGINHA, MAPAS E LINHA


A estação e o pátio continuam mais ou menos da mesma forma hoje, dez anos depois da fotografia acima

Varginha não tem mapa da cidade. Não tem guia, não tem nada. Eu estou na cidade, preciso de um mapa para facilitar a meu trabalho nestes três dias e somente encontrei três exemplares: um no prédio que um dia foi a estação ferroviária, outro numa das imobiliárias que fui e o terceiro é um mapa pequeno onde somente são mostradas as ruas principais, o que não resolve o meu problema.

Hoje tive de procurar diversos endereços específicos na cidade e tive de ir com explicações dadas por quem tem o mapa na cabeça. Deu-me algumas referências e lá fui eu com o meu carrinho. De todos os locais a que tive de ir, apanhei em todos, especificamente em um deles, que, para achar, perdi cerca de 40 minutos, mesmo com indicações.

A imobiliária diz que recebe da prefeitura para vender para quem quiser. Está bem, mas quando foram buscar um para mim, descobriram que não havia mais exemplares. Na minha opinião, isto ocorre porque a procura deve ser mínima e, quando cedem o último para alguém, nem se lembram de providenciar mais deles. Nas bancas de jornais não se acham mapas. Na prefeitura não havia mapas, pelo menos não na secretaria de cultura (a não ser o único que eles tinham aberto embaixo do vidro da mesa), que, em teoria, seria a responsável pela sua distribuição.

Os mapas que vi na secretaria da cultura (que fica na estação) e na imobiliária são diferentes, ou melhor, de impressões diferentes. Se as bancas não o têm, significa que não há procura. E, para piorar, placas nas ruas são algo meio "mosca branca".

O curioso em Varginha é que a cidade mais velha, aquela que sobreviveu mais ou menos sozinha sem os bairros periféricos de hoje (os bons e os ruins), começa no fim da estrada que vem da Fernão Dias, uma BR (aliás, como todo estado brasileiro, menos São Paulo, quase todas as rodovias são federais). Até hoje é assim, mas a cidade avançou ao longo da estrada. Até 1950/60, a cidade tradicional era quadriculada e seguia de baixo, onde a linha férrea costeava o início dessas ruas, para cima, onde hoje existe uma avenida que, mudando de nome constantemente, é a que acompanha o topo do espigão (mais ou menos como, em São Paulo, o espigão Doutor Arnaldo-Paulista-Bernardino de Campos-Domingos de Moraes-Jabaquara).

Do espigão para lá, a cidade começou seu crescimento real nos anos citados acima. Isto é claro - basta notar o aspecto das ruas e avenidas, o estilo das casas, etc. Eu sempre prestei atenção nisso, dá para ver claramente. A cidade, para lá da linha, também avançou - como avançou, também, para além do Moinho Sul Mineiro, aonde os últimos trens cargueiros da linha chegavam até alguns anos atrás.

Por enquanto, não vi ninguém reclamar dos trilhos, pedindo que fossem retirados: e olhem que não encontrei um viaduto sobre a linha, são todas passagens em nível normais. Hoje não passa mais trem, mas os trilhos e as passagens de nível continuam lá, a maioria com seus sinais de "cuidado", aquele famoso X. Também ninguém fala de implantar trem regional ou VLT aproveitando a linha hoje inútil. E olhe que ela acompanha regiões bastante populadas.

O leito ainda, parece, não foi invadido por nada, e, em alguns pontos próximos à antiga estação, passa sobre o leito de algumas ruas. Somente para ressaltar: o último trem de passageiros passou por ali entre 1976 e 1983 (não consegui até hoje uma data correta). Nos últimos anos, Varinha era estação terminal da linha Cruzeiro à Jureia. Após o moinho Sul Mineiro, a linha foi cortada em 1966, para a construção da represa de Furnas, que inundou boa parte dos trilhos entre Varginha e Jureia. Não adiante: o trem não tem vez mesmo.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

MAIS DO MESMO


Pois é, quase sempre escrevo de ferrovias, geralmente metendo o pau no que fizeram e no que ainda fazem com elas aqui na terrinha.

Ou falo das sacanagens do governo para cima de seus estúpidos eleitores: saquinhos de supermercado, cãmara de vereadores de São Paulo, falta de vergonha na cara...

Ou sobre a manutenção da liberação de construção de prédios enormes não somente em São Paulo, mas em todas as cidades e bairros já saturados com eles.

Será que meus leitores aguentam? Todo dia xingando todos os "construtores" do país. Como se eu tivesse razão em tudo ou se tivesse todas as soluções necessárias. Não tenho. Infelizmente.

A verdade é que gosto de escrever sobre história e sobre os desmandos e hipocrisias a que somos obrigados a assistir todos os dias. É duro ler o jornal todas as manhãs, especialmente a sessão de cartas, com as quais concordo praticamente todas.

É duro ver gente escrevendo no facebook que o atual governo é um bando de anjos e que todos os jornais mentem. Em que mundo esse pessoal vive?

Saudades dos tempos em que eu levava minha filha para a escola, cantando junto com ela: "bom dia, árvore! Bom dia, grama! Bom dia, asfalto! Bom dia, poste"! E ela rindo, como uma louquinha... eram dois rindo. O mundo pode ser feliz. Mesmo que as coisas não respondam aos nossos bons dias.

domingo, 1 de julho de 2012

O DESPREZO DA FEPASA PELOS PASSAGEIROS

O PS-3 em Osasco, provavelmente anos 1990. Foto Carlos Roberto de Almeida

Fundada, pelo menos pelo que alardearam na imprensa, para melhorar os serviços e custos ferroviários nas linhas do Estado, tanto dos trens cargueiros quanto dos de passageiros, em pouco tempo a FEPASA começou a mostrar suas garras para os já desconfiadíssimos usuários destes últimos trens.

De 1971 até o início de 1977 inúmeras linhas e ramais foram fechados para os passageiros. As cargas, então, foram reduzidas a cargas de volume grande, salvo algumas exceções. Isto levou ao fechamanto de mais ramais, inclusive para cargas, e seus consequentes desmontes.

A falta de respeito para com os usuários tanto de um trem quanto de outro se refletiu rapidamente e da pior forma possível. Em vez de reformas de base para melhorar linhas, serviços e material rodante, o patrimônio foi sendo cada vez mais dilapidado. Coisas típicas de completa falta de planejamento a médio e longo prazo. A curto prazo, era alterado a cada mudança de presidente na empresa, fato que se dava em períodos bastante pequenos.

O relato de um antigo usuário dos trens de passageiros da antiga Sorocabana mostra bem o que ocorreu para as linhas que pertenceram a essa ferrovia: "A partir de 77 restaram 3 horários na linha da ex-Sorocabana:

PS1 – 07h00 – Assis

PS3 – 17h00 – Presidente Epitácio

PS5 – 21h20 – Assis

Ao longo dos anos foram modificados para mais ou para menos nos horários e destinos, mas sempre os três trens. Não sei qual fazia baldeação em Ourinhos (nota deste autor: para dali sair para Maringá). Pela lógica, o PS5. Mas era baldeação “sem responsabilidade”. Ou seja, se chegar no horário, ótimo. Se não chegar, um abraço. Assim funcionou por um curto período para Itapetininga. De São Paulo ou intermediárias não se vendia mais passagens para Itapetininga ou Maringá. O passageiro tinha que chegar em Iperó ou Ourinhos e comprar o prosseguimento. Meio draconiano, mas foi assim. Infelizmente. Para desestimular o uso do trem.

Para Itapetininga, foi por bem pouco tempo (nota deste autor: os trens do ramal de Itararé, onde estava Itapetininga, que era ponto de mudança de locomotivas das elétricas para diesel). Não tenho lembrança das datas exatas (nota deste autor: a extinção dos trens para o ramal de Itararé, para onde o trem saía na estação de Iperó, ocorreu em 1978).

Mas, em diversas vezes passei por essa situação de viajar na “sorte” para pegar a baldeação em Iperó. E quando acabou a opção passou a ser o uso do ônibus no trecho Boituva a Itapetininga".

Por esse relato vê-se uma situação de caos, muito provavelmente criada para que os usuários se afastassem ao méximo de andar de trem. Isso ocorreu em outras linhas, também. Em países sérios, seria causa para processo e punições severas. Aqui na terrinha, todos nós sabemos que não aconteceu absolutamente nada com quem nos desserviu por tanto tempo.

Como também ele relatou, "três trens". Tristeza. Eram muitos na linha-tronco, até o início dos anos 1960, e mais muitos nos diversos ramais em operação. Ele se esqueceu de citar o Santos-Juquiá, que corria no ramal de Juquiá (portanto, não no tronco) e que somente foi extinto em 1997. Os outros ramais, tchau. Até a Mairinque-Santos, mais importante ramal de todos os da ex-Sorocabana, perdeu seus trens em 1976. Entre 1982 e 1997, ganhou um mistinho que subia a serra de Santos até Embu-Guaçu (por que não São Paulo? Nem pergunte). Mas era somente isso.