França - Primeira Guerra Mundial
Hoje soube, pelo radio do meu carro, que o músico John Barry morreu de enfarte com 77 anos. Pasmem os senhores, eu jamais havia ouvido falar dele. Muito menos sabia por que ele era famoso. O próprio rádio esclareceu: ele compôs onze trilhas sonoras para os filmes de 007, desde o segundo. No primeiro, ele havia feito apenas arranjos.
O que me chamou a atenção foi o que disseram a mais sobre ele: que, a cerca de dez anos, ele havia contado suas memórias sobre o bombardeio nazista sobre a Inglaterra em 1942, mais especificamente (ainda segundo a reportagem) sobre a cidade de York, onde nasceu.
Portanto, vai-se mais uma pessoa que assistiu aos horrores de uma guerra já lendária. Cada vez é menor, por motivos óbvios, o número de pessoas que presenciaram a guerra (e outras da primeira metade do século XX) in loco. Depois dessa guerra, já na segunda metade do último século, os combates passaram para o segundo, ou terceiro mundo, sei lá: Coréia, diversas na África, Vietnam e arredores, depois no quintal da Europa: os Balcãs... enfim, no primeiro mundo, elas praticamente acabaram. Estou falando de guerras convencionais, claro.
A sensação de estar sob um bombardeio deve ser terrível. Ou no meio de tropas que, mesmo sem aviões lá em cima, invadem a sua cidade para destruir tudo atrás dos supostos inimigos. Que, no caso, é você, assistindo da primeira fileira mesmo sem querer.
Quantas pessoas no Brasil já viram um bombardeio aéreo, já estiveram sob ele? Claro, os pracinhas que lutaram na Itália, mas, e em território verde-amarelo? Poucos. E quase todos estão hoje mortos. Os paulistanos em julho de 1924 sofreram o mais longo bombardeio aéreo na história do Brasil. E era fogo amigo, do governo estadual e de tropas federais que os ajudavam, tentando expulsar os revolucionários de dentro da capital do Estado.
Houve bombardeios sobre Campinas durante a revolução de 1932. Quantas pessoas ainda vivas podem falar sobre esses horrores hoje em dia? Haverá alguma ainda viva? Antes disso, bombardeios vindos de canhões terrestres e do mar causaram danos ao Rio de Janeiro, Manaus, Florianópolis, a própria São Paulo em 1924... sempre lembrando que houve aviões voando sobre o Contestado na guerra civil no Paraná e em Santa Catarina em 1915.
São lembranças e experiências terríveis, sem dúvida. Muito diferentes das memórias de minha mãe sobre as provações causadas pela Revolução de 1932 a São Paulo e pela Segunda Guerra ao Brasil: racionamento de alimentos, de gasolina...
Devemos aproveitar ao máximo o que os mais velhos nos contam, para que tentemos evitar que essas catástrofes se repitam, aqui ou em qualquer parte do mundo. E elas continuam acontecendo.
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011
domingo, 30 de janeiro de 2011
UMA ANTIGA MARCA DE SORO
Corre o ano de 2020. Em Presidente Venceslau, hoje uma decadente cidade próxima ao rio Paraná, o menino de 10 anos e seu avô conversam em frente a um prédio em ruínas.
- Vovô, por que as pessoas daqui dizem que nós ficamos na Alta Sorocabana?
- Porque, meu netinho, antigamente passavam por aqui os trilhos de uma estrada de ferro chamada Sorocabana, e como estávamos na parte mais longínqua dela, chamavam de “Alta”...
- Vovô, o que é estrada de ferro?
- Ah, netinho, você era muito novinho quando ela desapareceu. Vieram uns homens aqui e tiraram os trilhos, porque a empresa que deveria usá-las dizia que não precisava mais deles. Sobre esses trilhos andavam trens, enormes locomotivas puxando carros que transportavam gente e mercadorias. Se você quiser ver como eram essas locomotivas, eu devo ter umas fotografias velhas lá em casa. Acho que até tenho umas revistas que mostram algumas que ainda andam hoje na Europa...
- Mas, vovô, por que a empresa não os quis mais?
- Porque... bem, é uma história comprida. Há muito tempo, ainda no século XIX, várias dessas estradas de ferro foram construídas no Brasil inteiro para transportar o que fosse necessário. Os automóveis ainda não existiam e as estradas eram muito, muito ruins. A que chegava aqui era a Sorocabana.
- Por que Sorocabana? Sorocaba não é uma cidade muito longe daqui?
- Sim, mas quando ela começou, ligava São Paulo a Sorocaba, e daí o nome. Depois, eles esticaram os trilhos até aqui. Mas a verdade é que, em 1920, os donos da estrada estavam quebrados e o Governo de São Paulo ficou com a ferrovia. Eles sabiam que era fundamental manter o transporte bom para o desenvolvimento de São Paulo. Eles recuperaram tudo e a Sorocabana passou a ser uma grande ferrovia.
- E depois, vovô?
- Depois, filho, começaram a chegar os automóveis, os ônibus e os caminhões e o Governo achou que deveria melhorar as estradas, e deixou de conservar as ferrovias. Um grande erro.
- Por que? Os automóveis não são bons e melhores do que os trens?
- Sim, é verdade até um certo ponto. Os trens ainda são uma forma boa e barata de carregar gente e mercadorias em trechos muito grandes. E como o Governo só olhava para as rodovias, hoje temos uma poluição e tráfego carregadíssimos nas estradas e nas cidades, e preços muito altos de transportes.
- Então desde que chegou o automóvel não tem mais trens?
- Não. A partir de 1950, as ferrovias passaram quase todas para os Governos, mas estes não as administravam mais como antes. Elas passaram a dar prejuízos cada vez maiores, mas, como ainda tinham serventia, foram ficando. Pra tentar melhorar um pouco, em 1971 o governador juntou todas as de São Paulo numa só, a Fepasa, e a Sorocabana desapareceu.
- Mas, vovô, mesmo assim, a gente ainda conhece o nome!
- Sim, filho, mas ele está desaparecendo da cabeça das pessoas. Aqui na cidade, pouca gente se lembra do nome, e mesmo assim, quando falam das ruínas aí da frente.
- O que era esse prédio, vovô?
- Era a estação. Aí os trens paravam e recolhiam e desembarcavam passageiros e mercadorias. Era um lugar muito bonito e com muito movimento. Era a Sorocabana aqui na cidade.
- Mas por que não cuidaram dela?
- Bem, netinho, a Fepasa foi indo, bem ou mal, até uns trinta anos atrás. Aí chegou um governador que decidiu que isso não servia mais para nada e a abandonou. Depois de quatro anos de abandono, vendeu-a para uma empresa que achou que os trilhos aqui nem para ela serviam e pressionou o Governo para que ele concordasse com ela. E aí, no dia em que o governador disse que ela tinha razão... tudo se foi.
- E ela tinha, vovô?
- Não, não tinha. A nossa cidade e muitas outras cresceram com a ferrovia. Agora correm o risco de desaparecer sem ela.
Quarenta anos se passaram. No matagal onde ficavam as ruínas da estação de Presidente Venceslau, em 2050, um dos poucos moradores da cidade passa por ali, critica a sujeira e conversa com o filho.
- Papai, ouvi hoje um velhinho dizer que isto aqui era bom nos tempos da Sorocabana. O que é Sorocabana?
- Não sei bem, filhote. Acho que era um remédio antigo, um soro para doentes... o soro Cabana...
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sábado, 29 de janeiro de 2011
SONHOS
Ao lado de minha linda Ana Maria, qualquer cidade é um sonho
Meus amigos acham estranho quando eu lhes conto sobre a minha viagem a Viena, em 1995. Sim, Viena, na Áustria. O meu sonho – ou um deles – sempre foi conhecer Viena. Tive a oportunidade de viajar para Milão, numa das duas únicas viagens que fiz à Europa em minha vida, ambas a serviço. Ao final de duas semanas trabalhando, peguei um avião de Milão para Viena num dia de semana e cheguei às 6 da tarde em Viena. Ali, fui para o hotel, deixei as malas e saí – a pé – andando pelas margens do Danúbio até o Anel, como se chama a área mais antiga da cidade, e onde existem os grandiosos palacetes que regiam a Áustria Imperial e que hoje ainda estão lá, numa imponência de fazer inveja a qualquer construção. Andei ao redor do Anel e dentro dele, até quase 11 horas da noite. Aí voltei para o hotel. Na manhã seguinte, bem cedo, peguei o metrô numa estação subterrânea ao lado do Danúbio e segui até o Palácio de Schönbrunn, aonde a Família Imperial ia durante parte do ano. Não pude entrar no atual museu, era muito cedo, mas os jardins e a visão do prédio valeram a pena. Voltei para o hotel, eram cerca de 9 e meia da manhã quando tomei o ônibus de volta para o aeroporto. Acabou-se a curta viagem. Dali, numa seqüência de troca de aviões, fui-me embora para o Brasil, onde cheguei na manhã seguinte. De Viena trouxe algumas fotos, algumas memórias e algumas folhas de plátano caídas nas ruas. Era outono. Valeu muito a pena, apesar do tempo curtíssimo.
A Viena de meus sonhos era diferente da realidade. Neles, aquele velho Imperador de bigodes brancos e às vezes com um chapéu de tirolês, Francisco José, era feliz com sua esposa, a Imperatriz Sissi, aquela, dos dois ou três filmes dos anos 1950 em que Romy Schneider fazia o papel de esposa feliz. Na realidade, Sissi separou-se do marido, foi assassinada mais tarde em Linz e seu filho Rodolfo, herdeiro do trono, suicidou-se antes mesmo da morte dela. Francisco José, que acompanhava feliz as valsas em seu castelo, não percebeu que o mundo à sua volta mudara e morreu ao som dos canhões da Primeira Guerra Mundial. Seu sobrinho-neto, que o sucedeu, foi deposto dois anos depois e morreu quatro anos mais tarde. O Império acabou. Afinal, Habsburgo quer dizer castelo de abutres. O que se esperar de uma família com esse nome?
Mas qual é o seu sonho? Num recente seriado de televisão a cabo, no capítulo de abertura, o médico rico famoso e insensível tanto com os clientes e com a família em Nova York tem a sua vida virada de cabeça para baixo quando sua esposa morre num acidente de carro. Sentindo-se culpado pela sua morte e por não ter dado a atenção que ela merecia dele, o médico volta nos dias seguintes ao hospital e pouco antes de operar um paciente desenganado, desite da operação e lhe faz uma pergunta. “Onde você gostaria de estar agora?” A resposta vem seguida do nome de uma cidade pequena na Pensilvânia. “Então vá para lá” – diz o médico – “vá aproveitar o que ainda tem de vida na cidade que você ama, porque essa é a melhor solução para você agora. Se você for operado, você não poderá ir para lá e não terá mais tempo de vida que sem a operação”. Por sua vez, ele se muda com os dois filhos para uma cidadezinha nas montanhas do Colorado. Era essa cidade que sua esposa, anos antes, havia dito que era ali que queria viver. Ela somente a conhecia por fotografias e reportagens.
Qual é o seu sonho? Qual é a cidade em que você gostaria de viver hoje? Aquela em que você vive? Ou outra, que você conheceu em alguma época em sua vida? Pequena ou grande? São Paulo? Santana de Parnaíba? Curitiba? Santa Cruz das Palmeiras? Rio de Janeiro? Salvador? Ribeirão Preto? Porto União? São Carlos? Ponta Grossa? Joinville? A cidade da qual gostamos pode ser bonita ou feia, pode ter os nossos amigos ou podemos dela ter uma lembrança inesquecível da única vez em que eventualmente fomos lá. As cidades que listei foram as que vieram primeiro à minha cabeça, cidades de que, por um motivo ou por outro, eu gosto, eu me lembro com satisfação. E quando pensamos em cidades muito grandes, como São Paulo, a pergunta é: Qual São Paulo? A Vila Mariana de minha infância? A Higienópolis de minha namorada, que hoje é minha esposa? O Sumaré onde eu morava? O centro velho, para onde eu ia de bonde? Várias das lembranças que tenho das cidades existem ainda, outras não. Em algumas cidades as quais revisitei depois de muitos anos, eu não consegui nem sequer achar o local que eu tinha na memória – a cidade, o local mudou tanto, que nada mais existia. Aí vem a frustração. Onde era a chácara de meu avô em Mogi das Cruzes, que eu visitava nos anos 1960? Tentei achar, mas não consegui nada, nem uma informação – mal sei em que parte da cidade ela ficava.
Mas temos de ter sonhos. Temos de ter um objetivo, para quando, se tivermos de escolher onde vamos viver o resto de nossas vidas, tenhamos o que escolher.
Meus amigos acham estranho quando eu lhes conto sobre a minha viagem a Viena, em 1995. Sim, Viena, na Áustria. O meu sonho – ou um deles – sempre foi conhecer Viena. Tive a oportunidade de viajar para Milão, numa das duas únicas viagens que fiz à Europa em minha vida, ambas a serviço. Ao final de duas semanas trabalhando, peguei um avião de Milão para Viena num dia de semana e cheguei às 6 da tarde em Viena. Ali, fui para o hotel, deixei as malas e saí – a pé – andando pelas margens do Danúbio até o Anel, como se chama a área mais antiga da cidade, e onde existem os grandiosos palacetes que regiam a Áustria Imperial e que hoje ainda estão lá, numa imponência de fazer inveja a qualquer construção. Andei ao redor do Anel e dentro dele, até quase 11 horas da noite. Aí voltei para o hotel. Na manhã seguinte, bem cedo, peguei o metrô numa estação subterrânea ao lado do Danúbio e segui até o Palácio de Schönbrunn, aonde a Família Imperial ia durante parte do ano. Não pude entrar no atual museu, era muito cedo, mas os jardins e a visão do prédio valeram a pena. Voltei para o hotel, eram cerca de 9 e meia da manhã quando tomei o ônibus de volta para o aeroporto. Acabou-se a curta viagem. Dali, numa seqüência de troca de aviões, fui-me embora para o Brasil, onde cheguei na manhã seguinte. De Viena trouxe algumas fotos, algumas memórias e algumas folhas de plátano caídas nas ruas. Era outono. Valeu muito a pena, apesar do tempo curtíssimo.
A Viena de meus sonhos era diferente da realidade. Neles, aquele velho Imperador de bigodes brancos e às vezes com um chapéu de tirolês, Francisco José, era feliz com sua esposa, a Imperatriz Sissi, aquela, dos dois ou três filmes dos anos 1950 em que Romy Schneider fazia o papel de esposa feliz. Na realidade, Sissi separou-se do marido, foi assassinada mais tarde em Linz e seu filho Rodolfo, herdeiro do trono, suicidou-se antes mesmo da morte dela. Francisco José, que acompanhava feliz as valsas em seu castelo, não percebeu que o mundo à sua volta mudara e morreu ao som dos canhões da Primeira Guerra Mundial. Seu sobrinho-neto, que o sucedeu, foi deposto dois anos depois e morreu quatro anos mais tarde. O Império acabou. Afinal, Habsburgo quer dizer castelo de abutres. O que se esperar de uma família com esse nome?
Mas qual é o seu sonho? Num recente seriado de televisão a cabo, no capítulo de abertura, o médico rico famoso e insensível tanto com os clientes e com a família em Nova York tem a sua vida virada de cabeça para baixo quando sua esposa morre num acidente de carro. Sentindo-se culpado pela sua morte e por não ter dado a atenção que ela merecia dele, o médico volta nos dias seguintes ao hospital e pouco antes de operar um paciente desenganado, desite da operação e lhe faz uma pergunta. “Onde você gostaria de estar agora?” A resposta vem seguida do nome de uma cidade pequena na Pensilvânia. “Então vá para lá” – diz o médico – “vá aproveitar o que ainda tem de vida na cidade que você ama, porque essa é a melhor solução para você agora. Se você for operado, você não poderá ir para lá e não terá mais tempo de vida que sem a operação”. Por sua vez, ele se muda com os dois filhos para uma cidadezinha nas montanhas do Colorado. Era essa cidade que sua esposa, anos antes, havia dito que era ali que queria viver. Ela somente a conhecia por fotografias e reportagens.
Qual é o seu sonho? Qual é a cidade em que você gostaria de viver hoje? Aquela em que você vive? Ou outra, que você conheceu em alguma época em sua vida? Pequena ou grande? São Paulo? Santana de Parnaíba? Curitiba? Santa Cruz das Palmeiras? Rio de Janeiro? Salvador? Ribeirão Preto? Porto União? São Carlos? Ponta Grossa? Joinville? A cidade da qual gostamos pode ser bonita ou feia, pode ter os nossos amigos ou podemos dela ter uma lembrança inesquecível da única vez em que eventualmente fomos lá. As cidades que listei foram as que vieram primeiro à minha cabeça, cidades de que, por um motivo ou por outro, eu gosto, eu me lembro com satisfação. E quando pensamos em cidades muito grandes, como São Paulo, a pergunta é: Qual São Paulo? A Vila Mariana de minha infância? A Higienópolis de minha namorada, que hoje é minha esposa? O Sumaré onde eu morava? O centro velho, para onde eu ia de bonde? Várias das lembranças que tenho das cidades existem ainda, outras não. Em algumas cidades as quais revisitei depois de muitos anos, eu não consegui nem sequer achar o local que eu tinha na memória – a cidade, o local mudou tanto, que nada mais existia. Aí vem a frustração. Onde era a chácara de meu avô em Mogi das Cruzes, que eu visitava nos anos 1960? Tentei achar, mas não consegui nada, nem uma informação – mal sei em que parte da cidade ela ficava.
Mas temos de ter sonhos. Temos de ter um objetivo, para quando, se tivermos de escolher onde vamos viver o resto de nossas vidas, tenhamos o que escolher.
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sexta-feira, 28 de janeiro de 2011
RETRATO DO DESCASO
Estação de Boituva em 1982. Foto Carlos Roberto de Almeida
O ano era 1982. Quase trinta anos atrás. A ferrovia já era cada vez mais desprezada pelos governos estaduais e federal no Brasil, mas ainda havia vários trens de passageiros de longa distância circulando. Poucos comparado a vinte anos antes, mas muito comparados com os dias de hoje, quando circulam em pouco mais de 2.000 km de linhas (há 28 mil quilômetros de linhas no país).
Um desses trens era da Fepasa circulando na antiga linha-tronco da Sorocabana, São Paulo-Presidente Epitácio. Somente nesta linha, eram 830 quilômetros utilizados pelo trem de passageiros. Apenas mais um ramal da ex-Sorocabana ainda tinha estes trens também circulando: a linha Santos-Juquiá.
Na linha de Epitácio, um passageiro ainda corriqueiro nas ferrovias paulistas estava nesse dia apenas observando o movimento na estação de Boituva. Nesse dia, ele não embarcou. Mas guardou sua lembrança do descaso que já era farto nesse transporte:
Nesse ano, os trens de passageiros já não iam mais para Itapetininga e Itararé. Então, obrigatoriamente tinha que usar ônibus numa viagem direta para São Paulo ou com baldeação. No dia da foto voltava de Itapetininga, indo para Campinas fazer um passeio e, em seguida, retornar para casa de trem.
A linha de ônibus existe até os dias atuais e liga Itapetininga a Campinas, parando em Tatuí, Boituva, Porto Feliz, Salto, Itu e Indaiatuba. O comum era descer em Boituva e embarcar no PS 6 com destino a São Paulo.
Um episódio que presenciei na estação de Boituva em meados dos anos 1990 foi que o PS 1 chegou com apenas três carros e abarrotado de passageiros. Na plataforma tinha cerca de 50 pessoas desejando embarcar. Mas como? No final das contas, depois de cerca de 10 minutos, o trem foi embora sem ter embarcado nenhum passageiro. A ironia é que este trem circulava com 3 carros sob alegação de baixa ocupação. Mas nem em dias como aquele, um final de semana quando a demanda costuma aumentar, a Cia colocava carros a mais. A conclusão lógica é que era proposital para desestimular o uso do trem.
Para quem imagina que o seu relato seja apenas "teoria da conspiração", posso dizer que, como pesquisador, ouvi diversos casos como este em diversas linhas férreas, e casos que já remontavam aos anos 1960. Carlos Almeida, o relator, tinha razão, sem dúvida.
O ano era 1982. Quase trinta anos atrás. A ferrovia já era cada vez mais desprezada pelos governos estaduais e federal no Brasil, mas ainda havia vários trens de passageiros de longa distância circulando. Poucos comparado a vinte anos antes, mas muito comparados com os dias de hoje, quando circulam em pouco mais de 2.000 km de linhas (há 28 mil quilômetros de linhas no país).
Um desses trens era da Fepasa circulando na antiga linha-tronco da Sorocabana, São Paulo-Presidente Epitácio. Somente nesta linha, eram 830 quilômetros utilizados pelo trem de passageiros. Apenas mais um ramal da ex-Sorocabana ainda tinha estes trens também circulando: a linha Santos-Juquiá.
Na linha de Epitácio, um passageiro ainda corriqueiro nas ferrovias paulistas estava nesse dia apenas observando o movimento na estação de Boituva. Nesse dia, ele não embarcou. Mas guardou sua lembrança do descaso que já era farto nesse transporte:
Nesse ano, os trens de passageiros já não iam mais para Itapetininga e Itararé. Então, obrigatoriamente tinha que usar ônibus numa viagem direta para São Paulo ou com baldeação. No dia da foto voltava de Itapetininga, indo para Campinas fazer um passeio e, em seguida, retornar para casa de trem.
A linha de ônibus existe até os dias atuais e liga Itapetininga a Campinas, parando em Tatuí, Boituva, Porto Feliz, Salto, Itu e Indaiatuba. O comum era descer em Boituva e embarcar no PS 6 com destino a São Paulo.
Um episódio que presenciei na estação de Boituva em meados dos anos 1990 foi que o PS 1 chegou com apenas três carros e abarrotado de passageiros. Na plataforma tinha cerca de 50 pessoas desejando embarcar. Mas como? No final das contas, depois de cerca de 10 minutos, o trem foi embora sem ter embarcado nenhum passageiro. A ironia é que este trem circulava com 3 carros sob alegação de baixa ocupação. Mas nem em dias como aquele, um final de semana quando a demanda costuma aumentar, a Cia colocava carros a mais. A conclusão lógica é que era proposital para desestimular o uso do trem.
Para quem imagina que o seu relato seja apenas "teoria da conspiração", posso dizer que, como pesquisador, ouvi diversos casos como este em diversas linhas férreas, e casos que já remontavam aos anos 1960. Carlos Almeida, o relator, tinha razão, sem dúvida.
quinta-feira, 27 de janeiro de 2011
COELHO BASTOS, SEIS ANOS DEPOIS
A vila em 2005 (foto Cleber Agostini)
Alguém sabe onde fica Coelho Bastos? Não se preocupe, parece que pouca gente sabe. Na verdade, eu sei – mais ou menos. Fica, ou ficava, no Estado de Minas Gerais, perto da divisa com o Rio de Janeiro. Era uma estação ferroviária da lendária Leopoldina e estava situada exatamente entre duas estações que se tornaram sede de municípios: Eugenópolis e Antonio Prado de Minas, que, aliás, são cidades pequenas. Nunca estive lá. Até gostaria, mas o fator tempo é determinante – são cerca de 600 quilômetros daqui de São Paulo, por estradas ruins.
Era apenas uma das páginas de estações de meu site sobre o assunto, sem foto e sem quase nenhuma informação – apenas a data de inauguração, que constava num livro antigo. Mais nada. Eis que um belo dia uma estudante universitária de São Paulo me consultou para saber se eu tinha alguma notícia adicional sobre a vila de Coelho Bastos, pois, procurando pela Internet, ela somente havia achado uma referência: a da página do meu site. Ela me agradeceu muito, pois vinha procurando há muito tempo a sua localização, porque precisava de uma certidão antiga que teria de ser procurada nas cidades em volta, e agora ela sabia quais cidades ficavam ali próximas. Na verdade, eu nem consegui descobrir a qual dos dois municípios citados ela pertence.
Não muito tempo depois, também por causa do site, uma alemã, morando na Alemanha, também me enviou uma mensagem em português, dizendo-se descendente dos Coelho Bastos. Queria saber se eu teria maiores informações, e eu não tinha. Mas quem eram eles? Eram fazendeiros de café na região, quando ali havia muito café. É a região de uma cidade de nome curioso, Porciúncula, que, aliás, fica no Estado do Rio de Janeiro, também muito próxima a Coelho Bastos. Foi por isso que a estação ganhou esse nome – os donos das terras na época da construção, final do século 19, já eram eles. Portanto, subitamente, um interesse grande pela estação – e quase nenhuma informação para dar ou receber.
A linha da Leopoldina que cortava essas terras era chamada de Linha do Manhuaçu. Ligava a região da cidade chamada Leopoldina, que deu o nome à ferrovia, à cidade de Manhuaçu, em Minas, acompanhando sempre de perto a divisa estadual entre Minas e Rio e, depois de um certo ponto, a divisa de Minas com o Espírito Santo, até chegar à cidade de Manhuaçu. Tudo na chamada Zona da Mata mineira. Curiosamente, a construção da linha teve problemas, pois, perto de Coelho Bastos, o Estado do Rio tem uma reentrância no Estado de Minas – exatamente onde fica Porciúncula e por onde a linha teria de passar, entrando e saindo do território fluminense por alguns poucos quilômetros. Como havia na época outra ferrovia com a concessão ali no Rio, houve problemas de “zona privilegiada”. Quem resolveu a situação foi exatamente o Conselheiro Antonio Prado, na época, ministro da República. Por isso, ele foi homenageado com uma estação, citada acima.
Enfim, continuo sem saber muito, quase nada, sobre Coelho Bastos. Não sei nem se existe ainda ali alguma estação em pé – a linha foi desativada há quase trinta anos, trilhos arrancados, abandono, essas coisas. Nem sei se em volta se formou algum vilarejo, e se ele sobrevive ainda hoje. O que sei é que a estudante da qual falei não havia conseguido achar nada sobre a vila naquela região, hoje pobre, sem grandes perspectivas. Uma região em que, ao contrário do que vivem dizendo, a desativação da ferrovia trouxe problemas e não soluções. Afinal, enquanto ele existia, havia um trem direto dali ao Rio de Janeiro, facilitando a vida dos moradores. São histórias do nosso Brasil, de nossas ferrovias, de nossas vidas.
Seis anos depois de escrever as linhas acima, eu já sei que a estação não existe mais, o vilarejo pequeníssimo ainda está lá e vi Jô Soares desempenhar o papel de um Coelho Bastos no filme O Xangô de Baker Street...
Alguém sabe onde fica Coelho Bastos? Não se preocupe, parece que pouca gente sabe. Na verdade, eu sei – mais ou menos. Fica, ou ficava, no Estado de Minas Gerais, perto da divisa com o Rio de Janeiro. Era uma estação ferroviária da lendária Leopoldina e estava situada exatamente entre duas estações que se tornaram sede de municípios: Eugenópolis e Antonio Prado de Minas, que, aliás, são cidades pequenas. Nunca estive lá. Até gostaria, mas o fator tempo é determinante – são cerca de 600 quilômetros daqui de São Paulo, por estradas ruins.
Era apenas uma das páginas de estações de meu site sobre o assunto, sem foto e sem quase nenhuma informação – apenas a data de inauguração, que constava num livro antigo. Mais nada. Eis que um belo dia uma estudante universitária de São Paulo me consultou para saber se eu tinha alguma notícia adicional sobre a vila de Coelho Bastos, pois, procurando pela Internet, ela somente havia achado uma referência: a da página do meu site. Ela me agradeceu muito, pois vinha procurando há muito tempo a sua localização, porque precisava de uma certidão antiga que teria de ser procurada nas cidades em volta, e agora ela sabia quais cidades ficavam ali próximas. Na verdade, eu nem consegui descobrir a qual dos dois municípios citados ela pertence.
Não muito tempo depois, também por causa do site, uma alemã, morando na Alemanha, também me enviou uma mensagem em português, dizendo-se descendente dos Coelho Bastos. Queria saber se eu teria maiores informações, e eu não tinha. Mas quem eram eles? Eram fazendeiros de café na região, quando ali havia muito café. É a região de uma cidade de nome curioso, Porciúncula, que, aliás, fica no Estado do Rio de Janeiro, também muito próxima a Coelho Bastos. Foi por isso que a estação ganhou esse nome – os donos das terras na época da construção, final do século 19, já eram eles. Portanto, subitamente, um interesse grande pela estação – e quase nenhuma informação para dar ou receber.
A linha da Leopoldina que cortava essas terras era chamada de Linha do Manhuaçu. Ligava a região da cidade chamada Leopoldina, que deu o nome à ferrovia, à cidade de Manhuaçu, em Minas, acompanhando sempre de perto a divisa estadual entre Minas e Rio e, depois de um certo ponto, a divisa de Minas com o Espírito Santo, até chegar à cidade de Manhuaçu. Tudo na chamada Zona da Mata mineira. Curiosamente, a construção da linha teve problemas, pois, perto de Coelho Bastos, o Estado do Rio tem uma reentrância no Estado de Minas – exatamente onde fica Porciúncula e por onde a linha teria de passar, entrando e saindo do território fluminense por alguns poucos quilômetros. Como havia na época outra ferrovia com a concessão ali no Rio, houve problemas de “zona privilegiada”. Quem resolveu a situação foi exatamente o Conselheiro Antonio Prado, na época, ministro da República. Por isso, ele foi homenageado com uma estação, citada acima.
Enfim, continuo sem saber muito, quase nada, sobre Coelho Bastos. Não sei nem se existe ainda ali alguma estação em pé – a linha foi desativada há quase trinta anos, trilhos arrancados, abandono, essas coisas. Nem sei se em volta se formou algum vilarejo, e se ele sobrevive ainda hoje. O que sei é que a estudante da qual falei não havia conseguido achar nada sobre a vila naquela região, hoje pobre, sem grandes perspectivas. Uma região em que, ao contrário do que vivem dizendo, a desativação da ferrovia trouxe problemas e não soluções. Afinal, enquanto ele existia, havia um trem direto dali ao Rio de Janeiro, facilitando a vida dos moradores. São histórias do nosso Brasil, de nossas ferrovias, de nossas vidas.
Seis anos depois de escrever as linhas acima, eu já sei que a estação não existe mais, o vilarejo pequeníssimo ainda está lá e vi Jô Soares desempenhar o papel de um Coelho Bastos no filme O Xangô de Baker Street...
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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011
O FASCÍNIO DAS VAPOROSAS
As locos ex-Cia. Paulista agora são a 10 e a 14. Aí estão elas chegando no Corredor. Foto Vagner Costa
Em mais uma aventura minha pelos pátios ferroviários brasileiros, deparei-me no último sábado com o que restou do velho quintal de manobras da antiga E. F. Perus-Pirapora, na pedreira de Cajamar, que, hoje, pertence à Votorantim. O material rodante, além dos trilhos ali dentro, no entanto, são da ferrovia, embora jogados às traças por quase trinta anos. E é esse material que necessita ser retirado dali, pois atrapalha o serviço da pedreira - que é, claro, extrair pedras, de calcário, no caso. E ainda sobram coisas por ali que vão se retiradas assim "que o dinheiro der".
É interessante, no entanto, ver o que se passa em volta de tudo isso. As locomotivas, como já escrevi sábado, pertenceram não somente à Perus-Pirapora, mas também a diversas outras ferrovias brasileiras. Cada uma destas tem seus fanáticos por sua história e material rodante. A que mais conquistou corações foi a Companhia Paulista. Pelo menos três antigas locomotivas dos seus ramais de "bitolinha" desativados em 1960 estão lá. Duas foram transportadas para o Corredor no último sábado.
A locomotiva 911 da Paulista é agora a 1o da EFPP. A foto é dos anos 1930. A principal modificação foi a retirada da chaminé-balão, utilizada então para reduzir o número de fagulhas que escapavam e queimavam a mata.
Um dos ferreofanáticos que as recebeu no Corredor prestou até reverência para as duas. Sua idade? Menos de trinta anos. Portanto, não era nascido quando a Paulista as desativou. Aliás, não era nascido quando a Perus-Pirapora parou. Como pode ter tanto fascínio por isso? É algo inexplicável. Assim como ele, há outros adoradores da velha Mogiana que não se conformam de que nenhuma de suas antigas locomotivas da bitola de 60 cm sobrou para a ferrovia. É fato, também, que as locomotivas da velha Paulista gozam de uma condição especial dentro do material.
Aliás, as locomotivas a vapor sempre foram especiais no meio do material ferroviário. As mais recentes máquinas elétricas e a diesel não geram tanta admiração quanto as vaporosas. Tanto que à medida que se extinguia o tráfego das máquinas a vapor, crescia o número dos apreciadores e das entidades de preservação.
No Brasil, as últimas ferrovias que utilizaram locomotivas a vapor de forma comercial foram a Perus-Pirapora (bitola 60 cm), a antiga E. F. Oeste de Minas (bitola 76 cm) e a E. F. Teresa Cristina (bitola métrica), em Santa Catarina. O que continuou funcionando foram uma ou outra usina de açúcar que possuía ainda ferrovias particulares e, por fim, poucas máquinas que puxam comboios turísticos de final de semana.
A locomotiva 91o é hoje a número 14 da EFPP. Aqui ela aparece, nos anos 1960, na sua última viagem a Vassununga, estação terminal do ramal de Santa Rita.
Das três estradas de ferro citadas, a primeira parou em 1983 e somente agora faz um outro curto passeio eventualmente. A ideia é aumentar e fazer viagens de forma regular, mas sempre como entertenimento. A segunda continuou funcionando para turismo depois de ser totalmente desativada em 1984 num trecho muito curto entre Tiradentes e São João del Rey, ativo até hoje. A terceira funciona a plena carga até hoje utilizando locomotivas diesel, tendo abandonado o uso das vaporeiras em 1991. Para cada caso houve um motivo específico para que a sobrevida de máquinas tão antigas e obsoletas tenha sido estendida comercialmente.
Deveria ser bastante curioso em fins dos anos 1970, começo dos 1980, ouvir apitos de locomotivas a vapor numa área já tomada industrialmente como era a região por onde passa a Perus-Pirapora, carregando minério de Cajamar a Perus e vice-versa, além de eventuais carros de passageiros transportando funcionários, pois as viagens comerciais de passageiros comuns haviam terminado em 1972.
Um inventário realizado e publicado em livro há cinco anos atrás pela Revista Ferroviária mostrou 419 locomotivas a vapor ainda existentes no Brasil, nas mais variadas condições: desde algumas em estado exemplar até várias em estado deplorável e irrecuperável. Salvo engano de minha parte, os três maiores acervos existentes estão em poder da ABPF - Associação Brasileira de Preservação Ferroviária, com diversas sucursais pelo país, da ferrovia que trafega entre São João del Rey e Tiradentes e da EFPP, com seu acervo ainda dividido em quatro pontos na região de São Paulo e Cajamar ao longo do rio Juqueri-Guaçu.
Em mais uma aventura minha pelos pátios ferroviários brasileiros, deparei-me no último sábado com o que restou do velho quintal de manobras da antiga E. F. Perus-Pirapora, na pedreira de Cajamar, que, hoje, pertence à Votorantim. O material rodante, além dos trilhos ali dentro, no entanto, são da ferrovia, embora jogados às traças por quase trinta anos. E é esse material que necessita ser retirado dali, pois atrapalha o serviço da pedreira - que é, claro, extrair pedras, de calcário, no caso. E ainda sobram coisas por ali que vão se retiradas assim "que o dinheiro der".
É interessante, no entanto, ver o que se passa em volta de tudo isso. As locomotivas, como já escrevi sábado, pertenceram não somente à Perus-Pirapora, mas também a diversas outras ferrovias brasileiras. Cada uma destas tem seus fanáticos por sua história e material rodante. A que mais conquistou corações foi a Companhia Paulista. Pelo menos três antigas locomotivas dos seus ramais de "bitolinha" desativados em 1960 estão lá. Duas foram transportadas para o Corredor no último sábado.
A locomotiva 911 da Paulista é agora a 1o da EFPP. A foto é dos anos 1930. A principal modificação foi a retirada da chaminé-balão, utilizada então para reduzir o número de fagulhas que escapavam e queimavam a mata.
Um dos ferreofanáticos que as recebeu no Corredor prestou até reverência para as duas. Sua idade? Menos de trinta anos. Portanto, não era nascido quando a Paulista as desativou. Aliás, não era nascido quando a Perus-Pirapora parou. Como pode ter tanto fascínio por isso? É algo inexplicável. Assim como ele, há outros adoradores da velha Mogiana que não se conformam de que nenhuma de suas antigas locomotivas da bitola de 60 cm sobrou para a ferrovia. É fato, também, que as locomotivas da velha Paulista gozam de uma condição especial dentro do material.
Aliás, as locomotivas a vapor sempre foram especiais no meio do material ferroviário. As mais recentes máquinas elétricas e a diesel não geram tanta admiração quanto as vaporosas. Tanto que à medida que se extinguia o tráfego das máquinas a vapor, crescia o número dos apreciadores e das entidades de preservação.
No Brasil, as últimas ferrovias que utilizaram locomotivas a vapor de forma comercial foram a Perus-Pirapora (bitola 60 cm), a antiga E. F. Oeste de Minas (bitola 76 cm) e a E. F. Teresa Cristina (bitola métrica), em Santa Catarina. O que continuou funcionando foram uma ou outra usina de açúcar que possuía ainda ferrovias particulares e, por fim, poucas máquinas que puxam comboios turísticos de final de semana.
A locomotiva 91o é hoje a número 14 da EFPP. Aqui ela aparece, nos anos 1960, na sua última viagem a Vassununga, estação terminal do ramal de Santa Rita.
Das três estradas de ferro citadas, a primeira parou em 1983 e somente agora faz um outro curto passeio eventualmente. A ideia é aumentar e fazer viagens de forma regular, mas sempre como entertenimento. A segunda continuou funcionando para turismo depois de ser totalmente desativada em 1984 num trecho muito curto entre Tiradentes e São João del Rey, ativo até hoje. A terceira funciona a plena carga até hoje utilizando locomotivas diesel, tendo abandonado o uso das vaporeiras em 1991. Para cada caso houve um motivo específico para que a sobrevida de máquinas tão antigas e obsoletas tenha sido estendida comercialmente.
Deveria ser bastante curioso em fins dos anos 1970, começo dos 1980, ouvir apitos de locomotivas a vapor numa área já tomada industrialmente como era a região por onde passa a Perus-Pirapora, carregando minério de Cajamar a Perus e vice-versa, além de eventuais carros de passageiros transportando funcionários, pois as viagens comerciais de passageiros comuns haviam terminado em 1972.
Um inventário realizado e publicado em livro há cinco anos atrás pela Revista Ferroviária mostrou 419 locomotivas a vapor ainda existentes no Brasil, nas mais variadas condições: desde algumas em estado exemplar até várias em estado deplorável e irrecuperável. Salvo engano de minha parte, os três maiores acervos existentes estão em poder da ABPF - Associação Brasileira de Preservação Ferroviária, com diversas sucursais pelo país, da ferrovia que trafega entre São João del Rey e Tiradentes e da EFPP, com seu acervo ainda dividido em quatro pontos na região de São Paulo e Cajamar ao longo do rio Juqueri-Guaçu.
terça-feira, 25 de janeiro de 2011
O PASSADO GLORIOSO DE SÃO PAULO
Existem, é claro, diversas razões para a cidade de São Paulo, e por conseguinte o Estado, tenham uma importância muito grande na Federação brasileira. A principal delas é, claro, a coincidência de fatores. Mas, que fatores?
É certo que o Estado de São Paulo, anteriormente província e, mais antigamente, capitania sempre teve uma importância grande para o império português, mesmo na época em que era apenas um amontoado de cidades distantes, todas elas paupérrimas. Isto incluía a cidade de São Paulo. Originalmente, a capitania paulista se formou a partir da junção das capitanias de São Vicente e de Santo Amaro, além da de Santana. Em teoria, estas capitanias chegavam até a linha de Tordesilhas, que, em termos de hoje, passa mais ou menos pelas cidades de Olímpia, Catanduva, Bauru, Cerqueira César e Itararé.
A capital era São Vicente, promovida a município, o primeiro do Brasil, em 1532. A cidade de São Paulo tornou-se capital apenas a partir do final do século XVII. Nessa época, a capitania se estendia ao que hoje são os estados de São Paulo, Paraná, Samta Catarina, parte do Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondonia e Goiás.
A descoberta da riqueza do ouro em Minas Gerais, também no fim do século XVII, acabou sendo péssimo para a capitania: o governo português, para facilitar o seu monopólio de compra desse ouro e evitar sua evasão, separou a capitania de Minas Gerais em 1720. Até 1748, São Paulo acabou por perder todas as outras, menos a do Paraná. No mesmo ano, Portugal decretou a extinção da capitania e incoporou-a à do Rio de Janeiro.
O erro foi desfeito em 1765. A capitania do Rio de Janeiro não tinha condições de controle sobre o território paulista e paranaense: ademais, o reino sempre dependeram da valentia e experiência com o conhecimento das terras desse território dos paulistas. Por que eles eram tão bons e fieis assim? Difícil dizer, mas eram; ao mesmo tempo, queriam também a retribuição. Retribuição não era, com certeza, uma perda de autonomia administrativa: junto com a restauração da capitania, Lisboa mandou para cá como Governador o Morgado de Mateus, experiente político com a função de povoar a pobre e inabitada província paulista.
A capital seria movida de São Paulo para Santos; porém, na última hora, isto não aconteceu e São Paulo reouve seu status de 1748. As providências tomadas pelo Morgado e seus sucessores, como o Lorena, foram facilitar a fundação de cidades no chamado oeste paulista: Campinas e Araraquara foram algumas delas. A construção de uma estrada melhor ligando a capital ao porto também foi uma delas: a calçada do Lorena, que segue aproximadamante o que veio a ser o Caminho do Mar mais tarde, equiparou-se às melhores estradas de rodagem européias da época. Isto facilitaria o transporte da região de Campinas e Araraquara aos portos para o seu transporte para Portugal. A partir de então, Santos, que era um dos portos do litoral paulista, passou a crescer mais em relação aos outros da costa. Com a chegada da estrada de ferro, em 1867, firmou-se como tal e os outros foram desaparecendo aos poucos.
A cidade de São Paulo, mesmo antes de tornar-se capital, tinha uma importância muito grande como boca de sertão: mesmo as cidades que foram surgindo depois da fundação de São Paulo, como Santana de Parnaíba e Mogi das Cruzes, também bocas-de-sertão, ainda dependiam do posto avançado que era São Paulo em relação ao litoral.
Quais foram os fatores que levaram a cidade de São Paulo ao seu crescimento econômico? Primeiro, o fato de ser a principal ligação com os portos do litoral. Também o fato de estar no início do rio Tietê, a verdadeira porta para o oeste. Graças à navegação por este rio, a capitania ganhou todos aqueles imensos territórios a oeste e ao norte - embora a colonização ao longo deste rio praticamente não tenha existido até o século XX.
Depois, o estabelecimento do governo da capitania na cidade; com a proclamação da independência (aliás, em terras paulistanas e não na corte, que era o Rio de Janeiro), teve a implantação dos cursos jurídicos no largo de São Francisco pelo governo imperial; finalmente, como centro nevrálgico da São Paulo Railway, teve a gradativa mudança dos ricos fazendeiros do interior paulista para a cidade, pois, com o transporte por trem, o seu deslocamento para as fazendas tornava-se fácil, ao mesmo tempo em que, passando mais tempo no Capital, podiam influenciar o governo provincial com mais facilidade para atender seus interesses.
Como a população era muito baixa na Província, podia-se dizer que seus interesses eram basicamente os da província. Metade do território, a metade oeste, no entanto, cvontinuava praticamente inexplorada. Mas o seu povoamento viria mais tarde, num atraso que foi até bom para o desenvolvimento da parte do território já então povoada. A imigração europeia a partir da segunda metade do século XIX beneficiou muito a mão-de-obra, que até então contava praticamente somente com a escrava, totalmente desmotivada, por motivos óbvios: não se espere um bom trabalho de quem trabalha sem ganhar sem ter direito algum.
A partir de então, veio o que a lógica já fazia adivinhar: investimentos, fábricas, mais ferrovias, mais estradas de rodagem... tudo se concentrando na capital de São Paulo, graças às facilidades com que ela passou a contar. Indústria na Capital e agricultura no interior. Melhores salários na Capital, piores no interior. Superpovoamento na Capital e êxodo rural no interior.
Há muitas coisas mais a serem contadas. Livros e mais livros foram e ainda poderão e deverão ser escritos sobre São Paulo. O desenvolvimento e o sentimento por São Paulo, cidade e estado, existe por causa de tudo isso e muito mais. Seria bom, no entanto, que ambas as entidades, através de seu povo, ricos e pobres, patrões e empregados, parassem neste feriado municipal em que a cidade de São Paulo completa 457 anos de idade (e 451 de município) para pensar que é preciso mudar a mentalidade para que daqui a poucos anos a cidade não se torne inabitável pelo fato de crescer tanto.
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segunda-feira, 24 de janeiro de 2011
ARQUITETURA INVISÍVEL
A casa atrás das lojas. Ao lado direito, um telhado em quatro águas de outra casa.
Como já escrevi há algum tempo neste blog, o professor Máximo de Moura Santos, amigo de meu avô Sud, possuía um colégio na rua Domingos de Moraes em fins da década de 1920. Quando meu avô estava construindo sua casa na rua Capitão Cavalcânti, a dois quarteirões dali, mudou-se com a família para uma dependência da escola.
O mapa da Sara Brasil de 1930 mostra o quarteirão citado. Todas essas casas já existiam. Ainda parecem existir três delas: da rua França Pinto para o norte, lado par da Domingos de Moraes, a segunda (um armazém já descaracterizado), a terceira (que pode ser vista acima das lojas) e a quarta (apenas se vê o telhado).
O número da casa era 148. Lado par, portanto. Entretanto, a numeração da época não era a métrica - que somente veio a ser implantada em São Paulo em 1938. Então, onde ficava a casa? Tenho uma fotografia dessa casa, tirada por meu avô. O número da casa estava escrito no verso da foto. Quando eu escrevi a biografia dele, perguntei a minha mãe - que havia morado ali e teria seis anos de idade - onde deveria ficar a casa. Ela não se lembrava muito bem. Achava que ficava entre as ruas França Pinto e Araxans (atual Sud Mennucci).
Quase quinze anos depois, descobri que não era ali, mas sim no quarteirão anterior (para quem vem da cidade), o que fica entre as ruas Joaquim Távora e França Pinto. Isto ocorreu porque, por acaso, folheando um velho livro de 1916, consegui identificar boa parte dos locais com numeração antiga da rua Domingos de Moraes. Ali estava escrito que "a rua França Pinto começava junto ao número 161 da rua Domingos de Moraes". Está certo, 161 era ímpar, mas isto implicava que o número 148 seria,então, no quarteirão citado acima.
Para ter um pouco mais de certeza, perguntei à minha mãe se ela se lembrava de onde ficava a casa. Ela disse que da casa ela se lembrava de ver, bem próxima, a caixa d'água da rua Vergueiro. Bingo. O quarteirão devia ser esse mesmo. Seria em que ponto, exatamente? Difícil de dizer. Esse quarteirão, em seu lado par, ostentou o prédio da antiga "fábrica de phosphoros" da Vila Mariana em toda a sua extensão até 1922. Portanto, as casas que ali existissem deveriam ser mais novas do que isso.
A mesma casa, vista de frente. Porém, quem passa na calçada do outro lado da rua dificilmente notará a velha casa. Reparem que à esquerda da loja "Basico", está a entrada lateral para os fundos, onde a casa ainda está - possivelmente alguém mora nela ainda
A mim, parece que o estilo da casa, cuja fotografia reproduzo aqui, condiz com essa afirmação. Da mesma forma, pelo menos uma casa que "descobri" recentemente no mesmo quarteirão, escondida atrás da fachada de três lojas à beira da calçada, parece ser dos anos 1920 ou até 1930. Ao lado, outra casa, da qual somente se vê um telhado de quatro águas, que possivelmente seja da mesma época, também escondida por três lojas.
A casa onde ficava o Colégio Moura Santos, antigo 148 da rua Domingos de Moraes. Na época da foto, era tanto escola quanto moradia de meu avô (final dos anos 1920).
Nenhuma delas parece ser a antiga escola. Ela talvez fosse ao lado direito da última, de quem olha da rua. Ali não há casa antiga. Ela deve ter sido demolida. Quando, não se sabe.
Nela nasceu minha tia Lélia, irmã de minha mãe, quatro meses antes de Sud e sua família se mudarem para a sua nova casa na Capitão Cavalcânti.
Enfim, há muita coisa antiga e bonita escondida em São Paulo, ainda.
Como já escrevi há algum tempo neste blog, o professor Máximo de Moura Santos, amigo de meu avô Sud, possuía um colégio na rua Domingos de Moraes em fins da década de 1920. Quando meu avô estava construindo sua casa na rua Capitão Cavalcânti, a dois quarteirões dali, mudou-se com a família para uma dependência da escola.
O mapa da Sara Brasil de 1930 mostra o quarteirão citado. Todas essas casas já existiam. Ainda parecem existir três delas: da rua França Pinto para o norte, lado par da Domingos de Moraes, a segunda (um armazém já descaracterizado), a terceira (que pode ser vista acima das lojas) e a quarta (apenas se vê o telhado).
O número da casa era 148. Lado par, portanto. Entretanto, a numeração da época não era a métrica - que somente veio a ser implantada em São Paulo em 1938. Então, onde ficava a casa? Tenho uma fotografia dessa casa, tirada por meu avô. O número da casa estava escrito no verso da foto. Quando eu escrevi a biografia dele, perguntei a minha mãe - que havia morado ali e teria seis anos de idade - onde deveria ficar a casa. Ela não se lembrava muito bem. Achava que ficava entre as ruas França Pinto e Araxans (atual Sud Mennucci).
Quase quinze anos depois, descobri que não era ali, mas sim no quarteirão anterior (para quem vem da cidade), o que fica entre as ruas Joaquim Távora e França Pinto. Isto ocorreu porque, por acaso, folheando um velho livro de 1916, consegui identificar boa parte dos locais com numeração antiga da rua Domingos de Moraes. Ali estava escrito que "a rua França Pinto começava junto ao número 161 da rua Domingos de Moraes". Está certo, 161 era ímpar, mas isto implicava que o número 148 seria,então, no quarteirão citado acima.
Para ter um pouco mais de certeza, perguntei à minha mãe se ela se lembrava de onde ficava a casa. Ela disse que da casa ela se lembrava de ver, bem próxima, a caixa d'água da rua Vergueiro. Bingo. O quarteirão devia ser esse mesmo. Seria em que ponto, exatamente? Difícil de dizer. Esse quarteirão, em seu lado par, ostentou o prédio da antiga "fábrica de phosphoros" da Vila Mariana em toda a sua extensão até 1922. Portanto, as casas que ali existissem deveriam ser mais novas do que isso.
A mesma casa, vista de frente. Porém, quem passa na calçada do outro lado da rua dificilmente notará a velha casa. Reparem que à esquerda da loja "Basico", está a entrada lateral para os fundos, onde a casa ainda está - possivelmente alguém mora nela ainda
A mim, parece que o estilo da casa, cuja fotografia reproduzo aqui, condiz com essa afirmação. Da mesma forma, pelo menos uma casa que "descobri" recentemente no mesmo quarteirão, escondida atrás da fachada de três lojas à beira da calçada, parece ser dos anos 1920 ou até 1930. Ao lado, outra casa, da qual somente se vê um telhado de quatro águas, que possivelmente seja da mesma época, também escondida por três lojas.
A casa onde ficava o Colégio Moura Santos, antigo 148 da rua Domingos de Moraes. Na época da foto, era tanto escola quanto moradia de meu avô (final dos anos 1920).
Nenhuma delas parece ser a antiga escola. Ela talvez fosse ao lado direito da última, de quem olha da rua. Ali não há casa antiga. Ela deve ter sido demolida. Quando, não se sabe.
Nela nasceu minha tia Lélia, irmã de minha mãe, quatro meses antes de Sud e sua família se mudarem para a sua nova casa na Capitão Cavalcânti.
Enfim, há muita coisa antiga e bonita escondida em São Paulo, ainda.
sábado, 22 de janeiro de 2011
RESGATE DE LOCOMOTIVAS A VAPOR
A locomotiva Balwin ex-CP nro. 14 sendo colocada no caminhão
A história pode não ser verdadeira, mas é real que três das quatro locomotivas das oficinas do pátio da pedreira de Cajamar, até 1983 parte do material rodante da E. F. Perus-Pirapora, foram retiradas depois de 28 anos estacionadas no mesmo local.
A locomotiva nro. 14, Badwin ex-CP, sendo erguida para ser colocada no caminhão
Uma operação com caminhões Munck e guindastes (chineses) tirou-as de seus túmulos e levou-as para o pátio do Corredor, onde já está outra parte do velho material rodante da antiga ferrovia, com alguns itens já restaurados e funcionando.
A locomotiva nro. 5 sendo retirada do galpão
Trata-se de uma luta que dura já esses vinte e oito anos para tentar salvar o material da ferrovia desativada, única de 60 cm de bitola que ainda existe no Brasil. Como foi a última a funcionar, ela comprou diversas locomotivas, vagões e carros de outras ferrovias desativadas anteriormente a ela.
A locomotiva Alco nro. 5 sendo colocada no caminhão
Das três locomotivas a vapor retiradas hoje, duas pertenceram à Companhia Paulista de Estradas de Ferro, as antigas 910 e 911, duas Baldwin 2-6-2 que trafegaram no antigo ramal de Santa Rita, de 1913, quando foram compradas, até 1960, quando da desativação do ramal. Sua numeração, na EFPP, foi alterada para 10 e 14. A outra locomotiva hoje retirada é a de número 5, uma Alco adquirida pela própria EFPP diretamente do fabricante em 1925.
A locomotiva Alco nro. 5 sendo içada
Parabéns a todos que participaram da operação em Cajamar: Rodrigo, Júlio, Nilson e Nelson e aos outros funcionários da transportadora. No Corredor, atrás do Parque Anhanguera e às margens do rio Juqueri-Guaçu, mais gente da preservação da EFPP esperava para recepcionar o material e colocar nos devidos locais.
sexta-feira, 21 de janeiro de 2011
NOTÍCIAS CENTENÁRIAS
Todos os dias eu leio a edição de cem anos atrás do jornal O Estado de São Paulo que é publicada no blog "Um Século", ou "Cem anos atrás". É curioso. Na verdade, dá apenas para ler a primeira página (Eram, em média, apenas 8 a 12 páginas por dia nessa época) e também um pequeno resumo de notícias de outras páginas que é publicado também diariamente.
A diagramação mudou bastante durante o ano de 1910, que acompanhei inteiro. No início do ano, mais notícias internacionais na primeira página. Depois de março, mês das eleições presidenciais, o acompanhamento da eleição, com resultados, críticas das supostas fraudes, etc. Porém, como tudo na vida, o assunto foi perdendo o interesse - pois já se sabia que o Marechal Hermes venceria, embora o resultado final tenha saído somente lá por agosto (não me lembro o dia exato). O Marechal, desafeto do jornal, viajou então para a Europa e lá permaneceu até a véspera de sua posse, sempre em 15 de novembro para os presidentes. Durante esse tempo havia notícias da viagem e também do interior - com notícias de Santos, Campinas e outras cidades do interior paulista.
Curiosamente, mais para o final do ano, as notícias da seção "interior" passaram a mostra praticamente somente a cidade do Rio de Janeiro, capital da República, mostrando o regionalismo paulista... Belo Horizonte e outras capitais também apareciam. O interior paulista foi deslocado para as páginas centrais, não reproduzidas no blog. No mês de dezembro e no de janeiro seguinte (2011), aparecia nas duas primeiras colunas todo o expediente do jornal - com os nomes dos agentes nas cidades do interior. Eram relacionados por regiões, que tinham o nome das ferrovias ou nomes de Estados: Linha Paulista, Linha Sorocabana, Linha Mogyana, Goyaz, Paraná, E. F. C. do Brasil e Rio. Era a força das ferrovias.
Hoje, a E. F. Central do Brasil é Vale do Paraíba. Já as linhas Paulista, Sorocabana e Mogiana em alguns casos mantêm os nomes, mesmo essas ferrovias tendo sido extintas há 40 anos. Ainda é a força das ferrovias...
E o que, exatamente, interessava tanto ao leitor os nomes dos agentes no interior para saírem na primeira página e ocuparem duas colunas de oito? No dia de hoje há cem anos, as outras 6 colunas mostravam os telegramas chegados do Interior (Rio, Curityba, Belem, Porto Alegre, Pelotas, Fortaleza e Aracaju) e as notícias da Europa (Argentina, Portugal e Italia).
Praticamente todos os dias, era publicada também a lista de viajantes que embarcavam nos trens noturnos (o mais concorrido, pois os passageiros dormiam durante a viagem, não tendo de se utilizar de hoteis nos destinos) de São Paulo ao Rio e vice-versa. Era como uma espécie de "coluna social": os nomes que apareciam eram todos nomes de "gente bem" ou, se não eram, passavam a ser...
Muito de vez em quando, apareciam anúncios na página de abertura, geralmente, anúncio de um espetáculo naquela noite, por exemplo. As remoções de agentes de correio, chefes de estações ferroviárias e de professores em cidades do distante interior eram também noticiados... falta de assunto? Havia, também, notícias diversas. Alguns itens estão espalhados por esta postagem.
A diagramação mudou bastante durante o ano de 1910, que acompanhei inteiro. No início do ano, mais notícias internacionais na primeira página. Depois de março, mês das eleições presidenciais, o acompanhamento da eleição, com resultados, críticas das supostas fraudes, etc. Porém, como tudo na vida, o assunto foi perdendo o interesse - pois já se sabia que o Marechal Hermes venceria, embora o resultado final tenha saído somente lá por agosto (não me lembro o dia exato). O Marechal, desafeto do jornal, viajou então para a Europa e lá permaneceu até a véspera de sua posse, sempre em 15 de novembro para os presidentes. Durante esse tempo havia notícias da viagem e também do interior - com notícias de Santos, Campinas e outras cidades do interior paulista.
Curiosamente, mais para o final do ano, as notícias da seção "interior" passaram a mostra praticamente somente a cidade do Rio de Janeiro, capital da República, mostrando o regionalismo paulista... Belo Horizonte e outras capitais também apareciam. O interior paulista foi deslocado para as páginas centrais, não reproduzidas no blog. No mês de dezembro e no de janeiro seguinte (2011), aparecia nas duas primeiras colunas todo o expediente do jornal - com os nomes dos agentes nas cidades do interior. Eram relacionados por regiões, que tinham o nome das ferrovias ou nomes de Estados: Linha Paulista, Linha Sorocabana, Linha Mogyana, Goyaz, Paraná, E. F. C. do Brasil e Rio. Era a força das ferrovias.
Hoje, a E. F. Central do Brasil é Vale do Paraíba. Já as linhas Paulista, Sorocabana e Mogiana em alguns casos mantêm os nomes, mesmo essas ferrovias tendo sido extintas há 40 anos. Ainda é a força das ferrovias...
E o que, exatamente, interessava tanto ao leitor os nomes dos agentes no interior para saírem na primeira página e ocuparem duas colunas de oito? No dia de hoje há cem anos, as outras 6 colunas mostravam os telegramas chegados do Interior (Rio, Curityba, Belem, Porto Alegre, Pelotas, Fortaleza e Aracaju) e as notícias da Europa (Argentina, Portugal e Italia).
Praticamente todos os dias, era publicada também a lista de viajantes que embarcavam nos trens noturnos (o mais concorrido, pois os passageiros dormiam durante a viagem, não tendo de se utilizar de hoteis nos destinos) de São Paulo ao Rio e vice-versa. Era como uma espécie de "coluna social": os nomes que apareciam eram todos nomes de "gente bem" ou, se não eram, passavam a ser...
Muito de vez em quando, apareciam anúncios na página de abertura, geralmente, anúncio de um espetáculo naquela noite, por exemplo. As remoções de agentes de correio, chefes de estações ferroviárias e de professores em cidades do distante interior eram também noticiados... falta de assunto? Havia, também, notícias diversas. Alguns itens estão espalhados por esta postagem.
quinta-feira, 20 de janeiro de 2011
AREIA BRANCA
Estação de Alfredo Guedes (ao fundo) e armazém (em primeiro plano). Foto Adriano Martins, 2009
O Adriano é de Lençóis Paulista e me mandou fotografias da estação/bairro rural de Alfredo Guedes... antiga Areia Branca. Ele mandou as fotografias para duas amigas, ex-professoras da cidade. Seus comentários estão transcritos abaixo.
Boa recordação dos trens de passageiros de um ramal da antiga Sorocabana que ainda funciona, mas não para eles, desativados em 1976, portanto 35 anos atrás:
Adriano, agradecemos as fotos do "Guedes". Durante anos eu (Meiry) desembarquei e embarquei nessa Estação, pois dava aula na Escola Estadual de Alfredo Guedes. Fazia o trajeto Lençóis a Guedes durante anos, na década de 1960. Viajava no trem de passageiros que passava por aqui com destino a São Paulo. Voltava de misto depois do meio dia. A estação era muito bonita e bem equipada. Os bancos de madeira eram o conforto para os professores cansados depois de enfrentar um período de aula, enquanto o trem não apontava na curva. Tenho na lembrança aquela estaçãozinha que tanta recordação me deixou. Adoramos todas as fotos que enviou. Um abraço, Terezinha e Meiry
O Adriano é de Lençóis Paulista e me mandou fotografias da estação/bairro rural de Alfredo Guedes... antiga Areia Branca. Ele mandou as fotografias para duas amigas, ex-professoras da cidade. Seus comentários estão transcritos abaixo.
Boa recordação dos trens de passageiros de um ramal da antiga Sorocabana que ainda funciona, mas não para eles, desativados em 1976, portanto 35 anos atrás:
Adriano, agradecemos as fotos do "Guedes". Durante anos eu (Meiry) desembarquei e embarquei nessa Estação, pois dava aula na Escola Estadual de Alfredo Guedes. Fazia o trajeto Lençóis a Guedes durante anos, na década de 1960. Viajava no trem de passageiros que passava por aqui com destino a São Paulo. Voltava de misto depois do meio dia. A estação era muito bonita e bem equipada. Os bancos de madeira eram o conforto para os professores cansados depois de enfrentar um período de aula, enquanto o trem não apontava na curva. Tenho na lembrança aquela estaçãozinha que tanta recordação me deixou. Adoramos todas as fotos que enviou. Um abraço, Terezinha e Meiry
terça-feira, 18 de janeiro de 2011
ÁREAS DE RISCO
Wilton Junior/AE - 15/1/2011
As frases abaixo foram transcritas de duas edições do jornal O Estado de S. Paulo, dos dias 9/1/2011 e 18/2/2011, portanto nos últimos dez dias.
"A Justiça determinou que a Prefeitura não faça a remoção dos moradores da favela do Tanque, uma área de risco na zona leste". "Em 2008, a Defensoria Pública conseguiu liminar que impediu a Prefeitura de remover sete famílias que moravam próximas ao córrego Taboão em Itaquera". "A construção de um piscinão que poderia ajudar a evitar enchentes no bairro esbarrou em ação movida por moradores da rua Abegoaria. Vinte famílias temiam a desvalorização dos imóveis e barraram a obra". "Após 20 anos, ação (para remover moradias irregulares de uma área de risco em Teresópolis) para tirar casas fica sem conclusão".
Quero esclarecer que os artigos não foram transcritos na íntegra, mas todos os casos acima tratam de áreas de risco, tanto de desabamento quanto de enchentes. No caso de Teresópolis, eram 30 casas; hoje, já há mais de 300 no local e a decisão não saiu ainda. Aliás, o que é "área de risco" exatamente? Em teoria, toda área é de risco... cidades já foram destruídas por terremotos, tsunamis, enchentes, incêndios, desabamentos, avalanches, erupções de vulcões. Até um meteoro poderia cair sobre uma cidade e destruí-las. A questão é saber quanto risco existe, certo?
Em casos de encostas e vales, os riscos são grandes: porém, parece que a Justiça brasileira age de forma a desconhecer o perigo e basta ler os textos acima para perceber isto. Quando se culpa "o governo" pelos mortos dos desabamentos em Teresópolis, não se culpa também o Judiciário? O fato, porém, é que quando os administradores das cidades querem de fato tomar providências para eliminar habitações em áreas de riscos, não conseguem fazer isto por diversos motivos, sendo um deles, a justiça brasileira. Outros motivos? Bem, o fato de se eliminar favelas e logo em seguida aparecerem novas no mesmo local é um deles. Haja fiscalização.
Assim como existem de fato cidades que tentam impedir pelo menos a expansão de loteamentos clandestinos, há outras que usam o povoamento "por baixo do pano" para angariar novos votos. Estas últimas não são poucas. Por fim, a maioria delas não age no sentido de impedir o povoamento irregular, tanto por pobres quanto por ricos.
É lógico que as tragédias vão continuar, infelizmente. E já deu para ver que não são somente os políticos que nos administram os culpados.
As frases abaixo foram transcritas de duas edições do jornal O Estado de S. Paulo, dos dias 9/1/2011 e 18/2/2011, portanto nos últimos dez dias.
"A Justiça determinou que a Prefeitura não faça a remoção dos moradores da favela do Tanque, uma área de risco na zona leste". "Em 2008, a Defensoria Pública conseguiu liminar que impediu a Prefeitura de remover sete famílias que moravam próximas ao córrego Taboão em Itaquera". "A construção de um piscinão que poderia ajudar a evitar enchentes no bairro esbarrou em ação movida por moradores da rua Abegoaria. Vinte famílias temiam a desvalorização dos imóveis e barraram a obra". "Após 20 anos, ação (para remover moradias irregulares de uma área de risco em Teresópolis) para tirar casas fica sem conclusão".
Quero esclarecer que os artigos não foram transcritos na íntegra, mas todos os casos acima tratam de áreas de risco, tanto de desabamento quanto de enchentes. No caso de Teresópolis, eram 30 casas; hoje, já há mais de 300 no local e a decisão não saiu ainda. Aliás, o que é "área de risco" exatamente? Em teoria, toda área é de risco... cidades já foram destruídas por terremotos, tsunamis, enchentes, incêndios, desabamentos, avalanches, erupções de vulcões. Até um meteoro poderia cair sobre uma cidade e destruí-las. A questão é saber quanto risco existe, certo?
Em casos de encostas e vales, os riscos são grandes: porém, parece que a Justiça brasileira age de forma a desconhecer o perigo e basta ler os textos acima para perceber isto. Quando se culpa "o governo" pelos mortos dos desabamentos em Teresópolis, não se culpa também o Judiciário? O fato, porém, é que quando os administradores das cidades querem de fato tomar providências para eliminar habitações em áreas de riscos, não conseguem fazer isto por diversos motivos, sendo um deles, a justiça brasileira. Outros motivos? Bem, o fato de se eliminar favelas e logo em seguida aparecerem novas no mesmo local é um deles. Haja fiscalização.
Assim como existem de fato cidades que tentam impedir pelo menos a expansão de loteamentos clandestinos, há outras que usam o povoamento "por baixo do pano" para angariar novos votos. Estas últimas não são poucas. Por fim, a maioria delas não age no sentido de impedir o povoamento irregular, tanto por pobres quanto por ricos.
É lógico que as tragédias vão continuar, infelizmente. E já deu para ver que não são somente os políticos que nos administram os culpados.
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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
QUEM FOI HECTOR LEGRU?
O prédio original da estação de Hector Legru, em 1919, hoje Promissão, SP
Ontem eu estava lendo um livro de 1950. Ele mostra o Estado de São Paulo em 1950, com a capital de então, seguido de uma viagem de avião - imaginária ou não - por todo o Estado naquele tempo. É, na verdade, um livro para escolares do ginásio, talves do ensino de segundo grau de então (era chamado de Escola Normal).
O livro, de nome Viagem através do Brasil: São Paulo, foi escrito por Lourenço Filho, concunhado de meu avô Sud Mennucci, nascido em Porto Ferreira e tio do Lólio, meu primo escritor e quase vizinho aqui em Santana de Parnaíba. Fazia parte de uma coleção editada pela Melhoramentos, que mostrava na mesma coleção a viagem por outros Estados brasileiros.
O livro é tratado em tom professoral, mas é bastante interessante. Não há fotografias, somente ilustrações de pessoas e de cidades e locais, feitas por Percy Lau. Porém, até Lourenço caiu numa armadilha quando, na página 185, falando sobre a cidade de Glicério e de outras na região da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, escreveu: "A luta com os índios (durante a construção e o início de operações da ferrovia) durou vários anos. Em 1906, sacrificaram eles um piedoso sacerdote (...) Pouco tempo depois, mataram o Engenheiro Hector Legru e vários trabalhadores". Erro crasso.
Legru não era engenheiro e não foi morto pelos índios. Nunca esteve na região e jamais pisou no Brasil. Ele era, na verdade, um banqueiro francês e também o principal sócio de Percival Farquhar na Brazil Railway Company, empresa que possuía, entre os anos de 1906 e de 1918, diversas ferrovias e portos no país, especificamente nos Estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e no atual Estado de Rondônia. Depois de 1918, ela ainda manteve a posse da Rede de Viação Paraná-Santa Catarina até 1942.
A Brazil Railway ainda nomeou com seu nome duas estações ferroviárias no Brasil: a de Hector Legru, na Noroeste, que depois se tornou a estação e a cidade de Promissão, e a de Legru, em Santa Catarina, no município de Porto União. Esta última também teve o nome alterado mais tarde para Engenheiro Eugênio de Mello - não confundir com outra, com o mesmo nome, em São José dos Campos, SP. Por que teriam sido nomeadas duas estações com o nome de alguém vivo e que nunca havia vindo - e não veio também mais tarde - para o Brasil? Certamente para adular um dos dois sócios principais das ferrovias na época. E olhe que Legru chegou a ser procurado pela polícia francesa por fraudes financeiras... Farquhar, por sua vez, sempre recusou em vida homenagens como esta.
O competente Lourenço Filho não foi o único a cair no "conto do Legru". Há diversas literaturas sobre este na Internet e em algumas piblicações que constroem uma biografia errada para o francês, às vezes chamado também de belga...
Ontem eu estava lendo um livro de 1950. Ele mostra o Estado de São Paulo em 1950, com a capital de então, seguido de uma viagem de avião - imaginária ou não - por todo o Estado naquele tempo. É, na verdade, um livro para escolares do ginásio, talves do ensino de segundo grau de então (era chamado de Escola Normal).
O livro, de nome Viagem através do Brasil: São Paulo, foi escrito por Lourenço Filho, concunhado de meu avô Sud Mennucci, nascido em Porto Ferreira e tio do Lólio, meu primo escritor e quase vizinho aqui em Santana de Parnaíba. Fazia parte de uma coleção editada pela Melhoramentos, que mostrava na mesma coleção a viagem por outros Estados brasileiros.
O livro é tratado em tom professoral, mas é bastante interessante. Não há fotografias, somente ilustrações de pessoas e de cidades e locais, feitas por Percy Lau. Porém, até Lourenço caiu numa armadilha quando, na página 185, falando sobre a cidade de Glicério e de outras na região da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, escreveu: "A luta com os índios (durante a construção e o início de operações da ferrovia) durou vários anos. Em 1906, sacrificaram eles um piedoso sacerdote (...) Pouco tempo depois, mataram o Engenheiro Hector Legru e vários trabalhadores". Erro crasso.
Legru não era engenheiro e não foi morto pelos índios. Nunca esteve na região e jamais pisou no Brasil. Ele era, na verdade, um banqueiro francês e também o principal sócio de Percival Farquhar na Brazil Railway Company, empresa que possuía, entre os anos de 1906 e de 1918, diversas ferrovias e portos no país, especificamente nos Estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e no atual Estado de Rondônia. Depois de 1918, ela ainda manteve a posse da Rede de Viação Paraná-Santa Catarina até 1942.
A Brazil Railway ainda nomeou com seu nome duas estações ferroviárias no Brasil: a de Hector Legru, na Noroeste, que depois se tornou a estação e a cidade de Promissão, e a de Legru, em Santa Catarina, no município de Porto União. Esta última também teve o nome alterado mais tarde para Engenheiro Eugênio de Mello - não confundir com outra, com o mesmo nome, em São José dos Campos, SP. Por que teriam sido nomeadas duas estações com o nome de alguém vivo e que nunca havia vindo - e não veio também mais tarde - para o Brasil? Certamente para adular um dos dois sócios principais das ferrovias na época. E olhe que Legru chegou a ser procurado pela polícia francesa por fraudes financeiras... Farquhar, por sua vez, sempre recusou em vida homenagens como esta.
O competente Lourenço Filho não foi o único a cair no "conto do Legru". Há diversas literaturas sobre este na Internet e em algumas piblicações que constroem uma biografia errada para o francês, às vezes chamado também de belga...
sábado, 15 de janeiro de 2011
OS TRILHOS DO MAL (III)
Em Cianorte a linha está praticamente toda FORA da cidade, no sentido nordeste...muito estranho quererem tirá-la dali... O pátio da estação está abaixo, na figura (o retangulo ao lado da av. Pará) e sobe para nordeste, entre as av. America e Rio Branco, sobe, faz uma curva ao sul da estrada para Vidigal e outra curva e continua para o nordeste. (Google Maps)
Cianorte, PR, quer retirar seus trilhos da cidade. Grande novidade, qual o prefeito do Brasil que não quer isso para fazer uma bela e poluente avenida? A ignorância grassa feio nesse sentido pelo país.
A pergunta aqui é: numa cidade de pouco menos de 70 mil pessoas, onde um trem não passa há mais de dez anos e que é terminal de linha (do ramal de Londrina, linha Ourinhos-Cianorte), qual é a vantagem de se retirar esses poucos quilômetros, dos quais somente cerca de 2 ficam em área urbana? Ou qual é o problema de se os retirar, se é algo que no momento não serve para nada?
Pensando em termos lógicos, somente voltará a passar trens por ali se um dia algum prefeito raciocinar e chegar à conclusão de que transporte público sobre trilhos é sempre uma excelente opção para qualquer cidade. Cargueiros jamais voltarão a passar. Como cheguei a esta conclusão? Ora, se alguma carga que interesse à ALL (difícil algo interessar para esta empresa) surgir em Cianorte, ela certamente será embarcada em outro ponto, não na zona urbana, onde fica hoje o pátio ferroviário ainda existente mas desativado.
Quem utilizava a linha até os anos 1990 era a cooperativa COCAMAR, próxima ao pátio da estação. E se um dia por milagre forem continuar a linha para Umuarama. como dizia o projeto da RFFSA de 1978, ela certamente sairia de algum ponto ao norte da cidade, na zona rural e a contornaria, o que deixaria o leito na cidade continuar às moscas e ser retirado... a não ser que ele a essa altura esteja sendo utilizado por transporte público.
O prefeito quer hoje retirar os trilhos dizendo que "é um empecilho para o desenvolvimento da cidade. Queremos urbanizar aquela área, conhecida como Esplanada (...) os trilhos ligam o nada a lugar algum (...) vai realizar uma audiência pública para que a população discuta o destino da linha férrea, que passa pela área central, impede a urbanização do trecho mais valorizado da cidade e não tem qualquer utilidade, porque há décadas o trem deixou de circular pelo município". (nota: este texto entre aspas e em itálico foi extraído de uma reportagem de O Diário de 14 de janeiro de 2011. Infelizmente a nota não dizia de que cidade ele o é, acredito que seja de Maringá)
Comentando o que está acima, refuto que: o trem não deixou de passar lá há décadas (o de passageiros, sim, este parou em 1979 e circulou ali por apenas 7 anos, tendo sido um trem misto); os cargueiros passaram até pouco mais de uma década; ele não passa pela área central da cidade, embora passe pela área urbana; o leito teria utilidade para a circulação de um trem metropolitano ou VLT; os terrenos são os mais valorizados mesmo? A impressão que se tem é que eles querem que seja o mais valorizado tirando o trem, pois este é o símbolo do abandono, e, se o reativarem, será um foco de degradação. Ou seja, o prefeito quer lotear a área e conseguir mais iptu, por ele um transporte público sobre trilhos nunca será implantado. Sobra a pergunta: a cidade quer isso? Ou é o prefeito que quer, somente para arrecadar mais impostos?
Finalmente, a velha questão: quanto mais se urbaniza uma cidade, mais crescem os problemas. Será que uma cidade de 70 mil habitantes que somente tem 40 anos de vida não tem um tamanho suficiente? A qualidade de vida será baixa em Cianorte? Não são as informações que temos. Para que impermeabilizá-la mais para atender interesses particulares e não de uma comunidade? Lembrem-se das tragédias ambientais nos últimos dias no Rio de Janeiro: está certo, são cidades serranas, superpopuladas, etc... mas Cianorte quer chegar lá (embora no caso não seja uma cidade serrana)?
Cianorte, PR, quer retirar seus trilhos da cidade. Grande novidade, qual o prefeito do Brasil que não quer isso para fazer uma bela e poluente avenida? A ignorância grassa feio nesse sentido pelo país.
A pergunta aqui é: numa cidade de pouco menos de 70 mil pessoas, onde um trem não passa há mais de dez anos e que é terminal de linha (do ramal de Londrina, linha Ourinhos-Cianorte), qual é a vantagem de se retirar esses poucos quilômetros, dos quais somente cerca de 2 ficam em área urbana? Ou qual é o problema de se os retirar, se é algo que no momento não serve para nada?
Pensando em termos lógicos, somente voltará a passar trens por ali se um dia algum prefeito raciocinar e chegar à conclusão de que transporte público sobre trilhos é sempre uma excelente opção para qualquer cidade. Cargueiros jamais voltarão a passar. Como cheguei a esta conclusão? Ora, se alguma carga que interesse à ALL (difícil algo interessar para esta empresa) surgir em Cianorte, ela certamente será embarcada em outro ponto, não na zona urbana, onde fica hoje o pátio ferroviário ainda existente mas desativado.
Quem utilizava a linha até os anos 1990 era a cooperativa COCAMAR, próxima ao pátio da estação. E se um dia por milagre forem continuar a linha para Umuarama. como dizia o projeto da RFFSA de 1978, ela certamente sairia de algum ponto ao norte da cidade, na zona rural e a contornaria, o que deixaria o leito na cidade continuar às moscas e ser retirado... a não ser que ele a essa altura esteja sendo utilizado por transporte público.
O prefeito quer hoje retirar os trilhos dizendo que "é um empecilho para o desenvolvimento da cidade. Queremos urbanizar aquela área, conhecida como Esplanada (...) os trilhos ligam o nada a lugar algum (...) vai realizar uma audiência pública para que a população discuta o destino da linha férrea, que passa pela área central, impede a urbanização do trecho mais valorizado da cidade e não tem qualquer utilidade, porque há décadas o trem deixou de circular pelo município". (nota: este texto entre aspas e em itálico foi extraído de uma reportagem de O Diário de 14 de janeiro de 2011. Infelizmente a nota não dizia de que cidade ele o é, acredito que seja de Maringá)
Comentando o que está acima, refuto que: o trem não deixou de passar lá há décadas (o de passageiros, sim, este parou em 1979 e circulou ali por apenas 7 anos, tendo sido um trem misto); os cargueiros passaram até pouco mais de uma década; ele não passa pela área central da cidade, embora passe pela área urbana; o leito teria utilidade para a circulação de um trem metropolitano ou VLT; os terrenos são os mais valorizados mesmo? A impressão que se tem é que eles querem que seja o mais valorizado tirando o trem, pois este é o símbolo do abandono, e, se o reativarem, será um foco de degradação. Ou seja, o prefeito quer lotear a área e conseguir mais iptu, por ele um transporte público sobre trilhos nunca será implantado. Sobra a pergunta: a cidade quer isso? Ou é o prefeito que quer, somente para arrecadar mais impostos?
Finalmente, a velha questão: quanto mais se urbaniza uma cidade, mais crescem os problemas. Será que uma cidade de 70 mil habitantes que somente tem 40 anos de vida não tem um tamanho suficiente? A qualidade de vida será baixa em Cianorte? Não são as informações que temos. Para que impermeabilizá-la mais para atender interesses particulares e não de uma comunidade? Lembrem-se das tragédias ambientais nos últimos dias no Rio de Janeiro: está certo, são cidades serranas, superpopuladas, etc... mas Cianorte quer chegar lá (embora no caso não seja uma cidade serrana)?
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sexta-feira, 14 de janeiro de 2011
AS ÁGUAS ROLARAM
Nova Friburgo (Jadson Marques/AE)
Mais uma vez as águas rolaram no verão. E vão continuar a rolar cada vez mais, por causa da imprudência das pessoas que insistem em viver nas encostas, dos governos que se omitem, do excesso de chuvas combinado com a impermeabilização dos solos, do excesso populacional (ou da concentração populacional) e de múltiplos outros fatores.
As tragédias estão em todos os jornais. Desta vez foi Nova Friburgo, Teresópolis, Franco da Rocha, Jaguariúna, São Paulo. O ano passado foram outros locais e no ano que vem serão ainda outros.
Como no ano passado, o fato será esquecido em breve. A verdade é que não se pode culpar somente os governos por tudo isto. O fato é que os próprios municípios deveriam se unir e incentivar a criação de organismos sérios por parte dos próprios munícipes. Como é claro que as enchentes não são necessariamente originadas no próprio município e sim em outros, esse organismo deveria ser composto de pessoas sérias das diversas cidades de uma mesma bacia hidrográfica (por exemplo) e que realmente conhecessem o assunto, de forma a poder pelo menos prever um problema como esse de forma a avisar a população com uma antecedencia viável. E trabalhar constantemente com objetivos sérios.
Está na hora de parar de depender do poder público. Na verdade, este organismo poderia ser a própria Defesa Civil de que tanto se fala, só que trabalhando de forma diferente do que atua hoje. Eu realmente não sei como ela atua, mas está mais do que claro que ela, como está, não está resolvendo.
Enquanto isso, os governos deveriam retirar mais do que imediatamente a população dos lugares de risco, que não são poucos. É claro que, infelizmente, a tarefa é dificílima, mas há de se ter vontade política.
A floresta nativa recuperar-se-á rapidamente nos locais que hoje são manchas de barro causadas pelos arrastes, mas se não se tomar cuidado essas manchas tornar-se-ão comunidades em vez de seram abandonadas para a construção, baseado no célebre lema "um raio não cai duas vezes no mesmo lugar".
Esperemos que o nosso Brasil ponha a cabeça no lugar.
Mais uma vez as águas rolaram no verão. E vão continuar a rolar cada vez mais, por causa da imprudência das pessoas que insistem em viver nas encostas, dos governos que se omitem, do excesso de chuvas combinado com a impermeabilização dos solos, do excesso populacional (ou da concentração populacional) e de múltiplos outros fatores.
As tragédias estão em todos os jornais. Desta vez foi Nova Friburgo, Teresópolis, Franco da Rocha, Jaguariúna, São Paulo. O ano passado foram outros locais e no ano que vem serão ainda outros.
Como no ano passado, o fato será esquecido em breve. A verdade é que não se pode culpar somente os governos por tudo isto. O fato é que os próprios municípios deveriam se unir e incentivar a criação de organismos sérios por parte dos próprios munícipes. Como é claro que as enchentes não são necessariamente originadas no próprio município e sim em outros, esse organismo deveria ser composto de pessoas sérias das diversas cidades de uma mesma bacia hidrográfica (por exemplo) e que realmente conhecessem o assunto, de forma a poder pelo menos prever um problema como esse de forma a avisar a população com uma antecedencia viável. E trabalhar constantemente com objetivos sérios.
Está na hora de parar de depender do poder público. Na verdade, este organismo poderia ser a própria Defesa Civil de que tanto se fala, só que trabalhando de forma diferente do que atua hoje. Eu realmente não sei como ela atua, mas está mais do que claro que ela, como está, não está resolvendo.
Enquanto isso, os governos deveriam retirar mais do que imediatamente a população dos lugares de risco, que não são poucos. É claro que, infelizmente, a tarefa é dificílima, mas há de se ter vontade política.
A floresta nativa recuperar-se-á rapidamente nos locais que hoje são manchas de barro causadas pelos arrastes, mas se não se tomar cuidado essas manchas tornar-se-ão comunidades em vez de seram abandonadas para a construção, baseado no célebre lema "um raio não cai duas vezes no mesmo lugar".
Esperemos que o nosso Brasil ponha a cabeça no lugar.
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quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
NOMES ESTRANHOS NOS LUGARES ERRADOS
Estação de Canguera (Foto Rodolfo Sirmanas)
A estação ferroviária da Central do Brasil - é assim que é chamada - se chamava Dom Pedro II. Os trens de subúrbio da Central tinham na frente esse nome quando andavam no sentido do centro. No tempo do Império a estação se chamava Estação da Corte. Não sei exatamente quando passou a ter o nome do Imperador, mas essa não foi a primeira estação que teve esse nome. Acredite ou não, em 1886 foi inaugurada a primeira estação de Dom Pedro II... em Mineiros do Tietê, Estado de São Paulo. Foi a Companhia Rio-Clarense que a construiu, e, aliás, o prédio existe até hoje. Em 1892, a estação foi comprada pela Companhia Paulista, já com o nome de Mineiros. Somente em 1944 o nome foi alterado para o atual.
A estação de Julio Prestes, em São Paulo, todos conhecem. Mas ela tem esse nome desde 1951, antes era estação São Paulo, nome oficial, mais chamada de estação da Sorocabana. Ela teve o nome "importado" de uma estação em São Roque, que teve esse nome antes que a de São Paulo, de 1949 a 1951. Antes e depois ela se chamou e chama Canguera, num bairro de São Roque.
Nomes populares substituindo na boca do povo os nomes oficiais sempre existiram, principalmente onde essas estações eram apenas um ponto no meio de uma cidade grande. A estação de Santos, da São Paulo Railway, era chamada de estação do Valongo. A estação de Juazeiro, na Bahia, era a que ficava na beira do rio, mas existia uma outra, também antiga, de nome Teodoro Sampaio. Ninguém na cidade, no entanto, a chamava assim, mas de Piranga, nome do bairro onde ela estava - e ainda está, em ruínas. Mas se perguntarmos pela estação pelo nome oficial, ninguém sabe qual é.
Esta estação já se chamou, um dia, há mais de 110 anos atrás, Dom Pedro II
A estação de Salvador, Bahia, jamais se chamou Salvador. Era Jequitaia no início e depois virou Estação da Calçada. Em Porto Alegre, era chamada de Castelinho, pelo seu aspecto arquitetônico. Em Campinas, a estação da Paulista tinha esse nome de "estação da Paulista", e não Campinas, seu nome oficial. Havia outra, a da Sorocabana, que se chamava Campinas também, mas que o povo a conhecia como Bonfim.
Em Alagoinhas, Bahia, o povo chamava a estação de São Francisco, mas no dístico estava "Alagoinhas". Na verdade, havia outra estação na cidade com o nome desta. Ponta Grossa tinha a estação chamada com este nome, mas, durante um bom tempo, seu nome oficial era Roxo de Rodrigues. Ninguém usava este nome.
Voz do povo, voz de Deus.
A estação ferroviária da Central do Brasil - é assim que é chamada - se chamava Dom Pedro II. Os trens de subúrbio da Central tinham na frente esse nome quando andavam no sentido do centro. No tempo do Império a estação se chamava Estação da Corte. Não sei exatamente quando passou a ter o nome do Imperador, mas essa não foi a primeira estação que teve esse nome. Acredite ou não, em 1886 foi inaugurada a primeira estação de Dom Pedro II... em Mineiros do Tietê, Estado de São Paulo. Foi a Companhia Rio-Clarense que a construiu, e, aliás, o prédio existe até hoje. Em 1892, a estação foi comprada pela Companhia Paulista, já com o nome de Mineiros. Somente em 1944 o nome foi alterado para o atual.
A estação de Julio Prestes, em São Paulo, todos conhecem. Mas ela tem esse nome desde 1951, antes era estação São Paulo, nome oficial, mais chamada de estação da Sorocabana. Ela teve o nome "importado" de uma estação em São Roque, que teve esse nome antes que a de São Paulo, de 1949 a 1951. Antes e depois ela se chamou e chama Canguera, num bairro de São Roque.
Nomes populares substituindo na boca do povo os nomes oficiais sempre existiram, principalmente onde essas estações eram apenas um ponto no meio de uma cidade grande. A estação de Santos, da São Paulo Railway, era chamada de estação do Valongo. A estação de Juazeiro, na Bahia, era a que ficava na beira do rio, mas existia uma outra, também antiga, de nome Teodoro Sampaio. Ninguém na cidade, no entanto, a chamava assim, mas de Piranga, nome do bairro onde ela estava - e ainda está, em ruínas. Mas se perguntarmos pela estação pelo nome oficial, ninguém sabe qual é.
Esta estação já se chamou, um dia, há mais de 110 anos atrás, Dom Pedro II
A estação de Salvador, Bahia, jamais se chamou Salvador. Era Jequitaia no início e depois virou Estação da Calçada. Em Porto Alegre, era chamada de Castelinho, pelo seu aspecto arquitetônico. Em Campinas, a estação da Paulista tinha esse nome de "estação da Paulista", e não Campinas, seu nome oficial. Havia outra, a da Sorocabana, que se chamava Campinas também, mas que o povo a conhecia como Bonfim.
Em Alagoinhas, Bahia, o povo chamava a estação de São Francisco, mas no dístico estava "Alagoinhas". Na verdade, havia outra estação na cidade com o nome desta. Ponta Grossa tinha a estação chamada com este nome, mas, durante um bom tempo, seu nome oficial era Roxo de Rodrigues. Ninguém usava este nome.
Voz do povo, voz de Deus.
quarta-feira, 12 de janeiro de 2011
UM PAÍS EM RUÍNAS
Igreja em Arcadas, Amparo, SP
O título é exagerado. Talvez fosse melhor ter escrito "um país de ruínas". Afinal, quem está mesmo em ruínas é o Haiti, um ano depois do terremoto, de acordo com a reportagem que li hoje nos jornais. Mas o que quero dizer basicamente é a quantidade de fotografias de ruínas que recebo quase que diariamente de pessoas engajadas com o tema "ferrovias" ou "preservação de patrimônio".
Casarão no antigo bairro rural de Barra Mansa, em Jaú, SP
Outro dia soube de um velho engenho com linhas ferroviárias próprias que existiu no município de Visconde do Rio Branco, próximo à cidade de Ubá, em Minas Gerais. Apesar de estar constantemente buscando novidades (ou "velhidades") nesse assunto, até hoje não havia tido notícia deste, que foi construído por diretores da E. F. Leopoldina em 1885 e depois comprado por uma empresa francesa.
Engenho Monte Alegre, em Piracicaba, SP
Coloquei-o no site, no assunto "ferrovias particulares" e, dois dias depois, meu amigo Jorge, de Gidifora, me manda duas fotos atualíssimas sobre o velho engenho. São ruínas. Ruínas, como sempre. Não é a primeira vez que isso acontece. Há algum tempo, coloquei, na página de meu site da estação de Pinheiro, no velho ramal de São Paulo da Central do Brasil, no Estado do Rio de Janeiro, uma fotografia de uma reportagem de 1910 sobre um casarão ao lado da estação, ainda em pleno funcionamento como escola. Passaram-se alguns dias e descobri fotos dele atualmente: ruínas. Ruínas, como sempre.
Estação ferroviária de Cachoeira Paulista, SP
Percorrendo o Brasil como percorro, já achei diversas ruínas, tanto dentro de cidades como fora. O engenho de Visconde do Rio Branco. Pinheiro. (estes, não conheço pessoalmente). Santo Amaro, Bahia. Cachoeira, Bahia. Maracangalha, Bahia - o engenho Cinco Rios. Estações ferroviárias por todos os cantos. Rotundas ferroviárias. Casarões em São Paulo, como o do Barão do Rio Pardo. Igrejas. Capelas. Fábricas. O antigo prédio do Hospício, no centro de São Paulo - mais precisamente, no Parque Dom Pedro II. Uma velha fábrica e seus depósitos junto à ponte da Vila dos Remédios, em São Paulo. Casas e sobrados na região do antigo Campo de Santana, em plena cidade do Rio de Janeiro.
Casas de antiga colônia rural próximas a São Bento, em Araras, SP.
Quantas propriedades citei? Com certeza absoluta, menos de 1 por cento do que existe em ruínas no Brasil. Por que isto ocorre? Falta de dinheiro dos proprietários? Falta de vontade dos mesmos para recuperar construções que, na maioria das vezes, são mais resistentes do que qualquer uma das construções mais recentes, mesmo as que são feitas hoje? Falta de respeito com o local onde vivem? Vandalismo puro e simples?
Igreja de Cravinhos, SP, que desmoronou em 2009 por falta de manutenção.
Sim, eu sei que ruínas existem por todo o planeta, mas a impressão de que aqui na terrinha há ruínas demais ainda persiste em minha mente.
O título é exagerado. Talvez fosse melhor ter escrito "um país de ruínas". Afinal, quem está mesmo em ruínas é o Haiti, um ano depois do terremoto, de acordo com a reportagem que li hoje nos jornais. Mas o que quero dizer basicamente é a quantidade de fotografias de ruínas que recebo quase que diariamente de pessoas engajadas com o tema "ferrovias" ou "preservação de patrimônio".
Casarão no antigo bairro rural de Barra Mansa, em Jaú, SP
Outro dia soube de um velho engenho com linhas ferroviárias próprias que existiu no município de Visconde do Rio Branco, próximo à cidade de Ubá, em Minas Gerais. Apesar de estar constantemente buscando novidades (ou "velhidades") nesse assunto, até hoje não havia tido notícia deste, que foi construído por diretores da E. F. Leopoldina em 1885 e depois comprado por uma empresa francesa.
Engenho Monte Alegre, em Piracicaba, SP
Coloquei-o no site, no assunto "ferrovias particulares" e, dois dias depois, meu amigo Jorge, de Gidifora, me manda duas fotos atualíssimas sobre o velho engenho. São ruínas. Ruínas, como sempre. Não é a primeira vez que isso acontece. Há algum tempo, coloquei, na página de meu site da estação de Pinheiro, no velho ramal de São Paulo da Central do Brasil, no Estado do Rio de Janeiro, uma fotografia de uma reportagem de 1910 sobre um casarão ao lado da estação, ainda em pleno funcionamento como escola. Passaram-se alguns dias e descobri fotos dele atualmente: ruínas. Ruínas, como sempre.
Estação ferroviária de Cachoeira Paulista, SP
Percorrendo o Brasil como percorro, já achei diversas ruínas, tanto dentro de cidades como fora. O engenho de Visconde do Rio Branco. Pinheiro. (estes, não conheço pessoalmente). Santo Amaro, Bahia. Cachoeira, Bahia. Maracangalha, Bahia - o engenho Cinco Rios. Estações ferroviárias por todos os cantos. Rotundas ferroviárias. Casarões em São Paulo, como o do Barão do Rio Pardo. Igrejas. Capelas. Fábricas. O antigo prédio do Hospício, no centro de São Paulo - mais precisamente, no Parque Dom Pedro II. Uma velha fábrica e seus depósitos junto à ponte da Vila dos Remédios, em São Paulo. Casas e sobrados na região do antigo Campo de Santana, em plena cidade do Rio de Janeiro.
Casas de antiga colônia rural próximas a São Bento, em Araras, SP.
Quantas propriedades citei? Com certeza absoluta, menos de 1 por cento do que existe em ruínas no Brasil. Por que isto ocorre? Falta de dinheiro dos proprietários? Falta de vontade dos mesmos para recuperar construções que, na maioria das vezes, são mais resistentes do que qualquer uma das construções mais recentes, mesmo as que são feitas hoje? Falta de respeito com o local onde vivem? Vandalismo puro e simples?
Igreja de Cravinhos, SP, que desmoronou em 2009 por falta de manutenção.
Sim, eu sei que ruínas existem por todo o planeta, mas a impressão de que aqui na terrinha há ruínas demais ainda persiste em minha mente.
terça-feira, 11 de janeiro de 2011
RUA SANTO ANTONIO EM TRÊS ÉPOCAS
Casa de chácara na rua Santo Antonio, 31 (numeração da época) em 1905, da família Ribeiro Branco. Ficava onde hoje está a Praça da Bandeira (Acervo Ubirajara Ribeiro)
Em pouco mais de cem anos, a cidade de São Paulo mudou muito. Claro, cresceu de cerca de 200 mil habitantes para mais de onze milhões. Isto fez com que inúmeras regiões - e também o centro da cidade - se desfigurassem, tanto em termos imobiliários quanto em mapa viário.
Mapa de 1905 do centro de São Paulo
Um exemplo disto está aqui - a região onde se iniciava a rua Santo Antonio, na Bela Vista. Nessa época (1905) ela se iniciava no largo da Memória - que era o nome do antigo Piques, ou largo do Piques. Originalmente, no entanto, a rua levava à Igreja de Santo Antonio, na rua Direita, entre as ruas Líbero Badaró e São Bento (a igreja existe até hoje, no mesmo local, que hoje está na praça do Patriarca, criada em 1922). A razão do nome da rua era a igreja. Notem agora que no mapa de 1905 (acima), ela passava pela rua da Abolição e seguia adiante. Esta esquina era a única pela qual a Santo Antonio passava antes de chegar à rua Major Quedinho e ao Velódromo, antigo campo de futebol e que durou até 1915.
Mapa de 1930 do centro de São Paulo (Sara Brasil)
No mapa de 1930, já se pode ver que houve mudanças. Embora o largo da Memória ainda existisse, o Parque do Anhangabaú já existia e "encostava" nele. O Velodromo já havia desaparecido e no seu lugar já existiam construções, a rua Florisbela (que não aparece no mapa, está mais à esquerda e que depois se chamou Nestor Pestana) e a rua Martins Fontes, ainda não completada. A rua João Adolfo também já existia e a avenida Anhangabaú era um esboço do início da futura Nove de Julho.
Mapa de 1997 do centro de São Paulo (O Guia Mapograf)
No mapa de 1997, mais mudanças: inúmeras casas já haviam sido demolidas para a construção, nos anos 1960, da atual Praça da Bandeira. Desapareceram com isso o largo da Memória e partes das casas das ruas Santo Amaro e Santo Antonio, além de inúmeras casas arrasadas para a cosntrução da praça e do viaduto que lá existe hoje. Na rua Santo Antonio há o encontro entre os viadutos Jacareí e Maria Paula, além do da rua Major Quedinho. A Nove de Julho e a 23 de Maio já existem há tempos - mais de 30 anos. A rua João Adolfo, que chegava na Santo Antonio, para hoje na Nove de Julho. O Parque do Anhangabaú virou avenida, depois foi concretada com túneis em baixo e sem os jardins que tinha.
Duas curiosidades: o viaduto Jacareí tem esse nome por causa de uma pequena rua que passava quase em baixo dele e que hoje ainda existe, diminuída em seu tamanho: basta comparar os mapas (em 1930 ela existe, mas ficou fora do mapa que pus aqui). Da mesma forma, já existia uma rua Maria Paula.
Interior da chácara da rua Santo Antonio dos Ribeiro Branco. As casas que se vêem fora estavam muito provavelmente na rua Santo Amaro nessa época (1905) (Acervo Ubirajara Ribeiro)
A outra: uma das casas que existia comprovadamente em 1905 na rua Santo Antonio era uma chácara onde morava a mesma família - Ribeiro Branco - que mais tarde se mudou para a Vila Mariana, na rua Madre Cabrini, e em 1927, para a rua Domingos de Morais, na belíssima Chácara Conceição, da qual já falei neste blog e que desapareceu em 1969 (a casa) e em 1991 (os maravilhosos jardins) para a construção de prédios.
No mapa de 1930, que mostra as construções, ela provavelmente não existia mais, pois a quantidade de casas que existem no local onde mais tarde foi construída a Praça da Bandeira era muito grande. O local possivelmente foi loteado. A comprovar.
(Nota: alterado em 30/8/2017 - o autor)
Em pouco mais de cem anos, a cidade de São Paulo mudou muito. Claro, cresceu de cerca de 200 mil habitantes para mais de onze milhões. Isto fez com que inúmeras regiões - e também o centro da cidade - se desfigurassem, tanto em termos imobiliários quanto em mapa viário.
Mapa de 1905 do centro de São Paulo
Um exemplo disto está aqui - a região onde se iniciava a rua Santo Antonio, na Bela Vista. Nessa época (1905) ela se iniciava no largo da Memória - que era o nome do antigo Piques, ou largo do Piques. Originalmente, no entanto, a rua levava à Igreja de Santo Antonio, na rua Direita, entre as ruas Líbero Badaró e São Bento (a igreja existe até hoje, no mesmo local, que hoje está na praça do Patriarca, criada em 1922). A razão do nome da rua era a igreja. Notem agora que no mapa de 1905 (acima), ela passava pela rua da Abolição e seguia adiante. Esta esquina era a única pela qual a Santo Antonio passava antes de chegar à rua Major Quedinho e ao Velódromo, antigo campo de futebol e que durou até 1915.
Mapa de 1930 do centro de São Paulo (Sara Brasil)
No mapa de 1930, já se pode ver que houve mudanças. Embora o largo da Memória ainda existisse, o Parque do Anhangabaú já existia e "encostava" nele. O Velodromo já havia desaparecido e no seu lugar já existiam construções, a rua Florisbela (que não aparece no mapa, está mais à esquerda e que depois se chamou Nestor Pestana) e a rua Martins Fontes, ainda não completada. A rua João Adolfo também já existia e a avenida Anhangabaú era um esboço do início da futura Nove de Julho.
Mapa de 1997 do centro de São Paulo (O Guia Mapograf)
No mapa de 1997, mais mudanças: inúmeras casas já haviam sido demolidas para a construção, nos anos 1960, da atual Praça da Bandeira. Desapareceram com isso o largo da Memória e partes das casas das ruas Santo Amaro e Santo Antonio, além de inúmeras casas arrasadas para a cosntrução da praça e do viaduto que lá existe hoje. Na rua Santo Antonio há o encontro entre os viadutos Jacareí e Maria Paula, além do da rua Major Quedinho. A Nove de Julho e a 23 de Maio já existem há tempos - mais de 30 anos. A rua João Adolfo, que chegava na Santo Antonio, para hoje na Nove de Julho. O Parque do Anhangabaú virou avenida, depois foi concretada com túneis em baixo e sem os jardins que tinha.
Duas curiosidades: o viaduto Jacareí tem esse nome por causa de uma pequena rua que passava quase em baixo dele e que hoje ainda existe, diminuída em seu tamanho: basta comparar os mapas (em 1930 ela existe, mas ficou fora do mapa que pus aqui). Da mesma forma, já existia uma rua Maria Paula.
Interior da chácara da rua Santo Antonio dos Ribeiro Branco. As casas que se vêem fora estavam muito provavelmente na rua Santo Amaro nessa época (1905) (Acervo Ubirajara Ribeiro)
A outra: uma das casas que existia comprovadamente em 1905 na rua Santo Antonio era uma chácara onde morava a mesma família - Ribeiro Branco - que mais tarde se mudou para a Vila Mariana, na rua Madre Cabrini, e em 1927, para a rua Domingos de Morais, na belíssima Chácara Conceição, da qual já falei neste blog e que desapareceu em 1969 (a casa) e em 1991 (os maravilhosos jardins) para a construção de prédios.
No mapa de 1930, que mostra as construções, ela provavelmente não existia mais, pois a quantidade de casas que existem no local onde mais tarde foi construída a Praça da Bandeira era muito grande. O local possivelmente foi loteado. A comprovar.
(Nota: alterado em 30/8/2017 - o autor)
segunda-feira, 10 de janeiro de 2011
RESTAURAÇÕES EM SANTA CRUZ E PIRAJU
Estação restaurada de Santa Cruz do Rio Pardo em dezembro de 2011. Foto Edson Rodrigues
A estação ferroviária de Santa Cruz do Rio Pardo fechou em dezembro de 1966. O último trem da Sorocabana, um trenzinho misto (passageiros e cargas) que ia e vinha da cidade e estação de Bernardino de Campos percorrendo 24 quilômetros, parou um belo dia pela última vez ali. Ramal deficitário, diziam.
A estação de Piraju restaurada em 2010. Foto Reinaldo Rodrigues
Provavelmente era mesmo. Ramais curtos valeram a pena quando a ferrovia transportava muita carga, inclusive café, que existia ali na região. Após 1930, diminuiu muito o que transportar. Até passageiros, que aos poucos preferiam tomar os ônibus, que tinham mais horários e já podiam percorrer rodovias melhores.
A estação de Santa Cruz do Rio Pardo abandonada em 2000. Foto do autor
Aliás, esse ramal e também o de Piraju foram custeados pelas prefeituras das duas cidades, uma perto da outra. O ramal de Piraju saía da estação de Manduri. Fizeram as obras, as estações e entregaram de mão beijada para a Sorocabana operar. Ambas as estações foram construídas pelo arquiteto, à época ainda não tão famoso, Ramos de Azevedo, entre 1906 e 1908.
A estação de Piraju abandonada, em 2000. Foto do autor
Os dois ramais pararam no mesmo dia. As duas belas construções foram abandonadas. E assim ficaram até o ano passado. A de Piraju, em verdade, foi restaurada um pouco antes. A de Santa Cruz estava quase pronta na virada do ano, ou seja, há 10 dias atrás. Deviam ser construções bem sólidas, pois com todo o abandono, mantiveram-se em pé.
As restaurações, pelo que pude ver, principalmente externamente, não parecem ter alterado muito os prédios originais. Apenas as cores foram alteradas, aparentemente. Seja como for, valeu a pena, era melhor do que deixá-los largados.
A estação de Santa Cruz em construção, em 1906. Ampliando a foto, nota-se que um peru está posando também no meio dos funcionários. Seria o almoço daquele dia?
Basicamente, as duas estão fora das duas cidades, ou melhor, no limite da sua zona urbana. Assim era em 1906, assim é hoje. Portanto, sujeitas a agressões de vândalos: necessitam ter gente que realmente tome conta delas. Esperamos que assim o seja. As duas ainda estão, pelo que sei, vazias, mas ainda restam pequenos detalhes a serem feitos, pelas informações que recebi. Vão ser, quase que certamente, centros culturais, seja lá o que este nome queira dizer: para cada cidade, a definição é diferente...
Mas valeu pelo esforço, esperemos que nada se deteriore a partir daqui.
A estação ferroviária de Santa Cruz do Rio Pardo fechou em dezembro de 1966. O último trem da Sorocabana, um trenzinho misto (passageiros e cargas) que ia e vinha da cidade e estação de Bernardino de Campos percorrendo 24 quilômetros, parou um belo dia pela última vez ali. Ramal deficitário, diziam.
A estação de Piraju restaurada em 2010. Foto Reinaldo Rodrigues
Provavelmente era mesmo. Ramais curtos valeram a pena quando a ferrovia transportava muita carga, inclusive café, que existia ali na região. Após 1930, diminuiu muito o que transportar. Até passageiros, que aos poucos preferiam tomar os ônibus, que tinham mais horários e já podiam percorrer rodovias melhores.
A estação de Santa Cruz do Rio Pardo abandonada em 2000. Foto do autor
Aliás, esse ramal e também o de Piraju foram custeados pelas prefeituras das duas cidades, uma perto da outra. O ramal de Piraju saía da estação de Manduri. Fizeram as obras, as estações e entregaram de mão beijada para a Sorocabana operar. Ambas as estações foram construídas pelo arquiteto, à época ainda não tão famoso, Ramos de Azevedo, entre 1906 e 1908.
A estação de Piraju abandonada, em 2000. Foto do autor
Os dois ramais pararam no mesmo dia. As duas belas construções foram abandonadas. E assim ficaram até o ano passado. A de Piraju, em verdade, foi restaurada um pouco antes. A de Santa Cruz estava quase pronta na virada do ano, ou seja, há 10 dias atrás. Deviam ser construções bem sólidas, pois com todo o abandono, mantiveram-se em pé.
As restaurações, pelo que pude ver, principalmente externamente, não parecem ter alterado muito os prédios originais. Apenas as cores foram alteradas, aparentemente. Seja como for, valeu a pena, era melhor do que deixá-los largados.
A estação de Santa Cruz em construção, em 1906. Ampliando a foto, nota-se que um peru está posando também no meio dos funcionários. Seria o almoço daquele dia?
Basicamente, as duas estão fora das duas cidades, ou melhor, no limite da sua zona urbana. Assim era em 1906, assim é hoje. Portanto, sujeitas a agressões de vândalos: necessitam ter gente que realmente tome conta delas. Esperamos que assim o seja. As duas ainda estão, pelo que sei, vazias, mas ainda restam pequenos detalhes a serem feitos, pelas informações que recebi. Vão ser, quase que certamente, centros culturais, seja lá o que este nome queira dizer: para cada cidade, a definição é diferente...
Mas valeu pelo esforço, esperemos que nada se deteriore a partir daqui.
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