sexta-feira, 22 de maio de 2009

NÚMEROS VERMELHOS

Eu era pequeno, mas já gostava de ler mapas. Sempre gostei deles. Abria os mapas de ruas do Guia Levi lá em casa e os estendia no chão da sala de visitas em minha casa no Sumaré. Era o início dos anos 1960. Eu me divertia vendo o tamanho da cidade, que já era grande naquela época, mas também bastante diferente de hoje, até no traçado de diversas ruas. Ainda não havia chegado o Prefeito Faria Lima, que começou com as obras de grandes avenidas e com o metrô. Não existiam a 23 de Maio, a Rubem Berta, a rua da Consolação como é hoje, a rua Vergueiro como é hoje, a avenida Sumaré, a Radial Leste e muitas outras.

Eu me fixava mais nas ruas próximas de onde eu morava, a dois quarteirões do Cemitério do Araçá, na pequena rua Tefé. Olhava as ruas quadriculadas dos bairros das Perdizes e Vila Pompéia, por exemplo. Numa delas moravam meus primos, na rua Wanderley. Eu achava curioso, por exemplo, que as ruas cruzassem uma avenida que tinha nome mas não existia (a avenida Sumaré) – aliás, cruzavam em teoria: na prática, não dava para cruzar, pois não dava passagem, não havia ponte sobre o córrego do Sumaré, mais tarde canalizado para a construção da avenida. E as ruas, no trecho do vale, eram todas de terra, menos as que citarei a seguir. Dava para cruzar pela rua Caiubi, era um ladeirão dos dois lados do vale, pavimentada toda ela com paralelepípedos. Também dava para cruzar pela João Ramalho, mas ali, o vale era muito mais aberto, quase plano. As duas ruas tinham duas mãos de direção.

Para ir à casa de meu tio Willi, que morava na Wanderley, mas do outro lado, lá no alto, junto da rua Campevas, meu pai subia até a avenida Doutor Arnaldo, seguia até a avenida Professor Alfonso Bovero, dobrava na rua Apinagés e dali chegava na rua Wanderley. Era o único jeito. A avenida e as ruas que a cruzavam somente foram asfaltadas no final dos anos 1960. Aí tudo mudou bastante. Não dava mais para andar de bicicleta no barreiro que era a avenida Sumaré, pois agora havia chegado o trânsito, com o asfalto.

Para o lado da Vila Pompeia, meu pai ia raramente. Pelo menos comigo. Ia, geralmente, quando eu pedia para ele me levar lá “para ver como era”. As ruas em sua maioria ali eram de terra. Havia somente casas e um ou outro prédio de três andares. Na rua Diana, todas as ruas que mais para trás cruzavam a avenida Sumaré mudavam de nome. As que até a rua Diana chamavam-se Ministro Gastão Mesquita (Esta mudava de nome também na avenida Sumaré, pois vindo da Cardoso de Almeida era Professor João Arruda), Wanderley, Caiuby, Bartira, João Ramalho e Homem de Mello, depois da rua Diana mudavam para Tavares Bastos, Coronel Melo Oliveira, Desembargador do Vale, Ministro Ferreira Alves, Padre Chico e Venâncio Ayres. Nessa ordem: eu sabia e ainda sei de cor. Mais tarde eu soube por que mudavam de nome: porque o loteamento que originou os bairros era outro na Vila Pompeia. Assim como todas essas ruas acabavam num vale que dividia a Vila Pompeia da Vila Romana. E assim por diante.

Nas ruas da Vila Pompeia e das Perdizes havia, nas casas, aquela plaquinha metálica azul, pequena, que numerava as casas. Só que algumas não eram azuis – eram vermelhas. Intrigado, perguntei a papai o porquê. Ele disse que era numeração não-oficial, e explicou que a Prefeitura, em alguns casos, não dava a numeração para as casas (sei lá por quê) e, então, os proprietários eram obrigados a colocar as mesmas plaquinhas, mas em cor vermelha.

Algumas dessas placas vermelhas sobrevivem até hoje, mas não é fácil de se as encontrar. Há três na rua Tavares Bastos. Uma delas está na fotografia acima. Com certeza o conceito de “numeração não-oficial” perdeu-se no tempo, pelo menos com a obrigatoriedade do uso das plaquinhas vermelhas. Mas elas continuaram ali em algumas casas – relíquias de um passado não tão distante.

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