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segunda-feira, 3 de outubro de 2016

QUAL O FUTURO DAS FERROVIAS NO PARANÁ?

Mapa ferroviário do Paraná, publicado pelo Diário do Povo em 26 de setembro: muitos erros e dúvidas

Uma reportagem no dia 26 de setembro último publicado no Diário do Povo, de Curitiba, PR, diz que na medida provisória que o governo federal deve publicar consta que: 1) trechos não aproveitados pelas concessionárias deverão ser retomados pelo governo para novas concessões; 2) haverá novas exigências para garantir a retomada antecipada dos contratos de concessão.

Pode ser. Infelizmente, porém, o que os governos vêm fazendo com as linhas pré-existentes às concessões de 1996/98 é simplesmente aceitar passivamente o abandono delas e temo que, se retomar linhas, será para desmanche e sucateamento assumido.

Há gente que, como eu, gosta do assunto ferrovias e crê que as linhas que não são utilizadas são todas antiquadas e não têm mais salvação. Eu já não penso dessa forma, pois sempre há alternativas, dependendo do que se quer transportar nessas linhas.

De qualquer forma, a notícia é centralizada no Estado do Paraná, claro. A jornalista afirma que há as linhas que são utilizadas e as que não. As duas que são utilizadas são as que trazem carga da região de Maringá e Londrina através da antiga E. F. Central do Paraná via Apucarana e terminando no pátio de Uvaranas, em Ponta Grossa. A outra vem de Cascavel, onde usa a Ferroeste para chegar a Guarapuava e, aí, entra com a concessionária Rumo (ex-ALL) para chegar a Ponta Grossa. Há, no entanto, uma terceira linha, que também deságua em Ponta Grossa e vem de Pinhalzinho, divisa com São Paulo, recebendo ou enviando cargas para os antigo ramais de Apiaí e de Itararé. Esta última linha aparece no mapa publicado pelo jornal como estando em operação, mas não foi citada no texto.

Ainda há de se citar que as três linhas citadas acima que se encontram em Ponta Grossa descarregam numa única linha que segue para Curitiba e, finalmente, o porto de Paranaguá.

Não mostraram a linha do ramal de Rio Branco, que sai de Curitiba para Rio Branco do Sul para carregar cimento.

Também mostra no mapa uma linha que aparece como utilizada, mas que na verdade nem trilhos mais tem, desde 1996: trata-se do trecho Irati (Engenheiro Gutierrez) a União da Vitória, na fronteira catarinense.

Finalmente, não mostra uma linha ainda existente, mas completamente abandonada desde o final do século XX: a linha Maringá-Cianorte.

Já ela escreve que a linha abandonada e que pode ser retomada é a é a do ramal de Paranapanema (Ourinhos-Jaguariaíva), daí a Ponta Grossa, depois a Engenheiro Bley e Rio Negro. O ramal, realmente, não é utilizado desde 2001. Já o trecho Ponta Grossa-Bley é pelo menos metade do trecho que liga Ponta Grossa a Curitiba, portanto, dizer que está abandonada e seria devolvida é, no mínimo, bem equivocado. Confesso que não sei se o trecho Bley-Rio Negro está sem movimento ou não. Surpreende-me não ter cargas, o que significaria que o trecho Mafra-São Francisco do Sul (que hoje é , na prática, uma continuação da linha Bley-Rio Negro) não está sendo alimentado, bem como a linha Mafra-Lajes-Roca Salles.

Quanto à ligação Guarapuava-Engenheiro Bley, fala-se de sua construção desde 1928. Até hoje, não saiu. São 92 anos de discussões e esquecimento.

A reportagem pode esclarecer que existem linhas usadas e outras não, mas não mostra rigorosamente a verdade, deixando dúvidas em quem a lê.

sábado, 27 de junho de 2015

O PARANÁ E SEUS TRENS

Mapa das ferrovias paranaenses em 1935. Em vermelho, a linha-tronco, que seguia para Santa Catarina ao sul. Aparece também a curtíssima linha isolada e particular, Porto Guaíra-Porto Mendes, extinta em 1960. Não existia ainda o ramal de Monte Alegre (acervo Sud Mennucci/Ralph Mennucci Giesbrecht).

Uma das histórias mais interessantes de ferrovias brasileiras referem-se às do Estado do Paraná. Sempre li o mais que pude sobre a Rede de Viação Paraná-Santa Catarina, que nada mais era do que a fusão da E. F. Paraná e da E. F. São Paulo - Rio Grande.

As ferrovias paranaenses em geral se ligavam com as de São Paulo (Ourinhos e Itararé) e de Santa Catarina (Porto União e Mafra). A safra se escoava por Paranaguá, embora o porto de Santos, SP, também tenha sido utilizado, principalmente até 1938, ano em que as ferrovias paranaenses conseguiram alcançar a linha Ourinhos-Londrina, que até então se ligava apenas a Ourinhos. Dali o trem seguia para Santos pela Sorocabana. Havia também escoamento pelo porto de São Francisco do Sul, SC, por causa das ligações com a linha do São Francisco, esta no norte de Santa Catarina.

Ao contrário de São Paulo, as linhas paranaenses jamais conseguiram atingir o rio Paraná e/ou cruzá-lo. Nem chegaram ao Paraguai e à Argentina. Houve planos e projetos. O primeiro projeto foi anterior à construção da primeira linha paranaense, a Curitiba-Paranaguá e chegava ao interior do Mato Grosso (na época, não existia ainda o Mato Grosso do Sul). Depois, houve estudos para a ligação de Guarapuava e também de União da Vitória com Foz do Iguaçu e com Assuncion. Finalmente, a linha Ourinhos-Londrina, que foi esticada até Cianorte somente em 1973, deveria seguir adiante até Guaíra, ao norte de Foz do Iguaçu, mas foi logo abandonado.

A principal atividade, que era o transporte do mate no início, passou a ser de grãos em geral, com predomínio do café até os anos 1960.

Em termos de passageiros (sempre lembrando que todas as linhas citadas agora transportavam também carga, aliás, a razão primordial de sua construção), a primeira linha foi a Paranaguá-Curitiba-Ponta Grossa, aberta entre 1883 e 1894. A segunda linha a ser construída foi a que ligava a estação de Serrinha (entre Curitiba e Ponta Grossa) a Rio Negro, pronta em 1895. Depois, esta linha foi ligada à linha do São Francisco, em SC, na estação de Mafra. Ambas compunham a Estrada de Ferro do Paraná.

Em 1900, foi entregue o primeiro trecho da E. F. São Paulo-Rio Grande, que seria mais tarde considerada a linha-tronco da Rede de Viação Paraná-Santa Catarina (RVPSC). Esta empresa foi criada em 1910, como entidade gestora das ferrovias paranaenses e catarinenses (na época pertencentes à Brazilian Railway de Percival Farquhar). Em 1942, a RVPSC tornou-se a entidade gestora de todas essas linhas, eliminando-se as antigas, E. F. Paraná e a E. F. SP-RG.

A linha-tronco foi sendo estendida a partir de 1900 - nesse ano, ela somente se ligava à linha de Paranaguá, pela estação de Ponta Grossa. Em 1905, chegou a Jaguariaíva, no norte, e União da Vitória, no sul. Em 1908, Jaguariaíva foi ligada a Sengés e, no ano seguinte, a Itararé, em SP, onde terminava o ramal da Sorocabana que vinha de São Paulo, via Boituva.

A mesma linha foi prolongada no final de 1910 até a fronteira de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul, em Marcelino Ramos, já do lado gaúcho do rio Uruguai. Dali, seguia pela VFRGS - Viação Férrea do Rio Grande do Sul - até Santa Maria, e dali podia-se atingir Uruguaiana, Porto Alegre e Santana do Livramento. Pela linha São Paulo-Porto União-Santa Maria, manejado por três ferrovias diferentes, passou, por exemplo, o famoso Trem Internacional, criado durante a Segunda Guerra Mundial para facilitar o acesso às cidades do Sul do país.

Em 1909, foi aberta a linha Curitiba-Rio Branco do Sul, que existe até hoje.

Outras linhas fram construídas a partir de 1915: Jaguariaíva a Ourinhos, terminada somente em 1938; o ramal de Barra Bonita e Rio do Peixe, terminado somente em 1948 e que ligava a estação de Wenceslau Braz (no ramal do Paranapanema, ou seja, a linha Jaguariaíva-Ourinhos) à estação de Lysimaco Costa. O ramal de Monte Alegre foi construído nos anos 1940/50 e em 1958 ligava a estação de Piraí do Sul, na linha-tronco, a Telêmaco Borba; o ramal de Guarapuava, que partia de outra estação do tronco, Engenheiro Gutierres, em Irati, a Guarapuava, linha iniciada em 1928 e terminada somente em 1954.

Finalmente, a linha da E. F. São Paulo-Paraná, companhia particular dos ingleses da Cia. de Melhoramentos Norte do Paraná, iniciada em 1923 e que em 1941 chegou a Arapongas, PR e que passava por Londrina. Esta linha foi vendida pelos ingleses à União em 1944 e incorporada à RVPSC no mesmo ano. A partir de então foi estendida para sudoeste, chegando a Maringá em 1954 e em Cianorte em 1973.

Houve também obras que modificaram certas linhas, como a linha entre Curitiba e Ponta Grossa e entre as estações de Joaquim Murtinho e Fabio Rego, no tronco, além da ligação Engenheiro Bley (que substituiu a de Serrinha como entroncamento) e Mafra.

E, claro, a construção da linha que sempre foi apenas cargueira, Apucarana-Ponta Grossa, entre 1948 e sua entrega tardia em 1975. A partir deste ano, a RFFSA passou a tomar conta das linhas da RVPSC, que desapareceu como entidade.

Os trens de passageiros singraram por todas estas linhas até... bem, até que o apocalipse chegasse ao Estado, entre 1969 e 1983. Em 1969, acabaram com o ramal de Barra Bonita. Em 1976, com o ramal de Monte Alegre e o de Antonina (Morretes-Antonina). No mesmo ano, deixou de circular o trem entre Jaguariaíva e Itararé (desculpa: queda de ponte em Itararé). Com este fechamento, São Paulo a Curitiba de trem somente podia ser feito via Ourinhos, o que encompridava muito o caminho, fora paradas longas e baldeações em Ourinhos, Jaguariaíva e Ponta Grossa.

Em 1979, fecharam o trem do Norte, ou seja, Curitiba-Ponta Grossa-Jaguariaíva-Ourinhos (acabou-se então, de vez, a demorada ligação São Paulo-Curitiba). Em 1983, fecharam quase todo o resto. Os trens que circulavam pelo Estado já eram todos mistos e as chuvas desse ano, que alagaram vários trechos de linha no Paraná e em Santa Catarina foram uma excelente desculpa para acabarem com (quase) tudo: ramal de Guarapuava e todo o trecho Jaguariaíva-Ponta Grossa-União da Vitória.

E o que sobrou? Bom, em janeiro de 1991, o ramal de Rio Branco do Sul, que, na prática, era o único trem de subúrbio de Curitiba, foi fechado, tornando-se somente o "trem do cimento", que funciona até hoje como cargueiro. Finalmente, o trem Curitiba-Paranaguá, o mais antigo trem de passageiros do Estado (1885), continuou operando - e opera até hoje - mas como trem turístico, ou seja, faz apenas o percurso integral sem paradas, ida e volta, diário. Desde alguns anos, faz apenas Curitiba-Morretes: de lá para Paranaguá, já não faz mais.

Muito resumidamente. é isso aí. O paranaense pelo menos tem um trem diário - turístico, mas tem. Do outro lado, não tem trens de subúrbio, que fazem, com certeza, muita falta. A linha do Rio Branco do Sul poderia muito bem estar-se servindo a isto até hoje, com as modificações necessárias e que, nos anos 1980, teriam sido mais fáceis de se fazer. A linha antiga que ligava Curitiba a Araucária (como parte da linha erradicada em 1992 entre a Capital e Ponta Grossa), em vez de também servir como subúrbios, a partir de 1977, quando construíram a variante nova (com passagem pelo Pátio Iguaçu), liberando a antiga, nunca foi utilizada para tal; não tenho conhecimento de que tal uso tenha sido sequer estudado. Vale lembrar que a linha passava por bairros bem populosos e também pelas estações de Portão e de Barigui, até chegar em Araucária:

sexta-feira, 5 de junho de 2015

DE SÃO PAULO A CURITIBA, DE TREM - E SE FOSSE HOJE?

A estação de Ponta Grossa, em 1935 (Relatório da RVPSC)
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Houve um tempo, mais precisamente entre 1909 e 1976, que se podia ir de São Paul a Curitiba de trem. Por que isso acabou?

Especificamente, viajar de trem entre São Paulo e Curitiba devia ser algo que nunca tenha sido muito comum, durante os sessenta e sete anos em que isso foi possível. E por que penso eu assim?

Bom, primeiro, estou falando como alguém que jamais fez essa viagem (quando acabou, eu tinha vinte e quatro anos de idade). Portanto, estou fazendo uma série de conjeturas que me parecem razoavelmente lógicas.

A separação da província do Paraná da de São Paulo, em 1853, foi uma consequência do isolamento de Curitiba e do porto de Paranaguá em relação ao governo central da província de São Paulo. Os paranaenses insistiam em ter um governo próprio, pois a viagem para Curitiba, quando necessária, era feita por navios a partir de Santos e desembargando em Paranaguá. Também era possível se fazer a cavalo até Ponta Grossa pela trilha dos tropeiros e dali até Curitiba. Era um trecho longo e, não por coincidência, a ferrovia fez praticamente o mesmo trajeto.

O caminho mais curto de São Paulo a Curitiba é o atual, que a BR-116, Regis Bittencourt, segue. E ela existe desde 1960. Antes dela, havia dois outros caminhos. Um, via Sorocaba, Itararé, Ponta Grossa até Curitiba; outro, via Sorocaba, Itapetiniga, Capão Bonito, Apiaí, Ribeira, Cerro Azul e, finalmente, Curitiba. Este caminho somente foi asfaltado há cerca de dez anos e é uma estrada extremamente estreita e cheia de curvas, principalmente no trecho paranaense.

Houve vários estudos, na área ferroviária, que queriam aproveitar o ramal Santos-Juquiá, pronto em 1915, prolongando-o até Curitiba. Isto, no entanto, faria com que o paulistano tivesse de descer até Santos, tomar essa linha que, de alguma forma, deveria subir novamente a Serra do Mar para alcançar Curitiba.

A Regis Bitencourt tem cerca de 400 quilômetros entre São Paulo e a capital paranaense. Já a ferrovia que unia as duas capitais tinha 830 quilômetros e uma longa parada em Ponta Grossa, sendo que havia divisões de comboio que às vezes obrigavam os passageiros a pernoitar em Ponta Grossa. Digo "tinha" por que todo o trecho entre Itapeva e Jaguariaíva foi arrancado há mais de vinte anos (1993). Se houvesse um trem de passageiros hoje entre São Paulo e Curitiba que seguisse a linha atual, ele teria de passar por uma variante construída entre Itapeva e Ponta Grossa nos anos 1970.

Na verdade, a razão oficial para a extinção do trem na linha de 1909 foi a queda de uma ponte em Itararé, em 1976. A partir daí, até se podia ir de trem a Curitiba, mas a volta era imensa, via Ourinhos. Isto, de qualquer forma, foi possível até junho de 1979, quando os trens foram extintos.

Não é à toa que Curitiba cresceu em velocidade muito maior somente após a abertura da Regis Bittencourt, 55 anos atrás. Somente aí a cidade passou a fazer parte de uma estrada realmente - no caso, de asfalto. Na ferrovia, era não era muito mais do que um ramal, mesmo sendo a capital e local de passagem de trens para o principal porto do Estado.

Mas e se a ferrovia, tal como ela era em 1976, tivesse mantido os seus trens de passageiros até hoje? Lembrar que o trecho entre Ponta Grossa e Curitiba foi retificado em 1966 e 1978, portanto, depois do fim dos trens para São Paulo. Lembremo-nos também que a linha problemática entre Itararé e Jaguariaíva (98 quilômetros de linha para 48 quilômetros de rodovia entre as duas) foi reformulada em metade desse trecho em 1964. A outra metade, entre Fábio Rego e Itararé, apesar de ter sido projetada, nunca foi realizada. Essas duas melhorias reduziram a distância, mas, quanto? Cinquenta, sessenta quilômetros? Pouco para os 830 quilômetros, que representam hoje o dobro da distância percorrida por automóveis na rodovia BR-116.

Enfim, se o percurso, com as modificações citadas e apenas ela, tivessem, por algum capricho, sido mantido, seria ele utilizado para viagens entre as duas capitais? Difícil. O mais provável seria que os passageiros fizessem pequenos percursos, como em trens regionais. Quais são as cidades que, hoje, seriam candidatas a terem bastante movimento?

Considerando obviamente que os trens da CPTM seriam independentes de um trem São Paulo-Curitiba, vamos supor que esse trem saísse da estação de Julio Prestes (ou da Barra Funda). Daí, parasse em estações que pudessem apresentar bom movimento. Então, eu sugeriria Osasco, Barueri, São Roque, Mairinque, talvez Alumínio e Sorocaba. Daí em diante: Tatuí, Itapetininga, Itapeva e Itararé. Já no Paraná, Jaguariaíva, Castro, Carambeí e Ponta Grossa. Daí até Curitiba, somente Palmeira, Balsa Nova e Araucária, para dali alcançar Curitiba.

Enfim, os 830 (talvez 760) quilômetros seriam percorridos por passageiros que iriam de uma cidade a outra e também pelos que se dirigiam aos dois extremos da linha. Afinal, fazer 830 quilômetros de uma vez tendo aviões e carros à disposição em, respectivamente, 40 minutos e cinco horas seria coisa para aventureiros. Bom para se fazer uma vez a cada cinco anos.

A conclusão é que trens estas duas capitais não seriam viáveis hoje, a não ser que se construísse uma linha totalmente nova e bem mais curta, capaz de transportar comboios que pudessem correr a pelo menos duzentos quilômetros por hora. Possível é. O difícil é convencer os governos de visão curta que continuamos tendo, apesar dos seguidos tombos que temos sido obrigados a sofrer desde sempre.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

A ESTAÇÃO DE GENERAL LÚCIO, PARANÁ

A estação de General Lucio em 2014 - foto Alexandre Fressato
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Uma das poucas estações pelas quais passei de trem na minha vida: General Lucio, no Paraná. Ela está sem função - o pátio ainda serve de cruzamento, o prédio, razoavelmente bem conservado, ocupado por uma família, pelo menos o era em 2009.
Parte da vila ferroviária em 2014 - foto Alexandre Fressato
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Como todas as estações de passageiros na linha, ela não vê trens de passageiros desde o início dos anos 1980, quando os poucos trens que faziam o trecho Curitiba-Ponta Grossa foram extintos. Mas sobreviveu ao contrário de outras (Balsa Nova, Guajuvira, Porto Amazonas) que foram para o saco há tempos.
Dístico na estação de General Lucio em 2014 - foto Alexandre Fressato
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Em 2009, andei num trem especial que comemorava o centenário do Coritiba e que fez o percurso somente de ida até Ponta Grossa. Não, eu não torço para o clube, mas, quando soube de história, tomei um avião até a capital paranaense e às 7 da manhã, partimos para Desvio Ribas, em Ponta Grossa.
Casa na vila ferroviária em 2014 - foto Alexandre Fressato
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Nesse dia, tive o prazer de fotografar o prédio. A fotografia é uma das que ilustram este artigo (mais abaixo).
A estação de General Lucio fotografada do trem especial  em 2009. Notar um cargueiro da ALL aguardando cruzamento - foto Ralph Giesbrecht
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A estação foi erguida em 1945 próximo ao local onde por muitos anos existiu uma pequena parada de nome Itagassava, saída de um desvio lenheiro (para carregamento de lenha). Curiosamente, foi inaugurada no dis de meu aniversário (13 de novembro), mas eu ainda não era nascido. Como ela recebeu o nome de um general, Emilio Lucio Esteves, que não tenho a menor ideia do que tinha a ver com o local (é possível que absolutamente nada) e que provavelmente havia morrido na época, pois já estava válida a lei que proibia nomes de logradouros a pessoas vivas.
A localização da estação de General Lucio em mapa do final dos anos 1950 - IBGE - à extrema esquerda, no mapa
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Muito próximo da estação, que está em uma região pantanosa ao lado do rio Iguaçu, pode-se ver o rio e algumas lagoas lindeiras. Local muito bonito ao vivo.
A varzea atrás de General Lucio em 2009 e o rio Iguaçu - foto Ralph Giesbrecht
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A modificação quase total da linha para Ponta Grossa, entregue em 1977, manteve, como por milagre, a estação no mesmo local e ela se conservou ali, quase na divisa dos municípios de Araucaria e de Balsa Nova, mas situada no primeiro.

Há poucos dias o colega Alexandre Fressato enviou fotos da estação tiradas, pelo que entendi, alguns dias atrás. Mostram inclusive detalhes de algumas outras edificações da vila ferroviária hoje sem função. No início, pensei que eram fotos da estação de General Luz, no Rio Grande do Sul, importante entroncamento ferroviário - mas também sem função de estação há tempos. Embora sejam prédios diferentes, não os tenho todos na cabeça - por exemplo, tenho fotos, mas jamais estive em General Luz - e não notei a sucinta diferença no nome.

De repente, vi o símbolo da RVPSC (Rede de Viação Paraná-Santa Catarina) numa das fotos e aí vi que me enganei feio.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

DE VOLTA AO PARANÁ

Hoje, 8 horas da manhã, peguei a Castelo Branco, rodoanel e saí na Reis Bitencourt, rumo a Curitiba, Paraná. Esse caminho, de carro, que já fiz algumas vezes, é curioso. Saio na estrada já no município de Taboão da Serra e entro no de Embu. São duas cidades que estão à beira da estrada, principalmente o primeiro. Daí para a frente, um grande trecho em Itapecerica da Serra, esta longe da estrada. Só se vê mesmo pequenos bairros sem nome - pelo menos, a estrada não os "anuncia" com placas. Para quem, como eu, gosta de ferrovias, não há muito o que ver. A Mairinque-Santos cruza a rodovia Regis Bitencourt embaixo de um pequeno viaduto. Só com muita atenção e baixa velocidade se vê a linha do lado direito de quem segue para o sul. Do outro lado, quase ao lado da estrada, fica a estação de Aldeia, a única estação ferroviária que existe no município de Itapecerica. Mas nõ pode ser vista do asfalto, devido ao desnível e por ser meio "escondida", pois a linha cruza em diagonal. Seguindo a rodovia em frente, passamos por São Lourenço da Serra, o município mais novo da área metropolitana de São Paulo e totalmente espalhado, com diversos bairros distantes um dos outros. Não sei, realmente, onde fica o centro da cidade, pode até ser um dos ajuntamentos que existem junto à estrada. Depois, Juquitiba, que não pode ser vista. Depois, a descida da Serra do Cafezal até chegar o Vale do Ribeira. Trecho de pista única, que está sendo duplicado há uns vinte anos e não anda. Típica obra federal. As piores estradas paulistas são federais. O vale chega praticamente na saída da rodovia Manoel da Nóbrega, que sai à esquerda, em , para o litoral, região de Peru[ibe, at[e chegar a Santos. Nesse ponto, junto à rodovia, chega também a Santos-Juquiá, esquecida pelas autoridades e pela ALL, que não a utiliza desde 2003. Nessa junção de rodovias e da ferrovia existe um pequeno bairro, já no município de Miracatu, chamado Pedro de Barros. É uma estação, perto da estrada mas que não dá para ser vista A partir daí, a ferrovia, ao lado direito da estrada, passa a acompanhá-la, às vezes mais perto, às vezes mais longe dela. Rodovia e ferrovia seguem quase que paralelamente então. Depois de Miracatu, Juquiá, Registro, o maor de todos no vale, Jacupiranga e Cajati. Aí a ferrovia acaba. Fora as cidades, apenas uma das pequenas estações é "anunciada" por uma placa na estrada. Trata-se de Oliveira Barros, pouco antes de Juquiá. É um bairro pequenino. Já a linha pouco se vê, pois está mais para dentro. Somente depois de Juquiá se vê vários trechos a poucos metros da estrada. Escondida pelo mato, só se sabe que ela está lá por causa dos aterros sobra os quais ela foi construída. A maioria das estações está abandonada ou em ruínas. De Cajati para a frente, exite Pariquera-Açu e Sete Barras. A sede desses municípios não pode ser vista da estrada. Sete Barras está na subida da serra. No fim dessa subida está a divisa São Paulo-Paraná. Da divisa até Curitiba são cerca de 100 quilömetros. E eis que, por volta de duas e pouco da tarde, chego a Curitiba. Bela cidade. Limpa e europeia. Ficarei aqui por esta noite, de onde, amanhã cedo, partirei para Joinville.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

NADA SE TENTA EM SÃO PAULO PARA MELHORAR O TRÁFEGO


E lá estava, eu, hoje de manhã, na Marginal do rio Pinheiros congestionada, como sempre.

É curioso como o congestionamento se alterou um pouco nas últimas semanas: embora basicamente o tráfego no sentido sul (a partir do Cebolão) esteja sempre lento, até pouca semanas atrás ele parava entre o Cebolão e a ponte da Cidade Universitária e depois soltava-se até a Eusébio Matoso, onde deixo a pista. Agora, ele continua ruim, mas menos, no início do trecho e, depois da Cidade Universitária, ele emperra até a mesma ponte citada.

De qualquer forma, é ruim. Raramente há tráfego fluente e o tempo perdido irrita.

Há pontos em que o tráfego sempre trava, como, por exemplo, quem vem do Cebolão pela pista expressa (que de expressa não tem mais nada), vai lentíssimo, quase parando, todos os dias, até a altura de metade do trecho entre o Cebolão e a ponte do Jaguaré; depois, solta, até travar de novo logo depois desta última ponte. Da mesma forma, há outros trechos em que diversas pistas andam razoavelmente, enquanto outras param. Curiosamente, a que mais emperra é geralmente a primeira e a segunda a partir do rio, ou seja, as que deveriam ser mais rápidas, pois não têm saídas ou entradas.

As explicações são difíceis, embora, quando haja acidentes, obviamente, a situação é facilmente explicada. Porém, na maioria dos dias não há carros travando a pista; e o trânsito flui e "desflui" constantemente. Dá para ver, no entanto, que os autos maiores (caminhões e os poucos ônibus que por ali passam) é que causam isso a cada vez que mudam de faixa. Eles seguram duas faixas nessa manobra: a da qual eles estão saindo e a em que eles estão entrando.

Mais interessante e curioso ainda é que todos os dias acontece isso, todos os dias o trânsito não anda, mas jamais se vê algum policial de trânsito fazendo qualquer coisa para tentar melhorar a fluidez. Até se vê alguns em algumas vezes: mas eles ficam simplesmente parado olhando. E conversando. Ninguém tenta fazer coisa alguma.

Quando dirijo nos Estados Unidos (aliás, faz muito tempo que isso não acontece), vejo que, de manhã, há sinais de trânsito que ficam abertos por 15 a 30 minutos para um fluxo só: por exemplo, das 7:45 às 8 da manhã, em alguns cruzamentos. Quem dirige por ali já sabe disso e está preparado ou para esperar ou para passar por ali antes ou depois. E a coisa funciona. No Rio de Janeiro, há ruas que mudam as mãos entre 8 e dez da manhã, com os carros indo pela no sentido mais movimentado.

Em São Paulo nada disso ocorre. Não seria o caso de se tentar fazer? Tentar alguma coisa, pelo menos. Nada se tenta. Constróem-se pontes, túneis e viadutos, mas o trânsito não melhora. Há excesso de carros, é verdade, mas nenhuma outra tentativa é feita. Por exemplo: não se "acertam" cruzamentos "tortos", onde o cruzamento de duas ruas tem uma delas de forma a obrigar os carros a entrarem na rua principal à direita e depois entrarem logo em seguida para a esquerda, pois a rua em que estão nao é uma continuação da anterior. Em Curitiba, vi algumas ruas que foram "acertadas".

Mais: por que não se permitem as entradas à esquerda? Ao se obrigar os motoristas a fazerem enormes voltas para fazer uma conversão dessas, pioram muito o tráfego em diversas ruas. Por que não tentar deixar haver as conversões, como o é nos Estados Unidos. Ah, mas lá o povo tem educação. Bom, então é mais barato aumentar o gasto de combustível, a poluição e a falta de paciência dos motoristas do que tentar educá-los?

Enfim, a atuação dos policiais em São Paulo poderia e deveria ser muito mais pro-ativa do que é hoje, onde policial somente olha para o trânsito para multar quem está supostamente fazendo uma conversão proibida para fugir de um enorme congestionamento, ou parando para deixar ou recolher um passageiro, ou falando no celular e dirigindo (bom, dirigindo em termos: em São Paulo deve se ficar mais tempo parado do que andando no carro. Não, não medi no relógio).

E assim vamos. Ou melhor: não vamos. Afinal, considerando-se que a velocidade média do tráfego urbano não aumentou em cem anos... há cem anos atrás, havia mais carroças do que automóveis. Hoje não há carroças (quase não há), mas vêmo-las ao nosso lado disputando "corrida" conosco a 5 km por hora.

domingo, 11 de dezembro de 2011

VIAJANDO NUMA KOMBI

Recife - anos 1960 (cartão postal)

Minhas recordações de criança de outras cidades começam em Joinville, SC. Eu era muito pequeno quando meus pais me levaram lá. Devia ter uns 4-5 anos de idade no máximo. O ano? 1955 ou 1956. Lembro-me da sorveteria da minha tia-avó, Tekla.

Depois, de minha ida aos Estados Unidos por cerca de um ano. Restam muitas recordações, um pouco embaralhadas. Quando voltamos, em fins de 1957, passamos a ir para nosso apartamento no Embaré, em Santos, a um quarteirão da igreja do bairro, em frente à praia. Santos já tinha uma parede de edifícios. Era aquele prédio que tinha um monte de apartamentos por andar (acho que mais de dez) e o hall dava para um vão central, ou seja, metade do hall era aberto. O prédio ainda existe. Íamos à praia, passeávamos a pé, de bonde (ao centro, Ilha Porchat, ao Gonzaga, a São Vicente, biquinha, Guarujá (via balsa), aquário). Adorava andar de bonde naquele trecho em que as linhas estavam no canteiro central, entre o aquário e a Ponta da Praia.

Depois, janeiro de 1959, São Carlos. Ficamos na Estância Suiça, local na entrada da cidade (de então) que, parece, nem existe mais. Nos anos seguintes: Santo Antonio do Pinhal, Campos do Jordão, Piracicaba, Campinas. A partir de 1963, passamos a sair do Estado.

Em janeiro de 1963, São José dos Campos, um mês hospedados dentro do CTA. São José dos Campos ainda começava na Dutra, e nem tão junto à estrada assim... o CTA era quase um deserto, o prédio do alojamento era novo e ficava no meio de um enorme descampado...

Em julho, fomos a Porto Alegre na Kombi de papai, via BR-2 (atual BR-116) até Curitiba, dali a Ponta Grossa, voltando depois para Curitiba, seguindo por Mafra e Rio Negro, Lajes, Vacaria, Caxias, até Porto Alegre. Voltamos por Torres, Araranguá, Blumenau, Joinville e Curitiba, daí São Paulo de novo.

Em 1965, a maior viagem: ida e volta a Pernambuco, esticando um dia a João Pessoa, seguindo via Dutra, Volta Redonda, Além Paraíba, Leopoldina, Governador Valadares, Teófilo Ottoni, Vitória da Conquista, Jequié, Feira de Santana, Salvador, Aracaju, atravessando o São Francisco via balsa em Penedo, Maceió, Recife. Na volta, viemos via Paulo Afonso, Alagoinhas (caminho maluco para a época - tudo de terra!), Salvador de novo, dali pelo mesmo caminho da ida, até São Paulo.

Em julho de 1965, Belo Horizonte, indo e vindo pela Fernão Dias. Duas semanas na capital mineira... Em 1966, uma semana em Curitiba.

Todas essas viagens foram feitas com meus pais, e, de 1961 para frente, sempre na Kombi que ele tinha, com cortininha e tudo, Muito bom, excelentes lembranças. Meio vagas já, mas muito agradáveis. Meu pai topava tudo, inclusive andar pelo nordeste em 1963 em estradas praticamente todas de terra ou com asfalto vagabundíssimo e cheio de buracos.

Pequenos pedaços de lembranças de um Brasil de cinquenta anos atrás.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

OS FRESQUINHOS DE GENEBRA

Vamos fazer a copa de 2014 aqui. Vai ser divertido.
Discussões e mais discussões sobre a lentidão do Brasil - ou do seu governo e entidades particulares - em colocar as coisas em ordem para a Copa do Mundo de 2014 e, de tabela, para as Olimpíadas de 2016. Estádios cujas obras não começam, infraestrutura ruim, inundações que não se resolvem, aeroportos que não funcionam bem há anos, transporte público geralmente insuficiente.

É difícil saber quem tem razão em criticar, pois o que acompanho são notícias de jornal. E todos nós sabemos que jornais e meios de comunicação não conseguem retratar tudo o que existe, de certo ou de errado. Porém, há coisas que vemos e que, consequentemente, temos como dar alguma opinião.

Primeiro lugar: o transporte público funciona nas cidades em que haverá jogos da Copa? Em regra, não. Há cidades em que funciona melhor, como Curitiba. Em São Paulo, onde moro, acho que não funciona tão mal quanto dizem, mas está longe de ser uma Brastemp (se bem que, hoje, a própria Brastemp está longe de ser uma). Imaginem se todos nós atendêssemos à propaganda do governo que diz para deixar o carro em casa e usar mais os ônibus e trens. Simplesmente não haveria lugar para todos e o caos estaria instalado. Pois é, imagine isto em dias de jogos com a cidade lotada de gringos e de visitantes das cidades do estado inteiro. Há como resolver isto? Duvido. Pode-se melhorar alguma coisa, mas não vão conseguir isto a curto prazo - ou seja, três anos. E talvez não se resolva nunca.

Segundo: os estádios são tão ruins assim? Ora, se são, porque todos nós vamos a jogos nos estádios? Gostamos de sofrer? Aguentamos o sol e a chuva, nenhum estádio é coberto - com exceção de algumas partes deles, o resto fica ao relento. Não é, convenhamos, nenhuma tragédia. Os banheiros são ruins e sujos. Poderiam ter manutenção decente, mas isto não é tão difícil e caro assim: basta querer. Os estádios não têm estacionamentos, mas mesmo assim, todos vão aos jogos. Têm evasão de renda, mas isto acontece porque as autoridades não querem resolver o problema (por que será, hein?). O resto é frescura da FIFA.

Terceiro: aeroportos. Estes, sim, têm de ter uma solução. São um caos hoje, imagine quando receberem mais gente, muito mais gente, todos de uma vez. Aí, sim, tem-se de meter a mão na massa e urgente.

Uma sugestão seria fazer todos os jogos em cidades não tão grandes assim. Ou seja: nada de São Paulo ou Rio de Janeiro, mas sim, por exemplo, Araraquara. 200 mil habitantes. (esta foi a primeira cidade que me veio à cabeça, é somente um exemplo). Tem jogo hoje? Ora, que se coloquem os interessados em hoteis na própria cidade ou em cidades em volta, com ônibus (já que trem não tem mesmo, nem vai ter) na porta programados para o número necessário. Como o trânsito na cidade normalmente é pequeno, um aumento não vai causar o mesmo caos que causaria por exemplo no Rio ou em São Paulo, que já são normalmente caóticas.

Ah, o Maracanã é tão tradicional, não podemos deixar de fazer um jogo ali. Ótimo. Façam a final e a cidade viverá um dia de caos somente e ficará contente. São Paulo ficará sem jogo? Ora, façam a abertura e pronto. Mais um dia de caos em outra cidade. Aliás, São Paulo só tem atualmente dirigentes e governantes que tentam passar a perna um nos outros, então, parece que não vai ter estádio nenhum pronto.

Convenhamos: a FIFA é uma frescura só. Dá para fazer uma Copa aqui, sim, exatamente do jeito que as coisas são hoje - estádios inclusive. Quem não gostar que não volte mais. Afinal, quando teremos outra copa no Brasil? Faz diferença? Se eu fosse o governo brasileiro, acho que, um ano antes da Copa, só de sacanagem diria: "parem de encher o saco. A Copa será realizada do jeito que as coisas estão agora, pois não conseguimos nem queremos resolver as coisas do jeito que vocês querem. Portanto, ou vêm assim mesmo, ou mudem de país. Vocês decidem".

E um abraço.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

NOSSOS BELOS IMÓVEIS SE DESFAZEM

Em Dois Córregos, enquanto as casas da cidade são exemplarmente mantidas, a vila ferroviária se desfaz em poeira. Na foto, vista de duas janelas, o interior da estação - Foto Alexandre Giesbrecht em 1/1/2011

Na Revista de História da Biblioteca Nacional deste mês de janeiro, uma reportagem sobre o Palacete do Barão do Rio Pardo onde o entrevistado fui... eu! Nem por isso o palacete está bem de vida. É de 1883 e está caindo, aliás, parte já caiu. Próximo à estação de Julio Prestes - na época, chamada de Estação São Paulo -, esta foi exatamente o motivo pelo qual o barão a construiu ali: o bairro tinha, então, apenas quatro ou cinco anos de existência e com as facilidades de locomoção para o interior por uma Sorocabana que ia avançando rumo a Botucatu (chegaria lá em 1888). Veja mais sobre o palacete no site de Douglas Nascimento, São Paulo Antiga.

Mas o patrimônio imobiliário paulista continua sofrendo: em Vinhedo, cidade que conheço pouco, o CONDEPHAAT tombou, no centro da cidade, pelo que entendi, as matas e a casa-sede da Fazenda Cachoeira, com cerca de duzentos anos de idade. Porém, os donos não se conformaram e hoje existe uma batalha judicial pelo cancelamento do terreno. Enquanto isso, o casarão se deteriora. Embora eu torça pela vitória da conservação, pimenta nos olhos dos outros é colírio: a venda do terreno com a demolição da casa e derrubada da mata certamente renderá muito mais aos donos que a exploração da área para turismo. Infelizmente, aqui não é a Europa.

No passeio que fiz por parte do interior paulista na semana passada, nota-se que as casas antigas, justamente as que fazem hoje a diferença em qualquer cidade, estão desaparecendo. Em algumas, ou não existe quase nada ou o que existe não é conservado. Apenas em duas delas vi o patrimônio sendo valorizado: em Agudos e em Dois Córregos, a conservação das casas parece estar na educação dos moradores. São cidades pequenas, onde isso pode facilmente se espalhar. O mesmo ocorre no pequeno vilarejo de Varpa, no município de Tupã.

É preciso que essa filosofia se espalhe. Mas de que forma podemos conseguir isso? Somente mesmo por educação de berço. Aulas na escola desde o jardim de infância sobre a valorização da história dos locais em que se vive. Por que somente em algumas cidades se investe na manutenção de belas fachadas e das casas? O que há de diferente nelas? Afinal, isso não existe somente em cidades pequenas. Existe também, por exemplo, em Curitiba, cidade bem maior do que as citadas acima.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

SANTA ESTUPIDEZ, BATMAN!


Quais foram as consequências do choque de um ônibus com uma composição cargueira próxima ao pátio ferroviário da estação de Americana, no Estado de São Paulo, na noite de anteontem? Bem, além de nove (ou dez, não ficou claro) pessoas mortas e de uma série de reportagens em jornais de todo o Brasil, houve também uma série de aproveitamentos políticos do acidente.

Uma delas: o Ministério Público Federal de Piracicaba quer saber quais são as condições da via férrea em Americana. Bom, na verdade, boa parte da via permanente das ferrovias e também da ALL pelo país inteiro é ruim. Porém, isso não teve qualquer influência sobre o acidente, pois o cargueiro estava passando em velocidade relativamente baixa (para um trem que transportava soja do interior para Santos, com cerca de 80 vagões, segundo li em algum lugar) - falando em termos de ferrovia, pois estava em zona urbana densamente povoada - e não parou porque é simplesmente impossível fazer isso em curta distância para um monstro desse. Quem devia ter parado e não o fez por falta de atenção foi o motorista do ônibus.

O que realmente teve muita influência foi o descaso das prefeituras e da ferrovia com as passagens de nível na cidade. Independentemente de quem tem de colocá-las, isto já deveria estar discutido e resolvido há muito tempo atrás. Sobre isso, o Ministério Público não se manifestou. E ontem, não muitas horas depois do acidente, aconteceu outro em Ibaté, cerca de 120 km à frente na mesma linha, também numa passagem de nível, quando uma locomotiva isolada se chocou com um automóvel, matando seu único ocupante. Sinalização? Como sempre, não havia.

Seria interessante, também, saber por que a ALL está colocando cancelas em todos os cruzamentos em nível na cidade de Curitiba e não está fazendo isso no resto das cidades por onde passa... essa notícia também surgiu hoje.

Para piorar as coisas, o digníssimo prefeito da cidade já disparou uma perola: por causa do acidente, vai tratar de fazer uma variante por fora da área urbana da cidade para que o trem passe, "livrando" a cidade de seus trilhos. Com isso, não somente ele poderá construir uma "linda" avenida, como também eliminará toda e qualquer possibilidade de se usar o leito atual para o tráfego de trens urbanos - VLTs, por exemplo.

Parece que a população está emburrecendo no Brasil. É muito mais barato e sensato manter a linha onde ela está e colocar cancelas e sinalização eficiente nos cruzamentos da cidade que construir uma variante por fora dela. Como diria Dick Grayson, o Robin: "Santa estupidez, Batman"!

quarta-feira, 21 de julho de 2010

SITUAÇÃO PRECÁRIA DAS FERROVIAS DO SUL

Trilhos da linha da antiga Noroeste em Bauru, SP, hoje utilizados pela ALL. Foto Ricardo Frontera, 18/7/2010

Transcrevo abaixo e-mail recebido de Paulo Stradiotto, de Curitiba, PR, que também comenta que além dos processos rolando na Policia Federal existem mais uns 6 na procuradoria do MPF do PR contra a ALL. Em Joaçaba, Mafra e Uruguaiana idem. Abaixo, a situação como está em Uruguaiana:

PORTARIA No- 28, DE 2 DE JUNHO DE 2010
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, na cidade Uruguaiana/
RS, pela Procuradora da República signatária, nos autos nº
1.29.011.000039/ 2005- 47:
CONSIDERANDO ser função institucional do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública, para proteção do patrimônio público e social, e de outros interesses difusos e coletivos, consoante dicção ao artigo 129, III, da Constituição Federal;
CONSIDERANDO competir ao Ministério Público Federal, em razão da regra prevista no artigo 6º, inciso VII, letras "a" e "b", inciso XIV, letra "f", da Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993, zelar pela observância dos princípios constitucionais reguladores da Administração Pública, entre estes os da legalidade, da moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput, Constituição Federal);
CONSIDERANDO o disposto na Resolução nº 87/2010, do Conselho Superior do Ministério Público Federal, que disciplina e regulamenta a instauração e tramitação do Inquérito Civil Público, bem como o previsto no art. 8º, inc. III, §3º da Lei Complementar 75/93;
CONSIDERANDO o Procedimento Administrativo nº 1.29.011.000039/2005-47 e apenso nº1.29.011.000246/2007-63, instaurados nesta Procuradoria da República, a fim de apurar o descumprimento do contrato de concessão do serviço de transporte ferroviário pela empresa concessionária ALL, mormente a desativação e destruição da malha federal de Itaqui/São Borja e São Borja/Santiago;
CONSIDERANDO que o modelo de desestatização aplicado para a privatização dos serviços de transporte ferroviário separou a malha ferroviária do país em regiões, e os bens de propriedade da Rede Ferroviária Federal S/A - RFFSA em Operacionais (assim entendidos aqueles indispensáveis à operação para a prestação dos serviços concessionados, arrendados às Concessionárias) e Não Operacionais (entendidos como desnecessários à operação e que permaneceram sob responsabilidade da RFFSA), tudo de acordo com o contrato de arrendamento pactuado (fls. 22 do procedimento nº1.29.011.000246/2007-63);
CONSIDERANDO que a ALL é a Concessionária do serviço de transporte ferroviário de cargas na denominada "Malha Sul", nos termos do Contrato de Concessão celebrado com a União em 27 de fevereiro de 1997 - "Contrato de Concessão", e na mesma data, celebrou Contrato de Arrendamento de Bens Vinculados à Prestação do Serviço Público e Transporte Ferroviário Federal S/A - RFFSA - "Contrato de Arrendamento";
CONSIDERANDO que se mostra evidente e inquestionável o interesse público na realização do transporte de cargas via linha férrea, pois possibilita a transferência da maioria do volume de carga atualmente transportado por via rodoviária para os trens, meio de transporte vantajoso para a coletividade frente às demais opções, sendo eficaz, menos ´poluente, barato e ágil, necessário às atividades agrícolas, comerciais e industriais locais, além de desonerar a União da necessidade de construção e frequente manutenção das rodovias, em razão da diminuição do fluxo de "cargas pesadas" pelas vias rodoviárias (fls. 23);
CONSIDERANDO ser obrigação da concessionária prestar serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, sem qualquer tipo de discriminação e sem incorrer em buso de poder econômico, atendendo às condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas, ainda zelar pela integridade dos bens vinculados à concessão, mantendo-os em perfeitas condições de funcionamento e conservação, conforme expresso na Cláusula Nona do Contrato de Concessão;
CONSIDERANDO o disposto pela Norma Complementar MT nº 06/2000, de 08 de fevereiro de 2000, fundamentada no artigo 6º, da Lei 8.987/95 e nos artigos 3 e 4 do Regulamento dos Transportes Ferroviários no sentido de que, para suspensão, supressão ou desativação, temporária ou definitiva, de transporte ferroviário de carga, deverá a concessionária obedecer ao procedimento previsto naquela norma, requerendo-o à ANTT, além de dar ampla publicidade ao fato, comunicando previamente sua intenção aos usuários dos serviços no trecho alcançado pela medida, às demais concessionárias que venham a ser afetadas direta ou indiretamente, ao proprietário dos bens arrendados, quando for o caso, e aos Prefeitos Municipais das cidades envolvidas;
CONSIDERANDO que em qualquer situação que o patrimônio público venha a sofrer lesão ou ameaça de lesão, sendo consequentemente atingidos os interesses da coletividade, extrapolando se a esfera de interesses da Administração Pública - e que este critério da lesividade, abrangente não apenas da lesão já ocorrida, mas também da ameaça de lesão futura, torna o patrimônio público objeto de interesse difuso - torna-se necessária a tutela pelos legitimados para as ações coletivas e pela intervenção obrigatória do Ministério Público nas hipóteses legalmente previstas;
CONSIDERANDO que é direito dos consumidores receber serviço adequado (Lei 8.987/95, art. 7º) e que "serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade de tarifas" (Lei 8.987/95, art. 6º, § 1º), e que "a atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço", conforme disposto no artigo 6º, § 2º do mesmo Diploma legal,
CONSIDERANDO o Termo de Ajustamento de Conduta firmado entre o Ministério Público Federal de Santo Ângelo/RS, ALL - América Latina Logística do Brasil S.A. , Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT e Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA, que estabeleceu à ALL diversas obrigações, como a conclusão de obras de recuperação de trechos, bem como a reparação/recuperação, como prioridade, e/ou propor a demolição, quando for o caso e em acordo com a RFFSA, as edificações que estão a ela arrendados nas localidades referidas no Termo, podendo, ainda a ALL firmar parcerias com Prefeituras ou outros órgãos interessados, fls. 20/25 do PA nº 1.29.011.000039/2005-47;
CONSIDERANDO que conforme informado pelo Relatório de Vistoria nº 034/2005 realizado pelo 2º Pelotão Ambiental da Brigada Militar a linha férrea que liga São Borja a Itaqui, no trecho compreendido entre São Borja e Bororé em uma extensão de aproximadamente 33 (trinta e três) Km, a malha férrea foi totalmente retirada pela Prefeitura Municipal de São Borja, para a construção de uma estrada rodoviária intermunicipal, tendo sido esta concluída no mês de abril de 2004 (fls. 80/81 do PA nº 1.29.011.000039/ 2005- 47);
CONSIDERANDO que foi realizada vistoria, conforme Relatório
de Vistoria nº 033/2005 do 2º Pelotão Ambiental da Brigada Militar, no trecho que liga São Borja a Santiago e constatado que em diversos segmentos, houve furtos (comprovados pelos Boletins de Ocorrência das fls. 105/245 do PA nº 1.29.011.000039/2005-47);
CONSIDERANDO que conforme informado pela ALL - América
Latina Logística, diversos fatores culminaram com o pedido de supressão de serviços e desativação definitiva do trecho Santiago à São Borja, justificada pela falta de demanda para a região, investimentos a serem realizados, prestação do serviço em condições antieconômicas, os crimes de furto de trilhos e o Decreto nº 9.186 de 2004, da Prefeitura Municipal de São Borja que desapropriou área da RFFSA e autorizou a retirada dos trilhos, sendo insustentável a operação ferroviária no local (fls. 249/298 do PA nº 1.29.011.000039/2005- 47);
CONSIDERANDO que no documento produzido pela ALL, denominado
"Análise da Desativação Definitiva de Trecho Concessionado" realizada em 2006 (fls. 576/590 dos autos nº 1.29.011.000039/2005-47), verifica-se que não houve nenhum estudo acerca da demanda do transporte ferroviário (caso funcionasse a linha férrea) em razão do fluxo de cargas pela Ponte Internacional São Borja (BR) - Santo Tomé (AR), inaugurada em 09-12-97 com o respectivo porto seco denominado de Centro Único de Fronteira-CUF; soma-se a isso a ausência de informações de que a ALL tenha comunicado sua decisão de desativação às empresas de transporte de cargas internacionais estabelecidas ou com representantes naquele município;
CONSIDERANDO que a ALL, ao aprovar a desativação do trecho, emitiu a NOTA TÉCNICA nº 142/GEFIC/SUCAR de 20-12-07 que considerou no último parágrafo do item 3 o seguinte: Cabe ressaltar, que até a presente data, esta agência não recebeu nenhuma manifestação dos usuários potenciais comunicados pela ALL da desativação do trecho ferroviário Santiago - São Borja, o que, S.m.j., pode ser interpretado que o atendimento das demandas de transporte destes usuários está sendo realizado de forma satisfatória. (fl. 624)
CONSIDERANDO que na "Análise da Desativação Definitiva de Trecho Concessionado" realizada em 2006 (fls. 576/590 dos autos nº 1.29.011.000039/2005-47), verifica-se no item nº 2.18 que trata sobre "Restrições de velocidade", a ALL informa os seguintes motivos: via desnivelada, junta desnivelada, via flambada, dormentação em mau estado, aterro com deslizamento, aterro com abatimento de plataforma e outras gabarito restritivo. (fl. 383). Sendo que esses motivos deixam claro que a "Análise da Desativação Definitiva de Trecho Concessionado" contem informações inverídicas, pois na verdade, a linha férrea estava destruída devido a retirada de trilhos em vários trechos, sendo impossível "Restrições de velocidade" pois sequer havia possibilidade de tráfego de trens, por desídia da ALL;
CONSIDERANDO que a "Análise da Desativação Definitiva de Trecho Concessionado" realizada em 2006 (fls. 586/590 dos autos nº
1.29.011.000039/2005-47), o item "5 Material rodante" informa que as máquinas, com dois eixos, indicadas para o trecho São Borja - Santiago, seriam melhor alocadas nos trechos de serra para operar os portos que possuem uma demanda muito maior; ficando evidente na "Análise da Desativação Definitiva de Trecho Concessionado" que a ausência de operação da linha de São Borja - Santiago, antes mesmo de evitar prejuízos, buscou maximizar lucros da ALL com prejuízo ao interesse público;
CONSIDERANDO que fica evidente que a "Análise da Desativação Definitiva de Trecho Concessionado", realizada em 2006 (fls. 586/590 dos autos nº 1.29.011.000039/2005-47), omite informações, sendo isso uma evidência de que a desativação da linha de São Borja - Santiago decorreu por motivos justificados com meias verdades pela ALL;
CONSIDERANDO que em 19-07-07 o Ministério Público Federal expediu a Recomendação nº 03/2007, para que a Agência Nacional de Transportes se abstivesse de autorizar o pedido de desativação do trecho ferroviário, mesmo assim a ANTT por meio da Resolução nº 2548, de 12 de fevereiro de 2008, publicada no DOU de 15 de fevereiro de 2008, autorizou a Concessionária América Latina Logística - ALL a proceder a desativação definitiva e a devolução do trecho ferroviário Santiago - São Borja (fl. 381 do PA nº 1.29.011.000039/2005- 47);
CONSIDERANDO que em 06 de maio de 2008, foi enviada Recomendação nº 01/2008 à ANTT recomendando que fosse anulada a Resolução nº 2548 de 12 de fevereiro de 2008 (que autoriza a Concessionária ALL a desativar o trecho ferroviário Santiago – São Borja), e após esta providência, a empresa concessionária do serviço de transportes ferroviários - ALL deveria apresentar a esta Procuradoria,
proposta e plano de metas para a reativação do transporte ferroviário no trecho entre os municípios de São Borja e Santiago, bem como plano de desocupação e reassentamento nas propriedades pertencentes à malha ferroviária (na eventual existência de ocupações), a qual não se verificou até o presente momento (fls. 249/298 do PA nº 1.29.011.000039/2005-47);
CONSIDERANDO que se verificou a existência da ação judicial nº 2003.51.01.023238-1, tramitando na 18ª Vara Federal do Rio de Janeiro, ajuizada pela Rede Ferroviária Federal S/A, ora substituída pela União Federal, em face da América Latina Logística S/A, onde verificou-se que foi deferida antecipação de tutela para a reativação dos trechos férreos abandonados pela ALL, em 26 de maio de 2006, ocorre, que posteriormente a ANTT desconsiderou a decisão judicial, ao autorizar a ALL a desativar em definitivo o trecho ferroviário, em fevereiro de 2008, por meio da Resolução nº 2548/08;
CONSIDERANDO que em 2008 a ALL foi intimada na Ação Judicial nº 2003.51.01.023238-1 para que no prazo de seis meses fosse realizada a restauração da via férrea e dos bens a ela vinculados, sob pena de multa diária de R$ 50.000,00 por dia de atraso, e relativamente ao trecho São Borja - Santiago, o qual se encontra na área de atuação deste MPF, não foi cumprida de maneira alguma a decisão liminar, estando a situação de abandono e descaso a conduzir à desativação e destruição da malha ferroviária (fl. 758 do PA nº1.29.011.000039/2005-47);
CONSIDERANDO que a ANTT sequer manifestou interesse em atuar na ação ajuizada pela União como litisconsorte (fl 700 do PA nº 1.29.011.000039/2005-47);
CONSIDERANDO que em que pese a liminar emitida na Ação Judicial nº 2003.51.01.023238-1, a ANTT emitiu e considera válida a Resolução nº 2548/08 que autorizou a ALL a proceder a desativação definitiva do trecho ferroviário Santiago à São Borja com indenização à União mediante valor ainda a ser definido pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes - DNIT (fls. 796/798 do PA nº 1.29.011.000039/2005-47);
CONSIDERANDO que esses fatos apontam a incidência da Lei de Improbidade Administrativa (art. 10 caput e incisos II, X e XII da Lei nº 8.429/92), especialmente por parte dos diretores da ANTT que autorizaram a desativação da malha e folham totalmente omissos em seu dever fiscalizatório;
CONSIDERANDO que, de acordo com o art. 2º da nº 7.347/85, Lei da Ação Civil Pública, o foro competente para julgar as ações civis públicas é o do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.
CONSIDERANDO o previsto na Resolução 87/2010 do CSMPF, relativamente ao período de tramitação do procedimento administrativo, bem como que o tema é complexo, exigindo atuação de vários órgãos;
DETERMINO a conversão deste Procedimento Administrativo em INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO, vinculado à 5ªCCR, com o seguinte objeto: Ativação da malha ferroviária Itaqui/São Borja e São Borja/Santiago- DNIT, ANTT, ALL.
a) Autue-se e registre-se;
b) Comunique-se à 3ª e 5ª Câmara de Coordenação e Revisão nos termos do art. 6º c/c o art. 16, da Resolução 87/2010, enviando cópia desta portaria por correio eletrônico, a fim de que seja dada a devida publicidade.
c)Instaure-se o presente com prazo inicial de um ano, nos termos do art. 15 da Resolução 87/2010 do CSMPF.
d) Oficie-se à ANTT solicitando que informe porque não manifestou interesse em atuar na Ação Judicial nº 2003.51.01.023238-1, ajuizada pela União, como litisconsorte;
c1) encaminhe cópia dos documentos que instruíram o pedido de suspensão ou supressão do serviço de transporte ferroviário de carga, ocorrido em 2008 no trecho São Borja - Santiago;
c2) informe o histórico dos fatos relevantes da concessão do trecho de Itaqui - São Borja, a partir de 1997.
Uruguaiana/RS, 02 de junho de 2010.
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, na cidade Uruguaiana/
LARA MARINA ZANELLA MARTINEZ CARO
Procuradora da República

domingo, 11 de julho de 2010

TRANQUEIRA

A estação de Tranqueira, de madeira e construída toda em madeira, em fotografia tirada por mim em 2002.

Ontem, ainda em Curitiba, resolvi visitar uma velha estação que fotografei em 2002 e da qual não tinha notícias há muito. Curioso, há estações que ninguém visita para fotografar.
Fiu até lá de carro, seguindo a rua Mateus Leme sempre em frente. A um determinado ponto, ela vira rodovia: a rodovia dos Minérios. Entra no município de Almirante Tamandaré e, depois da entrada para esta cidade, seguimos mais seis quilômetros para chegar ao bairro de Tranqueira.
À medida que se vai avançando pela estrada, começamos a ver as caieiras que existem aos montes ali - e, também, a estrada e seus arredores cada vez mais esbranquiçado, com o acúmulo da poeira branca que precipita do ar da fumaça expelida pelas usinas. Somente junto a Tranqueira, há duas. E há diversas outras antes de chegar e também depois, no caminho para Rio Branco do Sul.
Eu sabia que a estação de madeira de Almirante Tamandaré já tinha ido para o chão. Eu a fotografei, também, em 2002. Tanto que, sabendo que ela não mais existia, nem me preocupei em ir até o local. Sefui pela estrada direto até Tranqueira. Eu não me lembrava que a estação não ficava ao lado da rodovia. Então, como a linha que cruza em nível a rodovia é simples, fui procurar por uma linha pelo menos dupla, onde poderia estar a estação.
Não foi tão simples. Avancei por um lado, à esquerda da rodovia (sentido Rio Branco do Sul) e entrei por uma rua de terra. Ali vi o início do pátio, com um AMV de onde saía um desvio. Não deu para prosseguir de carro por ali pois havia um atoleiro. Dei a volta, entrei numa estrada asfaltada e a um certo ponto, entrei à esquerda, acompanhando a linha - também simples, ali. A um determinado ponto, a linha se abria no pátio. Olhei em frente. Nada da estação.
Acompanhei a linha com o carro e nada - nem sombra da plataforma. A estação deve ter sido demolida, pensei. Parei numa casinha e perguntei a um senhor, que rapidamente: falou: "ficava logo ali", apontando com o dedo, "foi incendiada há alguns anos". Típico. Estação de madeira, já abandonada em 2002, o incêndio era quase que inevitável. Pode ter sido acidental, com algum idiota acendendo uma fogueira dentro ela. Ou proposital, ou por vandalismo, ou de algum morador cansado de ver o prédio descuidado e possivelmente com mendigos ou drogados dentro dele. Já vi isso acontecer em outras estações - se não são de madeira, mete-se a marreta nelas.
No caso, não havia plataforma porque mesmo esta era também de madeira. Então, com o mato crescido ao lado da linha, não se vislumbra nada, mesmo. Uma pena, era uma construção de madeira bem típica da região, como se pode ver na foto acima, uma das tiradas por mim em 2002. Como as outras estações do ramal que tinham a mesma tipologia desta também não mais existem, não sobra mais nenhuma para contar a história. Triste, mesmo.

sábado, 10 de julho de 2010

A RUA MATEUS LEME EM CURITIBA

Algumas casas fotografadas hoje na rua Mateus Leme: Acima, à esquerda, uma casa com duas fachadas; à direita, casa em nível mais alto que a rua, comum nessa via; o belo casarão em frente ao Shopping Müller, com a sua lateral na rua que cruza a Mateus Leme; e algumas casas com a frente junto à calçada, sentido centro.

Aqui estou eu, de novo em Curitiba, cidade da qual gosto demais. Meu filho veio para cá de automóvel ontem, para voltar no domingo e eu resolvi entrar de carona. Motivo? Matar as saudades da cidade. Adoro andar por Curitiba, admirar a cidade. Sinto-me bem aqui. Pela primeira vez, fiquei do outro lado da cidade. Normalmente, fico pelos lados do Batel, onde estão a maioria dos hotéis mais novos. Desta vez, fiquei num hotel junto ao Bosque do Papa, numa travessada rua Mateus Leme.

Esta rua me surpreendeu. Eu já havia passado por ela, mas uma ou duas vezes sem prestar atenção. Desta vez, resolvi ir para o centro da cidade a pá. Fui e voltei duas vezes. Vinte e cinco minutos cada "perna". A rua é muito interessante. Longa, liga o largo da Ordem, no centro velho da cidade, com a cidade de Rio Branco do Sul: é só seguir sempre em frente. Ela mantém, pelo menos até a altura do Bosque do Papa, um equilíbrio entre as construções que a acompanham. Casas antigas de fachada à beira da calçada, intercaladas por casas construídas em plano mais alto evidenciando-se no centro de um grande jardim, por alguns edifícios de apartamentos mais recentes e pequenas lojas, além do velho prédio do Müller e um casarão que virou a recepçõ de um hotel Ibis construído nos seus fundos.

No trecho entre seu início e o Shopping Müller, a maioria das construções são casas antigas, época em que a via era caminho para a Metalúrgica Müller, que ocupava o prédio do hoje shopping. Belas casas, bem conservadas, ornam o antigo caminho. O trecho seguinte já mostra casas maiores com recuo em relação à calçada, posidionadas em terrenos mais altos, dando-lhe uma imponência sutil. Em frente ao shopping, uma delas é enorme - três andares e grande área de construção, muito bonita. Deve ser hoje um escritório. Uma das casas e curiosa, com uma fachada art-decô à frente de uma casa de telhado alto com duas águas e a terceira água caindo para a frente (uma das casas retratadas acima).

Depois do bosque, o número de árvores nas calçadas aumenta e dá uma beleza diferente à rua, sempre tortuosa. Mais um parque, o São Lourenço, aparece encostando à sua direita, mais à frente. Depois, as construções diminuem em frequência. De vez em quando, uma casa ou conjunto de casas mais antigas aparece, sugerindo que no passado estavam isoladas como pequenas ilhas urbanas. Finalmente, a estrada, a rodovia atual que sai para os municípios de Almirante Tamandaré e Rio Branco d Sul, antiga Votuverava, chamada de Rodovia dos Minérios.

Bela surpresa a rua Mateus Leme. Pelo menos para mim, um paulistano que costuma visitar Curitiba algumas vezes por ano com muito prazer. Que se onserve assim por muito e muito tempo. Conseguirá ela resistir à destruidora especulação imobiliária?

sexta-feira, 9 de julho de 2010

PEDÁGIOS E CONCESSIONÁRIAS

Foto Felipe Grandin - O Estado de S. Paulo

Desde que o governo paulista resolveu entregar a manutenção das estradas estaduais - que, em São Paulo, são a maioria, é o único Estado em que isso acontece no Brasil, cujos Estados têm rodovias em sua maioria de propriedade do governo da União - para concessionárias privadas, duas coisas ocorreram: primeiro, as estradas melhoraram muitíssimo; segundo, as reclamações aumentaram logaritmicamente, por causa dos altos preços que os motoristas têm de pagar.

Devo deixar claro que é uma vergonha que o Estado - e, por tabela, os outros Estados e também a União - não sejam capazes de mater estradas decentemente fazendo eles mesmos o serviço, ou por departamentos como o antigo DER ou por empresas de capital estatal majoritário. Ora, se empresas particulares podem, por que o governo não pode? Não pode porque é incompetente, para dizer o mínimo.

Outra coisa que não está nem um pouco clara é: quem é que paga pela construção de viadutos, duplicação de pistas, etc., etc., etc (suponho que itens menores, como reasfaltamento, construção de pedágios, tapar buracos e limpez de pistas e canteiros sejam feitas pelas concessionárias)? O governo ou a concessionária? A impressão que dá é que é o governo, pois a cada nova obra, aparece a placa do governo do Estado. Ora, a concessionária ganha e não gasta? É um mundaréu de dinheiro. Os pedágios têm seus valores muito altos, mesmo.

Pedágios como os da Castelo Branco, que foram feitos apenas para que a população supostamente mais rica de Alphaville o pagasse, são escandalosos: dá para ver que as pistas laterais da Castelo acabam exatamente na entrada e saída de Alphaville, no km 23. E há outros escândalos. Porém, realmente as estradas estão boas, muito boas. Dos males o menor: paga-se um absurdo, mas recebe-se boas estradas.

Enquanto isso, as estradas federais fizeram concessões de forma diferente: há cerca de dois anos, entregaram a concessão a quem oferecesse o pedágio mais baixo para fazer o serviço de conservação. Parece que foi o Ovo de Colombo. Hoje pode-se ver que a manutenção dessas rodovias federais vai mal: basta andar ela Regis Bittencourt ou pel Fernão Dias. Estas rodovias federais, duas das poucas em São Paulo que historicamente eram ruins, estão melhor: mais limpas e sem grandes buracos. Note bem, porém: sem grandes buracos, não sem buracos. Ou seja: arrecadar menos pedágio gera menos obras e mais desleixo.
Pude ter uma boa ideia disso hoje, quando vim com meu filho dirigindo de São Paulo para Curitiba. A um dado momento, o transito parou. Levamos mais de uma hora e trinta minutos para andar dez quilômetros na serra do Cafezal, em Cajati, SP. Um caminhão que tombou sua carga pesada às cinco da manhã ainda estava com a carga no chão interditando uma pista às duas da tarde. Além disso, nenhum, absolutamente nenhum aviso foi dado em ponto algum da estrada sobre o acidente e o congestionamento. Nem pela polícia rodoviária federal, nem pela concessionária - que poderia ter dado a notícia no pedágio anterior. Notar que essa morosidade não tinha nenhum escape e foi num trecho em que não havia qualquer posto de gasolina. Motoristas com pouco combustível correram o risco de ter pane seca.

Tudo continua como dantes no quartel de Abrantes, senhores. O Brasil não muda, nem com privatização, nem com estatização.

domingo, 31 de janeiro de 2010

QUE COMAM BRIOCHES!

Maria Antonieta de Áustria, rainha da França (1774-1792). Foto Wikipedia

Há governantes que não percebem a real necessidade do povo que governam. A rainha de França, Maria Antonieta, esposa de Luiz XVI, respondeu aos pedidos do povo por pão com a frase célebre: “Eles não têm pão? Que comam brioches”. Por essa e por mais outras, além de não perceber a gravidade da situação que a cercava, perdeu — literalmente — a cabeça.

Nem isso fez os governantes dos quase 250 anos que se passaram aprender. É verdade que eles hoje não perdem mais as cabeças, mas algumas vezes — infelizmente, somente algumas vezes — perdem o governo. Hoje em dia, parece que pessoas como o Sr. Kassab são cegas. Há outros exemplos, muitos deles. Não vou ficar numerando, mas cito um fato lido no jornal O Estado de S. Paulo de hoje que fala sobre transporte urbano sobre trilhos.

Diversas cidades que falavam em implantar Veículos Leves sobre Trilhos ou “Metrôs Leves” — é tudo basicamente a mesma coisa — agora dizem que, já que não foram escolhidas para sediar a Copa do Mundo de 2014, vão deixar esses planos para trás e construir corredores de ônibus. Campo Grande, Natal, Cuiabá e Porto Alegre são as cidades citadas. Lá, o povo vai comer brioches — e talvez, pois sempre é possível que não construam é coisa alguma.

Para não dizerem que eu só penso em trilhos, vamos acrescentar o que a reportagem escreve:

"Em média, o custo para adotar os VLTs é o dobro do de corredores de ônibus do tipo BRT (Bus Rapid Transit), usado em Curitiba e Bogotá. Um projeto para trens leves exige pelo menos R$ 37 milhões por quilômetro, enquanto um BRT sai por R$ 18,8 milhões/km. Para o consultor Peter Alouche, os investimentos não devem ser analisados somente pela quantia inicial. 'Os custos podem ser maiores a princípio, mas a longo prazo isso se reverte. Uma frota de ônibus precisa ser trocada a cada cinco anos e um trem dura 40 anos'. Alouche também afirma que o VLT vem acompanhado de uma revitalização urbanística da região. 'O fato de ser um projeto mais caro significa que vai haver uma preocupação maior com a área, que será recuperada urbanisticamente. O Transmilênio (elogiado corredor de ônibus de Bogotá) funciona bem como meio de transporte, mas dividiu a cidade em duas'.

Os defensores de corredores no estilo BRT argumentam que, a um custo de operação menor, conseguem transportar praticamente a mesma quantidade de pessoas dos VLTs. Nos ônibus, são entre 10 mil e 20 mil passageiros por hora e sentido, enquanto o modelo sobre trilhos tem capacidade entre 15 mil e 35 mil. ‘Só é preciso elaborar bem os projetos. Mesmo um BRT pode dar errado se for feito no tapa, para ficar pronto a tempo da Copa’, completa Balassiano, que ressalta que os corredores precisam ser um ‘sistema à parte’, não enfrentando cruzamentos e outros tipos de interferência. O investimento, porém, parece ser o diferencial para a escolha entre os dois modelos. A prefeitura de Campo Grande, por exemplo, ficou de fora da Copa e então desistiu de um projeto de 12 quilômetros de VLT. No lugar, o município vai trabalhar na criação de um sistema com 32 quilômetros de corredores, ao custo de R$ 150 milhões. ‘Nossa demanda é baixa para a utilização de um VLT e, por isso, vamos trabalhar em um sistema de terminais e corredores’, diz o diretor da Agência Municipal de Transportes da cidade, Rudel Trindade”.

Tudo é explicação e desculpas — como se não fosse necessário para qualquer cidade desse porte olhar para o crescimento futuro, com Copa ou sem Copa. Enfim, notamos a cegueira habitual. Não vão perder a cabeça, mas vão ser lembrados no futuro pelos seus sucessores da forma “isso é culpa das administrações anteriores”, como costuma dizer a maioria dos governantes neste País de Deus.

O povo? Ora, o povo... que continue respirando a fumaceira dos ônibus desregulados e do enorme ruído decorrente de seu tráfego, em vez do silêncio e limpeza dos bondes (ops, desculpe, VLTs).