segunda-feira, 30 de novembro de 2009

ASSASSINARAM O CAMARÃO

Foto Wikipedia

Escrever rápido ou ter de falar rapidamente leva-nos a fazer gafes constantemente. Eu mesmo já escrevi enormes bobagens no blog ou em mensagens enviadas por e-mails simplesmente por não reler o que escrevo na maioria das vezes... principalmente em curtos e-mails.

Erros de datilografia, de português (detesto fazer erros de português) e mesmo de pensar uma coisa e escrever outra não são percebidos quando não relemos o que escrevemos... ou quando não prestamos atenção no que estamos falando naquele momento. Quantas vezes não escrevi datas erradas (como 1808 em lugar de 1908, por exemplo) por erros de datilografia?

Costumo criticar repórteres de jornais ou de rádios por escreverem ou falarem coisas incorretas. É realmente difícil para eles que são obrigados muitas vezes a fazerem reportagens em curtíssimos períodos de tempo para apresentá-las de forma escrita ou falada. Não se conseguem todas as informações e sai uma bobagem só. Afinal, não podemos exigir que repórteres saibam tudo sobre tudo.

Muitas vezes, no entanto, os erros saem por falta de revisão ou por erros na datilografia. Como no meu caso.

Agora, há também os “ouvintes-repórteres” que são pessoas comuns que mandam mensagens por celular ou mesmo usando o telefone celular como tal que falam esquisitices. Às vezes pode até parecer uma brincadeira sarcástica deles, mas como saber se não é ignorância mesmo? Outro dia ouvi um que, falando com a rádio por seu celular, disse que “estava na hora de o DSV perceber que a Marquês de São Vicente não é um nobre que tem uma casa na praia (!!!) e sim uma avenida na Barra Funda que vive congestionada o dia todo”.

Na semana passada foi a repórter do estúdio da Radio Sul América Trânsito, que fica transmitindo como está o trânsito em São Paulo durante todo o dia, pagar os seus pecados. Uma ouvinte deixou um recado de um acidente, que a repórter colocou no ar: “Na rua Felipe Camarão, acaba de ocorrer um acidente entre quatro carros e um caminhão”. A rua, para quem não sabe, é a primeira travessa à direita para quem atravessa a avenida Salim Maluf pela Celso Garcia no sentido da Penha.

A repórter, no estúdio, repetiu a informação depois do recado da ouvinte: “Portanto, evitem a rua Felipe Camarão, pois ali ocorreu um acidente com quatro carros e um camarão”. Ela percebeu o erro e repetiu imediatamente: “o acidente foi entre quatro carros e um caminhão”. O nome camarão a confundiu. Ficou por isso.

Porém, cerca de dez minutos depois, ela, quando voltou ao ar, estava dando risadas junto com seu companheiro de estúdio, dizendo que os ouvintes estavam telefonando ou mandando mensagens rindo da cara dela e perguntando como tinha sido o acidente e se “o camarão estava muito machucado”. Bom humor de todos, o que é bom.

Acabei pensando que, se isso fosse mais de quarenta anos atrás, talvez ninguém notasse, pois existiam os famosos bondes-camarão. Com a ressalva que a rua Felipe Camarão jamais teve bondes.

domingo, 29 de novembro de 2009

O OCASO DO LARGO DA BATATA

Clicando sobre a imagem (do "Guia de São Paulo-1966") v. poderá ver onde o largo ficava, acima da letra B do lado esquerdo. Repare na rua Iguatemi, ainda estreita (e ainda não era a Faria Lima) e que terminava na rua de Pinheiros. Hoj e avenida continua, e engolfou ruas do lado de lá, como a Martim Garcia e a Miguel Isasa, e o próprio largo da Batata. Repare que este nome não está assinalado.

Eu não sei se o Largo da Batata realmente existiu. Ou melhor, se o nome é oficial. Mas é curioso e tradicional. E dentro de alguns anos ele não será mais um nome lembrado na Capital de São Paulo. Ele está sendo destruído pelo metrô e pela especulação imobiliária que está vindo com ele.

Pior ainda, existem ali em volta pequenos estabelecimentos com profissionais que são tradicionais na área. Se são realmente tão competentes não posso dizer, pois jamais usei seus serviços. Mas sapateiros, marceneiros, alfaiates e outros não são profissões que se aprendiam na escola. São pessoas já de uma certa idade, no caso, pois estão lá há muito anos e têm uma experiência certamente relevante. São com certeza profissionais honestos e corretos, senão não durariam muito por lá e teriam má fama, coisa que não ocorre.

Onde é, afinal, o largo da Batata? Mesmo eu, que conheço São Paulo em detalhes desde os anos 1960, quando ainda criança me deitava em cima de mapas da cidade do Guia Levi abertos no chão da sala de visitas da casa de meus pais, somente vim a ouvir pela primeira vez esse nome quando estava na Universidade de São Paulo como estudante, na primeira metade dos anos 1970. Meus colegas me convidavam para ir num dos bares que havia por lá, e eu, mesmo sendo conhecido como uma pessoa que jamais bebeu álcool, ia para lá tomar uma Coca-Cola.

O largo fica mais ou menos na esquina da antiga rua Martim Garcia – hoje parte da avenida Brigadeiro Faria Lima – com a Cardeal Arcoverde e a rua Miguel Isasa, outra que foi engolida pelo prolongamento da mesma avenida. Portanto, somente sobrou do largo o que ficava no lado impar da rua Miguel Isasa – é difícil até de descrever o local, que hoje nem largo é. Estranho, não?

O fato é que esse pessoal vai ter de se mudar, as casas irão para o chão e virão para o mesmo local prédios ou galpões de lojas com duzentas outras empresas, ou mais. Para onde irá esse pessoal? Eles terão condições de oferecer sua experiência para outras pessoas que não os conhecerão em outros lugares?

Isso sem contar que eles deveriam ser tombados pelo Patrimônio. Mas não se podem tombar pessoas, claro. Que pena.

Enfim, boa parte do largo já se havia ido anos atrás com as obras de prolongamento da avenida Brigadeiro Faria Lima e agora vai-se de vez levando suas vidas e memórias. O metrô poderia pelo menos chamar a estação que ficará ali de Largo da Batata. Como fez há mais de trinta anos com a Praça da Árvore, que nem árvore mais tem e também foi parcialmente arrasada pelas obras da linha Norte-Sul.

sábado, 28 de novembro de 2009

A MARGINAL DO RIO PINHEIROS

Na foto, um carro trafega pela Marginal ainda não delineada nem asfaltada em 1958. À sua frente está a ponte velha do Jaguaré, e à esquerda, um trem da Sorocabana segue para Santo Amaro. Pode ser visto o limpador de para-brisas do automóvel em primeiro plano e À direita o canal do rio Pinheiros. Este trecho somente foi entregue 20 anos depois.

Hoje encontrei uma cópia de um jornal – A Gazeta – de 30 de julho de 1958. Nem me lembrava que a tinha; veio numa fornada de artigos de jornal que o meu amigo Coaraci copiou para mim há alguns anos e que versavam sobre a linha da Sorocabana que havia sido inaugurada ao longo do rio em janeiro do ano anterior.

Hoje essa é a linha da CPTM, chamada de linha 3, ou linha Diamante (acho que é Diamante – não há meio de eu conseguir me lembrar das cores de tanta linha). Mas naquela época, era uma linha de trens puxados por locomotivas diesel que circulavam entre a Júlio Prestes, entravam por essa linha fazendo a curva antes de cruzarem o rio Pinheiros pela ponte e iam até a estação de Evangelista de Souza, de onde desciam para Santos pela linha Mairinque-Santos.

Portanto, nem eram bitola larga, como hoje, nem tinham TUEs – os trens unidade elétricos que percorrem hoje a linha – e nem tinha a avenida Marginal. Era um barreiro só para quem vinha de Pinheiros, por exemplo, para atravessar e chegar à estaçãozinha do mesmo nome na beira do rio – e que não é a estação de hoje.

Em 1958, no entanto, começaram a fazer a Marginal. O tal jornal falava exatamente sobre isso. Acima das fotos, a primeira manchete dizia: “Trecho inicial: Cidade Jardim a Santo Amaro”. A manchete principal, abaixo dessa, em letras bem maiores: “Vai ser aberta a marginal esquerda do rio Pinheiros” – ou seja, a do outro lado em relação à linha. Finalmente, as sub-manchetes, em letras menores: “Por enquanto, apenas uma pista de dez metros – Futuramente, duas pistas de 14 metros, canteiro central divisório e acostamentos – Extensão de 6,5 quilômetros – Ligação entre a Via Anchieta e a Dutra – Prolongamento de avenidas que hoje morrem ‘a margem do rio Pinheiros – Obras de arte – Importância da avenida perimetral que faz parte do anel rodoviário da Capital”. O texto não veio na cópia.

Portanto, a Marginal era o Rodoanel da época, mas, como o atual, estava longe de ficar totalmente pronto. E para pegar o trem na estação, com a Marginal pronta (se bem que as manchetes falam da marginal do outro lado), passava a ser um problema: não havia passarelas, mas também não havia nem sombra do volume de tráfego que existe hoje.

A foto reproduzida acima, da mesma edição do jornal, não tem legenda (ou se tem não veio em minha cópia), mas mostra o que era a Marginal Direita do Pinheiros naquela época (1958): deve ser o trecho entre o que hoje é o Cebolão e a ponte do Jaguaré, pois a linha (vê-se uma composição ferroviária) está à esquerda, entre os postes. Ao fundo, deve ser — só pode ser — a ponte velha do Jaguaré, que ainda existe e não é utilizada, espremida entre as duas pontes atuais e abertas em 1973.

Eu comecei a dirigir em maio de 1969, seis meses antes de completar 18 anos. Já peguei a Marginal do Pinheiros pronta em boa parte como é atualmente, asfaltada, dos dois lados do rio. Somente não existia justamente o trecho que é mostrado na foto – esse somente foi asfaltado e ligado ao resto em 1978, quando da construção do Cebolão e da inauguração do viaduto feito sobre a linha do trem pouco antes da ponte do Jaguaré para quem vem de Pinheiros para o Cebolão.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

VIVER SEM ELETRICIDADE - II


Um mês atrás, escrevi neste blog sobre como era viver sem eletricidade e que antigamente era mais fácil, pois as pessoas não a conheciam e muito menos estavam acostumadas com ela.

Bom, ontem eu não postei nenhum artigo. Motivo? Geralmente posto à noite. E faltou luz em casa. Desta vez, porém, durante cerca de 20 minutos houve vinte e duas quedas de luz por alguns segundos. Vinte e duas. Duas delas foram mais longas: cerca de um minuto. Algumas, no entanto, foram instantâneas. É ótimo para acabar com os aparelhos elétricos e eletrônicos da sua casa.

Finalmente, acabou de vez. Eram cerca de sete da noite. Não havia ainda anoitecido, mas a chuva era forte e estava bem mais escuro do que deveria estar naquele momento. Rapidamente escureceu. Abrimos a janela, pois a chuva de vento estava agora uma chuva pesada mas vertical. Acendemos um lampião – que é a pilha. E com luz fraca. Para quem enxerga mal como eu, não dá a oportunidade de fazer nada.

Lá fora, sem luz, chovia e não dava para andar a pé. Às oito e meia, estava muito escuro. Daria para andar sem chuva, mas pouco se enxergava. Claro, nem tente ligar para a Eletropaulo para saber alguma previsão. Primeiro, porque não se consegue. Segundo, porque não se consegue uma previsão confiável. Geralmente, cada vez que ligamos há um motivo diferente, uma situação diferente, um local diferente e uma previsão diferente.

Eram já quase nove horas e não havia ninguém da Eletropaulo ainda no local do problema, que era na avenida Alphaville, na entrada de Parnaíba para quem vem de Barueri. Um cabo caído no chão faiscando. Como sempre, aliás. Certamente, a Eletropaulo não usa materiais bons nem dá a manutenção apropriada, pois esses problemas de falta de luz ocorrem diversas vezes por ano e desde que eu me mudei para lá — há 28 anos!!

Brigamos para ter eletricidade e paradoxalmente para não construirmos represas e destruir o meio ambiente – mas de qualquer forma, a distribuição ainda está num estágio rudimentar. A foto acima mostra como eram os problemas no início do século 20. Hoje, mudaram os postes, mas não mudaram os problemas.

A Light se chama hoje Eletropaulo, os donos são outros, mas o serviço parece ter regredido. Azar de nós, que nos acostumamos à eletricidade e não sabemos viver sem ela. Nem este blog sabe. Quem sabe um computador movido a óleo de baleia fosse a solução? Ou óleo de milho, pois as baleias estão em extinção.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O TROCADERO


A cidade de São Paulo teve algumas mansões que não só não existem mais como existiram por pouco tempo. O Trocadero foi uma delas.

Pouca gente hoje já ouviu falar dela, mas era uma casa muito bonita que ficava na esquina da Praça Ramos de Azevedo com a rua Conselheiro Crispiniano. A foto acima mostra o “Palacete Trocadero” em 1935-6, quando era sede do Centro do Professorado Paulista (CPP).

Meu avô Sud Mennucci presidiu o CPP de 1932 a 1948, tendo sido um dos primeiros presidentes – o Centro foi fundado em 1930 e ele foi convidado pelo professor Cymbelino de Freitas, que viria a ser o primeiro presidente, em 1930, para se juntar ao grupo de professores que estavam organizando o Centro nesse ano, e precisava de alguém com fama o suficiente para agregar o maior número de professores no Estado.

O Centro teve diversas sedes até comprar um palacete na avenida da Liberdade, que foi reformado em 1937, quando a casa foi totalmente desfigurada e transformada em sua sede até os anos 1960. Nessa década esse palacete foi demolido e o terreno cedido em aluguel para as obras da linha Norte-Sul do metrô de São Paulo.

Nos anos 1970, terminado o metrô, um edifício, que é o atual, foi construído para abrigar o já bem maior CPP da época. Nos últimos anos, o presidente foi um primo de Sud, Palmiro Mennucci, que faleceu no exercício do cargo no ano passado. Antes dele, o professor Sólon Borges dos Reis presidiu o Centro durante cerca de 40 anos. Também é falecido, fato que ocorreu há poucos anos, depois de deixar a presidência para Palmiro.

Enfim, uma pena que o Trocadero tenha ido para o chão. Ele teve vários usos e na verdade não sei quando foi contruído e quando foi demolido – sei que não durou muito tempo. No seu lugar hoje há um edifício que no nível da rua abriga, se não me engano, uma das lojas Marisa. Ao seu lado, sobrevive até hoje o prédio que abrigava o antigo Hotel Esplanada (que pode ser visto à direita na fotografia), que atualmente serve de escritório central do Grupo Votorantim.

O Trocadero abrigou o Centro entre 1º de junho de 1935 e 9 de abril de 1936. Depois foi transformado na sede da Câmara Municipal de São Paulo por algum tempo. Ampliando-se a foto acima, pode-se ver à esquerda, no segundo andar, uma placa com o nome “Centro do Professorado Paulista”. À direita, na entrada principal dando frente para a praça Ramos, o nome “Trocadero”, em letras sobre o frontão.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

COMPARANDO TEMPOS DE PERCURSOS

Em 21 de novembro último, o trem despecial Curitiba-Ponta Grossa volta vazio para Curitiba - os passageiros da ida voltaram de ônibus mais tarde, conforme estabelecia o programa. Foto Daniel Trevisan, no pátio de Ângelo Lopes.

Andando no trem especial Curitiba-Ponta Grossa no último dia 21, pude ver como seria difícil ter novamente trens de passageiros no Brasil utilizando-se linhas já existentes e não linha novas. Como escrevi três dias atrás, levamos exatamente cinco horas de Curitiba a Ponta Grossa, e isto sem parar em lugar nenhum. E mais: não desembarcamos na estação de Ponta Grossa, mas sim em Desvio Ribas. Caso fôssemos até a velha estação (o que hoje é impossível porque não há mais trilhos depois de Oficinas), seriam mais pelo menos 25 minutos, como eram em 1978.

O trem leva tanto tempo por quê, afinal? Bom, dois motivos podem ser citados: o estado da linha, que tem péssima manutenção, considerando que somente cargueiros andam lá (perde-se a carga, mas não se perdem vidas de passageiros) e o tempo que o trem leva para percorrer os enormes e compridos pátios de Iguaçu e de Araucária a velocidade próxima a 15 km/hora.

Considerando que hoje se vai de carro pela BR-277 de uma cidade a outra em menos de duas horas, teríamos de conseguir um trem e uma linha que nos permitisse fazer o mesmo trecho em pelo menos o mesmo tempo da rodovia.

Usando-se os horários do Guia Levi em quatro anos diferentes, como era nos tempos do trem regular esse percurso nos trens da Rede de Viação Paraná-Santa Catarina e RFFSA? Em julho de 1948, havia trens diários — dois horários para ir e dois para voltar — e no horário do “trem rápido” ele levava 4 horas e 40 minutos para fazer um trecho com paradas em seis estações intermediárias, sendo a mais longa delas em Engenheiro Bley (bifurcação para a Lapa e Mafra), com 5 minutos. Era ainda trem a vapor e a linha era a antiga, ainda. Já o outro trem diário parava em 16 estações (“parador”) e levava 5 horas e 5 minutos.

Vinte anos depois, em maio de 1968, havia somente um trem por dia, que às segundas, quintas e sábados tinha carro-restaurante e nos outros dias não. Ambos levavam 5 horas e dez minutos. A linha era a mesma de 1948 e o número de estações não se alterou. Já se notava uma baixa na velocidade. Em janeiro de 1976, já com linha nova entre Engenheiro Bley e Ponta Grossa (desde 1969), o único trem — que não era mais diário, fazendo o percurso de ida apenas quatro vezes por semana — levava 4 horas e 35 minutos, parando em 12 estações — a linha nova tinha menos delas.

Finalmente, em março de 1978, um ano e pouco antes do fim, o único trem (idas somente às terças e quintas-feiras) fazia o mesmo percurso de 1976 (embora a linha nova de Curitiba a Engenheiro Bley já estivesse aberta, os trens de passageiros rodavam pela velha) em 3 horas e 45 minutos – menos que em 1978, mas parando em dez estações, duas a menos. Vejam que em 1978, já no período de decadência das ferrovias e principalmente dos trens de passageiros, o trem levava uma hora e quinze minutos menos do que o trem levou três dias atrás, e ainda parando em dez pontos!

Ou seja, hoje as condições da linha são piores para um trem de passageiros. E, ainda por cima, a linha utilizada foi agora a de 1977, que o trem de 1978 ainda não usava e que era uma linha de maior velocidade, em teoria. Se se implantasse um trem de passageiros regular na linha atual entre as duas cidades, ele seria praticamente um trem direto — com exceção de Guajuvira e de Machado da Costa, onde há localidades junto à linha ou próximas a ela, não há nenhuma estação onde haveria passageiros para embarque ou desembarque, dadas seus isolamentos atuais — Machado da Costa seria para desembarcar quem fosse para Porto Amazonas (não tão próximo) e Guajuvira atenderia à pequeníssima população local do lugarejo. Nada mais. Mas fazer em cinco horas e 25 minutos um trecho que pode ser percorrido de carro em menos de duas horas? Nunca. Precisar-se-ia de uma linha nova e exclusiva, e que necessitaria de um novo leito.

São 114 quilômetros hoje entre Curitiba e Ponta Grossa por rodovia. Eram 184 quilômetros de ferrovia pela linha velha. Hoje são 151 na linha atual. Tirem suas conclusões dos dados acima.

Há muito o que se fazer nas ferrovias se o Brasil quiser retomar seriamente o tráfego de passageiros, que, apesar de tudo, jamais deveria ter sido aniquilado.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

SUGESTÕES PARA A EDILIDADE PAULISTANA

Vila Mariana em 1905. A estação é a desaparecida Estação Vila Mariana, do tramway de Santo Amaro.

Fica bonito chamar os vereadores paulistanos de edis em vez de vereadores. É só um sinônimo, mas como é pouco usado, deve dar charme a essa turma que não faz nada, só aparece de vez em quando no plenário para bater papo e não vota coisa alguma.

Enfim, como a maioria dos projetos de leis apresentados pelos nossos vereadores é para dar ou mudar nomes nas ruas da cidade (é a maioria, sim, embora não me lembre da porcentagem), vamos sugerir algo para mudar isto.

Conforme o meu artigo Estradas Velhas, publicado neste blog há alguns dias, vou sugerir que os vereadores façam um projeto de lei para impedir a mudança de nomes dos logradouros públicos da cidade. Não, isso não vai lhes tirar o emprego. Ao contrário, vai lhes dar mais tempo para fazer coisas mais úteis e também, como a maioria, mais tempo para não fazer coisa alguma.

O projeto de lei que sugiro diz o seguinte:

Não será mais permitido a ninguém alterar nomes de logradouros paulistanos, visto que isto atrapalha as localizações de locais tradicionais, ajuda ainda mais a atrapalhar o trânsito e arruína a memória da cidade.

Exceções – poderão ser alterados nomes dos logradouros, desde que sejam para: 1) diminuir o seu tamanho (exemplo: Avenida Presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira para Presidente Juscelino); 2) Para retornar o nome do logradouro ao seu nome anterior, ou original (mesmo que este nome não tenha sido oficial); 3) Para dar à rua o nome pela qual ela é tradicionalmente chamada (como, por exemplo, avenida Condessa Elisabeth Robiano, para Marginal do Tietê); 4) Ruas novas, que geralmente se chamam por números ou por letras, sendo que neste caso, o nome deverá ser dado o mais curto possível e de forma alguma homenageando pessoas que não tenham celebridade notória ou tenham efetivamente feito algo de importante pela cidade; e finalmente 5) Revogam-se as disposições em contrário (este artigo jamais pode faltar; dá charme).

Chega de homenagear ilustres desconhecidos (e, pior, com o nome enorme!!!) para deixar viúvas felizes prejudicando a memória paulistana. Chega de dar nomes da mãe e do pai do Maluf a avenidas (sim, eles têm os nomes em duas delas). Já pensaram, por exemplo, o meu nome a uma rua da cidade? Ralph Mennucci Giesbrecht? Quem iria se lembrar ou decorar um nome desse tamanho e impronunciável (é raríssimo alguém saber pronunciar ou escrever corretamente qualquer um dos meus três nomes). É isso que temos de combater.

Ah, a cidade tem mais o que fazer? Tem mesmo! E essa lei, com custo praticamente nulo, daria tempo aos nossos edis para fazer coisas mais úteis pela cidade, repito. Agora, se querem dar dinheiro para fabricantes de placas, que perderiam muito da boquinha, mandem também colocar uma placa diferente nas ruas que tiveram o nome mudado, mostrando o nome original na segunda placa (Rua Oscar Freire = Alameda Iguaçu, por exemplo. Os nomes são reais). Sorocaba já faz isso há anos.

domingo, 22 de novembro de 2009

APRENDIZADO


Depois da viagem de trem de Curitiba para Ponta Grossa, no sábado, hoje, domingo, retornei para São Paulo. Foi uma correria – na ida, peguei o ônibus da Azul no Shopping Tamboré, para onde minha filha me levou de carro às seis e meia da manhã (são apenas seis quilômetros de casa, nessa hora, sem trânsito ainda), fui para Viracopos (Castelo, Rodoanel, Bandeirantes e Viracopos, 1h10m) e lá aguardei mais de uma hora para tomar o voo da Azul para Curitiba.

Em Curitiba, tomei o ônibus para o centro e fiquei no hotel que fica na última parada do ônibus do Aeroporto antes de pegar a avenida Comendador Franco para o aeroporto de novo). Enfim, cheguei ao hotel, onde descansei um pouco. Uma hora depois, saí a pé por Curitiba, cidade que dá prazer em fazer isto.

No dia seguinte, fui a pé para a estação rodoferroviária, pois eram apenas quatro quarteirões do hotel em que fiquei (atrás do Shopping Estação). Fiz a viagem e cheguei de volta ao hotel já de noite, às 9 horas, depois de jantar alguma coisa rápida no Shopping.

Hoje cedo, a mesma viagem, de forma inversa. Cheguei em casa por volta das 3 horas da tarde. Vim pensando nas coisas que me disseram diversos curitibanos com os quais conversei. Eles se queixavam do trânsito. Meu Deus, morei seis meses em Curitiba em 2002 e voltei para a cidade pelo menos 4 vezes por ano até o ano passado e só vi trânsito quando havia obras ou algum acidente.

Cansei de ouvir também motoristas de táxi durante todos esses anos reclamando do trânsito. Sugeri a vários deles que fossem dirigir em São Paulo por uma semana para mudarem de ideia. São Paulo tem quase 11 milhões de habitantes (o município e Curitiba não chega a dois. A cidade, portanto, é bem menor, e acredito que a percentagem de pessoas que moram em casas ainda seja bem superior à percentagem paulistana. O sistema de transporte deles por ônibus funciona infinitamente melhor que o de São Paulo, além do fato que Curitiba tem ruas largas e na maioria dos bairros em forma quadriculada... em São Paulo, são uma mistura de formatos de quarteirões, curvas demais e trânsito demais.

Seria muito bom que os administradores da cidade de São Paulo e de Curitiba conversassem entre si, numa conversa séria e não política. Se os curitibanos já reclamam hoje de seu trânsito, imagine o que vão reclamar quando chegarem (espero que isso jamais ocorra) ao mesmo número de habitantes que São Paulo tem hoje. Nossos administradores poderiam ver, então, o que teriam evitado se tivessem tentado controlar a cidade há cinquenta anos atrás. E os de Curitiba poderiam ver o futuro horroroso que se arriscam a ter.

Tanto São Paulo quanto Curitiba precisam parar de crescer. E a maioria das cidades brasileiras, também. É preciso, principalmente em São Paulo, parar com a construção de prédios. Simplesmente assim, parar. A população não aguenta mais o crescimento e a cidade como está, mas não se manifesta, não protesta. As empresas de construção civil deitam e rolam, construindo mais e mais inclusive em locais que não suportam mais isso (Vila Olímpia e Campo Belo, por exemplo).

O que precisará acontecer para que São Paulo pare? Uma catástrofe? O trânsito piorar ainda mais? E Curitiba que acompanhe o que ocorrer aqui nos próximos anos, para não cair nos mesmos erros. É preciso interiorizar a economia e o crescimento. Chega de êxodo rural e para as capitais, ou mesmo para as cidades grandes (Ribeirão Preto, Bauru, Presidente Prudente, Sorocaba, Campinas, Santo André. Guarulhos, Osasco e muitas mais).

Que Ponta Grossa, que visitei ontem, fique como é hoje, uma maravilha. Que os estádios da cidade fiquem como é o do clube Guarani, onde ontem assisti a uma partida de futebol de masters. Sua foto está acima, tomada ontem por mim. Ponta Grossa, no duro, no duro, não precisa de um estádio maior, mesmo porque o outro, do Operário, tem o mesmo tamanho.

Senão, salve-se quem puder.

sábado, 21 de novembro de 2009

30 ANOS DEPOIS

Estação desativada mas bem conservada de General Lucio, hoje. O trem da ALL em sentido contratio na linha principal aguarda para poder seguir viagem no sentido de Curitiba.

Trinta anos depois, o trem de passageiros entre Curitiba e Ponta Grossa, que existia desde 1894, voltou a funcionar. Uma viagem isolada comemorativa do primeiro jogo de futebol oficial da história do Paraná, realizado cem anos atrás em Ponta Grossa entre o Operário local e o Coritiba F. C., foi realizada hoje numa iniciativa da empresa Serra Verde, da ALL e do próprio Coritiba.

Fui de São Paulo a Curitiba especialmente para andar num trecho de trilhos em que jamais havia andado e que havia sido extinto exatamente no dia 1º de junho de 1979 ainda pela RFFSA. O trem partiu da estação rodoferroviária de Curitiba exatamente às 7:20 da manhã de hoje e chegou à estação de Desvio Ribas, em Ponta Grossa, às 12:20, numa viagem de 5 horas exatas sem paradas.

O trem foi escolhido para transporte de torcedores e de velhos jogadores do Coritiba exatamente por ter sido por ele que os jogadores do mesmo time viajaram em novembro de 1909. Havia, no entanto, muitas diferenças nas duas viagens.

O trem era de linha e não especial como hoje (que, aliás, teve além da locomotiva diesel, 8 carros quase cheios e um carro-bagagem). A locomotiva era a vapor e a de hoje, a diesel. A linha percorria trajetos diferentes, que somente se encontravam em dois lugares: Guajuvira e General Lúcio. A estação inicial foi a de Curitiba-velha, que funcionou de 1885 a 1972 e desde esse ano passou a ser a de hoje, chamada de Rodoferroviária.

A estação de Ponta Grossa também foi desativada (em 1989) e portanto a chegada e desembarque foi na estação de Desvio Ribas — que já existia em 1909, mas não era a mesma naquela época. Dali tomamos ônibus para o restaurante onde foi servido o almoço para o time do Coritiba, que ainda existe — embora em local diferente. Depois fomos ao estádio para assistir ao jogo entre os masters dos dois times. Este foi realizado no estádio do Guarani de Ponta Grossa, pois o estádio do Operário está em reforma.

O Operário venceu o jogo de 1909, por 1 a 0. Hoje, o Coritiba venceu por 5 a 1.

Foi uma grande festa. Eu era o único sujeito que tinha vindo de São Paulo e não torcia pelo Coritiba. Fui para andar de trem. Fui também para fazer uma singela homenagem ao grande sujeito que foi meu pai, Ernesto Giesbrecht, nascido em Ponta Grossa em 1921 e que saiu da cidade com 13 anos de idade, em 1934. Morreu em São Paulo, em 1996.

Foi uma bela viagem, para mim, inesquecível. Um belo trajeto. Durante o percurso, as pessoas paravam espantadas em ver um trem de passageiros que, por ali, não passa nunca. Pena que todas as estações durante o caminho estão desativadas e abandonadas, com a exceção da de Desvio Ribas. Quanto a Ponta Grossa, é uma bela cidade que eu já conhecia. Quanto a Curitiba, sem comentário. Eles já foram feitos ontem neste blog.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

A BELA CURITIBA

A estação em Curitiba, na sua frente para a av. 7 de Setembro. Foto minha em 2002.

Depois de quase um ano e meio, eis que volto a Curitiba, a cidade de que mais gosto no Brasil. Limpa, bonita, casas bonitas, gente bonita... a cidade de meus sonhos. Eu sempre digo à Ana Maria que vamos nos mudar para Curitiba, mas isso provavelmente nunca acontecerá, por uma série de razões.

De 2002 a junho de 2008, vim muitas e muitas vezes para cá. Quase sempre a serviço. Porém, este ano o serviço aqui acabou e o motivo de minha vinda hoje é outro. Escrevo daqui.

Hoje saí à tarde para dar uma volta a pé e visitar alguns lugares que sempre visito. Também precisava almoçar, pois cheguei aqui por volta do meio-dia. Achei que ia pegar chuva, mas apesar de estar uma tarde cinzenta e ontem a chuva forte que caiu no final do dia ter causado inundações e desabamentos, até agora, já noite, não caiu água.

Saí de novo agora há pouco e fui comer alguma coisa no Shopping Estação. A velha e original estação de Curitiba manteve somente o seu prédio principal. O pátio foi para o saco no início dos anos 1990. Ele ocupava toda a área à frente do prédio da estação (que sempre deu frente para a Avenida Sete de Setembro) e chegava até a avenida Silva Jardim. Um dos extremos laterais – que hoje é um dos extremos do prédio do shopping – ficava na avenida Floriano Peixoto. O outro lado chegava até a rua João Negrão. A linha saía do pátio cruzando a rua João Negrão por cima num viaduto de ferro, a “Ponte Preta”. Ainda existe, embora não seja o viaduto original de 1884.

O shopping tem prédios grandes e novos, que “abafam” a pequena estação, principalmente para quem olha por dentro. A plataforma e sua cobertura original ainda estão lá, mas a cobertura é inútil: entre o prédio da estação e os prédios do shopping há uma cobertura metálica em arco branco, que lembra as novas estações da CPTM na linha do rio Pinheiros, em São Paulo.

O shopping ocupou boa parte do pátio, mas não todo: sua parte traseira dá para a rua Rockfeller, que faz um “S” ao sair da Avenida Sete de Setembro e depois cruza a Silva Jardim. Ou seja, o pátio foi engolido pelo shopping e por prédios (inclusive o hotel Slaviero Rockfeller) que ficam hoje dando frente para a Silva Jardim.

A rua Rockfeller cortou o local onde ficava a rotunda do pátio, uma rotunda de 180 graus. Porém, parece-me que ela não havia sobrevivido até o arrasamento do pário, já havia sido desativada e demolida tempos antes. Não sei quando. O fato é que uma área aberta e com alguns prédios ferroviários grandes e pequenos (e a rotunda), que poderia ser um magnífico museu a céu aberto junto ao centro da cidade, foi destruída.

Na frente da estação, do outro lado da Avenida Sete, as ruínas do hotel Tassi parece que vão deixar de ser ruínas: há um início de obras, e o prédio abandonado está envolto por cortinas de obra e andaimes. Essa é uma boa notícia. Foi nesse belíssimo hotel (na época) que meu avô foi torturado por algo que não fez nos anos 1930.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

OBRIGADO, LEITORES!

Propagandas hipócritas e mentirosas já existiam em 1913

Hoje, véspera de feriado no município de São Paulo, voltei tarde da casa de meu filho para casa. Tarde? Bom, pelo menos mais tarde do que todos os dias volto de meu escritório para casa, pegando a Castelo Branco para chegar ao Alphaville. Eram quase nove horas da noite e passei por um cartaz luminoso no início da rodovia, com os dizeres: “OBRIGADO POR ESCOLHEREM NOSSA RODOVIA – CCR”.

CCR (se não há engano de minha parte, nunca presto atenção nesses nomes) é a concessionária que cobra os caríssimos pedágios da Castelo Branco, inclusive um pedágio que funciona há oito anos e proibido por lei estadual por estar a menos de 35 km da Praça da Sé em São Paulo. Eu o pago todos os dias porque não tem jeito. E não há ação judicial que consiga parar a cobrança do mesmo – além de ilegal por isto, também é ilegal por causa da quilometragem que ele cobra e o que é previsto em contrato é menor do que o seu valor.

Enfim, como no Brasil existem diversas leis que não são cumpridas, provando que a Justiça está longe de ser cega – sua vista é muito boa e diferencia bastante quem ganha e quem perde as ações - fazer o quê? Pular da janela? O brasileiro é muito cordato, aceita tudo.

Porém, vamos deixar o pedágio de lado e dizer que: a rodovia Castelo Branco é boa. Uma das melhores de São Paulo, sem dúvida. Porém, se eu quiser ir para Alphaville desde a Capital, não terei escolha: ou ando por ela por 9 km (do Cebolão ao Alphaville) ou faço caminhos mais compridos, mais estreitos, com mais trânsito, com lombadas e com sinais etc. Se eu não tenho escolha, por que a concessionária de cujo nome eu nem tenho certeza me agradece? Propaganda hipócrita, claro. Uma das muitas a que assistimos na televisão ou lemos em jornais e em revistas todos os dias.

Portanto, caros leitores: obrigado por lerem meu blog. Neste caso, não estou sendo hipócrita: existem sei lá quantos milhares de blogs no Brasil e os meus seguidores leem o meu blog. Agradeço mesmo, de coração, sem hipocrisia e com muito mais razão do que a CCR — ou seja lá que nome ela tiver.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

ESTRADAS VELHAS

A placa acima estava em Jandira no ano de 2006, num trecho da antiga estrada. Não sei se ainda está. Notar Itu escrito como Itú na placa relativamente nova.

Vou bater no mesmo martelo que já bati outras vezes aqui: é um absurdo o que mudam de nomes nas ruas de São Paulo, e também o tamanho dos nomes que vão colocando nas ruas da cidade. Tudo isso certamente dificulta a localização dos logradouros quando se está dirigindo (mesmo com mapa na mão) e é certamente uma das inúmeras causas dos cada vez mais monstruosos congestionamentos de São Paulo.

Por que não se mantiveram os nomes tradicionais de diversos logradouros? Fico imaginando como seria hoje se todos os nomes originais das ruas, praças etc. tivessem sido mantidos nos últimos cento e vinte anos, quando – pasmem – já se iniciaram as trocas de nomes. Após a república, já se deu uma série de trocas: ruas com nomes da família real ou de seus títulos (Rua da Imperatriz, no antigo largo da Sé, por exemplo, foi uma das primeiras a mudar).

O fato não se dá somente na cidade de São Paulo, mas percebo que no Rio de Janeiro, por exemplo, as trocas ocorreram em bem menor escala. Lá ainda há muitas “estradas” antigas – ponho a palavra entre aspas porque conservaram o nome. O centro da cidade mantém os nomes de muitos anos atrás. E mesmo em outros casos – ferrovias, por exemplo – no Brasil são trocados os nomes.

Que nomes bonitos tinham a Sorocabana e a Mogiana como ferrovias! Extintas na formação da Fepasa em 1971, o nome se manteve nas regiões por onde elas passavam, mas na ferrovia, não. Parece brincadeira, mas há gente hoje em dia, quase 40 anos após o desaparecimento dos nomes, que não sabe que as duas citadas foram ferrovias. Idem com a Leopoldina, no Rio, outro belo nome, ou a mais antiga Linha do Cantagalo, que passava por Nova Friburgo e acabou nos anos 1960, para mim o nome de ferrovia mais bonito do País. Meu bisavô viveu e morreu em Figueira do Rio Doce, lindo e poético nome de cidade em Minas Gerais, e que em 1940 teve o nome alterado para um patético governador daquele Estado – o nome hoje é Governador Valadares.

Na capital e área metropolitana, os nomes que eu ainda conheci há não tanto tempo assim de “estradas” e “estradas velhas” foram sendo trocados. Uma pena. Isso é história, lembranças de um tempo de um Brasil completamente diferente. Estrada Velha da Penha – este, será que mudou? Nos anos 1980 ainda se chamava assim, no meio do Tatuapé. Estrada Velha de Cotia – virou avenida Heitor Antonio Eiras Garcia – nome enorme e sem relação com a via. Estrada Velha de Itu, ou somente Estrada de Itu, que já foi também Caminho de Itu ou Estrada Real de Itu – esta passa por diversos municípios da Grande São Paulo e na Capital virou av. Corifeu de Azevedo Marques. Em Jandira, ainda havia até dois anos atrás placas com esse nome num trecho da mesma via, ainda sem asfalto na época. Estrada velha de Parnaíba – esta saía de São Paulo e mudou de nome em diversos trechos, seccionada que foi por aterros e mesmo por nomes. Aqui era a avenida Alphaville e hoje é a av. Yojiro Takaoka. Na divisa de Barueri com Osasco, ela mudou de nome para rua João Ferreira de Camargo há poucos anos.

Querem mais? Estrada de São Miguel virou av. São Miguel. Para quê? Estrada de Vila Ema e do Oratório também mantiveram os nomes mas viraram avenidas – o que, aliás, não são, sendo ruas estreitas. Estrada do Vergueiro, hoje rua Vergueiro. Estrada do Araçá, hoje rua Heitor Penteado. Estrada da Terceira Divisão, em Sapopemba, parece que ainda mantém o nome. Estrada de Guarulhos virou avenida. Estrada velha do Morumbi virou rua com outro nome (não se trata da avenida Morumbi). Era a estrada velha para chegar à fazenda, que ganhou o nome “velha” quando se abriu a “nova”. Idem com a da Penha, já citada. Estrada das Boiadas, que se tornou avenida Diógenes Ribeiro de Lima nos anos 1960. Olhem o tamanho do nome. E originalmente ela seguia pela rua que hoje é a Groenlândia, nos Jardins.

O nome Estrada do Pêssego desapareceu, em Itaquera (sobrou a avenida Jacu-Pêssego, nome não-oficial e caindo em desuso, porque há outro hoje). Estrada de Itaquera virou avenida. Estrada do Iguatemi virou nome de gente e não era a rua Iguatemi: a estrada fica lá em Sapopemba, na divisa com Mauá.

E por aí vai. A história também se vai dessa forma. Voltarei ao assunto.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

UMA HORA E TRINTA E CINCO MINUTOS

A Marginal do Tietê no início deste mês, quando foram abertas parte das novas pistas. O congestionamento continua. (Foto O Estado de S. Paulo)

Hoje fui para o escritório mais cedo do que de costume. O caminho foi o mesmo: Alphaville – Castelo (via pedagiada) – Marginal Pinheiros – Ponte da Eusébio Matoso – Eusébio Matoso até a esquina da Faria Lima. Estou falando da Grande São Paulo, a maior área metropolitana do Brasil em população, e infelizmente também em número de veículos.

Saí de casa às 7h25 da manhã e cheguei ao meu destino às 9 horas. Uma hora e trinta e cinco minutos para fazer vinte e cinco quilômetros. Média de velocidade: 16 quilômetros por hora. Hoje foi pior porque o Estado está fazendo obras para o chamado Cebolão, complexo viário que liga as Marginais do Tietê e do Pinheiros e a rodovia Castelo Branco. Mas todos os dias têm sido o mesmo drama. Demora menos quando saio depois das nove, mas não tão menos assim.

Causa? As obras, mesmo. Há três estrangulamentos – o primeiro no quilômetro 18, quando diversas filas de veículos se formam e ocupam todas as pistas da via pedagiada para passar para a via central; o segundo no quilômetro 17, porque lá na frente, no quilômetro 14, se formam de novo filas para entrar na via central, causadas pelos veículos que saem das ruas de Osasco que desembocam na Castelo Branco; e o terceiro na junção com a Marginal do Pinheiros, onde as obras estrangularam a pista e somente passa um veículo por vez. Depois, é o eterno transito lento, devagar quase parando, da Marginal do Pinheiros.

Isto se prolonga desde o mês de julho e deve terminar – se terminar – em dezembro. Durante todo este tempo de obras que se passou, não se viu um policial de trânsito, seja municipal ou estadual (a Castelo é estadual, enquanto as ruas que nela desembocam são municipais, e no quilômetro 14 há a divisa de municípios entre Osasco e São Paulo).

Na verdade, o problema acontece durante o dia e a noite toda, somente não existindo na madrugada. Os motoristas, mal-educados e sem a menor paciência (pode-se culpá-los por este segundo item?) estão cansados. Mas isto não incomoda o governo, que pouco se lixa para tudo isto.

Pior: não há grandes perspectivas de se melhorar o problema. As obras que estão sendo feitas não vão resolver os congestionamentos da Marginal do rio Pinheiros nem do rio Tietê. Então, de que adianta aliviar a Castelo Branco e, neste momento, causar-lhe o caos total?

Por que não há guardas para organizar e orientar os motoristas que fazem o que querem sem se importar com os outros? Aliás, por que não há policiais de trânsito em algum lugar da cidade todos os dias? Quando há, eles estão multando. E multando quem está burlando o rodízio municipal de placas ou usando telefone celular enquanto dirige. O resto? Dane-se.

Agora vem o mês das compras de Natal junto com as obras. Ai meu Deus.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

LEMBRANÇAS DO RIO PIRACICABA

A estação da Paulista em Piracicaba, os bondes, os velhos carros. Isso foi antes de eu conhecer a cidade, a foto parece ser do início dos anos 1950.

Como já escrevi por aqui, meu pai adorava viajar. Em muitas dessas viagens ia de carro e levava a família: minha mãe, eu e minha irmã. Só que o carro que ele teve na virada dos anos 1960 não era tão confiável assim. Era um Studebaker 1951, que ele comprou em 1959. Naquele tempo, os carros nacionais começavam a ser fabricados e ainda havia muitos modelos estrangeiros rodando — alguns bem antigos.

A chapa era 5-99-98. Escrita assim, mesmo, com o sempre presente (no caso) SÃO PAULO-SP em cima dos algarismos. Não era como hoje, em que existe uma outra placa no lado de cima da placa maior com essa escrita (ou da cidade que for o caso). Era a própria placa que a tinha. A outra plaquinha era o licenciamento: quando o carro era licenciado – anualmente, como hoje – era trocada a plaquinha do ano anterior pelo atual. Fomos a Piracicaba com o carro porque era uma cidade relativamente próxima – uns 150 km. Via Anhanguera, depois a estrada que liga Nova Odessa a Piracicaba passando por Santa Bárbara d’Oeste. Foi a primeira vez que fui à cidade.

O motivo da viagem foi o de sempre: reunião da SBPQ. Tanto meu pai como minha mãe participavam todos os anos. Nesse caso, julho de 1961, ficamos na casa do tio Homero e da tia Zizinha. Era na rua Prudente de Morais, uma casa antiga, na ladeira. Não sei se ela ainda existe. Meus tios-avós infelizmente já se foram.

Piracicaba ainda tinha bondes. Ainda tinha a linha e os trens da Sorocabana. Ainda tinha os trens da Paulista. Ainda tinha peixes no rio. O rio ainda não cheirava mal.

Lembro-me de sair a pé com meus tios durante o dia para ir, sei lá, comprar algumas coisas. Mas do que me lembro bem foi de uma ida ao rio Piracicaba de carro – o rio não era tão perto assim da casa deles. Papai parou o carro junto às pedras do rio, acredito que na margem do lado da cidade (difícil de ter certeza), bem perto do famoso salto.

Eu descobri que ali existia um arvoredo que dava o que eu chamava de “fichas”, na verdade, vagens maduras e marrons que quando se abriam tinham seus “feijões” dentro, e eu os chamava de fichas. Eu ficava atirando as fichas no rio. Até que meu pai descobriu que ele tinha perdido o chaveiro com a chave do carro e provavelmente entre as pedras ou dentro do rio. Aí foi um fuzuê.

Não havia jeito de conseguirmos achar a chave nem de abrir a porta. Até que eu me lembrei e disse para o papai que a gente deveria ver se o porta-malas estava aberto. Ele não sabia por que aquilo poderia resolver o problema, mas eu sim. Estava. Eu entrei no porta-malas e daí para o interior do carro (habitáculo??) passando por entre o banco traseiro e o porta-malas, aquela espécie de prateleira que os carros tinham e se jogavam revistas, pulôveres e mais um monte de bugigangas. Por algum motivo era ela removível, e, embora eu soubesse disso, meu pai não sabia.

Salvei o dia. Naquela tarde, eu fui o herói. Abri o carro por dentro. Chamamos um chaveiro e ele refez a chave. Não antes de meu pai fazer “ignição direta” e levar o carro para a casa do tio Homero. O chaveiro foi lá, claro.

Meu Deus, que saudades de tudo isso.

domingo, 15 de novembro de 2009

A HISTÓRIA DA SUA CIDADE

Crianças na escola em Cerqueira César, SP, em 1914. A cidade se chamava Três Ranchos em 1890. Quem escreveu sua história? (Foto do Album Ilustrado, 12.05.1914)

Quem tem interesse em saber a história das cidades brasileiras tem uma enorme dificuldade. É claro que existem exceções, mas a regra é: nem tente achar nas livrarias. São poucas as cidades que têm em suas livrarias algum livro sobre a história da cidade. Em muitos casos eles até foram escritos, mas também em muitos casos já se esgotaram e não houve reedição.

Tente a Internet. Ache pouquíssimos textos, difíceis de ser localizados. Para um sujeito como eu, que as vive procurando (especialmente, mas não necessariamente, se for alguma cidade que tem ou um dia teve ferrovia), é frustrante. Às vezes acho, mas o texto tem poucas linhas e não esclarece coisa alguma.

Para saber a história de muitas cidades, é necessário pesquisar em diversos livros, alguns esgotados e que são achados por acaso. Ou na Internet, a mesma coisa. A Wikipédia tem histórias em algumas cidades, em outras não – digamos, na maioria. Não é culpa dela, é que ninguém se interessa em escrever, mesmo.

São Paulo tem hoje diversos livros de sua história por causa dos seus 450 anos comemorados em 2004. Belo Horizonte pelos seus cem anos em 1997, mas neste caso a maioria é achada hoje em sebos apenas. Campinas não tem um livro recente de história da cidade (não estou falando de assuntos específicos, onde há alguns, também difíceis de encontrar).

As pessoas hoje em geral querem ver fotografias antigas. Há cidades, como Ribeirão Preto, Jaboticabal, São José dos Campos e outras, que mostram fotos antigas e pouquíssimo texto. O ideal é ter os dois. Quem quer ver fotos, fique só nelas. Texto, só nele. Se quer ambos, tem os dois. Santos tem livros de histórias em livrarias – pelo menos em uma que conheço, junto à avenida Anna Costa. Há cidades relativamente pequenas que resolveram investir em algo bem feito e lançaram livros magníficos sobre a cidade, como Santa Rita do Passa Quatro, Guariba (SP), Lapa (PR) e Sacramento (MG). Não que sejam as únicas: afinal, estas são as que me vieram agora à cabeça, alem do fato de o Brasil ter mais de 5 mil municípios e eu não ter ideia de muitas cidades que lançam seus livros.

A cidade onde vivo há quase 30 anos não tem livros sobre ela, com a exceção de dois já esgotados, um escrito em 1925 e outro reeditado em 1971 – o original também é de 1925. Recentemente o prefeito quis que se escrevesse um livro de história sobre a cidade atualizado. Não passou da ideia. A cidade é Santana de Parnaíba, tombada pelo CONDEPHAAT e um dos municípios mais antigos de São Paulo – data de 1625.

O que há, gente? Ninguém se importa mais com isso? Recentemente consegui um livro de uns dois ou três anos atrás sobre um bairro de um município paulista. É verdade que ele foi município por dois ou três anos nos anos 1930, mas é um bairro e dos pequenos! Muito legal a iniciativa de quem o escreveu!

Por outro lado, detesto livros que se dizem de história municipal mas têm mais da metade das páginas falando dos políticos que ela tem ou teve, a enorme maioria insignificantes. Uma cidade é uma cidade, seus políticos não são a sua história. Lembrando sempre que políticos municipais (assim como os estaduais e os federais) são em sua quase totalidade medíocres.

Se v. souber de algum livro da história de uma cidade – porque geralmente só se sabe que é lançado na própria cidade – corra para adquirir o seu, pois no ano que vem ele somente existirá em sebos.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

O CIRCUITO DA GÁVEA

Eu nem conhecia ainda o Rio de Janeiro e já sabia que existia, ou havia existido um dia, o “circuito da Gávea”. Não sabia o que era, nos anos 1960. Tanto que a primeira vez que fui ao Rio, fui com minha namorada (atual esposa, a bela Ana Maria), que é carioca, e quando olhava nos mapas da cidade e via a Gávea ficava curioso. Mas que circuito era aquele que eu ouvira falar? De corridas?

Sim, de corridas. Olhando nos meus papéis velhos, na “Noite Ilustrada”, precisamente de 7 de junho de 1938, aparece um mapa do circuito. Na verdade, é uma página solta da revista, separada por meu avô naquele tempo, para colocar em seu fantástico arquivo. Ele adorava mapas. Veja-o acima.

A revista dizia que a prova “se inscreve entre as mais difíceis do mundo” e que os argentinos a chamavam de “o trampolim do Diabo”. Reparem que no mapa há números. De acordo com a revista, o número 1 é a saída, rua Marquês de São Vicente; o 2, a entrada do canal; o 3, o local de chegada; o 4, a Gruta da Imprensa; o 5, a Lagoinha; o 6, a Serra; o 7, o trampolim do Diabo; o 8, a rua Marquês de São Vicente.

Entre o local de chegada e o da cronometragem, o local da Rádio Nacional, que “fará, com das vezes anteriores, uma transmissão sensacional dos mínimos detalhes da grande prova”.

Eu conheço pouco a Gávea, embora após 1972 tenha ido diversas vezes ao Rio. Não sei onde são os lugares citados. Conheço só o tal canal, mas não sei o nome da rua por onde ele passa. Não sei, também, o que são no mapa as cruzes maltadas. Seriam os tais pontos de cronometragem? E porque a chegada ficava num ponto diferente da saída num percurso fechado?

E o Trampolim do Diabo? Era um ponto da pista ou toda ela? Afinal, a revista fala que os argentinos chamavam a prova com esse nome, mas o mapa cita um ponto.

Quando terá sido a última prova da Gávea?

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

LOLLIO DO PORTO


Até uns quinze anos atrás, o “tio Lollio” era um dos fantasmas da minha família. Era um quadro (foto acima) na copa da casa de minha avó. Quem era Lollio? Vovó Maria dizia sempre para mim que foi um irmão dela que morreu solteiro muitos anos antes. “Como ele morreu?”, eu perguntei.

Vovó respondeu que “houve um incêndio num cinema no bairro do Brás e ele, como um monte de pessoas, correu para ver. Foi de bonde. Na volta, numa curva que havia para o bonde entrar na avenida Celso Garcia, como eram duas linhas e os bondes estavam lotados de gente pendurada que iam e vinham de ver o tal incêndio – era bonde aberto naquela época – os dois se chocaram de lado (ou melhor, as pessoas se chocaram de lado) e muita gente saiu ferida ou morta no acidente”.

Eu não sei se houve mesmo o tal incêndio, se foi num cinema ou não e se houve mesmo muitas mortes e feridos, ou se isso era uma história que teria chegado distorcida aos ouvidos de Maria, que, nessa época, nem morava nem conhecia a cidade de São Paulo, muito menos o Brás. O fato é que ela dizia que Lólio não morreu no acidente, mas morreu uma semana depois em consequência dele, e do coração.

Isto é que eu sabia dele, coisas que ouvi uma ou mais vezes na minha infância quando ia à casa de vovó na Vila Mariana, anos 1950, 60.

Em 1995, quando consegui os arquivos de vovô, guardados por quase 50 anos no fundo de um armário, eu saquei de lá uma porção de preciosidades em termos de história da família e mesmo de São Paulo e do Brasil. Um dos recortes de jornal tinha o título: “Lollio da Silva Oliveira”, assim mesmo, com dois ll e sem acento no o. Aí ele começou a deixar de ser um fantasma e tomar forma – ele evidentemente viveu um dia, ali estavam as provas.

Na notícia, que era a de seu enterro no dia 28 de agosto de 1921, em “Porto Ferreira, às 13 e meia horas, do inditoso moço”, havia sua vida resumida: ele nasceu em 1896 e tinha, portanto, 25 anos; a morte foi por pneumonia (e não do coração); ele era músico e pertencia a uma corporação musical, ao mesmo tempo em que estudava no segundo ano mixto (na época, era com x mesmo) da Escola Normal de Pirassununga. Pelo recorte, “estiveram presentes todas as autoridades federais, estaduais e municipais da localidade”. Havia funcionários federais no Porto (que era como os habitantes de lá sempre chamaram a cidade)?

Seu túmulo tinha diversas coroas, enviadas pela família e amigos. Havia uma em que estava escrito: “Ao Lollio, todo o amargor de sua noiva”. O que teria acontecido com ela, cujo nome eu jamais soube? Curiosas também eram as coroas enviadas com o dito “sentidas lágrimas de suas amiguinhas de Porto Ferreira” e “Ao Lollio, homenagem das normalistas viajantes” – provavelmente as que viajavam no trem da Paulista até Pirassununga com ele. Seria ele um mulherengo contumaz? Com 25 anos na Escola Normal, ele estava atrasado nos estudos. Boêmio que não ligava para os estudos?

Segundo outras informações que consegui, ele tocava flauta e era compositor de valsas, como a “Lágrimas de Carmen”, música a qual jamais ouvi. Enfim, o que fazia Lollio, que morava no Porto, em São Paulo, no Brás? Pelo que descobri, o único dos seus irmãos que morava na Capital na época – eram 13 irmãos no total e ele foi o segundo deles a falecer – era o Maneco, justamente o mais velho, 13 anos a mais do que ele. Estaria ele o visitando ou passando uns tempos ali? Se ele jamais tivesse ido ao Brás, teria ele morrido de pneumonia?

Enfim, Lollio foi mais uma das pessoas que morreram jovens, mas que aparentemente foi um sujeito feliz.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

O TAV (OU TAD?) E A VELHA RIO-CLARENSE


O Diário do Povo de Campinas publicou hoje uma reportagem sobre o TGV, também chamado de TAV (Trem de alta velocidade) ou Trem-bala. Pelo que as prefeituras falam, parece que o nome será TAD – Trem de Alta Dificuldade.

Cada prefeitura consultada impõe alguma dificuldade (leia-se mudança de traçado), mas querem os empregos que ele gerará. “As que terão estações esperam o desenvolvimento econômico que virá com os passageiros, enquanto as demais contam os prejuízos com o impacto ambiental, com as desapropriações, a segregação de bairros, a destruição de lavouras e tentam mudar o trajeto”. Dá para construir uma estrada de ferro e contentar a todo mundo? Estrada de rodagem não causa o mesmo efeito?

Em Campinas, o prefeito não quer o pátio de manobras no velho pátio (de lá a linha segue para Viracopos), para “não inviabilizar o megaprojeto imobiliário elaborado pelo escritório do arquiteto Jaime Lerner”. Ora, cancele-se o projeto, que sem dúvida pode ser feito em outro local e nem é importante para a cidade, sinceramente. Ele quer que o pátio seja em Boa Vista, local hoje perigosíssimo nos subúrbios da cidade. Em Itupeva, a linha deverá passar entre condomínios de casas de alto padrão (vem a pergunta: se fossem casas simples, ele também reclamaria?). O prefeito quer colocar a linha às margens da Rodovia dos Bandeirantes.

Em Jundiaí, a estação está prevista para ser junto ao entroncamento das rodovias dos Bandeirantes e Anhanguera. A Prefeitura quer mudá-la de local, por motivos que mais parecem enrolação do que algo plausível. Em Caieiras, o prefeito não quer porque segundo ele a cidade seria cruzada por um elevado sobre um hospital, a sede da prefeitura etc.. Em São Paulo, Capital, ainda se discute se vão ou não colocar a estação na Barra Funda – o local mais lógico por ter acesso por trilhos. Já em Guarulhos, onde haverá a estação do aeroporto, o prefeito quer ficar com as oficinas, etc na cidade. Já no Vale do Paraíba, tudo que é cidade quer sua estação. Assim, vai ser trem rápido de que forma, parando até em caixa dágua, como se dizia antigamente? Em São José dos Campos, também se quer colocar a estação longe da cidade. Se for assim, melhor nem tê-la.

Enfim, a reportagem trata de ouvir opiniões de diversos setores nas cidades paulistas da via, e tem gente que quer e gente que não quer. O problema é que quem não quer vai criar problemas, porque geralmente são as Prefeituras.

No fim, esse trem parece a Companhia Rio-Clarense, que apareceu em 1884 e foi comprada pela Paulista oito anos depois: todo fazendeiro acionista queria que a linha passasse na fazenda dele. Resultado: saiu uma porcaria, que a Paulista demorou anos para consertar. No TGV, quase todo prefeito entrevistado quer que a linha não passe na cidade e com isso quer modificar o traçado. Ou seja, desse jeito vai sair uma porcaria – se sair alguma coisa.

Os trechos em itálico e entre aspas são transcritos do jornal e escritos por Maria Teresa Costa.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

A ÚLTIMA VIAGEM DE TREM


Para mim, a última viagem de trem foi em 13 de maio de 1998. Peguei o carro, deixei num estacionamento perto da estação de Sorocaba e comprei um bilhete no hall da estação para pegar o trem das seis (o único, aliás, que saía dali) para Apiaí. Curiosamente, esse trem não tinha nem um ano de idade – foi a última linha criada pela Fepasa, no final de 1997. Era diária e era um trem de longo percurso regular de passageiros.

Nessa época ainda existia o trem Julio Prestes-Presidente Prudente, também diário. Em Presidente Prudente se podia tomar outro trem para Presidente Epitácio. Na linha da ex-Sorocabana, eram só estes.

O trem para Apiaí saiu às seis pontualmente (é, de vez em quando eles ainda eram pontuais). A primeira estação onde ele parou foi Iperó. Nenhuma antes. Ali ele saía para o ramal de Itararé. Parou em Tatuí, Morro do Alto e chegou a Itapetininga. Lá soltaram a elétrica (uma Loba) e engataram uma diesel. Algum problema deu. Muitas pancadas e 45 minutos mais tarde, ele partiu para o interiorzão.

Parou em Rechan – como em Itapetininga, muita gente estava esperando o trem nessa estação que ficava num pequeno bairro rural. Eles estavam ali só para ver o trem chegar e partir. Um ou outro embarcou e desembarcou. O trem estava quase cheio. Era um sucesso. Conversando com passageiros, eles em sua maioria afirmavam que tomavam o ônibus para Sorocaba de manhã, faziam o que tinham de fazer e voltavam de trem.

Era um carro restaurante e dois de passageiros. Confortável. Tinha o bilheteiro, que checava, uniformizado, as passagens de quem entrava. Conversando com ele, soube que ele morava em Peruíbe. O trem parou também em Engenheiro Hermillo, Angatuba e Buri, Itapeva, também. Toda as estações com muita gente. Mesmo a de Itapeva, já perto da meia-noite.

Aí parou em Nova Itapeva, já no ramal de Apiaí. De Itapeva para Itararé, os trilhos já estavam nessa época cobertos de mato, sem movimento havia anos. Depois de Nova Itapeva, ele parou em uma ou duas estações antes de Apiaí: Entroncamento e Nova Campina, esta, na verdade, uma plataforma de concreto sem nada. Um Volkswagen estava esperando às duas da manhã uma senhora que desceu ali. A esta altura o trem já não estava cheio, mas estava longe de estar vazio.

Em Apiaí ele chegou às duas e meia. Desci na estação, fora da cidade, e fui dormir no banco da estação. Uma hora mais tarde, ele partiu novamente. Antes, claro, subi no trem e dormi até acordar em Itapeva, onde esperamos mais de meia hora para que se tirasse um cargueiro do desvio principal em Buri. A estação de Itapeva estava já em início de deterioração, mas estava aberta e tinha chefe. Dormi de novo, para acordar não muito depois com o nascer do sol perto da estação de Engenheiro Bacelar. Uma maravilha.

Na volta, mais conversa, parando nas mesmas estações e vendo um grupo de pequenos estudantes entrar em Tatuí para fazer uma excursão a Sorocaba. Antes, já havíamos trocado outra vez de locomotiva em Itapetininga, desta vez uma troca feita em apenas 15 minutos. Chegamos em Sorocaba pouco depois do meio-dia. Peguei o carro e fui para São Paulo.

Depois disso, somente trens turísticos e da CPTM. Pena. Mas valeu muito a pena. Esse trem ainda durou até março de 2001. Foi um dos quatro últimos do Estado a ser cancelados pela FERROBAN nesse dia.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

MEU REINO POR UMA MÁQUINA DO TEMPO

Serraria em Valinhos do Sul, ao sul de Ponta Grossa, PR, anos 1920

Em várias vezes em que estava escrevendo algum artigo ou mesmo livro tive de me transportar no tempo. Não, isso não significa que eu tenha encontrado uma máquina do tempo. Significa que, para se escrever sobre fatos históricos, a melhor coisa para fazer é tentar pensar com da mesma forma que as pessoas que viveram naquele tempo.

Não é fácil, mas pode-se tentar. Cansei de ler livros onde os autores falam de cem ou duzentos anos atrás (e até muito mais!) comentando que (agora, um exemplo) homens como Percival Farquhar foram os destruidores de nossa flora, ao construírem uma enorme fábrica, moderníssima para a época, e ali massacrarem as árvores que existiam em Santa Catarina e no Paraná. Repito: é apenas um exemplo.

Ora, esses escritores comentam isso porque não tentaram pensar como se pensava há cem anos atrás. Naqueles tempos, derrubar árvores a três por dois era mais do que comum e um enorme sinônimo de progresso. As árvores derrubadas gerariam dinheiro e também deixariam os campos livres para plantações e para pasto de gado e outros animais, gerando a riqueza da região.

Ora, falando especificamente nesse caso, isso seguiu ocorrendo, mais lentamente ou mais rapidamente em outros locais, como no Norte do Paraná, em todo o oeste virgem do Estado de São Paulo, em Rondônia e no Amazonas, este bastante recentemente. O caso das derrubadas das matas na Amazônia é tão recente que se confunde com os nossos dias. A imprensa denuncia quase todos os dias enormes desmatamentos por lá, levantando sempre a ameaça de mudanças climáticas e de aquecimento global.

Acham que há cem anos as pessoas e a imprensa estavam preocupadas com isto? Raras vezes poder-se-ia achar alguma coisa contra tudo isso na imprensa ou na literatura. Não digo que nunca tenha existido, mas eu jamais encontrei algo assim nos jornais de muitos anos atrás.

Por isso, julgar-se Percival Farquhar e sua Brazil Railway, junto com a sua Lumber de Três Barras, como um ser irracional que sorria ameaçadoramente quando se lembrava das árvores caindo é ver filmes demais de terror. Os ingleses que chegaram vinte anos depois dele no Patrimônio Três Bocas – local onde se iniciou a construção da cidade de Londrina no meio da selva – tinham até incentivos governamentais. Ninguém protestou contra a criação de grandes cidades entre 1929 e 1950, pico das fundações de cidades como Londrina, Apucarana, Jataí, Maringá e Cianorte, entre outras, no Norte do Paraná.

Portanto, chamá-los de coveiros das florestas nacionais é insensato. Eles destruíram amplas áreas de floresta virgem? Sim. Mas, se não fossem eles, seriam outros, mais lenta ou mais rapidamente do que quem realmente coordenou tudo isso. Tudo porque naquela época se podia fazer isso. Assim como se podia traficar e escravizar negros no mundo até o final do século XIX, especialmente no Brasil. Alguém protestava na época? Poucos – é certo que os protestos contra a escravidão aumentaram muito depois que os ingleses fecharam o tráfego pelos mares em 1850. Portanto, em algum momento isso parou, parou a escravidão também. Mas que não se condenem os homens que tinham escravos – pois essa situação era absolutamente normal naquela época.

Hoje, não. Derrubar árvores nativas é crime, escravizar pessoas independentemente de sua cor também é. Existem muitos outros casos de pensamentos completamente diferentes dependendo da época. Portanto, tomemos cuidado ao escrevermos sobre história.

Outro exemplo: discutir a possibilidade de um certo fator ter acontecido para colaborar com o crescimento de uma ou outra cidade, por exemplo. Somente não podemos deixar de saber que os relatórios, biografias e histórias do cotidiano das cidades do início do século 20 e do final do 19 mostram que todas elas eram belas e maravilhosas, as cidades eram todas ótimas para investimentos, climas ótimos, terras maravilhosas para as plantações, os homens eram todos honestíssimos, nos relatórios ninguém mentia. O mal não existia...

É por isso que homens como Napoleão e Luiz IX de França são considerados heróis nacionais. O último foi até canonizado (São Luiz). Tudo porque, em suas épocas, matar milhares de inocentes era perfeitamente normal para se ter poder. Não o é hoje. Vamos cassar então a fama de Napoleão e de São Luiz dos franceses por isso? Jamais.

domingo, 8 de novembro de 2009

DESABAFO

A ponte de pedras, chamada Ponte do Peixoto, foi construída pela E. F. Dom Pedro II durante o Império. Com o fim deste a ferrovia tornou-se a Central do Brasil. Esta magnífica obra de arte está abandonada no meio do mato, embora seus trilhos ainda estejam cruzando-a e a concessionária tenha abandonado a linha - parte da bitola métrica da Linha do Centro na região de Rio Acima, MG.

Esta semana chegaram-me notícias sobre a inauguração que deverá acontecer logo, logo, de um trem turístico na localidade de Rio Acima, em Minas Gerais. Entretanto, em listas de discussão falou-se sobre o abandono da linha métrica da Central nessas região. Falou-se muito também sobre a quebra de bitola em Lafayette, aliás assunto do meu blog no dia de ontem.

Aí, vieram os desabafos, ambos de um conhecido pesquisador ferroviário e morador em Belo Horizonte, uma das pessoas que mais me manda fotografias e informações para meu site de estações ferroviárias. Optei por transcrevê-los abaixo. Não sou somente eu que fico revoltado com o abandono das ferrovias no País.

Caros, excelentes textos, parabenizo-os por esta e as mensagens anteriores de mesmo tema. Entretanto, já em pleno século 21, continuamos a pagar o preço da chamada "quebra da bitola" cuja decisão, se política, militar, econômica, vaidade pessoal, falta de visão de futuro, seja qual tenha sido, nos coloca na ridícula situação de operação ferroviária com duas bitolas distintas, algo absolutamente irremovível, obrigando-nos a transbordos, linhas mistas, rivalidades e tudo o mais de ruim que a bitola diferente possa trazer. Isto é o Brasil, país exótico do esquecido e longínquo cone sul das Américas, vivendo suas idiossincrasias e suas bobagens seculares”.

Logo depois, veio o segundo desabafo:


“Caros, tenho acompanhado a troca de mensagens decorrentes da incursão do último domingo, Sabará, Honório Bicalho, Linha do Centro às margens da Estrada Real, Rio Acima, túneis abandonados – as fotos publicadas, todas do Pedro, ocasionaram discussões filosóficas, sobretudo comportamentais do brasileiro comum, opiniões sobre a gestão do bem público (nossos governantes sabem o que é isso?), etc, etc.
À parte das surpresas agradáveis, como o trem turístico de Rio Acima, ganham ênfase, nos nossos corações ferroviófilos, o abandono, a destruição e o descaso.

O fenômeno é inexplicável, pelo menos quando se apela ao bom senso - se se dispõe de uma infraestrutura de transporte, como na região entre Rio Acima e BH, como podem os governos relegá-la ao abandono, gerando perdas financeiras incalculáveis e a substituindo por transporte rodoviário de péssima qualidade e altíssimo nível de risco, como presenciamos aqui, a cada dia?

Abandonado o bem público ferroviário é saqueado, isto é o que vemos em nossas incursões. Nada sobra, tudo é reaproveitável nas construções miseráveis e improvisadas que vemos aumentar a cada dia nas periferias das cidades, mesmo as cidades pequenas como Rio Acima. Ocupação insana, migração irrefreável do campo para as cidades, está é a imagem que sempre nos recebe às margens das nossas ferrovias abandonadas e relegadas ao ostracismo e ao saque.


Solução? A meu ver, não há. A conjunção de fatores, ou sejam, abandono do governo, saques, destruição, má educação, desrespeito, contratos de concessão absurdos (a concessionária tem que manter o que recebeu, mas eu duvido que isto se cumpra, a ANTT é um fantoche, a exemplo de qualquer órgão governamental), é perversa, pervertida e cruel.
Resta-nos, como diz o Pedro, fotografar agora tudo o que pudermos porque nossas fotos serão a única testemunha de que algo ferroviário existiu. Tudo o mais vai sumir na voracidade da ocupação humana
”.

Concordo com praticamente tudo o que ele escreveu acima. E gostaria de não concordar, de ter provas cabais para desmenti-lo, mas não as tenho. Sinto muito por isso.

sábado, 7 de novembro de 2009

QUEBRA DE BITOLA

Diferentes bitolas em Lafayette, MG. Larga à esquerda, métrica à direita. Foto de Julio Cesar da Silva, maio de 2009.

“O que ser isso?”, como diz um amigo meu. Bem, os loucos como eu, que gostam de ferrovias e de suas histórias, explicariam que quebra de bitola é a mudança da bitola dos trilhos quando se passa de uma ferrovia para outra – ou mesmo dentro da mesma ferrovia. Talvez o mais famoso caso brasileiro seja o caso da Linha do Centro da Central do Brasil.

Ela construiu a sua linha do Centro entre 1858 e 1910 – ano em que chegou a Pirapora, às margens do São Francisco – em bitola larga (1,60 m) até chegar à estação de Lafayette, em Minas, estação atingida no final de 1883, a 462 quilômetros da cidade do Rio de Janeiro. Dali até Pirapora, a linha foi construída em bitola métrica. Por que a quebra de bitola na sua linha principal?

O assunto foi bastante discutido esta semana em uma das listas de discussão que existem na Internet no meio dos pesquisadores ferroviários. O fato é que, seja qual tenha sido o motivo da quebra naquele ponto, é realmente mais barato construir linhas de bitola mais estreitas, pois o custo de cortes, aterros, pontes, viadutos, túneis etc. é mais baixo. No entanto, há grandes custos que seriam evitados se a bitola fosse constante: são os da baldeação de materiais e de passageiros, das manobras de locomotivas, carros e vagões e das horas de serviço de funcionários.

Depois de 1926, com a finalização do ramal de Corinto a Montes Claros, a Linha do Centro passou a ser a linha Rio-Montes Claros, com Pirapora tornando-se ponto terminal de um ramal. Em 1948, a Central seguiu a linha de Montes Claros até Monte Azul. Tudo isto, no entanto, continuava em bitola métrica.

Mais tarde, na região de Belo Horizonte e por alguns quilômetros para o norte de Lafayette, foram construídas variantes e modificações de linhas que se tornaram de bitola mista na linha do Centro. Belo Horizonte, no entanto, era atingida desde 1919 pela Linha do Paraopeba, onde os trens que vinham do Rio trocavam de linha na estação de Joaquim Murtinho e seguiam pela variante para chegar à capital mineira.

A Linha do Centro, no entanto, jamais teve a quebra de bitola erradicada. No final dos anos 1980, estava em início de construção o prolongamento da linha em bitola larga para chegar a General Carneiro (ponto em que juntavam ao norte as linhas do Centro e de Paraopeba), mas as obras foram abandonadas. Vários túneis dessa linha jamais aberta estão até hoje abandonados ao longo do rio das Velhas.

Em São Paulo, a baldeação obrigatória em Cachoeira Paulista entre a linha da E. F. D. Pedro II que vinha do Rio e a da E. F. do Norte, que vinha de São Paulo, a primeira larga e a segunda métrica, foi um dos principais fatores que levaram a última a ficar em situação financeira precária, a ser comprada em 1890 pela Central, sucessora da D. Pedro. Em 1908, a linha toda já estava em bitola larga.

A Mogiana, de bitola métrica, que se entroncava em Campinas com a Companhia Paulista, da larga, sempre teve fretes mais caros para o café de sua região por causa da quebra de bitola. Existem muitos outros casos a ser relatados pelo Brasil afora.

No entanto, não se espantem meus leitores em saber que em toda a sua história ferroviária, o Brasil já teve cerca de 35 bitolas diferentes em suas ferrovias (incluindo linhas de bondes).

Hoje, existem apenas cinco: a larga, a métrica, a standard (1,44 m) e as estreitas de 60 e de 75 cm – estas duas últimas em curtos trechos de duas ferrovias turísticas e a standard na E. F. Amapá e em uma linha do metrô de São Paulo. Ou seja, a quebra de bitola continua existindo. Em bem menos lugares do que antes, mas está aí causando seus prejuízos.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

REFLEXÕES DURANTE UM PASSEIO A PÉ

Visto de longe, o Votucavaru, ponto mais alto do Alphaville e um dos mais altos de Parnaíba. Ao seu pé, diversos loteamentos Alphaville: o 8, o 9, o 10 e o 11. É muita casa onde até 40 anos atrás somente existia a Fazenda Bela Vista

Depois de passar um mês num hospital na Alameda Santos, operado para colocar quatro pontes de safena, tenho de fazer exercícios. Sou meio preguiçoso, mas agora não tem jeito. Três vezes por semana no mínimo tenho de andar ou fazer esteira.

Aqui no Alphaville, as opções são caminhar pelo condomínio ou sair para a avenida, onde o barulho do tráfego é insuportável. Aí, também posso sair para uma rua que costeia o condomínio e dá no rio Tietê. Não há trânsito nesse caminho, com a exceção de um ou outro carro ou bicicleta de vez em quando. E o desapontamento de ver como as pessoas jogam lixo na rua.

Hoje cedo, andei dentro do condomínio. Cruzei com algumas pessoas fazendo a mesma coisa. Cumprimento todas; se não faço, poucas me cumprimentam e cruzamo-nos então como se fôssemos estátuas andantes. Algumas a quem falo “bom dia” não me respondem de volta. Perdemos a noção de educação e uma das causas disso é o medo dos dias atuais.

O asfalto estava molhado, pois choveu pela noite. Depois de vários dias quentes, hoje estava fresco às nove da manhã. Subo e desço ruas – a área do condomínio é pequena, mas como tem ladeiras. Não há praticamente nenhum trecho rigorosamente plano. O que é bonito, no entanto, é que em muitas ruas começam a se formar túneis de árvores. Em outras, até já há trechos de túneis. Quando me mudei para cá, há exatos 27 anos e meio, era árido, quase como um deserto. As árvores que hoje são altas eram tocos. Havia também pinheiros que hoje foram derrubados para a construção de casas – e nem poderiam deixar de ter sido, pois estavam plantados em área edificandi.

Bem mais tarde, construíram um caminho para andanças no limite sul do condomínio, na área de delimitação com o Parque Ecológico do Tietê. Dali para baixo é um despenhadeiro cheio de eucaliptos que termina nas águas do lago que foi criado quando se retificou o rio nos anos 1970. O caminho é muito bonito, um “yellow brick road”, literalmente. Só faltava Mr. Elton John passar por ali fazendo Cooper.

O caminho é tão bonito que não me canso de andar nele. É sem dúvida a parte mais bonita do condomínio, cercado de árvores – eucaliptos fora, alguns dentro e outras árvores. Pena que ele não circula toda a área, mas isso seria querer demais.

Caminho de 30 a 40 minutos. Se faço esteira, o tempo é o mesmo, mas canso-me mais andando nas ruas por causa das ladeiras. Enfim. É um lugar muito bonito. Não há prédios visíveis, a não ser quando passamos pela área da entrada do residencial, onde o muro se abre e enxergamos alguns prédios ao longe – e até um MacDonalds (argh).

Enquanto ando, ouço o som dos pássaros que não existiam (fora os quero-queros) quando para cá me mudei e que foram chegando com as árvores, muitas frutíferas. O ruído das cigarras às vezes é ensurdecedor e ao mesmo tempo agradável. Ruído de carros, um ou outro que cruza com você.

Infelizmente a especulação imobiliária e a falta de controle – involuntária ou não – da municipalidade permitiu a construção de um pombal de prédios entre o condomínio e o rio Tietê (os compradores logo vão saber o que é o cheiro do Tietê morando literalmente ao lado dele nesses prédios). Quem mora do outro lado do condomínio em relação a onde está minha casa vai ter prédios ao fundo de suas casas. Não é uma beleza?

Não adiante onde estamos, não conseguimos fugir da ganância das imobiliárias. Somos coniventes com elas, porque compramos o que fazem. Durante um passeio, realmente pensamos em muitas coisas para nos distrair... inclusive no que é ruim.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

ERA UM BELO LUGAR

Em 1913, a cidade de São Paulo buscava se tornar uma cidade limpa e livre das epidemias que costumavam grassar nas diversas cidades brasileiras de então. Uma das providências era a retificação de rios (como o Tamanduateí, acima, na esquina com a rua Luiz Gama). Notem que a esquina era do rio, não da avenida do Estado, pois esta ainda não existia.

Uma ponte aparentemente de madeira, simpática e bem feita, dava passagem a esta rua sobre o rio. Era, sem dúvida, um belo lugar, depois da reforma recém-feita.

Hoje, este local tem uma avenida de duas pistas de cada lado, com o rio totalmente tapado – só dá para se o ver pelas frestas debaixo do tampão para quem está nas pistas mais baixas ao lado do rio. Ainda por cima (literalmente por cima) foi construído ali o elevado – bem elevado, realmente – para passar o chamado “Fura-Fila”, que na verdade é uma avenida estreita feita sobre pilares para que passem ônibus que levam à avenida das Juntas Provisórias, mais ao sul da cidade, e que depois seguirão para a Cidade Tiradentes, local tão distante para mim que jamais lá estive (e olhem que eu já rodei pela cidade de São Paulo praticamente inteira).

Não que o transporte esteja errado – é bom que haja esse transporte rápido para locais afastados do Centro – mas os elevados enfeiam demais os locais por onde passam. Os pilares de concreto com as vigas por onde correm a avenida dos ônibus são realmente muito feios. E é difícil de se as tornar bonitos.

Enfim, a foto é apenas um exemplo (foi tirada de uma revista, A Vida Moderna, acervo Paulo Castagnet) de como a cidade um dia foi bonita e hoje com sua monstruosidade tende a se tornar no conjunto cada vez mais feia. Ainda existem rincões bonitos, cada vez menos fáceis de se encontrar.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

RIO ACIMA, MINAS GERAIS

Foto Gutierrez L. Coelho em 1/11/2009

Rio Acima é um município perto de Belo Horizonte – faz parte da Grande Belo Horizonte (região metropolitana) – que acaba de ganhar um trem turístico. Com uma locomotiva a vapor e três carros de madeira que parecem ter vindo da VFRGS (antiga Viação Férrea do Rio Grande do Sul), embora também se diga que pelo menos um deles veio da RVPSC (Rede de Viação Paraná-Santa Catarina). Engraçado, nomes antigos de ferrovias extintas que começam a se perder no tempo.

Rio Acima ganhou o trem que ainda não andou ali, espera-se que o faça antes do final do ano. Esperamos que a cidade tenha mais sorte que vários outros projetos de trens turísticos que, até com as locomotivas e carros disponíveis, não vingaram. O fato é que a locomotiva, segundo o expert carioca João Bosco Setti, é uma Orenstein & Koppel que trabalhou na Usina Cruangi, em Tinabúba, Pernambuco, puxando cana de açúcar por muitos anos. Foi construída em 1924 e andava em bitola de 60 centímetros, mas como tem um interessante sistema que permite adaptar a bitola à vontade do freguês (ainda segundo Setti), foi adaptada pra bitola métrica, que é a medida dos trilhos que (ainda) passam pela estação da cidade.

Aliás, foi um crime o que fizeram com Rio Acima. Era sua pequena estação quase centenária o ponto final de um trem de subúrbio que vinha de Belo Horizonte e se estendia de leste a oeste da cidade, utilizando as antigas linhas da Central do Brasil que possuem bitola mista na capital mineira. Para o sul de General Carneiro, onde a linha do Paraopeba encontrava a Linha do Centro da Central, a linha seguia em bitola métrica.

Por volta de 1993 (esta data é meio confusa, havendo colegas que citam outros anos próximos a esse), com a abertura do Demetrô de Belo Horizonte, Rio Acima ficou a ver navios. Pelo Demetrô, acabaram com o subúrbio, que não era nenhuma maravilha, mas atendia a cidade. E esta ficou sem o seu trem diário — aliás, havia mais de um por dia.

Hoje é atendida por ônibus que trafegam nas péssimas estradas que levam a Belo Horizonte e outras cidades ali por perto. E mais: se quiserem voltar com o trem, terão de repor muitos quilômetros de trilhos roubados durante os últimos anos. Incrível: desde que a linha do Centro foi concessionada à FCA e os trens de subúrbio que por ali trafegavam deixaram de faze-lo, tudo foi abandonado ao Deus-dará. Sabe Deus quantos quilômetros o trem turístico conseguirá rodar a partir de Rio Acima. Provavelmente terão de repor trilhos, além de limpar muito mato.

É fato, no entanto, que a região é muito bonita. As pontes e viadutos de pedra que existem ali por onde a linha passava são maravilhosos, além da paisagem e da floresta que sobreviveu em alguns trechos. Quem andar nesse trem na sua primeira viagem vai fazer uma viagem que não se faz há muitos anos.

Porém, trem turístico é apenas trem turístico. Não é meio de transporte, é quase como um brinquedo. E Rio Acima continuará mal atendida em termos de transportes, ela que já tinha seu trem de subúrbio (fora os trens de passageiros de longa distancia que também já passaram por lá e desapareceram há mais tempo ainda).