segunda-feira, 7 de setembro de 2009

PORTO UNIÃO DA VITÓRIA

Se existem duas cidades que em alguma época da minha vida eu cismei que queria porque queria conhecer, são Viena, na Áustria, e União da Vitória, no Paraná. Acabei conhecendo uma pequena parte de Viena numa noite e na manhã seguinte, quando estive em Milão, em 1995, e tomei um avião à tarde para Viena e depois voltei na manhã seguinte. Valeu a pena? Sim, claro! Viena é belíssima.

Não há comparação entre Viena e União da Vitória/Porto União. Em 2002, comecei a estudar as ferrovias no Paraná e em Santa Catarina e “descobri” que havia uma cidade (ou melhor, duas – gêmeas!) em que a estação ferroviária estava dividida ao meio, com uma metade em cada Estado e o que dividia boa parte delas era a linha da E. F. São Paulo-Rio Grande, depois Rede de Viação Paraná-Santa Catarina. Chamavam-se União da Vitória, no Paraná, e Porto União, em Santa Catarina. Até 1942 existiam duas estações. Nesse ano se completou a estação de União para as duas – depois renomeada como Porto União da Vitória, que juntava os dois nomes (e que já havia sido o nome da cidade no século 19, quando pertencia toda ela ao Paraná e antes de ela ser dividida em 1917).

Junto com meu filho, que também gostou da história e insistiu para que fôssemos para lá o mais cedo possível, aportamos na cidade catarinense de Porto União em 2003, num dia frio de setembro; quando descemos do ônibus (a 10 horas de São Paulo). A temperatura estava exatamente dois graus positivos, às seis da manhã. Fomos ao hotel andando – ficava a dois quarteirões da rodoviária – e deixando as coisas, eu fui (Alexandre ficou dormindo) à estação ferroviária, que ficava a um quarteirão somente dali.

Incrível – não eram ainda sete horas e já havia um enorme movimento de gente. Uma locomotiva a vapor sendo “esquentada”, pois iria sair para um passeio até o pé do Morro de São João, onde a ferrovia sobe mais de 600 metros em 50 quilômetros. Melhor dia para chegar lá, impossível.

Comecei a conversar com as pessoas, que se mostravam intrigadas pelo fato de eu ter viajado dez horas de ônibus desde São Paulo para pegar o trem que sairia de manhã ali. Eu expliquei minha admiração pela cidade e o que me atraía a ela. Porém, voltando à cidade mais quatro vezes pelo menos desde essa época – a última foi no ano passado – me empolguei cada vez mais com a magia que a cidade transmite.

Além da estação curiosa (a foto acima é dela, tomada por Alexandre Giesbrecht em 13/9/2003: do lado direito da linha, Santa Catarina), do fato de atravessar a linha e mudar de estado, noto que embora haja uma certa rivalidade implícita entre as pessoas de cada cidade, há ao mesmo tempo uma amizade muito grande entre eles – ao ponto de que muita gente que lá mora não saber exatamente em que cidade está, dependendo do local (quem for de lá vai negar, mas é isso mesmo). Existe um ponto em que a linha foi retificada em 1950, mas a divisa não – então, naquela parte da cidade, mais ao sul de Porto União, a linha atual passa dentro desta e não divide nada – mas alguns metros mais para oeste, uma rua tortuosa que era o leito da linha anterior tem várias placas de “Divisa de Estados Paraná-Santa Catarina”.

Uma filha de polonês com ucraniana faz casacos maravilhosos para bebês e crianças e exporta para os dois países, além da simpatia com que nos recebe. Ao mesmo tempo, é historiadora da cidade. Na cidade lá no alto do morro, Mattos Costa, a historiadora de lá conta sobre os tempos da Guerra do Contestado, que chegou lá com uma carnificina brutal, mas não chegou nunca a União da Vitória, embora a população tenha fugido uma vez pensando que o ataque fosse iminente (agosto de 1914).

Foi ela que me contou as histórias e previsões do velho monge João Maria. João Maria não era nada bobo; ele tinha bons conhecimentos de geologia, e fez previsões, do alto de um dos morros de Porto União, ao olhar para a pequena cidade do final do século 19, que “quando a cruz caísse, a grande serpente sufocaria a cidade”. A cruz foi colocada por ele em cima desse morro. A serpente é o rio Iguaçu, que serpenteia numa grande curva que pode ser vista do alto desse morro, em volta da cidade. O morro tem terreno arenoso. A cruz caiu em 1905, em 1910 e em 1983, ano das três grandes enchentes da cidade. As águas levaram o solo onde ela estava, da mesma forma que inundaram a cidade varrida pela serpente. A crença no monge somente aumentou por todos esses anos e em todas essas ocasiões. Prova disso é que, quando estive a última vez na cidade, houve – e eu presenciei – às sete da noite a inauguração de um parque no local de onde está colocada a cruz. Políticos, vereadores, prefeito e algumas autoridades estavam presentes e discursando no local, com grande afluência de público. Nota: na hora da cerimônia, chovia bastante. Eu, sem guarda-chuva, fiquei encharcado e tive de voltar para o hotel. Porém, desta vez, a cruz não caiu, e a cidade não foi inundada.

8 comentários:

  1. Quem diria! um post sobre uma pequena cidadezinha, cheia de história, e como diria o próprio escritor com uma "magia que a cidade transmite" por si só. Fico feliz em observar a impressão que a cidade causa nos vizitantes. Mas feliz mesmo fico em ter o privilégio de poder viver aqui, que apesar de de algumas controversias, posso afirmar que ela transcende aos olhos de quem sabe enxergar.

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  2. Pois é, Diego - eu adorei essa cidade. Não voltei mais vezes do que as que citei porque não tive tempo. Mas certamente voltarei, se possível, muitas mais!

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  3. Ralph, no finalzinho de julho saí de Niterói e dirigi uns 1050 km até as Gêmeas do Iguaçu. O motivo que me levou até lá foi uma confraternização entre camaradas de trabalho, sendo que um deles (o idealizador) é morador de Porto União. Passei um excelente fim de semana na região e pude conhecer um pouco da beleza natural das cidades, seus sabores e sua gente. Ah, também conferi o trabalho abnegado dos "Amigos do Trem" e passeei no comboio tracionado pela 310. O resultado disso tudo não poderia ser melhor: fiquei apaixonado pela região. E com certeza terei que voltar lá pra comer mais xixo e renovar o estoque de Steinhäger...

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  4. Fiquei imensamente feliz ao ler sobre União da Vitória e Porto União. Nasci e ainda moro aqui. É uma cidade ótima. Parabéns pelo post.

    E não posso deixar de falar sobre o comentário do nosso amigo Leandro, que citou a Associação Amigos do Trem, a qual o presidente da mesma é meu cunhado, Marcelo Roveda.

    Adorei o post!

    Abraço.

    Josi Rempel

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  5. Adorei ler esse post falando da cidade que nasci e moro atualmente.
    Ja morei em vários lugares desse nosso Brasil, cidades de grande e pequeno porte, mas voltei a morar na minha querida e amada União da Vitoria.
    Obrigada

    Ana Maria

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  6. Sorte sua, Ana Maria. Se eu pudesse, iria morar aí também. Moro em São Paulo. Abraços

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