quarta-feira, 30 de maio de 2012

CENTO E TRINTA E CINCO ANOS DO RAMAL DE SÃO PAULO - E NADA A COMEMORAR

Em 2011, acidente em Cachoeira Paulista com um trem cargueiro: a macabra estação em cena noturna espera sua ruína e seu "tombamento" - no sentido literal da palavra. Dia desses vai ao chão (foto Marco Giffoni)
Em 1977 completaram-se cem anos da linha construída no Vale do Paraíba pela E. F. do Norte (ou E. F. São Paulo-Rio), em bitola métrica. Essa linha partia originalmente de São Paulo, da estação Braz (depois Roosevelt) e se encontrava com a linha (em bitola larga, 1,60 m) da E. F. Dom Pedro II na então magnífica estação de Cachoeira Paulista.

O tempo passou. A E. F. do Norte não aguentou e faliu, tendo sido comprada pela Central do Brasil em 1896. A Central já era então a antiga Dom Pedro II. Com a compra, uniram-se as linhas evitando-se a baldeação obrigatória e custosa em Cachoeira - dizem que isso foi o que "matou" a Norte. Em 1908, a linha entre São Paulo e Rio passou a ser chamada de "ramal de São Paulo". As cidades, cuja produção de café baixava ano após ano com o esgotamento dos solos da região, mesmo assim desenvolviam-se com a ferrovia, usando-a e crescendo com ela.

Trens luxuosos partiam mais duas vezes por dia ligando as duas capitais em aproximadamente oito horas de viagem. Os jornais publicavam diariamente até os anos 1940 as pessoas que por ele viajavam - uma espécie de "coluna social" da época. Era certamente um serviço pago, pois com certeza não se noticiava todas as pessoas, só "algumas". A partir de 1928 o Cruzeiro do Sul passou a ligar com mais luxo as duas cidades. Em 1952 foi substituído pelo Santa Cruz. Outras composições mais simples e até trens mistos iam e vinham diariamente pelo ramal.

A crise de 1929, a Guerra, a chegada da indústria automobilística e o descaso rapidamente foram baixando o nível de qualidade e a confiabilidade dos trens. Os seguidos acidentes da Central do Brasil foram cada vez mais assustando os "nobres" usuários que passaram não tão aos poucos assim a se utilizar dos aviões e de seus próprios automóveis. Cargas pegavam cada vez mais os caminhões. Em 1952, a abertura da moderna - para a época - rodovia Presidente Dutra foi um golpe duro para a ferrovia.

Pois então - em 1977, o jornal O Estado de S. Paulo resolveu publicar uma reportagem para festejar o centenário. Só que o quadro do ramal e das ferrovias em geral era sombrio. Ainda existiam os trens de passageiros singrando ao longo do Paraíba do Sul e subindo e descendo a serra das Araras, mas as estações já não eram as mesmas, dando amplos sinais de abandono. Aos poucos, as de menor movimento foram sendo fechadas e abandonadas, algumas demolidas por esta ou aquela razão.

Na reportagem desse ano, as cidades do Vale em geral queixavam-se da linha. Os prefeitos já tinham a mentalidade que hoje ainda mantêm. O de Lorena reclamava que a ferrovia dividiu a cidade em duas. Era mentira. Em 1877, a cidade acabava na ferrovia, ou melhor, a ferrovia foi construída contornando a zona urbana. Como em diversas cidades, elas atravessaram a linha férrea, não foi esta que passou pelo meio da cidade. Nem na capital paulista isto ocorreu no princípio.

Em Pindamonhangaba, o prefeito reclamava que as passagens de nível eram poucas e as que existiam eram perigosas. Com poucas passagens, estas atrapalhavam o tráfego de automóveis. Alguém hoje pode imaginar qual seria o "grande" tráfego de automóveis em Pinda em 1977, trinta e cinco anos atrás? Era ridículo. Até hoje, o tráfego é pequeno na cidade, que, é verdade, cresceu, de lá para cá, mas não o suficiente para ter problemas sérios de trânsito de automóveis.

A reportagem era realmente constrangedora. Não havia o que comemorar nos cem anos da estrada de ferro que veio para salvar a região decadente cem anos antes e que fora tão bem recebida com festas e bandinhas na época.

Catorze anos mais tarde, o trem acabou. Ficaram os cargueiros. O Trem de Prata, colocado em 1994 para durar quatro anos apenas, não parava em cidade alguma no trajeto. Acabou em 1998. As estações foram sendo cada vez mais largadas. Cachoeira, hoje, está a ponto de desabar. São José está imunda e sem uso. Guaratinguetá chegou a ter perigo de desabar antes de ter sido restaurada há cerca de quatro anos. A de Taubaté está na miséria. E por aí vai. Muitas foram demolidas: Moreira César, Canas, Embaú...

Hoje, pouca coisa mudou - prefeitos continuam se queixando e querendo avenidas. Porém, no mundo inteiro e até no Brasil, a ferrovia é vista como a grande solução. Só que no Brasil as pessoas falam e não fazem. Trens de passageiros, então, parece que somente um milagre tra-los-á de volta um dia. E nós, sentados na estação - quando há bancos - só esperamos.

5 comentários:

  1. É uma pena que o Ramal de São Paulo esteja praticamente entregue somente ao tráfego de minério, pois nem mesmo o AutoTrem (serviço ferroviário de transporte de caminhões entre Rio e São Paulo) não existe mais.

    Os governantes debatem tanto sobre o TAV, mas temos uma ferrovia que não tem muito uso e que pode ser reformada para receber trens pendulares a 220 Km/h em viagens entre as duas capitais, atendendo ao Vale do Paraíba também. Os custos seriam semelhantes, mas os benefícios seriam muito maiores, Ralph.

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  2. Não posso concordar que seja apenas minério no Ramal de SP, existe um tráfego intenso de produtos siderúrgicos e cimento, que nas minhas observações em Crueiro é maior do que o de minério. Sei que acima de Cruzeiro também trafegam outras cargas.

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  3. Eu li e reli a minha postagem e em nenhum lugar eu falei que se transporta aoenas minerio no ramal. Sei que há um imenso tráfego de pranchas com bobinas ferroviárias, por exemplo...

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  4. Ralph, desculpe a confusão, não é na reportagem, são nos comentários.

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