quarta-feira, 7 de outubro de 2009

A VELHA NOROESTE

Interior de um carro de luxo da Noroeste nos anos 1940 e 1950
Ontem me lembraram da Noroeste. Foi o dia de minha palestra – a quarta sobre o assunto – sobre ferrovias no curso do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, na rua Benjamin Constant.

A palestra sempre vai além do horário, por causa da agradável conversa que se toma após a apresentação. O tema sempre gira em torno dos trens de passageiros “e a saudade que eles deixaram”, como diz parte do longo título de meu livro publicado em 2001.

Uma senhora que a assistiu começou a se lembrar das viagens que fez pela Noroeste do Brasil. Com mais de oitenta anos, disse que a última viagem foi sessenta anos atrás. Ao pé da letra, em 1949. E deve ter sido mesmo, porque pelo seu relato o trem partia ainda de Porto Esperança e não de Corumbá. Realmente, ele chegou a Corumbá somente em 1952.

Eram, segundo ela, oito dias de viagem. Oito dias? Mas como? Ora, ela morava em Cuiabá, onde nasceu “num casarão urbano que existe até hoje, de 1840”. De Cuiabá a Porto Esperança eram seis dias de viagem pelos vapores que desciam o rio Paraguai. Mais dois dias até São Paulo, pela Noroeste, baldeando em Bauru para a Paulista e trocando de locomotiva (elétrica para vapor ou diesel) em Jundiaí, onde tomava o comando a Santos-Jundiaí.

Foram várias viagens, segundo ela. Ela adorava. Ela se lembra da “majestosa ponte de ferro sobre o rio Paraná”, da baldeação em Bauru e dos trens da Noroeste, muito bonitos e confortáveis, segundo ela... os únicos senões eram o calor e a poeira, sempre presentes. O trem saía com poltronas limpas de Bauru e chegava com poltronas escurecidas a Porto Esperança.

E Porto Esperança? No meio de lugar nenhum, às margens do rio Paraguai, pequeno e pobre, era nessa época igual ao que é hoje. Ela se recorda da alegria de ver as luzes do vilarejo, ao longe, do barco que chegava depois de seis dias de viagem. Ali pegariam o trem que sempre estava à espera dos vapores.

A partir de 1949, ela passou a vir de avião de linha. Uma viagem que se fazia em oito dias passou a ser feita em oito horas, segundo ela. E que hoje se faz em duas. Mas ela diz que nem as duas horas do avião que ela ainda toma para ir de quando em vez a Cuiabá matam o conforto do trem – até dos vapores ela se lembra com alegria, onde quase sempre passageiros cantavam e faziam serestas para passar o tempo.

E não pensem que a senhora, que tinha um nome longo – dois prenomes e quatro sobrenomes – era gente sem posses. Fazia, e ainda faz, parte da famosa “elite”, tanto citada pelo nosso Presidente que diz que esse pessoal não interessa, interessam os pobres (sem comentários).

A simplicidade fazia parte dessa época. Claro, no entanto, que substituir uma viagem de oito dias por uma de oito horas valia a pena, cansava muito menos, mas não era a mesma coisa. Como ela diz, era outra época, eram outras pessoas.

A Noroeste hoje sobrevive no nome da ferrovia, que continua sendo pronunciado, embora oficialmente não exista mais, no clube de futebol, no banco recentemente extinto e que tinha esse nome, na zona das cidades que a ferrovia percorria e que mantêm o velho nome.

8 comentários:

  1. Prezado Ralph,

    Dia desses ouvi um comentário do Boris Casoy na Radio BandNews que me deixou furioso e muito preocupado. O celebérrimo âncora comentou sobre uma notícia lida por outra apresentadora na qual o prefeito Kassab tinha se declarado "com a pulga atrás da orelha" por conta do projeto de readequação do Campo de Marte para que a área venha abrigar um pátio de operações para o futuro trem de alta velocidade. A notícia dizia que o alcaíde se mostrava incrédulo quanto a viabilidade do projeto tendo em vista a carência de espaços na cidade e a área do Campo de Marte estar no limite para suportar qualquer remanejamento.

    Aí veio o comentário do âncora: "o prefeito Kassab está "com a pulga atrás da orelha" e eu tenho sérias dúvidas quanto a esse projeto do trem bala. Por que desse trem ligando São Paulo, Campinas e Rio de Janeiro? quanto isso vai custar? O transporte aéreo hoje existente não é suficiente? Quanto custará uma passagem nesse trem bala?"

    O motivo da minha furia foi constatar que uma pessoa que se apresenta como sensata e com uma visão aberta, se posiciona contra um projeto moderno e alternativo ao sistema avião - ônbius imposto há alguns anos numa parte do país que tem quatro enormes regiões metropolitanas com quase quarenta milhões de habitantes. Ele deveria ter buscado mais dados para emitir uma opinião tão retrógrada num momento que o país e o planeta precisa tanto de altenartivas de modais de transporte.

    Estou pensando numa forma de me manifestar perante ao respeitado âncora.

    Carlos Alberto

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  2. Eu não acredito que o Campo de Marte seja a única opção para uma estaçào. E ele tem uma grande desvantagem: não há trens chegando nele (metrô, CPTM). Agora, o Kassab fala muita besteira. Deveria abrir menos a boca. E não está fazendo um bom segundo governo.

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  3. muito legal esse post eu trabalho na novoeste e criei recentemente um blog sobre a ferrovia http://diariodeumferroviario.blogspot.com/

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  4. Gostei do seu blog. Tem pouca coisa ainda, mas é interessante ver as ferrovias pelo olhar de um maquinista. Abração - Ralph

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  5. Relendo por acaso o primeiro comentário acima, do Sonof68, e relendo minha resposta a ele, percebi que escrevi uma grande besteira. Não era o Kassab que merecia ser censurado por mim (embora realmente o segundo governo dele deixe a desejar). Era o Boris Casoy, foi ele quem o Son of68 censurou. Eu concordo com o postador. Eu também tenho dúvidas que o TAV saia, mas sou totalmente a favor dele. Acho que o Boris pisou na bola nessa, feio.

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  6. Estadão, 03.09.1917:

    http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19170903-14130-nac-0004-999-4-not

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  7. Estadão, 08.09.1917:

    http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19170908-14135-nac-0002-999-2-not

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  8. Estadão, 06.09.1917:

    http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19170906-14133-nac-0003-999-3-not

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