terça-feira, 13 de outubro de 2009

A PENHA E O GOUVEIA

Está quase pronto “O Monstro da Penha”. Os jornais da última semana mostraram fotos de um edifício (os meus leitores já sabem que odeio edifícios) de sei lá quantos andares, mas alto o suficiente para cobrir a vista de parte da Basílica da Penha, exatamente a sua fachada, geralmente a parte mais bonita de qualquer construção, principalmente religiosa. E mais: a igreja da Penha foi construída num dos pontos mais altos do bairro exatamente para ser vista de longe. Agora, pelo menos de um lado, não vai mais ser vista.

Eu já sabia dele: o Douglas Nascimento, que faz o site “São Paulo Abandonada”, já havia me alertado sobre ele, mandando-me por e-mail uma foto que ele tirou. Dias depois saiu no jornal. Mais precisamente, li a reportagem no Jornal da Tarde do último sábado. Parece que as opiniões estão divididas no bairro. Alguns acham ótimo, outros detestaram.

Eu estou com os últimos. Não moro na Penha, fui poucas vezes em minha vida lá mas conheço o bairro razoavelmente para me decepcionar com o mau gosto desse construtor (e, claro, atração pelo dinheiro, que certamente receberá em boa quantidade). Também preciso de dinheiro, mas teria eu a cara-de-pau de construir um prédio exatamente naquele lugar? Há tantos lugares para isso!

Opiniões de gente que gostou, pois “o prédio trouxe mais progresso para o bairro” realmente me assusta. É essa a noção de “progresso”? Prédios em profusão (e nos lugares errados)? E não é a primeira vez que ouço essa deturpação de o que é progresso. Meu comentário para o Douglas foi exatamente esse: “Eu não entendo por que as pessoas querem 'tanto o progresso' das suas cidades ou bairros. Progresso é encher de prédios os lugares antes ocupados por casinhas? Derrubar árvores e extinguir vegetação por causa disso? Tapar o sol e as belas vistas? Impermeabilizar o solo? Derrubar coisas antigas? Isto é progresso? Mas que estupidez. Nós merecemos, realmente.” Ao que ele respondeu: “Confundem progresso com prédios, confundem desenvolvimento com descaso. É fruto da péssima educação que recebemos no ensino público atualmente, aliado com campanha de desinformação da população.”

Depois da minha frase acima, coloquei outra, logo em seguida: “Aqui em Alphaville (no caso, em Barueri) uma construtora anuncia um prédio ao lado do córrego do Gouveia (esse nome acho que somente eu sei) e taparam o vale do córrego, todo arborizado, com uma cerca de tabuas, anunciando que o prédio terá um parque exclusivo. Que m----! O que era um lugar bonito podendo ser visto da avenida agora não poderá mais? Ora, que pelo menos obriguem os caras a cercarem com grades de forma a que não se perca a vista. Mas duvido. Provavelmente construirão um muro mesmo e a vista em vez do belo vale será um muro horrendo que viverá pichado.”

Devo esclarecer que provavelmente ninguém por aqui sabe onde fica esse córrego, pois ninguém sabe mais esses nomes. Tentarei explicar: ele cruza a avenida Andrômeda, bem próximo já à Via Parque, um pouco antes do viaduto que ali existe, sentido rio Tietê. É um dos poucos lugares ainda virgens de Alphaville. Eu não faço questão que o local seja público (mas que deveria ser, deveria!), mas pelo menos quero ter o direito de admirar o local como sempre tenho feito nos últimos anos, pois passo ali quase todos os dias.

Ah, mas que louco sou eu? Ora, sou só um sujeito que acha que progresso não é construir edifícios de dez, vinte ou trinta andares, mas entre outras coisas aprender a conservar o que já existe de belo.

7 comentários:

  1. O "belo" do "pogresso" é só o que é novo, claro. Pensamentos assim que geraram, entre outras coisas, o monstrengo de concreto na Praça Roosevelt ("Se é de concreto, representa o progresso!"), que degradou a praça e a região, e tantas outras desastradas intervenções. Na poluída Pittsburgh dos anos 1940, considerava-se a poluição sinal de progresso, e ficavam satisfeitos com ela, mesmo quando esta causava uma camada espessa de fuligem em cima de cada copo de leite das crianças!

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  2. "Pogresso" é ver os "populares" metendo o pau no barulho que os trens fazem passando pelas linhas de noite e deixarem os caminhões, ônibus e atuomóveis fazerem muito mais barulho e poluírem muito mais... E dá mais status morrer atropelado por um veículo sobre pneus do que por um trem, embora a chance deste último acontecer seja infinitamente menor do que a primeira...

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  3. Olá Sr. Ralph. Eu de novo. Já que o Sr. falou na Penha (minhas origens), outro "assassinato" a espreita. A antiga fábrica de ônibus C.A.I.O., na baixada da Guaiaúna, já foi pro chão, para dar lugar aos prédios. Era uma fábrica bonita - sim, bonita! -, mas foi ao chão. Sobre igrejas, não muito longe dalí,na Vila Santa Isabel, há muito que a Grande Igreja e sua Abóbada desaparecerm no meio dos prédios do Tatuapé.

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  4. No Estadão de hoje (dia 14)saiu uma reportagem dizendo que a Prefeitura agora quer uma lei para evitar esse tipo de coisa, ou seja, predios taparem vistas. Agora, quando a maioria delas já se foi? Veja a rua da Boa Vista, no centro da cidade, que tem esse nome porque até o século 19 de lá se tinha uma "boa vista"... ela foi a primeira a se ferrar.

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  5. O assassinato mais cruel foi com a Vila Maria Zelia, e uma outra vila, no Belém, da qual não lembro o nome. Essa vila, por exemplo, foi bombardeda literalmente por revoltosos na revolução de 1924, e não foi ao chão. Ironia, porque os p´redios a engoliram.

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  6. São tantos os exemplos, Dado... o que me impressiona é a nossa passividade em relação à destruição da cidade e a sua horrorosa verticalização, que até a luz do sol apaga. Se resolvermos lutar, vamos usar a máxima de Ciro: "melhor, combateremos à sombra".

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  7. Navegando pelo Google encontro a sua bela narrativa sobre esse "MONSTRUOSO EDIFÍCIO" edificado bem no centro do bairro da Penha.
    Não sei como a Prefeitura autorizou esta obra
    alterando considerávelmente o zoneamento deste
    quarteirão, afim, de construirem um predio
    deste porte, prejudicando os imóveis vizinhos.
    Posso falar, pq o meu pai adquiriu na planta um dos sete sobrados vizinhos, a esse predio que foram construidos e entregues em 1935, pelo construtor Sr.José Hernandes Filho. - Sem a tecnologia das INCORPORADORAS do século 21.
    Não posso ver esta obra "monstruosa" como progresso para o nosso bairro, é um destaque arquitetônico destoando totalmente com a beleza desta colina ofuscando o ponto alto da devoção católica a Basílica de Nossa Senhora da Penha - Padroeira da Cidade de São Paulo - e compromotendo a estrutura dos imóveis que o circundam. Ele merecia um lugar de destaque em áres livre, sem estar rodeado de construções antigas. Mas,isso não seria interessante comercialmente...

    Nada posso fazer,para reverter esse quadro, só posso registrar aqui a minha indignação.

    Desculpe-me, pelo desabafo, e parabéns pelo brilhante texto, Ralph!

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