Assim era a linha em 1966, próximo à ponte da Cidade Universitária.
Desde 1929, quando a São Paulo Tramway, Light and Power, ou, mais simplificadamente, a Light resolveu retificar o rio Pinheiros para torná-lo parte do complicado sistema de abastecimento de água e de luz para a Capital que então crescia sem parar, a Sorocabana viu uma chance de chegar a Santos sem partir de Mairinque.
Na época, a ferrovia Mairinque-Santos estava em início de obras, com seus (por volta de) vinte túneis começando a serem escavados e uma previsão de alguns anos para ver a primeira ferrovia paulista afora a São Paulo Railway alcançar o porto de Santos.
Em 1938, a Sorocabana inaugurou a linha. Seus trens podiam vir do interior com café e outros produtos para descer a serra, entrando pela cidade de Mairinque sem precisar baldear para a SPR. Uma grande obra de engenharia e uma ferrovia muito melhor, sem dúvida, que aquela que já tinha feito setenta anos na mão dos ingleses.
Veio a guerra e os ingleses gastando fortunas para conseguir sobreviver a ela. Venderam tudo que podiam para levantar fundos para custear uma guerra longa e sangrenta na qual viram seu poderio secular desabar e cair no quintal americano. Em 1944, venderam para o governo federal a ferrovia São Paulo-Paraná, enquanto sua empresa de colonização do Norte do Paraná, um dos negócios mais bem sucedidos do mundo, foi vendida para um grupo de empresários paulistas (para quem não sabe - a empresa ainda existe!).
Em 1946, cessava a concessão para uso da SPR. A ferrovia teria de ser entregue para o governo de volta. De volta, não: quem a construiu foram os ingleses, depois de puxarem magistralmente o tapete do Barão de Mauá. Agora, porém, nem tentaram negociar: entregaram de vez para o governo, que, em vez de cedê-la à Companhia Paulista, bastante interessada, ficaram com ela e a transformaram na E. F. Santos a Jundiaí. Afinal, os ingleses não eram mais monopolistas, e, pior: com o concorrente (a Sorocabana) tendo uma ferrovia mais moderna.
Com o rio Pinheiros retificado já, a Sorocabana resolveu fazer uma nova linha: saindo da linha-tronco, mas bem mais próximo à sua estação inicial de Julio Prestes, mais precisamente logo depois da estação de Imperatriz Leopoldina, próxima da junção dos rios Tietê e Pinheiros, essa linha acompanharia o rio Pinheiros até cruzá-lo bem mais ao sul, na região de Interlagos, e, daí, seguir por terras ainda pouco habitadas até a estação de Evangelista de Souza, na beirada da Serra do Mar. Ali a nova linha encontrar-se-ia com a linha vinda de Mairinque.
Não pesquisei, realmente, os verdadeiros motivos que levaram a Sorocabana a construi-la: acredito que um dos motivos seria a facilidade de triagem na estação da Barra Funda, então um enorme pátio de triagem de mercadorias, de tudo que vinha do interior. Afinal, fazer a triagem em São Paulo e retornar para Mairinque para descer a serra não facilitava a vida de ninguém.
As obras demoraram mais do que se imaginava, mas em janeiro de 1957 a linha estava aberta. Com ela, criou-se também uma nova opção de linha de passageiros para os bairros da zona Sul de São Paulo e também para Santos. Com certeza este não era o principal motivo de abertura da linha: era apenas um sub-produto. Além do mais, Santo Amaro ainda era uma região não muito habitada, e o rio Pinheiros retificado estava com milhares de metros quadrados de terrenos vazios. O tempo passou rápido para São Paulo e a Sorocabana: em 1964, a linha já tinha um movimento razoável de passageiros e fazia uma rota de subúrbio entre Julio Prestes e Evangelista de Souza. O movimento de cargas ia bem, tão bem que, na relação de linhas "anti-econômicas" apresentada ao governo federal, a Sorocabana falava em erradicar a linha Marinque-Evangelista, então com menos de trinta anos de operação.
Seria um enorme erro de difícil reparação se alguém não tivesse tirado a linha da lista e a mantido em operação: hoje, é uma das linhas mais movimentadas do Brasil e uma das poucas do anel ferroviário de São Paulo, evitando uma passagem de toneladas de produtos em comboios longuíssimos pelas congestionadas linhas da Capital, hoje abarrotadas de trens da CPTM.
Por outro lado, nos anos 1970, a Fepasa, que operava as linhas de subúrbio da Sorocabana, já não dava conta desse transporte com suas estações já ultrapassadas e ainda por cima de difícil acesso, com a construção da Marginal de forma a deixar a linha espremida entre a pista e o rio. Uma reforma foi feita no final dessa década, mas o resto dela somente se completou em 2000. Hoje, tem muito tráfego, é operada pela CPTM desde 1994 e vai muito bem, obrigado... mas tudo é novo. Por outro lado, não há cargas na linha desde o final do século.
E também sem os antigos Caveirões, apelidados pelos usuários devido a serem carros feitos a partir de antigos vagões sem janelas, e sem os Carmem Miranda, comboios que trafegaram nos anos 1970. Nenhum deles, no entanto, dignos de serem utilizados numa linha tão promissora.
quinta-feira, 6 de maio de 2010
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O texto está impecável. Mas terei de ser chato e corrigir a legenda da foto: acho que o ano citado é 1966 e não 1996, não?
ResponderExcluirSaco! Não há jeito de não errar!!! Já corrigi.
ResponderExcluirSão tempos que nos deixam saudades...
ResponderExcluirE aproveitando... o meu blog concorre ao prêmio Top Blog 2010. Clique no link http://migre.me/Ct4I e deixe lá o seu voto.
Desde já, muito obrigado!
Há algumas evidências indiretas de que o trem de passageiros Santos-SP seria reativado usando-se essa linha que, apesar de ter o dobro da distância normal, permite maiores velocidades nas composições por não recorrer a mandracaiadas para atravessar a serra do Mar. Mas há dúvidas se esse anúncio, bastante recente, não tem motivações eleitoreiras. De toda forma, a linha entre Interlagos e Evangelista teria de ser reconstruída, já que muitos trilhos foram retirados na região, aparentemente pela própria concessionária da ferrovia.
ResponderExcluirAliás, fosse este um país sério, essa linha atenderia não só Santos, mas a todo o litoral central-sul, de Praia Grande a Peruíbe. Como, aliás, o fez entre 1956 e 1975, quando o serviço ferroviário na região foi abandonado com a oportuna justificativa de um surto de encefalite que então grassava por lá. É claro que o surto passou, mas o trem regular diário de SP não voltou...
Essa é que foi a desculpa na época? Puxa... os caras são imaginativos... mas eu realmente nunca consegui a data correta de quando o trem JP-Santos foi pro saco. Foi 1975? Em 1976 ainda havia, com certeza, tráfego na linha, mas não sei se somente para Evangelista ou Colônia...
ResponderExcluirOs motivos alegados para suprimir ferrovias nacionais (ou linhas de tróleibus e bondes) são de todo naipe. Acidentes causados por chuvas torrenciais são os mais comuns. No caso da supressão dos trens da Fepasa para o litoral paulista em 1975, ninguém quis mexer com os ônibus interurbanos que serviam a região, apesar de certamente eles transportarem muito mais pessoas. E, afinal, se havia problema mesmo, a região deveria ter sido segregada, como no livro "A Peste", de Camus...
ResponderExcluirMas, que nada. Puro pretexto. Hoje, com a dengue comendo solta - um problema muito maior do que a encefalite de 1975, pois as seguidas reindidências da epidemia a transformaram no tipo hemorrágico, muitas vezes fatal -, ninguém fala em suprimir os Cometas, Ultras e Expressos Brasileiros da vida.
Boa Noite Ralph!
ResponderExcluirLeio seu blog diariamente, moro bem próximo a essa linha, e utilizo diariamente a linha Esmeralda da CPTM. Gosto muito quando você posta informações a respeito do Ramal de Jurubatuba!
Acredito que você tenha conhecimento disso, mas existe um projeto das Subprefeituras da região para reativar a linha entre Grajaú e Evangelista de Souza, criando uma espécie de Expresso Turístico, para incentivar o turismo ecológico no extremo sul de São Paulo. É uma ideia muito bacana, e torço muito para que saia do papel um dia!
Gostaria de obter informações sobre um acidente de trem ocorrido entre São Paulo e Paraná há muito tempo.Creio que um meu tio avô tenha morrido nele com toda a família.Obrigada. Neide .DF
ResponderExcluirNeide, difícil. Sem detalhes ou datas...
ResponderExcluirDas antigas Estações Ferroviárias do Ramal de Jurubatuba da EFS, hoje restam apenas duas;
ResponderExcluirA que leva o próprio nome do "JURUBATUBA", que passou por modernizações na gestão FEPASA e mais recentemente pela CPTM, se tornando mais uma das modernas estações Metroferroviárias deste ramal.
A outra é a Antiga Estação Cidade Dutra, que desde 2007 ganhou como sua vizinha a Nova Estação Autódromo da CPTM.
A estação Cidade Dutra só resistiu ao tempo, graças a um ex ferroviário da Sorocabana / Fepasa (Sr. Manoel Rocha), que mesmo após aposentado da ferrovia continuou morando e mantendo a velha estação, ocupando a mesma até meados de 2003.
No periodo de 2004 a 2007, a antiga estação Cidade Dutra teve o pátio e o prédio utilizados como alojamanto das óbras de modernização do trecho Jurubatuba / Grajaú e construção da estação Autódromo.
O governo paulista através da CPTM promoveu a modernização da linha, mas NÃO TEVE O CUIDADO de prever uma reforma ou recuperação da antiga estação Cidade Dutra neste pacote de óbras de modernização.
A antiga estação, com seu prédio de madeira da década de 1950, vai resistindo ao tempo. Mas sem qualquer cuidado ou manutenção.
A mesma deveria ter sido recuperada para ser hoje um Museu deste Ramal Ferroviário de Jurubatuba. Ou então, poderia ser até mesmo uma base de manutenção da prória CPTM para esta linha, com a reposição de seus désvios, para se deixar alí uma composição de manutenção de eletrificação, com Lcomotiva à Diesel de prontidão tanto para estes serviços, bem como para socorro dos Trens Metroplitanos, quando avariados. Já que a poucos metros dela, do lado oposto, está a Sub-Estação da Eletrificação Cidade Dutra.
Mas o que podemos esperar de ações de preservação por parte do governo, em um país onde infelizmente a história é apenas uma vaga lembrança?!...
A antiga Estação Cidade Dutra, hoje um marco histórico do Ramal de Jurubatuba, permanece praticamente abandonada e sem uso!
E aqueles que através de entidades ou associações tentam ações no intuíto de preservar este patrimônio, não encontram qualquer tipo de apoio ou respaldo, seja por parte do governo paulista através da CPTM, seja por qualquer outro órgão público!
É até um contraste negativo, por exemplo em dias de eventos no Autódromo de Interlagos. Onde pessoas que muitas vezes nem usam os Trens Metropolitanos no dia a dia, mas que para este evento utilizam a Linha - 09 Esmeralda da CPTM para se locomoverem de outras localidas até a Estação Autódromo em Interlagos. Visto que ao desembarcaram na nova e moderna estação Autódromo, vizualizam a situação descaso e abandono da Antiga Estação Cidade Dutra, que vai de mau a pior sim muito obrigado, a cada dia que passa...
E então senhores gestores do governo do estado de São Paulo; O que vocês dizem a este respeito?...
No Estadão de 22.09.1957, página 27, saiu uma reportagem sobre a nova linha que estava para ser inaugurada algum tempo depois:
ResponderExcluirhttp://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19570922-25274-nac-0027-999-27-not/busca/ponte+sobre+rio+Pinheiros