Em 2003, como hoje, a parte baixa do Gato Preto no km 36 da Anhanguera era isto: além das casinhas ao lado do antigo forno de cal, a oficina com o outro bar à direita (não aparecem) e a antiga estaçãozinha à esquerda (não aparece também)
Hoje pela manhã mais uma vez estive no Gato Preto. Para quem não sabe, embora já tenha postado algumas matérias sobre o bairro neste blog, ele fica no município de Cajamar, à margem esquerda da via Anhanguera, no km 36. Local muito calmo, ele na verdade está dos dois lados da estrada: é ao lado esquerdo que geralmente vou por causa das antigas oficinas da E. F. Perus-Pirapora.
O bairro existe por causa da instalação de fornos de cal e das oficinas da ferrovia citada, esta aberta em 1914. Sempre foram ambos do mesmo dono. Os últimos foram a família Abdala, que fecharam tudo - ferrovia e fornos, em 1983, quatro anos antes de fecharem também a fábrica de cimento de Perus, que administrava os dois.
O fato é que o fechamento foi bastante surreal: num belo dia de janeiro desse ano, veio a ordem para que cessassem as operações no local e nos outros pontos da ferrovia. O que estava em determinado local, ali ficou. As locomotivas, vagões e carros ficaram onde estavam, inclusive alguns vagões carregados com minério que deveriam seguir viagem no pátio da pedreira da empresa, em Cajamar (hoje de posse da Votorantim). Até hoje os vagões com o minério estão ali esperando seguir viagem.
Em Gato Preto, em volta da oficina, na parte baixa do bairro, fornou-se uma pequeníssima vila que ainda existe. Poucas casas, espalhadas, além de dois bares, o forno de cal, este abandonado, e as oficinas, ainda ali, com um ou outro vagão e quatro locomotivas abandonadas ao relento. Restos da base de pedras de uma antiga ponte metálica da ferrovia, uma ponte sobre o rio Juqueri-Mirim, o próprio rio sujo e assoreado... o local foi esquecido pelo tempo. Até 2003 ainda havia trilhos fora da área da oficina, depois foram arrancados. Vez por outra aparece alguém do IFPP, que tenta recuperar o que for possível da antiga ferrovia, esta prestes a completar cem anos do início das operações.
Dentro do pátio das oficinas, trilhos e material rodante, bem como peças pesadíssimas de ferro fundido estão abandonadas. Nos galpões, alguns telhados já caíram, outros esperam por isso. As plantas invadiram tudo: pequenas salas e escritórios e também máquinas, Uma debulhadora de arroz de madeira, raríssima, ainda está ali escondida.
Há também materiais mais novos: um fogão Semer, uma Brasília... mato, lenha, trilhos que não foram arrancados. Do lado do bar ao lado do antigo forno de cal, um morador aponta para um morro do outro lado da rodovia e diz que ali algumas construções recentes acabaram com diversas nascentes. Aponta para outro lado e diz que "aquele plano ali já foi um morro — dois anos atrás, foi arrasado". A terraplenagem está sendo feita mais para a frente, sentido de Jordanésia: parece que quando chegar à oficina e ao forno vai levar tudo também.
O material ferroviário tem de ser removido, mas a entidade que cuida corre atrás de fundos para isso. Quando for, possivelmente tudo virá abaixo. Se estamos ali, parados, junto à chaminé do forno de cal, que já tem uma grande árvore apoiada sobre a boca dessa chaminé sabe Deus como, olhando para a estrada, vemos uma paisagem bonita e sentimos uma calma enorme. Sossego que logo será substituído pela construção de galpões para indústrias. O dono não se preocupa com o sossego de quem vive lá, gente que provavelmente vai sair ou ter de sair dali quando isso acontecer.
Será o fim do Gato Preto. Se sobreviver, vão sobrar apenas as casas e a escola que não se veem dali de baixo, pois estão nas ruas "mais para cima". A Perus-Pirapora, ali, pelo menos, será somente uma saudade.
sábado, 22 de maio de 2010
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