sábado, 30 de novembro de 2013

DONA CATARINA - UMA ESTAÇÃO

A estação em 1998, já desativada e sem trilhos
Em 1897, a Sorocabana, depois de comprar (meio que "na marra") a Ytuana, seu desafeto até 1892, resolveu prolongar a linha-tronco da Ytuana, que terminava na estação de Ytu, desde 1873. A linha foi prolongada até a estação de Entroncamento, na linha da Sorocabana e que pouco depois passou a se chamar Mairink (hoje Mairinque), não por acaso sobrenome do banqueiro que era o dono da ferrovia nessa época.

Essa linha nova fez com que a Sorocabana tivesse de aumentar a bitola da linha da Ytuana, que era de 96 centímetros e não de um metro, pois a linha do prolongamento já havia sido construída com bitola métrica. Neste novo trecho, a ferrovia construiu três novas estações: Pirapitingui, Dona Catarina e Moreiras.

O trecho tinha cerca de 52 quilômetros, com as estações, que foram todas inauguradas no mesmo dia da linha.
A estação, bastante descaracterizada (Foto de hoje)
Mais tarde, em 1913, a Sorocabana, já como concessão da Brasil Railway, de Percival Farquhar, uniu a estação de Itaici a Campinas, abrindo mais três estações nesse trecho: Helvetia, Descampado e Sete Quedas. Nesta obra, trabalhou como chefe do pessoal meu tio-bisavô, Howell Louis Fry, que eu conheci em 1976 pessoalmente, já com mais de noventa anos, e ainda bem lúcido, com enormes olhos azuis. Dessa forma, podia-se agora ir de Campinas a Mairinque direto, e daí para São Paulo.

Enquanto era evidente que era muito mais curto e rápido continuar indo de Campinas a São Paulo pelas linhas da SPR e da Paulista (com troca de tripulação e de locomotiva em Jundiaí), o novo trecho abria uma opção para que a Mogiana seguisse com sua bitola métrica, igual à da Sorocabana, mas menor que as outras, diretamente para São Paulo. Fato, aliás, que não se tem conhecimento de que tenha acontecido, pelo menos não de forma contínua.

Das três estações do trecho, inacreditavelmente, todas estão em pé: duas em Mairinque (Dona Catarina e Moreiras) e uma em Itu (Pirapitingui), esta última servindo de residência até com certeza alguns anos atrás. Provavelmente continua. As duas de Mairinque foram adquiridas há anos pela Prefeitura.

Cabe também uma explicação de por que estas estações foram desativadas: serviram como paradas para passageiros até 1976 e, depois, até 1987, quando a linha foi desativada por causa da construção de uma variante em bitola mista (o famoso "corredor de exportação" que liga Campinas a Mairinque e dali a Santos), ficaram provavelmente abertas para pequenas cargas. Com a retirada dos trilhos logo depois, passaram a não servir para mais nada.
As caixas d'água da estação ainda estão ali, em péssimo estado e sem uso (Foto de hoje)
Estive hoje, depois de pelo menos dez anos (acho que mais) na estação de Dona Catarina. Ela fica no km 69 da rodovia Castelo Branco, onde há um viaduto que se toma para quem vem de São Paulo chegar ao pequeno bairro com o mesmo nome. Aliás, pelo que se conta, o nome teria sido uma homenagem da Sorocabana à mãe do presidente da época, Prudente de Moraes, cujo nome era dona Catarina de Moraes Barros, que morava em Pirapitingui, onde nasceu seu filho e que era ali perto.

A estação, quando a visitei pela primeira vez em 1998, era então uma delegacia, e estava meio mal cuidada, mas ainda conservava, pelo menos exteriormente, seu aspecto original. Hoje, vi que, do original, ela conserva apenas a forma da abertura das portas, a forma do edifício e o madeirame da cobertura da plataforma. Só. O resto foi bastante modificado, ela funciona como creche, o interior foi todo modificado e exteriomente ela foi pintada de branco. Infelizmente, portanto, é mais um prédio quase totalmente descaracterizado.

Obviamente, não há nem sinal de trilhos, como já não havia em 1998. O curioso é que a estação fica a alguns metros abaixo do leito da rua principal do pequeno bairro (bairro feio, sem nada para atrair ninguém a não ser a velha estação, isto quando o sujeito sabe que ela ainda está lá) e tinha um pátio bastante pequeno, pois logo a seguir vem outra queda, deixando-a como em um degrau. Provavelmente tinha apenas a linha principal e um desvio e, sem muita certeza, uma outra linha passando pelo outro lado (o da entrada). Não vi sinais de nenhuma escadaria para se alcançar a estação para quem vinha lá "de cima". Também não havia nenhuma em 1998, pelo que me lembro.

Enfim, é isso aí. A memória vai desaparecendo. Mais algumas reformas e o prédio estará irreconhecível, isso se ninguém pensar em "derrubar essa velharia".

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

O AUTÓDROMO DO JAGUARÉ

Correio Paulistano, 1936

São Paulo teve o seu autódromo de Interlagos aberto por uma empresa particular, a mesma que construiu a estrada nova de Santo Amaro (mais tarde, Auto-Estrada Washington Luiz e hoje somente avenida), justamente com o objetico de levar o paulistano ao autódromo, à represa e também dar-lhe uma alternativa melhor para chegar ao centro de Santo Amaro (incorporado a São Paulo em 1935), em vez de usar a então pavorosa Estrada de Santo Amaro (hoje avenida Santo Amaro).

Antes, porém, a família Villares tinha aquele terreno enorme do lado esquerdo do rio Pinheiros, perto de sua foz no Tietê, entre o rio Jaguaré e a linha da Sorocabana (hoje da CPTM) e queria ali fazer um loteamento industrial, parte residencial e... um autódromo!

Em 1936, portanto quatro anos antes de abrirem Interlagos, os Villares anunciaram o "seu" autódromo nos jornais. Não deu em nada, como sabemos. Sabemos também que aquilo virou mesmo um distrito industrial (hoje uma mistura de galpões abandonados com algumas indústrias, várias favelas e uma pequena área residencial) cheio de desvios ferroviários de bitola métrica e larga que provinham do pátio ferroviário de Presidente Altino. Provinham, pois quase tudo foi arrancado ou asfaltado, escondendo-os dos antigos usuários.

A foto acima mostra uma propaganda do que quase foi esse autódromo.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

O QUE ACONTECEU COM O BAR EM CAMAÇARI?

Bar da estação em maio de 2013. Foto Camaçari Notícias.

Buscando alguma coisa na Internet - que nem me lembro mais o que era, embora isso tivesse ocorrido ontem - descobri uma notícia de maio deste ano da graça de Nosso Senhor Jesus Cristo de 2013 (é o estilo antigo de se noticiar datas) que a FCA havia ganho uma ação contra o bar instalado na estação ferroviária de Camaçari desde o início dos anos 1990.

A questão é: por que a FCA quereria desativar um bar numa estação que ela não usa e que fica no meio (não no centro) da cidade baiana de Camaçari?

Estive nesse bar em 2005. Típica construção da Leste Brasileiro dos anos 1940, a estação foi desativadanos anos 1980 para passageiros e, alguns anos depois, nela começou a funcionar um bar. Seja regular ou irregularmente, o bar sobrevivia até esta data.

O bar na estação em 2005, em foto que eu tirei. As mesas ficavam do outro lado.

Na foto  que saiu na reportagem, estava até mais cuidado do que em 2005.

Continuei procurando sobre notícias do tal bar e vi que apesar de tudo, ele, que deveria fechar no dia seguinte ao da reportagem de 10 de maio, ainda estava aberto em 20 de julho.

Várias das estações, algumas muito parecidas com a de Camaçari, estão totalmente abandonadas nessa linha que não tem mais trens de passageiros desde alguma data incerta durante os anos 1980. A estação de Parafuso é uma delas. Estive também lá em 2005 e ela estava em ruínas. A reportagem mais recente de 20 de julho mostrava uma foto dela, mostando que Camaçari poderia ficar do mesmo jeito: "Como Camaçari não tem tradição de cuidar de seus cartões históricos, como o antigo cinema, a estação do centro da cidade também corre sérios riscos de ficar abandonada e em ruínas como a de Parafuso, caso o bar realmente feche".

A FCA alegava que um bar ao largo da linha, encostado a ela, é perigoso, porque um cidadão bêbado pode sair dele e ser atropelado pelo trem". Sei. Que conte outra. Desde 1990 isto não aconteceu nenhuma vez.

Mas a questão é: Reginaldo da Encarnação Brandão, o Regis, ficou sem seu bar ou não? Afinal, ao mesmo tempo em que já estamos em novembro, estamos também no Brasil, onde para tudo se dá um jeitinho.


domingo, 24 de novembro de 2013

TRENS METROPOLITANOS NO BRASIL

Trens da CPTM numa estação desativada em 2000, Carlos de Campos (ex-Guaiauna), em foto de 2013 por Carlos Roberto de Almeida

O transporte urbano no Brasil sempre foi uma desgraceira, salvo algumas honrosas exceções.

A partir de um determinado momento no século XIX, começaram a aparecer os trens, e logo descobriram que os trechos mais próximos das cidades, quanto mais populosa ele era, mais convinha estabelecer-se um trem de passageiros para cobrir somente essa parte mais habitada com trens de percurso mais curto, deixando os percursos mais longos das mesmas linhas para ter menos horários.

Até aí, nada de mais.

Porém, com o aparecimento dos ônibus, estes foram pegando o lugar dos trens não somente nas partes citadinas onde não havia linha, mas depois também entrando pelos mesmos percursos dos chamados "trens de subúrbio", "trens metropolitanos" e "metrôs" - este últimos, bem mais recentemente.

No duro mesmo, não há diferença entre trem de subúrbio, metropolitanos ou metrôs. Em São Paulo e no Rio, por exemplo, trens metropolitanos são os que foram feitos sobre linhas férreas antigas que já estavam ali e os foram criando. Metrôs, por sua vez, forsm linhas criadas para transportar passageiros com tecnologia mais moderna. Os metropolitanos do Rio já existiam na Central do Brasil desde praticamente o início das operações da sua antecessora, a D. Pedro II, em 1858. Em 1869 já havia relatos deles nos relatórios dessa ferrovia. Em São Paulo, os da Central foram criados em 1914, da Sorocabana em 1922 e da Santos-Jundiaí "aos poucos", pois praticamente toda a linha fica no planalto e sempre foi coberta por trens que iam aumentando a frequencia no planalto à medida em que a população crescia. Estes já foram Mauá-Pirituba, esticando depois para Rio Grande da Serra;Paranapiacaba de um lado e Francisco Morato de outro. E depois até Jundiaí. O resto era a serra e a baixada santista, que chegou a ter por curto espaço de tempo um suburbio entre Santos e Cubatão e, na linha da Sorocabana, o TIM (Ana Costa-Samaritá).

Consequência: com muita concorrência e sem poder aumentar os horários - ou sem querer para fazer isto - nas linhas de subúrbio, a qualidade foi caindo. Eles foram se tornando literalmente umas porcarias, não respeitando horários, não tendo o material rodante a manutenção necessária, o que ocasionava excesso de desastres. Coloque-se neste miolo os bondes, hoje chamados de VLTs.

Os bondes acabaram durante os anos 1950, 60 e início dos 1970. Sobraram o de Campos do Jordão e o de Santa Tereza, no Rio. Santos retomou bondes turísticos no centro nos anos 1980, correndo somente em finais de semanas. Diversas cidades brasileiras tiveram bondes a tração animal e elétrica. São Paulo, por exemplo, teve-os de 1872 a 1905 (tração animal) e de 1900 a 1968.

Deixanso os bondes neste artigo de lado, uma relação interessante podemos depreender do que aconteceu.

Quais foram os Estados brasileiros que jamais tiveram trens de passageiros, metropolitanos (ou mesmo cargueiros)? Dos 26 existentes, quem nunca os teve foram: Amazonas, Acre e Roraima. Convém ressaltar que Mato Grosso (o atual) e Tocantins (estado surgido em 1988) jamais tiveram trens de passageiros (lembrando que a E. F. Tocantins não rodava nesse estado, mas no Pará), somente cargueiros (ambos bem recentes, da Ferronorte e da Norte-Sul).

Das capitais brasileiras, quais não têm ou tiveram trens metropolitanos (subúrbios) ou metrôs? São elas: Manaus, Rio Branco, Boa Vista, Macapá, Cuiabá, Goiânia, Campo Grande, São Luís, Aracaju, Vitória, Palmas e Florianópolis.

Das capitas citadas, lembremo-nos que Curitiba teve trens de subúrbios até 1991 e após esse ano foram abandonados.

Mais uma relação mostra as cidades brasileiras que não estão nas áreas metropolitanas, mas que já tiveram trens de subúrbios, tendo eles sido extintos há pelo menos 30-40 anos: Vassouras, Lavras-Ribeirão Vermelho, Juiz de Fora, Santos, Campinas e Bauru. E lembremos que existe hoje apenas uma cidade que ainda têm trens metropolitanos diários em mais de um horário e que não fica em área metropoitana alguma: trata-se de Pindamonhangaba.

Podemos pensar em "zonas cinzentas" que são os pequenos ramais que Campos dos Goitacazes possuía (Atafona, Santo Amaro), no VLT de Juazeiro a Crato (bastante recente) e que poderiam ser considerados trens metropolitanos de certa forma.

Da mesma forma que São Paulo teve pelo menos dois desses trens que foram extintos sem nunca terem sido transformados em algo mais eficiente e moderno, como o Tramway da Cantareira e até mesmo a E. F. Perus-Pirapora.

Posso estar me esquecendo de alguma coisa? Claro que sim. Isto foi tirado de minha cabeça enquanto eu escrevia. Que os leitores me corrijam onde houver erros ou esquecimentos de minha parte. E que Deus salve o Brasil.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

MISTÉRIOS DE SÃO PAULO

Mapa da Sara Brasil, 1930 (detalhe) - reparem na linha passando pela Doutor Arnaldo e pela Cardoso de Almeida
.

Em teoria, mapas deveriam apresentar a realidade de uma cidade em um determinado instante. Porém, quanto mais rápido cresce uma cidade, menos este mapa é fiel. Quando ele é lançado graficamente e até hoje em dia na Internet, ele pode já estar velho... assim como velhos erros podem não ter sido corrigidos.

Mapas são, assim como os jornais, excelentes indicadores de fatos. Mas não podemos nos fiar neles como se fossem a verdade absoluta.

Também em teoria, o mapa elaborado em 1930 pela Sara Brasil na cidade de São Paulo, englobando o município inteiro, deveria ser mais confiável que os outros mapas, pois foi feito para a prefeitura em um tamanho e escala grandes o suficiente para mostrar as projeções de cada construção existente dentro do perímetro do município - lembrando-nos que Santo Amaro ainda não havia sido anexado a São Paulo e que Osasco ainda era um bairro paulistano.

Mesmo assim, certamente deu muito trabalho para ser feito - e no intervalo entre o término da pesquisa e a publicação do mapa, construções devem ter sido demolidas e outras construídas.

Mas, problemas à parte, é um mapa maravilhoso. E ajuda muito, mesmo com essa margem de erro impossível de se avaliar. O que me estranha, no entanto, são algumas coisas que não parecem fiel ao que existiu um dia.

Um deles é a linha de bonde que está indicada no trecho do mapa que coloco no topo deste artigo, ligando a avenida Doutor Arnaldo à rua Caiubi, esquina com a rua Cardoso de Almeida. Conheci bem as linhas ali existentes, pois morei bem perto dali - na rua Teffé - uma rua que, no mapa, praticamente não tem construção alguma e as que ali existem parecem não existir mais.

A linha que vinha do centro da cidade pela avenida Doutor Arnaldo virava à esquerda na rua Teodoro Sampaio e ia para o largo de Pinheiros. Correto. Também havia um ramal que partia da esquina dessas duas ruas e seguia até a rua Cardel Arcoverde, onde fazia um balão e voltava. Esse balão não existe no mapa, mas sabe-se que ele existiu até os anos 1940.

Por outro lado, a linha que vinha pela rua Cardoso de Almeida proveniente da avenida São João terminava no topo da colina, na rua Caiubi. Ali os trilhos entravam alguns metros nesta rua para os dois lados e manobravam para voltar, como se fosse um triângulo. Lembro-me bem disso.

A ligação existente neste mapa, entre as ruas Crdeal Arcoverde e Caiubi, passando pela Doutor Arnaldo e pela Cardoso de Almeida, até onde eu saiba, jamais existiu. Em tudo que li sobre bondes - e não foi pouco - na capital paulista, jamais houve referências a essa ligação. Por que ela aparece no mapa, então, se ele é considerado um dos mapas mais confiáveis da cidade de São Paulo?

Teria essa linha sido colocada e logo em seguida arrancada? Pouco provável. Acredito (mas é mera suposição) que ela estava planejada para ser instalada, sim, e, por algum motivo que ignoro, acabou não o sendo. Mas o mapa acabou considerando isso uma certeza e ali a colocou.

Terá isso sido possível? Os outros conhecedores, que se apresentem e me desmintam. Ou confirmem o que eu disse e que o mapa realmente cometeu um erro.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

OS TRILHOS DO MAL - BAURU

Mapa feito e publicado no Jornal da Cidade de alguns dias atrás. E reparem na revisão: o que está em azul claro é citado como sendo "linhas aéreas". Claro que não é. São essas as linhas férreas (para o sul, ex-Sorocabana, para o oeste, a Noroeste e a Paulista, para o leste, a Paulista.

Já falamos sobre o assunto Bauru. Com linhas da antiga Paulista, Sorocabana e Noroeste do Brasil, a cidade agora quer fazer um anel ferro viário à sua volta para que os cargueiros não atrapalhem mais a cidade. Sempre a mesma história.

Só que aqgora, há a promessa de se aproveitar as linhas históricas que cruzam a cidade desde 1905 para trens metropolitanos ou VLTs. Resta saber se é verdade, se é sério, se é promessa eleitoral, se é promessa fútil, ou se é mentira mesmo.

Para que gastar milhões de reais fazendo um contorno inútil? É evidente que a cidade pode viver com os cargueiros. Centenas, milhares de cidades pelo mundo inteiro, no primeiro, segundo e terceiro mundo, inclusive o Brasil, convivem com os trilhos e os trens. Muitas delas com os trilhos no meio das ruas, o que não é o caso de Bauru, onde há e sempre houve um corredor específico para as linhas que a cruzam.

A cidade é uma das maiores do Estado, com cerca de 600 mil habitantes e não deixou de crescer por causa dos trens. Muito pelo contrário, se a Sorocabana não tivesse aportado ali com os primeiros comboios em 1905, é muito possível que ela fosse hoje uma cidadezinha de segunda (o que talvez nem fosse um mau negócio).

Muitos a chamam de "o maior entroncamento ferroviário do Brasil". Não é. Mas é (era) um entroncamento bastante importante. A questão é saber para que gastar tanto dinheiro em desaporpiração de terras e em obras e materiais para construir uma linha contornando a cidade em vez de gastar isso para justamente colocar e fazer funcionar trens como os da CPTM ligando os bairros que já estão ligados por trilhos, só faltam os trens de passageiros, ali sumidos desde 2001.

Cada dia que passa chego à conclusão de que o Brasil é um país inviável, onde nada é planejado em termos macro e o que é planejado em termos micro é mal pensado. Caso de Bauru, claramente, com mais uma ideia de jerico como tantas as que proliferam pela nossa terrinha.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O "EXPRESSO DA VITÓRIA" DE JANIO QUADROS

O Expresso, em local ignorado, antes de partir

Em fevereiro de 1960, o então deputado e matogrossense Janio Quadros já havia assumido sua candidatura a presidente do Brasil, depois de ter sido vereador (em São Paulo), prefeito (da Capital) e governador paulista e para isso pergorria descaradamente o Estado paulista usando os trens, em boa parte dessas viagens.

Na data citada, ele percorreu as cidades ao longo da Sorocabana, então uma companhia estadual. O governador do Estado era Adhemar de Barros, que também era candidato à presidência da República.
Mapa do percurso

Supõe-se que Janio alugava um trem da Sorocabana, com os carros aqui mostrados. Não creio que Adhemar, que nunca se deu bem com Janio, tenha cedido gratuitamente esses carros e a locomotiva para o que seria, de acordo com o jornal Folha de S. Paulo, a terceira versão do Expresso da Vitoria. Apesar de ter lido edição por edição da Folha desde os anos 1930, não vi nenhum outro "expresso" ser anunciado antes disso. Onde teria sido? Paulista? Zona Araraquarense: Noroeste? Mogiana?

Havia nessa época algo que proibisse, na lei eleitoral, de se usar gratuitamente os trens estaduais? A única ferrovia ainda privada era a Paulista. Teoricamente, se ela aopiasse Janio, poderia cobrar ou não o uso de um trem especial seu. Já as outras, todas estatais, teriam cedido os trens? Isto era legal na época? Adhemar aceitou ceder gratuitamente ou por pagamento os trens das ferrovias estaduais?
Três dias de viagem por trem

Por fim: isto era ético na época? Ou ninguém ligava para isto? Hoje não seria considerado ético e certamente seria proibido. Como não temos mais ferrovias de passageiros, no entanto, não é possível se fazer mais isto hoje em dia.
O Expresso chega a Sorocaba.

E, ainda sobre a ética: embora ela em teoria exista, na prática, político algum se preocupa com ela hoje em dia, se é que algum dia se preocupou anteriormente.

Enfim, discussões à parte, é interessante ver algumas das (péssimas) fotos do acervo da Folha de S. Paulo da época nesta postagem.
Composição do Expresso.

Como sabemos, Janio ganhou as eleições, renunciou seis meses depois su´pstamente num golpe de Estado frustrado e jogou o país nas mãos de um político sem nenhuma experiência para exercer a presidência: Jango - que acabou deposto por um golpe militar apoiado pela classe média, a única que sempre pensou neste país.

domingo, 17 de novembro de 2013

O FIM DAS FERROVIAS, O INÍCIO DO CAOS URBANO - 1959


Natal de 1959. Na edição de 23 de dezembro desse ano, o jornal Folha da Manhã anunciava, numa notícia bastante pequena e meio escondida, o decreto que a autorizava a desativar três ramais de sua rede: o ramal de Artemis (16 km, de Montana, estação na linha Piracicaba a São Pedro, até Artemis, ex-Porto João Alfredo), o ramal de Padua Salles (92 km, ligando a estação de Guanabara à estação de Padua Salles, na margem esquerda do rio Mogi-Guaçu, em Conchal, ex-linha da Funilense) e o Ramal Férreo Campineiro (27 km), que, havia vários anos, somente funcionava com bondes, ligando a estação de Campinas à localidade de Cabras, que dava à linha o apelido de Cabrita.

Medida desastrosa sob todos os aspectos para a época. Eram deficitários? Provavelmente. Quase que certamente. Porém, sem investimentos por parte da Sorocabana - isso podia ser visto numa notícia de 1950, dez anos antes, que citava o mau estado da linha do ramal de Artemis - era evidente que as linhas tendiam a ficar piores e não rentáveis. No caso de Artemis, que alimentava a linha fluvial desse porto até Porto Martins, no rio Tietê, em Botucatu, a linha fluvial já havia sido desativada. Linhas piores, menos passageiros. Menos passageiros, linhas piores ainda. O eterno círculo vicioso, feito de propósito pelas estradas de ferro nessa época e daí para a frente.

A linha da Cabrita acabou parando em 10 de fevereiro de 1960, menos de dois meses depois. A da Funilense, com uma revolta popular, foi prolongada por mais um ano, depois de parar por boa parte do mês de janeiro de 1960. E o ramal de Artemis foi prolongado até 1962.

O fato é que o decreto também autorizava (ou obrigava?) a Sorocabana a "ceder gratuitamente ao DER a totalidade ou parte das áreas de terreno que constituem o leito das linhas a serem surpimidas e que se tornem necessárias à construção de rodovias".

Era a sabotagem das ferrovias em favor das rodovias. O futuro está mostrando quais foram as consequências destes erros, já que esse foi apenas um de dezenas de decretos semelhantes que propagou contra as ferrovias pelo Estado e pelo País inteiro.

Em 1959, essas três linhas já tinham características de trens de subúrbios. Já fariam falta aos usuários. Que não se pense que as estradas que substituíram esses trechos ferroviários foram imediatamente construídas asfaltadas após a retirada dos trilhos. Se já apresentavam essas características, por que não foram reformadas, nem que fosse aos poucos, e mantidas até hoje?

sábado, 16 de novembro de 2013

PAPO FURADO EM TERRAS BAIANAS


No final do século XIX,  Bahia já tinha muitas ferrovias e projetos: um deles, quem prestar atenção, é o da atual FIOL.

Um artigo publicado dia 12 de novembro último no jornal Valor Econômico enaltece a necessidade de se ter ferrovias na Bahia para escoar sua produção. Nada de errado nisso. Aliás, é válido para qualquer estado brasileiro, principalmente os de território vasto.

E dizem por aí que não adianta olhar para o passado, o negócio é olhar para o futuro. Discordo. O passado é que nos ensina a traçar o futuro. Seus acertos e erros que já ocorreram são uma lição sobre o que fazer e o que não fazer. No caso da Bahia, por exemplo, o artigo não fala do que já existiu na Bahia em termos de ferrovias, nem que a maioria delas estão abandonadas, mas ainda existem. E não eram tão poucas. Por que não usá-las, então, pelo menos enquanto não se constróem as que vêm prometendo há anos?

Abaixo, os trechos entre aspas e em itálico são trechos retirados do artigo do jornal. O que segue, sem as aspas, são os meus comentários.

"A Bahia quer desatar os nós logísticos que atrapalham principalmente o fluxo de mercadorias dos portos de Salvador e Aratu, os principais do Estado. Nesse cenário, o modal ferroviário aparece como uma chave-mestra para a ampliação da economia baiana, segundo José Muniz Rebouças, presidente da Companhia das Docas da Bahia (Codeba)." Ora bolas. arrancarm os trilhos entre Calçada e o porto já há anos! Se eles são tão importantes assim, porque os arrancaram? O mesmo fizeram com o trecho Mapele-Paripe, que é caminho para Calçada - deixaram apenas o trecho Paripe-Calçada e somente para os trens de subúrbio.

E para continuar, antes havia trens de subúrbio entre Salvador e Candeias e entre Salvador e Dias D'Ávila, passando por Camaçari, importante centro industrial desde os anos 1970. Tiraram-nos. É essa a importância que dão para a ferrovia na Bahia? Quanto ao porto de Aratu, ele tem acesso desde os anos 1970 por um ramal que sai próximo a Mapele, na linha que não foi arrancada.

"Essa questão está sendo resolvida com a construção da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol)", diz. Além da Fiol, projeto de 1,5 mil quilômetros que pretende cruzar todo o território baiano, o Estado acaba de ganhar a Via Expressa Baía de Todos-os-Santos, obra de R$ 480 milhões que liga a BR-324 ao Porto de Salvador. Em Simões Filho, a 30 quilômetros da capital, um projeto privado de R$ 1,3 bilhão pretende entregar um complexo de logística multimodal, vizinho ao terminal de Aratu." O que estão esperando, então, para construir a FIOL, da qual se ouve falar desde pelo menos o início do governo do incompetente PT, em 2003?

O próprio artigo mostra que, mesmo considerada um dos projetos mais atrasados do PAC, a FIOL ainda pena para sair do papel. Os lotes de 1 a 4, que compõem um trecho de 537 quilômetros entre Caetité e Ilhéus (BA), têm pouco mais de 18% das obras prontas, com previsão de conclusão em dezembro de 2014, segundo o Ministério dos Transportes. É evidente, com esses números, que não vai ser terminada no fim do ano que vem.

E mais: "A Bahia defende a mudança do traçado da Oeste-Leste, estabelecendo o seu entroncamento com a Ferrovia Norte-Sul em Campinorte (GO), ao invés de Figueiropólis (TO)." A troca permitiria aos terminais baianos entrar na competição pela safra de grãos do Tocantins e do Mato Grosso." Ora, quanto mais mudanças, mais demora. E ninguém decide nada, embora os palpites pipoquem a todo instante.

"Em Simões Filho, a Cone SA, do grupo pernambucano Moura Dubeux, vai investir R$ 1,3 bilhão, até 2022, na construção do Cone Aratu, uma plataforma de infraestrutura industrial e de logística multimodal em uma área de quatro milhões de metros quadrados, vizinho ao porto. A ideia é desafogar o tráfego da Região Metropolitana de Salvador (RMS) e otimizar cadeias produtivas e de distribuição." Ótimo. Mas só em 2022? Por que tanto tempo? Existe uma ferrovia passando por ali há exatamente 153 anos... por que não se a usa? É ultrapassada? Provavelmente. Mas funciona e pode ser usada mais ainda para facilitar o escoamento, como o era no tempo das vacas gordas das ferrovias, ou seja, pelo menos até 1960.

"O Porto de Aratu poderia ter um maior escoamento de cargas se contasse com uma malha ferroviária eficiente, retroárea de armazenagem e integração rodoviária com mais opções". Por que - repito - não se usar mais as ferrovias que já o alimentam, então? Que se as reformem aos poucos, puxa vida!

Há outros pontos citados na reportagem, que não transcrevi pois não achei importante. Na realidade, é tudo papo furado. Neste país fala-se muito, faz-se pouco e o que é feito o é lentamente demais. Isto já acontece há muito tempo, desde o fim do governo militar. Os presidentes que os seguiram foram fracos e passaram a não ouvir o que o povo pedia nas ruas. Finalmente, o mais incompetente deles, o PT (embora haja um empate destes, que estão no poder desde 2003, com o governo ridículo de José Sarney), não sabe fazer coisa alguma, Em mais de 10 anos de governo, o Brasil só foi para trás - apesar de eles acharem o contrário.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

BARUERI NA BERLINDA

Na fotografia acima, é fácil ver o terminal, o grande retângulo. Ao sul dele, o retângulo menos é a estação ferroviária. (Google Maps)
Ontem, quinta-feira, véspera de feriado do dia da República, voltei de São Paulo de trem e, ao contrário do que sempre faço, não desci na imunda Carapicuíba, tentei a sorte descendo em Barueri.

Embora em teoria Barueri devesse ser a estação que mais tivesse ônibus para o Alphaville que fica do lado de Parnaíba (a maior parte, aliás) e não Carapicuíba, que fica um pouco mais longe, deixei há um bom tempo de descer em Barueri pois já fiquei ali esperando o ônibus mais de uma hora no terminal em frente à estação. Em Carapicuíba, no entanto, ali eles passam em bem maior número.

Fui realmente fazer um teste. A vantagem de se descer em Barueri é que os ônibus que vão para os Alphavilles de número mais alto fazem um caminho mais lógico e curto. Porém, são poucos.

Como fazia tempo que não descia ali, vi que algo mudou. O terminal é o mesmo, mas entupido de gente e de ônibus. Perguntei a um fiscal da empresa (Benfica Barueri, monopolista na cidade, algo inaceitável numa cidade de mais de 400 mil habitantes e com bairros espalhados por todo o seu território) onde era o local de se tomar os ônibus para Alphaville/Parnaíba, já que as placas do terminal mostravam apenas ônibus para o Alphaville barueriense. Ele me respondeu que não era mais ali, o terminal não comportava mais ônibus intermunicipais, e que eu teria de pegá-lo num ponto situado a cerca de três quarteirões dali.

Nada de tão longe, fui e encontrei o ponto onde ele indicou (na Henriqueta Mendes Guerra, em frente a um terreno vazio e antes ocupado por alguma fábrica que jamais soube do que era). O ônibus demorou uns dez minutos para passar, nem tanto assim. E a viagem até minha casa foi por um percurso lógico e sem as voltas idiotas que alguns ônibus que partem de Carapicuíba dão.

Mas está muito claro o que o fiscal disse: o terminal não aguenta mais. A estação de Barueri está ali e descarrega muita gente para tomar os ônibus. O largo de Barueri (acho que o nome é Largo de São João, nome da igreja que ficava ali e do rio que passa a um quarteirão dali) está praticamente todo coberto pelo telhado do terminal e é bem pequeno, como sempre foi.

A foto acima mostra o largo como era antigamente. A foto é possivelmente dos anos 1920 ou 1930. Vejam a igreja à direita no meio dos casarões. A igreja mudou-se para a avenida e os casarões ou foram demolidos ou estão totalmente descaracterizados. O prédio da estação está à direita, em frente à rua Campos Salles (a da igreja). Dá para ter uma ideia do tamanho do largo, comparando com a foto aérea atual do Google Maps, colocada no topo do artigo.

Não há solução: ou se demolem todas as casas entre o largo e a avenida e à direita e esquerda do largo (dificilmente farão isso), ou se muda o terminal. Mudar o terminal significa mudar a estação também, pois ela é a grande "fornecedora" de passageiros para os ônibus do terminal. Já se falou nisso.

Acredito que a melhor coisa seria manter a estação onde está e mudar o terminal para a estação de Antonio João, não tão longe assim, na divisa com Carapicuíba, próxima ao rio Cotia. Ali há espaço e poderia alimentar o terminal, deixando a estação atual de Barueri como uma estação com movimento também, pois está no centro da cidade. Ou, ainda, mudar de lugar a estação de Antonio João, colocando-a mais próxima da estação de Barueri em um ponto onde há mais local ainda vazio para se fazer um bom terminal.

Seja qual for a solução, está mais do que na hora de a Prefeitura e a CPTM se mexerem para resolver isso.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

A ÚLTIMA VIAGEM

O trem Santa Cruz, Rio-São Paulo, vindo do Rio e passando pela estação de São José dos Campos. Autor e data desconhecidas. Possivelmente anos 1980.

Este texto foi escrito em 9 de novembro de 2003, portanto dez anos atrás, por Roberto Dias Guimarães, 

Não me lembro por que estava em meu arquivo virtual, mas achei-o hoje e gostei dele. Pode ter sido enviado a mim pela pessoa que o escreveu. Deve ter sido. Mas realmente, perdão, não me lembro. Segue o que ele escreveu no provável e-mail que recebi:

"Sou carioca e cheguei aqui em S.Paulo em 1979, transferido na empresa onde trabalhava. Esta cidade é muito diferente do Rio de Janeiro, nos seus hábitos, costumes, tradições e personagens. Logo fiquei impressionado com a seriedade com que eram tratadas as coisas mais corriqueiras. Horários rígidos, os ônibus urbanos pareciam londrinos pela pontualidade com chegavam aos pontos de embarque, a organização das feiras-livres, com suas barracas muito bem arranjadas e alinhadas, teatros em que não se podia entrar trajando calças jeans.

O Jockey Club a exigir paletó e gravata para frequentar as suas dependências sociais e mais um sem número de evidências que faziam com que a vida aqui estivesse a mil anos-luz da que levava no Rio.

Nessa época, década de 1980, fiz inúmeras viagens de trem para lá e, por conta disso, registrei mais uma curiosidade. O trem - Santa Cruz - imponente e confortável partia da magnífica Estação da Luz, pontualmente às 23 h. Nem um minuto a mais ou a menos. 23 horas e ao soar do apito, o trem começava a evoluir compassada e maciamente.

Numa dessas viagens, por volta de uma hora da manhã, quando voltávamos do Carro-Restaurante com destino à nossa cabine, cruzamos com o Chefe do Trem, que era quem recepcionava os passageiros, mostrava as cabines, registrava os horários de jantar e café da manhã, etc... Era responsável por um ou dois vagões, no máximo. Era um negro, já de idade mais avançada, usando pesados óculos, com seu uniforme impecável: calça cinza, paletó branco e um quepe que lhe conferia um ar de comandante das barcaças do Mississipi. Muito sério e envolvido com o seu trabalho.

Depois de acomodar a minha família na cabine, senti vontade de fumar um cigarro e me dirigi até o fundo do vagão onde havia uma janela enorme e, assim, além de não incomodar ninguém, poderia desfrutar daquela brisa da noite que estava muito gostosa.

Nesse local, ficava um cubículo estreito onde o Chefe do Trem podia descansar durante a viagem. Passei por ele, cumprimentei-o mais uma vez e percebi que estava chorando. Enxugando os olhos e os óculos grossos. Perguntei se estava sentindo alguma coisa, se precisava de alguma ajuda, coisas assim. Ele, então, me respondeu que estava chorando porque sentia saudades. Indaguei de quem era a saudade tão doída que o fazia chorar. Para espanto meu, respondeu que já estava com saudades da estrada de ferro, da empresa e, especialmente, daquele trem. Ia se aposentar e aquela era a sua última viagem como Chefe do Trem. Havia trabalhado durante quarenta anos na RFFSA e, ao menos, os últimos vinte e dois naquela função de que muito se orgulhava.

Resolvi, então, "esticar" o assunto e passei a ouví-lo com real interesse pelas histórias que tinha para contar e que eram muitas. A cada trecho da ferrovia ele tinha um fato interessante a relatar, os passageiros ilustres que tinha conhecido, os que tinham medo de avião, as paradas forçadas por incidentes, a luz tênue dos vagões, amarelada, esmaecida,que tinha aniquilado praticamente a sua visão.

Em suma, não dormi naquela viagem. Ficamos conversando a madrugada inteira. Afinal, talvez fôsse eu o último passageiro a quem tinha o prazer de servir.

Chegamos ao Rio, não pontualmente como saímos, mas inteiros e ainda pude lhe desejar muito boa sorte na nova vida. Fiz um amigo e fiquei feliz pois ele me falou, com grande satisfação, que iria voltar no mesmo trem, à noite, mas como passageiro, pela primeira vez.

Seu nome era José e morava no Brás."

terça-feira, 12 de novembro de 2013

MACAÉ, TÍPICA CIDADE BRASILEIRA

Estação de Macaé em 1923, com trilhos, trens e movimento. O Malho
Não conheço Macaé, mas sei que a linha da ex-Leopoldina cruza a cidade e que foi abandonada pela FCA já há algum tempo.

Aí, um prefeito teve a ideia de colocar um VLT - veículo leve sobre trilhos, ou bonde moderno - na linha "inútil". E até que foi rápido na coisa, comprando trens da fábrica lá de Barbalha, no Ceará, a mesma que construiu o VLT de Juazeiro e Crato.

Mas o prefeito demorou para implantar a linha, ou não foi tão esperto assim para conseguir vencer a maldita burocracia brasileira e acabou deixando o cargo no fim de seu mandato. Logicamente, outro prefeito assumiu.

E como todo bom prefeito, resolveu acabar com o que o anterior fez.

Não posso julgar aqui a escolha de um ou outro. Se havia problemas com a implantação do VLT - digo, problemas sérios e reais, não aquela lenga-lenga de análise ambiental e Ministérios Públicos expedindo liminares muitas vezes apenas demagógicas para lá e para cá - também não sei. O fato é que o prefeito anterior, seja lá quem for, teve uma ideia boa para dar um transporte mais moderno para seus munícipes.

Agora, com o VLT suspenso, resolveram fazer uma audiência pública - outra inutilidade que serve apenas para dizer que "quem manda é o povo", quando elas são sempre manipulações políticas e frequentemente mais uma fote de atrasos para a implantação de qualquer coisa - e chamaram os dois prefeitos, o último e o atual. para cada um "defender sua tese" para decidir se o projeto é retomado ou não. É evidente que até agora perdeu-se muito dinheiro pelo ralo da burocracia com a paralização.

Na verdade, quando escrevo estas linhas, a audiência já deve ter sido realizada, pois estava marcada para a noite de ontem, dia 11. Nunca se sabe, pois neste país tudo é motivo para adiamentos quando alguém não quer fazer coisa alguma.

Terá ela, caso tenha sido realmente realizada, resolvido alguma coisa? Ou, como sempre, não servirá para nada, apenas, repetindo o que já disse, para atrasar o projeto e possivelmente permitir seu cancelamento a curto prazo?

Enquanto aqui discutimos o sexo dos anjos, os países árabes, Singapura, o oriente asiático, a Rússia, o leste europeu e logicamente a China, vão construindo o seu futuro bem mais solidamente do que aqui, já que enrolações ali são resolvidas com autoridade e vontade real de se fazer alguma coisa.

Concluam o que quiserem e se alguém souber do que ocorreu - ou não ocorreu - em Macaé ontem, que se manifeste.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

FERROVIAS PAULISTAS: O LINDO FUTURO É O NEGRO PRESENTE


Uma reportagem publicada no extinto jornal carioca "A Rua" em 6 de outubro de 1926, portanto 87 anos atrás, mostrava com o título "Politica Ferroviaria - As estradas em São Paulo e Minas" a situação das estradas de ferro nesses dois Estados.

Eram realmente outros tempos. Investia-se em ferrovias por todo o país, havia ainda diversas ferrovias particulares, as ferrovias que pertenciam ao governo federal e estadual investiam bastante no negócio. Bem ao contrário de hoje, as linhas eram bem cuidadas (em algumas delas, muito bem cuidadas) e os trens proliferavam pelo País todo.

Começavam dizendo que São Paulo havia perdido o título da maior quilometragem por Estado no País havia já 4 ou 5 anos e que Minas Gerais havia lhes passado à frente. O primeiro com 6.873 quilômetros e o segundo, agora, "beirando os 8 mil quilômetros", citando especificamente as aberturas das linhas Ibiá-Uberaba, Mariana-Ponte Nova, Lavras-Três Corações e a Bocaiuva-Montes Claros. Afinal, dizia o jornal, a área mineira era muito maior do que a paulista e que por isso Minas precisava de mais quilometragem.

O jornal, como se quisesse pedir desculpas aos paulistas, afirmava que isto estava longe de ser um fator de decadência no Estado. Era "apenas o reflexo da mudança da diretriz na sua politica ferroviaria". Dizia que as ferrovias paulistas, afinal de contas, estendiam-se por quase todo o seu território e que apenas uma ou outra não chegavam às divisas estaduais, citando como exemplos a Paulista, que parava em Barretos numa linha e em Piratininga na outra, a São Paulo-Goiaz em Villa Olimpia (Olímpia, hoje) e a E. F. Araraquara em São José do Rio Preto, "aguardando os tempos amadurecerem" - seja lá o que isto quisesse dizer.

São Paulo investia agora em qualidade, não em quantidade, ainda segundo o artigo. Era o reaparelhamento que se "urgia reorganizar". A Paulista havia duplicado a linha Jundiaí-Campinas, estava eletrificando-o (na verdade, esse trecho estava eletrificado desde 1922) e alargando a bitola entre São Carlos e Rincão, enquanto avançava a eletrificação de Campinas até Tatu. Também construía (entregara em 1922) o ramal de Piracicaba em bitola larga e começava o prolongamento após Piratininga para atingir o rio Paraná.

A reportagem ainda previa a rápida eletrificação de Tatu até Itirapina e o alargamento da bitola entre Ricão e Pontal (ops! era só até Passagem, dali para a frente foi por outro caminho). Tanto que o jornal citava a compra da São Paulo-Goiaz pela Paulista entre Passagem e Bebedouro, o alargamento da bitola além de Pitangueiras e também no ramal de Jaú. E, finalmente, o início da construção do trecho, já em bitola larga, entre Barretos e Porto Colombia. E até o prolongamento da bitolinha de 60 cm entre Moema (depois Bento Carvalho) e Vassununga.

Depois fala da Sorocabana, que estava investindo pesadamente em trilhos, dormentes e empedramento em suas linhas. E por fim da Mogiana, citando obras e planos de retificação da linha principal (na época, estava sendo entregue a linha nova entre Campinas e Desembargador Furtado) e também empedramento, etc.

A Araraquarense, depois do desastre da administração da Northern Railway, que terminou em 1919, era agora do governo estadual e trocava trilhos e dormentes. Na Noroeste, idem, citando o início das obras da variante de Araçatuba a Jupiá. E diz, para terminar, que apenas duas estradas paulistas estavam "fora deste lufa-lufa": a SPR e a Central do Brasil.

Bons tempos, realmente. Pena que, menos de cinquenta anos depois, muito disso tudo já estivesse sido mantido em condições precárias. Hoje, 87 anos depois, todas as linhas citadas ainda existem (menos a bitolinha de Vassununga), mas muitas estão com pouquíssimo tráfego e outras, completamente abandonadas. Como jogamos dinheiro fora, meu Deus. O mundo inteiro está errado em continuar a modernizar e rodar suas ferrovias: só nós estamos certo em jogá-las ao precipício.




domingo, 10 de novembro de 2013

QUEM IMAGINARIA, EM 1978, QUE...?


No Cebolão já aberto, o ciclista passeia em paz. Foto Reginaldo Manente/OESP - 11/7/1978
O Cebolão foi aberto ao tráfego em meados de 1978. Não consegui encontrar em meus alfarrábios a data exata (talvez algum leitor saiba), mas isto, aqui, não é tão importante.

O que aqui escrevo foi baseado em uma notícia de O Estado de S. Paulo de 11 de julho de 1978, que criticava diversos aspectos do complexo de viadutos, numa época em que o jornal ainda tinha de explicar que ele era "um anel viário com 18,5 quilômetros que interliga as marginais dos rios Pinheiros e Tietê entre si e com a rodovia Castelo Branco". Notar os 18,5 quilômetros, que pode ter sido algum erro de impressão ou uma fonte errada.

O motorista de um Galaxie (Galaxie!!!) reclamava do fato de que ele estava na Marginal Esquerda do Pinheiros e queria entrar para a Castelo Branco, mas confundiu-se com a sinalização, segundo ele, mal feita.

As placas ficavam muito próximas da bifurcação das pistas, de forma que ele, ao invés de seguir para Adamantina (pela Castelo Branco), acabou entrando na Marginal do Tietê e seguindo no sentido da via Dutra. (Não ficou claro como o motorista estava na marginal esquerda do Pinheiros e queria seguir para a Castelo. Acho que o jornal trocou as palavras.) As placas ficavam tão perto dos acessos que não davam tempo ao motorista para decidir onde entrar, causando perigosas manobras na entrada do tal Cebolão.

Outro reclamava que se "a gente vem pelo lado direito e quer ir para a Castelo, que fica à esquerda, precisa atravessar a estrada numa diagonal. O mesmo não acontece para quem está na esquerda e quer ir para as marginais do Tietê".

O trânsito ainda era pequeno, mas a reportagem afirmava que o aumento do tráfego procedente do Cebolão em direção à Anhanguera já estava provocando congestionamentos na alça de acesso ao viaduto Domingos de Moraes, na marginal externa do Tietê, sentido Lapa-Penha, com reflexos na rua Brigadeiro Gavião Peixoto, que vem da Lapa. Curioso. Esse viaduto citado não fica na Marginal, mas sim na rua Brigadeiro Gavião Peixoto, sobre a linha da hoje CPTM.

No primeiro dia de teste do conjunto, segundo o jornal, não havia nenhum policial para orientar os motoristas nas "vinte e uma pistas" do Cebolão. Mal sabia ele que isso jamais ocorreu nos 35 anos que se seguiram. À noite do dia anterior, havia se formado um congestionamento no acesso provisório da Marginal Direita do Pinheiros no sentido do Tietê (não faz sentido - parece que outra vez o repórter trocou a direita pela esquerda) , provocada pelo acúmulo de veículos no cruzamento com uma linha da FEPASA (suponho que ele falava da velha ponte que atravessava o rio, mas não passava sobre as pistas, mas em nível, do ramal da Armour, ponte esta logo além da Anhanguera, logo após a ponte desta estrada).

O consolo era que a ponte dos Remédios, sempre congestionada antes da abertura do complexo, agora estava sempre fluindo bem (esta ponte era a saída para quem vinha pela Marginal Pinheiros para a Castelo, pois o trecho entre a ponte do Jaguaré e o Cebolão não existia antes da abertura deste).

O triste é que esses motoristas reclamões nem imaginavam o que iria acontecer nos próximos 36 anos com o tráfego em toda essa região. Eram felizes e não sabiam.

sábado, 9 de novembro de 2013

AS FERROVIAS DO MAL

Asfaltamento de trilhos no Cabo, PE (foto Facebook/Diego Santos)

Como já disse, recebo colaborações para meu site de estações ferroviárias praticamente todos os dias, fora as pesquisas que faço, lendo inúmeras publicações antigas e modernas e o que se consegue na Internet.

A maioria é realmente triste, mostrando locais outrora movimentados que hoje são abandonados ou transformados para outras funcionalidades. Isto quando não foram demolidos. Nisto se inclui até estações que foram o margo da fundação de muitas cidades.

Outra coisa que me deixa irritado são as promessas não cumpridas por parte das autoridades (reforma de estações, volta de trens, construção de novas ferrovias, etc.).

Muitas das destruições de partes das ferrovias de outrora são flagradas na hora em que estão acontecendo. Boa parte delas, também, é ilegal: em muitos dos casos, as prefeituras não têm ordem para demolir ou arrancar trilhos mas o fazem.
Interior da estação de Piqui, no ramal de Ponta Porã, MS (foto Thobias Pezzoni)

Por outro lado, boa parte das estações e outros imóveis de vilas ferroviárias são abandonadas, quando deveriam ser cuidados por seus donos. Entretanto, isto somente é dever das próprias ferrovias. Das concessionárias, quando requisitam edifícios para seu uso e acabam não os usando... o resultado disto é o abandono e algumas vezes até a demolição. Em outros, os imóveis permanecem nas mãos da entidade "Inventariança da RFFSA", que tem a função de vender o material inservível para levantar dinheiro para pagar as dívida da RFFSA, extinta há cerca de dez anos já. No entanto, o governo, que nos enche de multa quando não cuidamos de nossas casas, não cortamos o mato que cresce em terrenos de nossa propriedade e quando jogamos lixo em local defronte a propriedades nossas, não faz a mesma coisa com a RFFSA, que, apesar de ser do govrtno, é uma empresa, mesmo em inventário.

Quantas estações, prédios e casas de antigos funcionários, quantos trilhos já foram arrancados ou tendo afalto passado por cima sem autorização da RFFSA? Quantas estações podem ser vistas jogadas às traças em meu site? Há quase 5 mil estações (ex-estações e estações atuantes ainda) no Brasil e uma enorme parte dela se encontra abandonada (nunca fiz o levantamento, pois isto muda constantemente). Quantas estações já foram reformadas ou restauradas paa depois de seis meses estarem novamente abandonadas, invadidas ou em ruínas?

No Cabo, cidade ao sul de Recife, em Pernambuco, e que é o ponto final dos subúrbios pernambucanos, recentemente a prefeitura passou asfalto por cima dos trilhos - suponho que seja a parte após a estação, que desce para Alagoas e que não vê um trem sequer há mais de dez anos.

Em Jacaréi em São José dos Campos, SP, os trilhos foram tirados ilegalmente de diversos trechos da cidade sem autorização. Idem em Piracicaba e Santa Barbara do Oeste. E os exemplos são muitos. Fica tudo por isto mesmo.

Este realmente não é um país sério, é um país de governantes mentirosos e com muitos planos - para eles mesmos - e de promessas não cumpridas.


sexta-feira, 8 de novembro de 2013

BURACOS FABRICADOS

Olha o buraco aí (Foto minha em 6/11/13)

Os últimos dias foram de muito trabalho. Não tive tempo nem de pensar sobre o que escrever no meu blog, que deveria ser diário, mas que está cada vez mais difícil de manter esse objetivo.

Hoje e ontem fui e voltei de ônibus para o meu escritório em Pinheiros. E é aí que dá para sentir mesmo como a pavimentação é ruim - com exceção da estrada e mesmo da Marginal do Tietê.

O ônibus que me leva para lá é intermunicipal, com poltronas etc - e como ele treme no asfalto. Buracos, lombadas, pisos irregulares... é mesmo difícil Difícil até de ler a revista que levo sempre para passar o tempo, pois a trepidação, somada à minha vista que nunca foi lá essas coisas, dificulta a leitura das letras.

Já na volta, pego o trem da CPTM e desço em Carapicuíba (a cidade mais suja do mundo) e lá tomo um ônibus urbano - que sofre mais do que o que pego na ida.

Acho que isso nunca vai mudar. Está certo que em anos de eleição, principalmente, os prefeitos e governadores mandam reasfaltasr as ruas, mas isso não dura mais. E tenho de reconhecer que é difícil fazer isso, devido à interrupção do tráfego nas vias a serem reasfaltadas - e haja tráfego.

Buracos e ondulações são comuns, como consequência de veículos pesados e de má formulação do asfalto. Basta vir a época de chuvas que pipocam burados.

Porém, há um tipo de buraco na cidade que me irrita especialmente: são os bueiros desnivelados. Ou seja, quando colocam uma capa nova de asfalto nas ruas, raramente elevam a altura do bueiro e de sua tampa para coincidir com o novo leito - e haja carro caindo com os pneus nesses byracos fabricados por absoluta incompetência pelas prefeituras.

É certo que há vezes em que o nivelamento é feito - mas também é certo que é muito comum encontrá-los nas ruas, neste caso citando os bueiros desnivelados.

A foto lá em cima mostra um deles. Fica na avenida Eusébio Matoso, pista direita de quem vem da ponte do rio Pinheiros e quase na esquina da avenida Faria Lima. Imaginem o estrago para quem cai neles. Abram os olhos, prefeitos incompetentes! - estes, infelizmente, são a grande maioria.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

GANHE DINHEIRO COM O ATRASO DOS TRENS

A estação de Pistoia e o trem. Foto Veronica Giesbrecht Menchi

Minha filha Veronica, que há mais de um ano vive em Pistoia, Toscana, Itália, disse-me hoje que recebeu pelo correio um envelope com um cheque de 11 euros e alguns centavos.

Na verdade, não é um cheque, segundo ela, mas algo como um "vale-desconto", que, quando ela for comprar o próximo bilhete mensal - ou algo do tipo - ela poderá deduzir esse valor do preço total.

Mas, afinal, por que ela ganhou o desconto? A resposta: quando o trem atrasa, v. pode preencher um formulário de reclamação que existe nas estações. Fazendo isto - ela já preencheu vários - a uma certa altura você recebe este vale-desconto, dependendo, claro, da quantidade de minutos de atraso e eventualmente algum outro fator.

É verdade que esse trem que ela toma em Pistoia e que segue para Firenze (Florença), onde ela trabalha, é chamado de trem metropolitano. Mas n"ao tem a quantidade de horários do nosso metrô paulistano ou da CPTM. Segundo ela, o trem sai mais ou menos de meia em meia hora.

Os trens aqui em São Paulo não têm realmente horário. Se têm, não são afixados: deve ser uma tabela que somente os maquinistas possuem. O que se sabe é que os trens do metrô têm intervalos de cerca de um minuto, um minuto e meio. Fora do horário de pico, este intervalo deve aumentar.

Já os trens da CPTM passa menos vezes - os intervalos são maiores, em fins de semana, podem chegar, sim, a meia hora.

Pela quantidade de trens existentes, bem mais do que os trens metropolitanos que ligam Pistoia a Florença, fica difícil reclamar de atrasos no horário - além do fato que não há um horário divulgado.

Já pensaram se fosse igual aqui no Brasil?

sábado, 2 de novembro de 2013

CACOS DA VARIANTE DE JUPIÁ

A atual estação de Araçatuba (a quarta da cidade desde sua instalação em 1908 - esta foi construída já fora da zona urbana cidade em 1992). Todas as fotos são do colaborador, cujo nome está no texto.
Hoje recebi de um colaborador de meu site sobre estações ferroviárias brasileiras uma série de fotografias e comentários sobre a variante de Jupiá.
Ferdinando Laboriau, antiga Ministro Konder, de 1929.
Mas qua raios é a variante de Jupiá? No final dos anos 1930, a E. F. Noroeste do Brasil começou a construir uma linha a partir de Araçatuba que, em vez de seguir o vale do rio Tietê, encostadinho no rio (ou quase) como era a linha de 1909 que ligava esta cidade ao rio Paraná em Jupiá, seguiria agora pelo divisor de águas dos rios Aguapeí e Feio até atingir o mesmo ponto e cruzar o rio Tietê na ponte construída em 1925.
Iporanga, ou Iporangá, foi demolida. Estes são alguns tijolos remanescentes do prédio, de 1929
Era uma linha mais moderna, com menos curvas e também mais longe da poeirada que era o trecho antigo e de seus focos de malária.
Guararapes-nova, em frente à estação original de Guararapes "velha", de 1949
Em dez anos, a variante foi entregue. O trecho da velha linha entre Araçatuba e Jupiá via Lussanvira foi mantido como um ramal e o mais problemático, entre esta última e Jupiá, passando por Ilha Seca, Timboré e Itapura, foi extinto em 1940.
Guararapes-velha, de 1929
Pouco mais de setenta anos depois, poucas composições cargueiras ainda passam pela variante (que já deixou de ser variante há muito tempo); os trens de passageiros acabaram ali em 1993 e após isso, as estações e pátios tornaram-se um abandono só. Existem, ou existiram, dezessete estações nesse novo trecho, sem contar as duas terminais (Araçatuba e Juquiá). Praticamente todas estão em petição de miséria.
Rubiácea, de 1930
Odilio Pereira de Queiroz Neto, este o nome da boa alma que mandou o material como atualização para o meu site (é bom lembrar que jamais estive nessa região, exceto Araçatuba e que todas as informações dessas estações nas páginas de mau site vieram de pesquisa bibliográfica e colaborações de terceiros), fê-lo referindo-se às seis primeiras estações a partir de Araçatuba. Uma delas foi demolida e as outras cinco estão em ruínas. É incrível que duas ou três delas, mesmo assim, sejam ainda utilizadas como moradias.
Bento de Abreu, de 1930
Assim como os cães ladram e a caravana passam, neste caso, as estações se dissolvem e os trens cargueiros passam.
Valparaíso, de 1932

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

O RIO DE JANEIRO DE 1927

O Rio de Janeiro antigo. Foto sem data. Autor desconhecido.

Antes de transcrever esta carta, escrita por meu avô Sud à minha avó Maria em fevereiro de 1927, alguns esclarecimentos: O português é o da época (reparem a falta de acentos - era muito mais fácil escrever sem eles); Ele passou os seis primeiros meses de 1927 no Rio de Janeiro para organizar o censo escolar da capital federal; teve uma oferta para ser transferido para lá, que não aceitou, ao fim de sua estada, em junho; Aecio e Astréa são seus filhos (Astréa é minha mãe, hoje com 90 anos). Segue a carta:

Maria

Fui domingo visitar o Horto Florestal, cujo director é o Francisco Iglesias, um conterraneo e amigo velho. Fiquei lá toda a tarde. Almoçamos e jantamos na casa de meu amigo e só à noite é que viemos dar uma volta pela cidade.

O Horto Florestal é um sitio maravilhoso. Alias, em materia de maravilhas o Rio não tem competidor em parte alguma do mundo. Aqui é um assombro de paisagem, que nos deixa boquiabertos e encantados a cada instante. Dizem as chronicas que o Horto era a estação de verão de D. Leopoldina, a infeliz rainha brasileira. Como gostava de historia natural, nenhum lugar se prestaria mais a esse estudo do que nesse amphitheatro natural que se formou num reconcavo da serra.

Hontem, continuando minha inspecção censitaria, dei a volta de Santa Thereza, num caminho que fica mais ou menos paralelo á estrada de ferro que leva ao Corcovado. Eu já perdi o habito das exclamações ruidosas de prazer e de admiração, mas tenho aqui de abandonar o meu ar de sbriedade e fazer como os outros.

Hoje vou dar a volta da Tijuca (a volta pequena, porque a grande, que vae terminar em Jacarépaguá eu já fiz).

Com todas essas bellezas, o Rio é a certos aspectos uma cidade intragavel. Tem zonas immundas e sujas. Perto da cidade, ma Ponta do Caju, tem duas praias infectas. E uma dellas se chama por cumulo de ironia a Praia do Retiro Saudoso. Os suburbios do Rio estão abbandonados ha annos. Não têm melhoramento algum, nem siquer o simples calçamento. Seguramente ha uns tres bons quatriennios que nada se faz por aquelles lados, onde mora a verdadeira população operosa da cidade. Mas os prefeitos só cuidavam do lado onde residem os vagabundos, que, por isso, não têm que fazer, sobra tempo que farta para fazer reclamações.

Ainda continuo a pensar, a proposito de nossa mudança para cá, aquillo mesmo que te disse na ultima carta. Ou elles me pagam o minimo de tres contos de reis ou eu não fico. O que é bonito deve ser para todos. Trabalhar emquanto os outros gozam... ah não. Trabalhar por trabalhar fico em São Paulo onde ninguem estranha que a gente se mate.

Por hoje chega. Abraços ao pessoal, D. Constancia, seu Daniel, beijos ao Aecio e á Astrea e aos pequenos dos cunhados e abraços do teu

Sud