terça-feira, 4 de junho de 2013

OS TRILHOS DO MAL (XII): LENÇÓIS PAULISTA, BAURU E UMA DISCUSSÃO

Lençóis Paulista em 2007. A foto mostra quase a cidade inteira (Foto xadreztorneios.blogspot.com)
Conversa de hoje por e-mail entre meu amigo Mario e eu, com algumas ponderações do Adriano, sobre as notícias de possíveis retiradas de trilhos na pequena cidade (70 mil habitantes) de Lençóis Paulista, região de Bauru. Inicialmente, transcrevo a matéria de jornal que engatilhou a discussão:

"ALL estuda contorno ferroviário em Lençóis Paulista (03/06/2013 - Jornal Tribuna): A ALL – América Latina Logística – vai iniciar um Estudo de Viabilidade Técnica Econômica e Ambiental – EVTEA para verificar a possibilidade da construção do contorno ferroviário na cidade de Lençóis Paulista. Representantes da ALL e do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (DNIT)estiveram reunidos na tarde desta segunda-feira, dia 3 de junho, juntamente com o Deputado Federal Milton Monti, o presidente da Câmara Humberto José Pita, a prefeita Bel Lorenzetti e diretores para anunciar o estudo. O EVTA realizado pela ALL, que deve ser concluído em 120 dias, analisa a capacidade da ferrovia nos municípios, o melhor traçado, a segurança, instalação de passagens de nível, entre outros aspectos técnicos.

O trabalho também considera aspectos de engenharia, socioeconômicos e ambientais que serão necessários para a execução do projeto. O custo inicial do estudo é de R$ 500 mil. O contorno ferroviário é uma obra de infraestrutura pública que deve ser pleiteada pelas prefeituras junto ao Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (DNIT). As obras são executadas com recursos do governo federal e a ALL – concessionária responsável pelo serviço de transporte de cargas – realiza uma consultoria técnica no projeto para assegurar a segurança e a produtividade da operação ferroviária.

O contorno ferroviário oferece uma série de benefícios, com a circulação fora do trecho urbano, é possível reduzir problemas como barulho das buzinas e interrupção do tráfego de veículos em passagem de nível. A realização do estudo é resultado da parceria entre a ALL, Triunfo e Vetorial – a Vetria Mineração – que irá atuar na extração, transporte e comercialização de minério de ferro de Corumbá (MS) via terminal portuário próprio em Santos (SP)." (final do artigo)

Acho que todos aqui já conhecem a minha opinião sobre a nova moda de "contornos ferroviários" que está virando a coqueluche no antigo Ramal de Bauru da Sorocabana. Não obstante esse trecho precisar de retificações já há muito tempo, tirar os trens de dentro da maior parte das cidades daquela região é uma desculpa e tanto para tentar viabilizar a existência da Vetria, que é quem está fazendo o estudo de viabilidade dessas obras. Coincidência isso?

Com a entrada em operação da Eldorado Celulose o tráfego de composições em Bauru aumentou muito pouco, coisa de 3 para 4 composições em dias mais movimentados, e olhando isso na maior cidade da região, que tem apenas uma passagem de nível dessa linha dentro da cidade, o que por si só não justificaria uma obra assim. Com as regras atuais de concessão, onde o concessionário não é indenizado no caso de melhorias e obras em via permanente, o único jeito economicamente viável de se promover retificações e melhorias em linhas já existentes, infelizmente, é de iniciativas como essa, pegando carona nos PACs da vida, e arrumando pressão política junto aos prefeitos para o governo federal pagar as obras.

O lado ruim dessa história é justamente ter que emplacar esses contornos ou anéis ferroviários para isso e tirar os trens de dentro da cidade, justamente de lugares que só passaram a existir por conta da parceria café-ferrovia no final do século 19 e início do 20. Bauru não é diferente, juntaram a ganância e especulação imobiliária, com verbas do PAC etc. e a grande novidade anunciada pelo prefeito é uma ida até Brasília para tentar conseguir verbas para erradicar os trilhos e implantar BRTs no lugar.

Um lugar que a ferrovia é praticamente um sinônimo que fez a cidade crescer muito no mapa e das poucas que já foram servidas por três ferrovias, sendo que uma iniciava na cidade. Agora quer simplesmente esquecer seu passado e perde a oportunidade de usar a malha ferroviária já existente para o transporte coletivo, com possibilidade de estender para a região, uma vez que boa parte dessa malha nem mais será utilizada se os novos trilhos circundarem a cidade. O pior de tudo é que o caso de Bauru não é isolado...

Bom, projeto global nem pensar, certo? Primeiro contornam uma cidade, depois outra, depois outra... Agudos fica no mei das duas o e se quiser também vai ser depois que as outras forem feitas. Vai ficar uma linha com uma sequência de simbolos do McDonald. Transporte de passageiros sobre trilhos para aproveitar a malha existente geralmente é a última coisa em que pensam. Não adianta depois tentar usar a linha "nova" pois, além de ter sido feita para cargas, passrão longe da cidade, por motivos óbvios. Gasta-se dinheiro para fazer os contornos.

Uma análise global é feita nesse sentido? (quanto se gasta mais em x anos, mantendo a linha atual e construindo a linha nova - incluindo, naturalmente, o custo da abertura da linha nova). Pode até ser vantajoso, mas como o estudo não é feito, nunca vão saber. Enfim, é isso aí. Planejamento de infraestrutura no Brasil é coisa que não existe. Particularmente, creio que houve um tempo em que existia muito mais do que hoje e o país tinha muito menos gente.

 Fora que: o ramal de Bauru foi retificado em 1966. Só que as retificações foram sempre entre as estações. Nenhuma das estações, mesmo as pequenas, teve o local alterado. Isso provavelmente foi feito para evitar grandes desapropriações e também por causa da topografia dentro das cidades por onde passa a linha. Os trens de passageiros acabaram na linha em 1976. As plataformas das estações do ramal foram arrebentadas recentemente para que os trens pudessem passar, e sem autorização dos donos - inventariança da RFFSA. Nota: claro que ninguém se importa com velhas estações abandonadas (e nem com as conservadas) e com a inventariança da RFFSA, que daqui a pouco acaba por falta de bens, não por terem sido vendidos, mas sim roubados e destruídos.

Finalmente, é interessante notar a matéria que originou a discussão e ver que aquela história de "com a circulação fora do trecho urbano, é possível reduzir problemas como barulho das buzinas e interrupção do tráfego de veículos em passagem de nível". Gente que ouve falar e escreve, sem analisar realmente se, numa cidade do porte de Lençóis, isso afeta grande coisa. Afinal, até hoje a ferrovia está praticamente no limite urbano da cidade.

6 comentários:

  1. Ralph : Sempre acham um pretexto para que os trilhos sejam erradicados para que no local sejam implantados no local a péssima cultura do "asfalto e pneus" . Este filme é parecido com o quê ocorreu aqui em São Paulo com a extensa malha de Bondes no final da década de 60 , com a desculpa de implantar uma extensa malha Metroviária que apesar dos pesares é pequena e a mais lotada do mundo e se não for será .......coitado de nós habitantes Paulistanos...
    Sei que cidades crescem e continuaram crescendo.É erradicado o passado ( extremamente importante em termos culturais e identidade histórica ), implantam o novo e o problema persiste.......Abraços: Fábio Tranquelin.

    ResponderExcluir
  2. mera especulação quero vem onde na regiao de bauru vao encontrar de novo 4 linhas vindo de quatro direçoes diferentes pode ate sair mas vai ficar caro muito caro.

    apartir de lençois ate toledo praticamente existem obras de retificaçao iniciadas pela fepasa a mais de 20 anos e nunca concluidas creio que estas ares ainda pertençao ao governo federal e isso como fica? lençois tem 2 duas passages de nivel a linha passa na margem da cidade o que justifica este contorno? so pode ser mesmo a all querendo viabilizar o trecho para transporte do minerio da vetria sem muito investimento dela pois o trecho lençois toledo e praticamente inviavel ao transporte de minerio grande fluxo

    ResponderExcluir
  3. Putz! Não acredito que querem retirar os trilhos de Bauru! Isso é um 'sacrilégio' com a memória da ferrovia e da própria cidade de Bauru. Existem cidades nos paises da Europa que tem patios muito maiores que os de Bauru e nem por isso atrapalham, a diferença é que são bem estruturados aprentemente. Não sou contra o progresso mas pra mim é um absurdo. Deveriam é pensar em trazer os trens de passageiros de volta e fazer melhorias nas ferrovias. Lastimável! Lamentavel! Estou indignado!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Endosso as palavras do Garcia. Construir o Futuro sim mais destruir um passado glorioso é BURRICE!!!!!!!!!!!!!!! Quantas cidades que são históricas mas perderam sua identidade no Brasil : Varias.............

      Excluir
  4. Bauru tranquilamente comporta um trem regional, ou VLT, melhor ainda, dentro da cidade e esticando pelo menos até Lençois e Alfredo Giedes, passando por Agudos, com pequenas modificações na linha atual. Aí, podem fazer a linha cargueira por fora da cidade e gastar o dinheiro que quiserem. A coisa é manter o que já existe, dando utilidade a ele. A cegueira administrativa no Brasil é muito grande. Pensa-se com o bolso e não com a massa encefálica.

    ResponderExcluir
  5. Contorno em Bauru, isso não vai sair nunca, o relevo da cidade é acidentado, não permite uma obra dessas.

    ResponderExcluir