sexta-feira, 31 de julho de 2015

1953: QUANDO A FERROVIA NÃO ERA MAIS A MESMA

Estação de Engenheiro Serra em 2000 - já "no osso". As outras estações desse trecho da Sorocabana eram, provavelmente, muito similares a essa. Foto do autor deste blog.

Em 1953, a Estrada de Ferro Sorocabana, depois de uma obra que levou vários anos, entregou ao tráfego a variante que ligava as estações de Rubião Junior, em Botucatu, à de Barra Grande, em Avaré.

Essa variante, na sua linha-tronco, diminuía a distância entre as estações citadas, além de entregar uma linha mais moderna e, ainda por cima, eletrificada. Note-se que o primeiro trecho dessa eletrificação foi entregue em 1944, nove anos antes, em um trecho que havia sido retificado em 1928 e eletrificado dezesseis anos depois. De lá para 1953, outras obras foram realizadas entre Iperó e Conchas e entre esta e a estação de Botucatu, este último com uma obra de grande vulto que entrou pela Serra de Botucatu com novos viadutos e túneis.

Aí se via que o futuro dos trens de passageiros já estava sendo sacrificado em favor de um traçado melhor e mais rápido para o transporte de mercadorias.
Restos da estação de Juca Novaes, em 2000. Aqui também, notem a desolação do local. Foto do autor deste blog.

Por que digo isto? Porque, especialmente nos traçados de Conchas a Botucatu e de Rubião Junior a Barra Grande, todas as velhas estações existentes nos trechos agora abandonados sofreram um grande baque no seu acesso à linha.

Concentrando-me mais na variante de 1953, as estações de Paula Souza, Miranda Azevedo, Lobo, Itatinga, Macedônia, Andrada e Silva, Ezequiel Ramos, Avaré e Ouro Branco foram todas abandonadas. Destas, apenas Itatinga e Avaré eram sedes de municípios e, por isto, ganharam novas versões.

A de Itatinga foi colocada em outro ponto, mas não tão distante do outro. Ganhou uma estaçãozinha vagabunda de madeira. Em teoria, provisória. Na prática, jamais foi substituída; foi destruída por um incêndio anos mais tarde. Aliás, a estação de Itatinga antiga nem estava no tronco,mas na ponta de um curto ramal que obrigava a quem viesse pela linha-mestra da Sorocabana a fazer uma baldeação na minúscula e longe de tudo estação de Miranda de Azevedo e tomar outro trem para chegar a seu destino. Na linha nova, a estação de Itatinga, embora em madeira, passou a ter um acesso mais fácil. Foi um caso único nessa retificação.
Restos da estação de Engenheiro Miller, em 2000. Notem a desolação do local. Foto do autor deste blog.

A de Avaré foi colocada num ponto oposto à estação original em relação à cidade. Também era provisória e, de todas as novas, foi a única que recebeu, cinco anos depois (1958) um novo prédio de alvenaria. Era uma estação muito maior do que a antiga, mas também muito mais feia, totalmente em concreto.

Paula Souza e Miranda Azevedo ganharam também uma nova versão, mas em locais ermos. As outras quatro, Engenheiro Vazquez, Engenheiro Serra, Engenheiro Miller, Juca Novaes e Ouro Branco - esta última, depois de Avaré - estavam em locais isoladíssimos. Todas em madeira, pequenas. A única que havia sobrado em 2000 foi a estação de Engenheiro Serra. Estava um caco e totalmente podre quando cheguei ao povoado, depois de uma enorme luta para fazê-lo, seguindo por uma longa estrada de terra. No ano seguinte, seria derrubada - ou teria caído, não sei. Comparando Engenheiro Serra com as outras, esta parece ter sido a única que tinha uma espécie de bairro rural junto a ela, com sítios espalhados e com grande distâncias entre um e outro. Já a de  Engenheiro Vazquez jamais consegui encontrar. Na verdade, ela foi a única que foi desativada muito cedo pela ferrovia, cerca de oito anos depois de sua abertura.

O fato é que, desta quatro estações, três com nome de engenheiros e uma com nome de Juca Novaes, eu visitei três. Locais muito isolados, acessíveis (e isto já em 2000) apenas por estradas de terra. Os embarques de passageiros nestas estações eram próximos de zero. Eram tão distantes de qualquer coisa que jamais consegui qualquer referência, qualquer história sobre os seus quarenta e cinco anos de vida útil. Nem de pessoas de Avaré, nem em jornais da época. Aliás, a simples denominação destas quatro estações. tão longínquas das estações correspondentes da linha velha (no caso, o trecho incluiria Lobo, Macedônia, Andrada e Silva e Ezequiel Neves), já mostravam a falta de referência para se dar nomes que não fossem de pessoas que nada tivessem a ver com esse traçado - o nome de engenheiros. Já Juca Novaes parece ter sido um político de Avaré e talvez - mera suposição de minha parte - fosse o dono das terras próximas à "sua" estação.

Isto mostra o seguinte cenário: a Sorocabana, nos anos 1950, ainda mantinha seus trens de passageiros, mas a decadência já se fazia presente. Ela ainda estava preocupada em diminuir suas distâncias e aumentar a velocidade de seus trens, mas já não se importava em contrariar os seus passageiros, colocando a linha bem longe das áreas povoadas. Isto não foi feito, com certeza, para sabotar os usuários, mas também foi feito sem grande preocupação com eles.

Para quem sempre está procurando histórias sobre estações ferroviárias, é uma frustração.

quarta-feira, 29 de julho de 2015

SEGUIR OS TRILHOS, O CAMINHO DAS CARROÇAS OU O VELHO BONDE?

Bonde na rua Domingos de Moraes.

Hoje, como já fiz diversas vezes, fui ao bairro da Saúde de metrô. Para quem não sabe, esse bairro fica para lá da Vila Mariana, no sentido de quem vai para o Jabaquara. Aliás, a avenida se chama Jabaquara naquele ponto.

Quando tomei o metrô ao lado do largo de Pinheiros, segui a linha 4 até a estação Paulista. Dali, fui pelo túne subterrâneo a pé para tomar o metrô da linha 2 para a estação Saúde. Quando já estava dentro do carro, tendo saído da estação de embarque, lembrei-me do que já estava cansado de saber, mas que, na minha mente, se confundia. Eu teria de mudar de novo de carro na estação Paraíso, para tomar a linha 1, no sentido Jabaquara. Esta é a linha norte-sul. Se eu permanecesse na linha 2, iria sair no Ipiranga, Sacomã, Vila Prudente, muito longe do meu objetivo.

É certo que ando meio distraído, mas neste caso, a distração tem uma explicação, por mais incongruente que possa parecer a alguns leitores.

Eu nasci no Sumaré, nos anos 1950. Morei lá até 1974. Como sempre ia à casa de minha avó, na Vila Mariana, eu o fazia ou de carro com meus pais, ou de bonde (até 1966), ou de ônibus (o antigo 55, que tomava na Doutor Arnaldo e que me deixava na esquina da rua Domingos de Moraes com a rua Capitão Cavalcanti).

Eu acompanhava o fluxo de trânsito dos automóveis, mas também a linha de bonde, que seguia, ininterrupta, desde a Doutor Arnaldo até a Domingos de Moraes, continuando depois da minha descida do bonde ou do ônibus rumo ao Jabaquara. Eu gostava de bondes. Ainda gosto, e muito... pena que eles foram extirpados da face da Terra... não, das ruas de São Paulo mesmo. Na Terra, eles ainda existem e não são poucos. Já no Brasil...

Porém, para um paulistano mais velho do que eu, ou melhor, muito mais velho, a ponto de ter vivido no século XIX e morrido, por exemplo, no século XX, lá por 1920, este percurso não seria tão lógico quanto me parece hoje.
Estação Saúde do Metrô (Wikipedia)
Embora a parte mais alta da hoje enorme área urbana seja realmente o espigão da avenida Paulista, que vem desde o Alto do Sumaré, no eixo da avenida Doutor Arnaldo, seguindo pelo eixo das avenidas Paulista, Bernardino de Campos, rua Domingos de Moraes e avenida Jabaquara até a Igreja de São Judas,para um paulistano do século XIX, esse espigão ficava fora da cidade. O centro da cidade era então bem definido na Praça da Sé, que tinha, como hoje, a praça João Mendes junto a ela. Dali saía a rua da Liberdade, que subia lentamente no sentido da Estrada do Vergueiro, continuando a pelo leve aclive até a rua do Paraíso.

Ali, a estrada do Vergueiro seguia para o lado do vale do rio Ipiranga, não sem antes jogar seu "trânsito" (entre aspas porque, nessa época, mesmo as carroças e cavalos eram poucos por ali) para um caminho que se bifurcava nesse ponto e que em 1896 viria a ser chamado de rua Domingos de Moraes. No século XIX, no entanto, essa rua se chamava Caminho do Carro para Santo Amaro e seguia pelo topo do espigão (como hoje) até onde hoje é a rua Luiz Goes, desviando nesse ponto para a direita e descendo o vale do córrego Paraguai, na atual avenida Senador Casemiro da Rocha até Santo Amaro, passando por um caminho hoje meio indefinido no meio do atual Planalto Paulista e do aeroporto de Congonhas.

Por causa dessa saída para a direita, em algum momento, construiu-se a atual avenida Jabaquara, que hoje é a continuação natural do fluxo de tráfego da Domingos e era também a continuação da linha do bonde, no início, para Santo Amaro (por outro trajeto), depois, para o córrego Jabaquara, que é o outro nome do Córrego das Águas Espraiadas. Ali, no alto do espigão da avenida, fica a Saúde e a estação Saúde do metrõ,,, e no final do século XX também tinha a estação da Saúde, que, no entanto, ficava bem antes do atual bairro e da atual estação, ou seja, na altura da rua Santa Cruz.

Para sedimentar mais ainda o raciocínio que o eixo do Caminho do Carro, seguido pela avenida Jabaquara, era o caminho principal para o sul da cidade, vale ressaltar que o Tramway de Santo Amaro, de Alberto Kuhlmann (depois comprado e miodificado pela Light em 1900) também seguiu esse trajeto: saía da rua São Joaquim (onde acabava, e ainda acaba, a rua da Liberdade e começava a Vergueiro), prosseguia pelo eixo do espigão sem dobrar no vale do Paraguai, seguindo pela Jabaquara até próximo ao aeroporto de Congonhas, dali seguindo para o largo Treze de Maio, em Santo Amaro, por dentro dos bairros atuais de Campo Belo, Brooklyn e Alto da Boa Vista.

Notar que hoje em dia a Liberdade e a rua Vergueiro são vias decadentes. Já o Sumaré e a avenida Paulista estão na área mais rica da cidade, ou seja, a Zona Oeste.

Portanto, voltando para a minha "lógica" de pensamento, a linha do atual metrô deveria seguir sempre pelo espigão da Paulista. Para o paulistano mais antigo, pela linha Liberdade-Vergueiro até encontrar esse espigão no bairro do Paraíso. Só que, no século XIX, os bairros do Sumaré e a avenida Paulista eram somente mata atlântica.

Confuso? Sim, para quem conhece pouco São Paulo, certamente o será. Mas, para quem gosta do assunto, algo a pensar. Enfim, duas diferentes linhas do metrô fazem todo o trajeto do espigão da Paulista, e não uma só. A troca de linhas se dá na Vila Mariana, ou na estação Paraíso, ou na Ana Rosa. Você escolhe.

segunda-feira, 27 de julho de 2015

O METRÔ PAULISTANO EM 2030


Uma edição do jornal O Estado de S. Paulo de cerca de três anos atrás publicou uma matéria sobre pelo menos algumas das linhas previstas para serem construídas e entrarem em funcionamento até o ano de 2030.

É evidente que, no Brasil em que vivemos, prever alguma coisa com um ano de antecipação já é algo arriscadíssimo. Imaginem falar em 2030. Não sei, de qualquer forma, se outras reportagens existiram durante estes três últimos anos, em que deixei de acompanhar o jornal de perto. Mas creio que não. De qualquer forma, não será nenhuma surpresa se diversas modificações nesses traçados - que se podem ver pelo mapa colocado no topo deste artigo e reproduzido da edição de 14 de setembro de 2012 - forem totalmente modificadas durante os próximos anos, mesmo se, por grande surpresa para todos, todas essas linhas que aparecem no mapa vierem mesmo a ser abertas daqui a 15 anos.

O fato é que a cidade continua a crescer, mesmo com o pouco espaço que tem. E também que novas linhas e novas ruas e avenidas sempre acabam levando o povoamento junto.

Por isso, criticar o metrô por ter construído uma linha "errada" sempre vai ser uma injustiça. Na verdade, por mais que haja pesquisas, nunca uma linha vai estar num lugar onde não seria preciso estar.

Primeiro, porque, se a região por acaso não crescer junto com as obras da linha, certamente crescerá depois da linha pronta e rapidamente. Não deve ser fácil trabalhar na área de projetos no metrô. Até 2030!

sábado, 25 de julho de 2015

A ROTA DA BAUXITA ACABOU. E AGORA?

Acima, Cataguases, Recreio, Leopoldina, Volta Grande e Além Paraíba. A linha que faz a rota da bauxita corre ao longo da BR-393, depois, em Volta Grande, passa a correr ao lado da rodovia MG-454, depois cruza a BR-116 e vai no sentido de Cataguazes, entrando e saindo do município de Leopoldina (cuja figura em vermelho não mostra o município, mas apenas o distrito da sede). Infelizmente a escala deste mapa não permite ver o traçado da linha férrea. (Google Maps)
Este artigo poderia se chamar, também, LEOPOLDINA E A LEOPOLDINA.

Bem, depois de cerca de seis meses de rumores, a rota da bauxita - agora é oficial - vai acabar no próximo dia 31 de julho, ou seja, a menos de uma semana de hoje.

E agora, qual vai ser a desculpa da prefeitura de Leopoldina, MG, para não colocar ali nessa linha (que rapidamente vai ser abandonada e ter os trilhos arrancados, seja pelo próprio dono deles - a União - como pelos sucateiros de plantão, que não precisam de autorização governamental?) um trem de passageiros, um trem metropolitano, um Veículo Leve Sobre Trilhos (VLT) em vez de construir uma avenida? (Não que a Prefeitura dessa cidade tenha afirmado isso, mas uma lâmpada costuma acender para os prefeitos aqui da terrinha quando uma linha férrea é abandonada, que adoram construir avenidas e pensam que trens são trambolhos que já deram que tinham o que dar no século XIX)
Recreio - uma paisagem pitoresca que vai acabar em poucos dias, bem como o movimento das oficinas da linha, dentro desta cidade. (Foto recebida de terceiros; autor desconhecido)

Bom, avenida ela não vai construir, porque a linha hoje passa pela zona rural do município e a prefeitura não terá ali uma avenida para os munícipes "admirarem". Aliás, uma estrada de terra passa ao longo dos trilhos entre Recreio (que não pertence ao município de Leopoldina) e Volta Grande (que também tem seu próprio município). Se a prefeitura de Leopoldina até hoje não asfaltou essa estrada entre as suas divisas com Recreio e com Volta Grande, é porque ela simplesmente não quis. Os ônibus que servem aos bairros rurais que têm quatro velhas estações - de Recreio para Além Paraíba, as estações de Abaíba, São Martinho, Providência e Trimonte, esta já no município de Volta Grande.

Depois desta última, as estações são: Volta Grande, Fernando Lobo (já em Além Paraíba), Melo Barreto e Além Paraíba.

Há três velhas estações da Leopoldina (aqui, falo da antiga ferrovia, não da cidade) em solo leopoldinense (aqui, o adjetivo refere-se à cidade de Leopoldina), em cerca de vinte quilômetros de trilhos em solo do município. Passando a cidade de Recreio, a linha volta a ficar em solo leopoldinense por mais três estações, também por mais aproximadamente vinte quilômetros (estações de Ribeiro Junqueira, um posto telegráfico sem nome e a estação de Vista Alegre, que era de onde saía a linha da Leopoldina para Leopoldina (da ferrovia para o centro da cidade) entre 1877 e 1964).

Da última estação, Vista Alegre, ela segue para a cidade de Cataguases, passando por mais uma estação antes de chegar à estação central deste último município. E, desta, ainda segue mais além, bem mais além, passando por Barão de Camargos e outra estações menores até chegar a Ubá, seguindo dali para Ponte Nova e para Caratinga.

Porém, prestemos atenção: para lá de Barão de Camargos, muito mato e terra sobre a linha e trechos de linha roubado. Afinal, desde 1997, apesar de ter sido privatizada também, a linha jamais interessou e portanto não foi utilizada pela FCA, atual concessionária; podem chamá-la de VL! (o ponto de interrogação está correto, não é falha de datilografia), se preferirem, seu novo nome já há algum tempo.

Enfim: o que para mim seria razoável restaurar uma linha de passageiros, com trens novos, entre as estações de Cataguazes e de Além Paraíba, que, aliás, é o primeiro município na fronteira sul do de Leopoldina.

Esta linha era parte da chamada Linha do Centro da E. F. Leopoldina. Na verdade, a última que sobrava em tráfego dentro do Estado de Minas Gerais, dentre outras linhas da mesmoa ferrovia e que já foram abandonadas há pelo menos quinze anos (algumas, desde os anos 1960 e 70, tiveram os trilhos retirados ainda dentro do período da RFFSA).

Para começar este empreendimento, o primeiro passo a ser dado seria uma reunião dos prefeitos de Cataguazes, Recreio, Leopoldina, Volta Grande e Além Paraíba. Aqui no Brasil, isso não é fácil. A reunião sim, já decisões conjuntas... Somente após eles quererem o trem, poder-se-ia então pedir isso à União. Isso, se até lá, a linha já não houver sido arrancada. Aí, vem aquelas coisas: licitações, licenças ambientais (como se uma linha que está ali desde 1877 e que funcionou até hoje devesse ter uma licença ambiental para trocar o tipo de trem que a percorre - mas, aqui, sabemos, é Brasil). E isso pode tomar anos. Para se evitar o desgaste, invasão, roubo de trilhos, etc. , o correto seria colocar o mais rápido possível um trem provisório na linha, com carros reformados e uma locomotiva a diesel.

Para se conseguir isto, é necessário ter ao mínimo uma coisa chamada vontade política. Terão estes senhores a vontade política para usar esta linha em prol de sua população?

Finalmente, um esclarecimento. Primeiro, escrevi há três anos um artigo falando desta região e sobre o trem da bauxita, que pode ser lido aqui: As viúvas da Leopoldina. Segundo, sei que há muitos conhecidos meus e que estão no mesmo barco que eu, ou seja, que gostam do assunto trens brasileiros, que discordam de minhas posições com relação à volta dos trens de passageiros.

Porém, eu insisto no assunto e martelo sempre a mesma coisa, porque basicamente acho que a situação hoje para as ferrovias é bastante diferente do que era nos anos 1960 e 1970, quando uma série de linhas brasileiras foram abandonadas pelo trens de passageiros (e até de cargas), sob uma óptica de que trens eram ultrapassados - conceito em que, até hoje, muitos dirigentes acreditam - ao mesmo tempo em que se baseavam em ferrovias que estavam, em grande parte, já obsoletas. Eu creio que hoje temos uma situação diferente, em que, acreditando nelas, teremos resultados bem diferente para as estradas de ferro no Brasil. Há que se renovar.

Quando penso em trens de passageiros, não penso nos trens R da Paulista nem nas porcarias que ainda transportavam passageiros em ramais pequenos ou em ferrovias do Nordeste. Penso em trens e linhas novas e sempre tendo em mente que este é uma medida necessária, como alternativa para ônibus, carros particulares e aviões e que, sem ser uma fábrica de gerar lucros, não precisa ser deficitária.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

O GOVERNO (DIZ QUE) QUER DAR LINHAS FÉRREAS EM CONCESSÃO, MAS...

O trem de bauxita em Além Paraíba, foto minha em 2012

Leiam as três notícias abaixo.

Vocês acham que, com notícias como esta, algum empresário quer ter uma concessão neste país?

Na primeira delas, "cem motivos" para você não comprar uma concessão.

Na segunda, tudo é indecisão (dos donos das linhas, o Governo).

Na terceira, prefeituras e ANTT fazem tudo para reduzir velocidades de comboios cargueiros (fora que as velocidades já são baixas por causa do estado das linhas, da grita das cidades contra "o trem perigoso e barulhento", como se caminhões e ônibus nas avenidas também não os fossem, e das favelas pegadas às linhas, que somente o governo pode retirar e nunca o faz), travando os horários e tempos de escoamento de safras e de minérios (que são praticamente as únicas coisas que o Brasil transporta por ferrovias atualmente).

Enquanto isso, trens cargueiros vão desaparecendo... o último foi anunciado nestes dias, o trem de bauxita que corria pela antiga Linha do Centro da Leopoldina e por um trecho da velha Linha Auxiliar da Central.

Pouca gente com vontade de entrar no barco

20/07/2015 - Estado de S. Paulo

Com a economia brasileira em franca desaceleração - projeta-se redução de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano - e os empresários do País mais preocupados em sobreviver do que em crescer, a presidente Dilma Rousseff vem se esforçando para atrair investimentos estrangeiros. “Virei uma espécie de caixeiro-viajante”, disse ela recentemente, entre uma viagem aos Estados Unidos e outra à Itália.
Os artigos que Dilma tem a oferecer são concessões para a realização de melhorias em importantes itens de infraestrutura (assim como para sua administração), incluindo aeroportos, portos, ferrovias e estradas. A esperança da presidente é atrair R$ 198 bilhões (US$ 69 bilhões) no total, sendo R$ 70 bilhões até o fim de seu mandato, em 2018.

A infraestrutura brasileira é precária e ruim. O Fórum Econômico Mundial coloca o Brasil na 120.ª posição, num ranking de 144 países, no quesito qualidade. As estradas e os aeroportos encontram-se em estado particularmente deplorável. A extensão da malha ferroviária não chega a um oitavo da existente nos EUA, país que se compara em tamanho ao Brasil. Com um déficit fiscal elevado e alto custo de endividamento, o governo brasileiro não está em condições de ampliar os próprios investimentos. Por isso, Dilma deixou de lado os instintos esquerdistas e se pôs a cortejar o investimento privado.

Entre os investidores, tanto interna como externamente, o ceticismo é palpável. O apetite dos estrangeiros por ativos brasileiros é cada vez menor: o investimento estrangeiro direto (IED), que nos primeiros cinco meses de 2014 foi de US$ 39,3 bilhões, caiu para US$ 25,5 bilhões este ano. E isso não obstante o enfraquecimento do real, que entre janeiro e julho de 2015 sofreu desvalorização de 20% ante o dólar, tornando os ativos brasileiros mais baratos para os estrangeiros. Alberto Ramos, do banco de investimentos Goldman Sachs, calcula que o IED chegará a apenas US$ 55 bilhões este ano, pouco mais da metade do total registrado no ano passado.

Há sete trimestres consecutivos vêm caindo os investimentos na economia, que representam só 19,7% do PIB brasileiro - bem abaixo do nível observado em outras grandes economias emergentes. Segundo Carlos Rocca, da escola de administração Ibmec, entre 2010 e 2014 os lucros das empresas não financeiras recuaram de aproximadamente 5,4% para apenas 1,4% do PIB, pressionados sobretudo pela elevação dos custos com mão de obra. Acrescente-se o efeito recessivo da elevação dos juros e dos cortes nos gastos públicos - necessários para equilibrar o orçamento e evitar um desastroso rebaixamento na avaliação de crédito do país - e “é difícil ver de que maneira o investimento vai aumentar”, diz Daniel Leichsenring, do fundo de hedge Verde, de São Paulo.
Da última vez que tentou seduzir o setor privado com concessões, em 2012, o governo brasileiro obteve somente 20% dos R$ 210 bilhões que esperava arrecadar, e isso só depois de Dilma desistir de tentar controlar as taxas de retorno. O pior é que as oportunidades mais atraentes, como a operação dos aeroportos internacionais de São Paulo e do Rio de Janeiro, foram leiloadas naquela ocasião.

O governo brasileiro não deve ter muito trabalho para encontrar interessados nas estradas e aeroportos de cidades de médio porte. A maior parte já está construída e gera receitas, mas precisa ser expandida e administrada com maior eficiência. Depois de quase dois anos de deliberações, o Tribunal de Contas da União (TCU) finalmente aprovou a venda de terminais de carga em portos estatais. Os primeiros leilões devem acontecer ainda este ano.

Mas, como antes, metade dos investimentos esperados se concentra nas ferrovias. Os planos parecem suspeitos - especialmente um projeto de R$ 40 bilhões que pretende ligar o Brasil ao Pacífico através do Peru, a ser parcialmente financiado com dinheiro chinês. O fato de que muitas grandes empreiteiras brasileiras façam parte de conglomerados envolvidos no escândalo de corrupção que atingiu a Petrobrás não ajuda muito.

Além do mais, para o Brasil, o aperfeiçoamento da infraestrutura está longe de ser a cura de todos os males. Como observa Dani Rodrik, da Universidade de Harvard, um país em que o setor de serviços responde por mais de 70% do PIB não deve imaginar que essas obras impulsionarão o crescimento como o fariam em países mais industrializados.

Para aumentar a produtividade e promover o crescimento no futuro, o Brasil precisa de melhores escolas, um sistema tributário mais simples e menos burocracia, e não apenas mais estradas. Até agora, o governo de Dilma Rousseff não enfrentou nenhuma dessas questões. Enquanto não o fizer, vai continuar sendo difícil vender o Brasil - seja dentro ou fora de casa.

Receitas com concessões devem frustrar governo em 2015

20/07/2015 - Valor Econômico

O governo deve arrecadar neste ano valor bem abaixo dos R$ 18 bilhões originalmente esperados com o item "concessões", que engloba desde leilões de infraestrutura e petróleo até a planejada transferência da administração das loterias para a iniciativa privada. A frustração, que deve ocorrer principalmente devido ao baixo número de lançamento de projetos neste ano, vai dificultar ainda mais o cumprimento da meta de superávit primário ¬ atualmente em 1,1% do PIB (R$ 55,3 bilhões).

A Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (COFF) da Câmara dos Deputados, em nota técnica, afirma que a receita com concessões chegará a, no máximo, R$ 8,2 bilhões (menos da metade do previsto). A expectativa da COFF leva em conta principalmente um provável adiamento de leilões de petróleo, que garantiriam, ao todo, ao menos R$ 7 bilhões em receitas nas contas do governo. "As razões para o adiamento são o viés de baixa da cotação internacional do barril de petróleo e sua volatilidade, que reduziriam os ganhos em potencial da União, assim como as dificuldades da estatal, em fase de redução dos planos de investimento, de atender ao modelo que determina sua entrada como operadora e investidora em todos os blocos com participação mínima de 30%", afirma a nota.

Além disso, a Agência Nacional de Petróleo (ANP) fixou o preço mínimo das áreas da próxima rodada de licitação em R$ 990 milhões ¬ menos da metade do previsto pelo Ministério de Minas e Energia. O mercado acha muito difícil que haja ágios relevantes.

O governo conta com a contribuição de outros itens para as receitas de concessões. O secretário do Tesouro, Marcelo Saintive, chegou a afirmar que a equipe econômica ainda estava contando com "vários projetos [de concessões] que podem ocorrer em 2015". Em logística, por exemplo, estão sendo preparadas licitações em quatro modais: rodovias, ferrovias, portos e aeroportos.

Os problemas para a contribuição ao superávit já começam pelo modelo de leilão. As estradas, que costumam ter processo de concessão mais célere, não trarão benefícios ao caixa do Tesouro. Elas serão licitadas não pelo critério de maior outorga (valor pago pelo vencedor do leilão ao governo), mas pelo de menor tarifa (ganha quem oferecer a menor cobrança de pedágio).

Também não podem entrar nas contas de 2015 os aeroportos a serem concedidos (Porto Alegre, Florianópolis, Salvador e Fortaleza). Apesar de geralmente proporcionarem volume grande de outorga, os terminais têm previsão de leilão somente a partir de 2016. No caso das ferrovias, o governo queria um leilão ainda neste ano, mas não há mais tempo. Na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), os técnicos trabalham para começar as licitações em 2016, ou seja, sem impacto nas contas deste ano.

Por isso, se o governo quiser contar com ativos de infraestrutura para as contas de 2015, só restariam os terminais portuários. O problema é destravar esses leilões, que estão desde 2012 na agenda e até agora não saíram do papel. Entre o empresariado, a percepção é que, além da letargia do governo, outro entrave é o custo para financiar os investimentos ¬ considerado alto no cenário atual.

Procurada, a assessoria de imprensa do Tesouro Nacional informou que ainda não há um detalhamento sobre quanto o governo espera arrecadar neste ano com os leilões de infraestrutura, pelo fato de essas estimativas "ainda estarem sendo estruturadas".

Além das licitações em logística e petróleo, o governo divulgou que espera ter receitas com a concessão ao setor privado da operação das loterias instantâneas, o que estava programado para ocorrer em julho (neste caso, não há expectativa oficial de receita divulgada). Mas técnicos do governo têm dito que os estudos sobre as loterias ainda estão em etapas iniciais.

Fábio Klein, economista da Tendências Consultoria Integrada, acredita que alcançar R$ 18 bilhões em concessões é uma meta pouco factível. "Estamos em um ambiente ruim [para investimentos]. Então não dá para contar muito com essa receita", afirma.

Bráulio Borges, economista¬chefe da LCA, afirma que, considerando o ritmo de arrecadação neste ano, o governo chegaria em dezembro com apenas R$ 9,3 bilhões em concessões em 2015 (cerca de metade do previsto). Para alcançar R$ 18 bilhões, o governo, segundo ele, teria que tomar medidas adicionais, como novos leilões. Nos cálculos de Borges, o governo tem a possibilidade de chegar, no total, a R$ 40 bilhões em superávit (contra a meta de R$ 55 bilhões).

ANTT estuda reduzir velocidade em ferrovia de Cubatão

20/07/2015 - Diário do Litoral

Após recomendação do Ministério Público Federal em Santos, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) iniciou estudos para a redução da velocidade máxima autorizada no trecho de linha férrea onde duas locomotivas colidiram, em 31 de outubro do ano passado, em frente ao bairro Vila São José, em Cubatão. O objetivo da medida sugerida pelo MPF é garantir a segurança do transporte ferroviário. A autarquia tem 180 dias para concluir a análise e apresentar parecer conclusivo sobre a necessidade e a viabilidade das mudanças.
Por conta do acidente, a agência já determinou a implantação de restrição permanente de 30 quilômetros por hora no perímetro urbano de Cubatão e proibiu que mais de um trem trafeguem no mesmo sentido em uma seção de bloqueio do trecho, de modo a impossibilitar que ocorra nova colisão.

A ANTT também notificou a concessionária MRS Logística, responsável pelo trecho onde se deu o acidente, para que realize estudo sobre a necessidade de restrição da velocidade máxima autorizada, bem como de adequações operacionais que possam minimizar os riscos de novas colisões. A MRS tem 90 dias para apresentar a análise à autarquia, sob pena de abertura de processo administrativo.

Colisão

O acidente envolveu duas locomotivas da América Latina Logística (ALL) e ocasionou o descarrilamento de quatro vagões, que carregavam cerca de 80 toneladas de milho e açúcar. Uma das composições colidiu na traseira da outra, que estava estacionada no mesmo ramal. O choque também provocou o derramamento de cinco mil a nove mil litros de óleos diesel e hidráulico que estavam nos tanques de abastecimento das locomotivas.
Segundo relatório da comissão de investigação, antes da colisão, a composição que trafegava pela via férrea chegou a 34 quilômetros por hora. Porém, a velocidade no trecho não deveria exceder os 25 quilômetros por hora, devido à eventual parada junto a outro trem.

Além das medidas sugeridas à ANTT, o procurador da República Thiago Lacerda Nobre recomendou à ALL e à MRS Logística S.A. que realizassem avaliação e atualização de seus maquinistas e controladores de tráfego quanto às normas a serem seguidas nos casos em que é preciso reduzir a velocidade dos trens. As duas concessionárias ainda não responderam à Procuradoria. Caso não acatem a recomendação, o MPF irá avaliar as medidas judiciais e/ou extrajudiciais que serão tomadas.

Procurada pela Reportagem, a MRS garante que está em contato tanto com o MPF quanto com a ANTT a respeito destas demandas, trabalhando no tema, para prestar as informações e esclarecimentos aos órgãos.
“O que podemos informar de antemão, sem prejuízo às demandas do MP, é que os processos da MRS de treinamento e atualização de controladores e maquinistas incluem, há vários anos, além de módulos teóricos muito robustos, práticas de simulação (inclusive de condução de trens, num simulador próprio), auditorias, programas de observação de tarefas e períodos de operação supervisionada, entre outros elementos”, afirma. Já a ALL se limitou a dizer que “a concessionária reforça que cumpre todas as normas estipuladas pela agência reguladora”.

Transnordestina entra em etapa de entregas sob pressão da ANTT

20/07/2015 - Valor Econômico

Em obras desde 2006, a ferrovia Transnordestina está prestes a entrar na aguardada fase das entregas. O cronograma definido no contrato de concessão prevê entregas de lotes em quase todos os meses entre agosto de 2015 e janeiro de 2017, prazo marcado para a conclusão das obras da estrada de ferro. Dona do projeto, a Transnordestina Logística SA (TLSA) deveria ter entregue até agora seis lotes de obras, mas isso não aconteceu. A empresa, controlada pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), está respondendo a processos administrativos da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que apura o descumprimento dos prazos contratuais.

De acordo com o diretor responsável pela área de ferrovias da ANTT, Carlos Fernando do Nascimento, os processos visam o esclarecimento de fatos que, "em tese, descaracterizam a efetiva entrega dos lotes". A ANTT já confirmou ao Valor atrasos anteriores na obra da ferrovia, mas agora tem preferido a cautela. Ainda assim, a autarquia não confirma a entrega de nenhum trecho da Transnordestina.  
Nascimento explica que o processo de homologação da entrega é complexo. Quando a concessionária conclui o trecho, o poder concedente tem de checar a conformidade técnica dos trabalhos. Quando a obra não é entregue, debruçase sobre as motivações da empresa para o atraso.

A olho nu, porém, a avaliação é bem mais simples. Chefe de gabinete da Prefeitura de Aurora, município do sertão cearense, Sebastião Rangel garante que estão longe de serem concluídos os dois trechos que ligam seu município às vizinhas Ingazeira e Lavras. As obras, que fazem parte do corredor entre a cidade de Missão Velha e o porto do Pecém, em Fortaleza, deveriam ter sido entregues, respectivamente, em abril e junho deste ano.
"Há uma escola no caminho da ferrovia que terá de ser derrubada, mas ainda está funcionando normalmente", disse Rangel. Também junho, deveria ter sido entregue um lote da Transnordestina entre a cidade de Araripina, em Pernambuco, e a divisa com o Piauí. A ANTT ainda está avaliando se a obra ficou pronta.

"A manifestação desta ANTT quanto ao cumprimento dos prazos depende do resultado de processo administrativo nos termos da legislação vigente, garantindo o direito à ampla defesa e contraditório. Desta forma, não se pode afirmar, neste momento, que houve descumprimento dos prazos, tendo em vista que o processo administrativo encontra¬se em curso", alegou a autarquia.

Somente neste ano, estão previstas no contrato as entregas de sete lotes de ferrovia, que somam centenas de quilômetros de trilhos. O estágio atual das obras não indica que a meta será cumprida, apesar da cautela demonstrada pela agência reguladora da ferrovia. Em janeiro, deste ano, entretanto, a ANTT já havia informado ao Valor a identificação de atrasos nas obras. A falta de mão de obra suficiente para a fiscalização pode ajudar a explicar a demora na checagem dos trabalhos da Transnordestina, mas a ANTT não confirma. A agência aguarda uma posição do Ministério do Planejamento para um pedido de contratação de 670 novos servidores.

A verdade é que a relação entre concessionária e poder concedente melhorou substancialmente desde que o ex¬ministro e ex¬governador do Ceará Ciro Gomes foi contratado pela CSN para cuidar da Transnordestina. Segundo relatos, ele tem acompanhado pessoalmente o andamento do projeto, tanto participando de reuniões em Brasília quanto visitando o campo de obras da ferrovia.


Com 1.753 quilômetros de extensão, a Transnordestina vai ligar o município de Eliseu Martins, no sertão do Piauí, aos portos de Suape, em Pernambuco, e Pecém, no Ceará. Após alguns aditivos, a obra está orçada atualmente em R$ 7,5 bilhões, mas dentro da própria TLSA há quem diga que a estrada de ferro não sai por menos de R$ 11 bilhões. O projeto é praticamente todo financiado com recursos públicos, principalmente fundos regionais de desenvolvimento e financiamentos do BNDES. A TLSA foi procurada, mas se negou a apresentar qualquer informação.

quinta-feira, 23 de julho de 2015

TRENS VIRAM SUCATA E SÃO VENDIDOS A PREÇO DE BANANA NO RIO DE JANEIRO

Material a ser leiloado. Foto e escritos Antonio Carlos Pastori.

E eu pergunto: por que o assunto trens e ferrovias tem sido tão mal administrado, para usar um termo leve, nos últimos sessenta anos no Brasil? A ideia corrente desde os anos 1950 que ferrovias e trens são coisas do passado, obsoletas, que apenas serviam no século XIX, continua viva na cabeça de muitos administradores governamentais. Vale ressaltar que no mundo inteiro, principalmente na Europa e na América do Norte, os trens são utilizados para transporte de cargas e de passageiros sem nenhum problema. Não se usam trens apenas porque algumas pessoas deles gostam. Usa-se porque são necessários.

Vejam esta: cerca de 97 vagões, ou melhor, carros de passageiros das décadas de 1960, 70 e 80 foram devolvidos pela Supervia, que administra e opera os trens metropolitanos do Rio de Janeiro (como a CPTM em São Paulo, mas concessionada como empresa privada) vão ser leiloados até o final de julho/2015 pela SETRANS - Secretaria de Transportes do Estado do Rio de Janeiro.

Segundo Antonio Pastori, esses carros serviram por muitos anos aos passageiros dos trens de subúrbio do Rio em diversos momentos operados e por empresas distintas: Central do Brasil, CBTU, Flumitrens e Supervia. Um dos motivos de leilão é que, além do obsolescência do material rodante, os carros estão ocupando grandes espaços nos depósitos da Supervia em São Diogo e Deodoro, que precisam ser liberados para receber novos trens. Uma pena que após prestarem relevantes serviços tenham fim tão medíocre: virar sucata.

Ainda segundo Pastori, estes carros poderiam ser reformados e/ou adaptados para usos mais nobres, como por exemplo, bibliotecas, salas de educação para cursos de informática, oficinas de artesanato, escolinha de música, carpintaria, anfiteatro, café cultural, museu ferroviário, ponto de informações turística e mais uma dezena de usos - cadeia pública -, em face a enorme durabilidade, solidez e resistência ao tempo das suas caixas de ferro e aço, permitindo que durem ainda mais de meio século, mesmo se expostas ao tempo.

Pastori ainda adiciona que, segundo o Governo do Estado do Rio, os recursos arrecadados deverão ser reaplicados em melhorias no sistema de trilhos do Estado, o que será muito pouco vis a vis às demandas de investimentos bilionários que o modal ferroviário requer. O que será arrecadado nos leilões será muito pouco, pois cada carro pesa entre 15 e 20 toneladas e será vendido a preço de sucata de ferro (R$ 0,70/kg), dando um total inferior a 1 milhão de reais. Seria muito mais interessante a SETRANS reservar alguns deles para uso mais nobre, conforme exemplificado nas fotos abaixo. 

Após reforma, poderia ser utilizados como Centro de Informações Turísticas e/ou Centro Cultural para preservação da memória ferroviária em cidades do Estado do Rio. O leilão deverá acontecer daqui a algumas semanas.

Uma carta foi enviada por ele ao Secretário de Estado dos Transportes, Sr. Carlos Roberto de Figueiredo Osório, depois de receber diversos e-mails de entidades preservacionistas, indignadas com o fato de esse material ter sido considerado, erroneamente, como inservível, devendo ser vendido a preço de sucata de ferro.

Ledo engano, pois essas velhas caixas metálicas com rodas de metal têm durabilidade secular - que o digam os ingleses, com seus tesouros ferroviários preservados e em operação até hoje. Eles podem, na verdade, ter serventia bem mais nobre do que serem irremediavelmente picotas pelo maçarico.

Saiba, senhor Secretário, que uma das maiores dificuldades para implantação de dezenas de projetos de TTR-Trens Turísticos e Regionais, assim como projetos culturais, é a falta de material rodante. E o Governo do Estado está contribuindo para o agravamento desta dificuldade.

Para reforçar os argumentos acima, solicito a leitura do pequeno artigo abaixo.

Antonio Pastori é pesquisador ferroviário e Vice-Presidente da AFPF-Associação Fluminense de Preservação Ferroviária, Mestre em Economia e pós graduando em Engenharia Ferroviária.

segunda-feira, 20 de julho de 2015

UMA CARTA DE CRUZEIRO (1947) SOBRE A LIGAÇÃO FERROVIÁRIA ENTRE MINAS GERAIS E A BAHIA


Cruzeiro, 8-9-1947.

Caro Prof. Sud

Cumprimentos.

Li, com a atenção que sempre merecem os seus escritos, o artigo “Ferrovia Norte-Sul”, de 6/9. Com a intenção de contribuir e trazer-lhe informações sobre o assunto, peço anotar o seguinte: em janeiro do corrente ano, já viajei de S. Felix até Brumado, no lado baiano, de trem. Também estava pronto a ser inaugurado o trecho Brumado-Malhada de Pedra, esta a 36 km daquela estação (o lastro já traz carga, etc., para Malhada).

É de notar que todo o trecho baiano está atacado, estando a principal dificuldade no trecho conhecido por “Saco da Onça”, onde tem de atravessar uma enorme serra. A impressão geral é que a falta de trilhos e de pagamento aos empreiteiros retarda a terminação deste notável empreendimento.
Do lado mineiro, em janeiro deste ano, a locomotiva já ia até Monte Azul, sendo de estranhar só agora seja inaugurada essa estação.

Viajando de caminhão, marquei trezentos e vinte e quatro quilômetros de Montes Claros a Brumado. Mesmo admitindo não corra oficialmente o trem até Malhada de Pedra (lado baiano), descontando-se os 238 km até Monte Azul, já inaugurados, restam apenas (permita-me o otimismo) 187 km... 

Todavia, tudo leva a crer que os 36 km além de Brumado já seja um feito!

Prometo-lhe melhores esclarecimentos, nas minhas próximas férias.
Sem outro, subscreve atenciosamente o colega e amigo

Casemiro L. Lamin
Do Colégio Estadual de Amparo

Cruzeiro, caixa postal 40

Esta carta, escrita há 68 anos atrás para meu avô Sud Mennucci, mostra o andamento da Ferrovia Norte-Sul na época. Não a Norte-Sul que vemos nos jornais de vez em quando, mas sim a primeira Norte-Sul que foi efetivamente construída, depois de as duas anteriores (Araguari-Belém, da Mogiana e Pirapora-Belém, da Central) não terem saído do papel.

Sud acompanhou esta construção o mais que pôde. Em seu arquivo pude encontrar diversos artigos de jornais da época (alguns escritos por ele próprio) sobre a construção da ligação entre Minas e a Bahia. Pena que ele não sobreviveu para ver a entrega da linha, em 1950. Morreu em julho de 1948.

Já escrevi outras vezes sobre esta Norte-Sul do final dos anos 1940. Ela ligou as cidades e estações de Montes Claros, na época estação terminal da linha do Centro da Central do Brasil, no norte de Minas, à estação de Contendas, no sul da Bahia. Ficou pronta e foi inaugurada em 1950. Na época, um trem poderia sair da divisa do Brasil com o Uruguai, em Livramento, e seguir até Natal, no Rio Grande do Norte.

Haveria baldeações de carga e de passageiros - se tal trem existisse - em São Paulo, pois havia bitola larga pela Central do Brasil, da estação Roosevelt até Belo Horizonte, voltando então à bitola métrica. Na divisa de Sergipe com Alagoas, o trem usava balsa. A partir de Natal, ele poderia seguir, no máximo, até Lajes (Itaretama), no interior do Rio Grande do Norte.
Algumas curvas do Saco da Onça, com duas estações construídas durante a obra.

Esse trem, com todos os seus defeitos, seria estratégico. Era a única forma de se alcançar decentemente o Norte do país com cargas vindas do sul enquanto a navegação de cabotagem estivesse suspensa durante a Segunda Guerra Mundial. Vargas dera a ordem para se fazer a ferrovia com urgência em 1942, logo depois de declara a guerra.

Acontece que a guerra acabou e a ferrovia não estava pronta. Houve várias interrupções, falta de verbas, etc. A carta acima é de 1947, mais de dois anos após a derrota da Alemanha e o fim da guerra na Europa. Algumas dificuldades estão citadas na carta. Realmente, o Saco da Onça era e é uma ferrovia difícil de ser percorrida depois de pronta.

Somente em 1958 o Ceará foi ligado ao Sul do país por trilhos, com a abertura da ferrovia que ligava Patos, na Paraíba, a Campina Grande. E apenas em 1968 foi aberta a ferrovia ligando o Maranhão e o Piauí a ela, com a ligação Crateus, CE a Teresina, PI.

Uma vez calculei quanto tempo demoraria ir de trem de Santana de Livramento, RS a São Luiz, MA, em 1972, quando todas as linhas que faziam a Norte-Sul ainda tinham trens de passageiros. Como não era uma viagem em que você embarcava no carro no RS e seguia com esse mesmo carro, apenas trocando de locomotivas (especialmente por causa das quebras de bitola), você teria de fazer as baldeações - muitas - necessárias durante a viagem. E tomaria cerca de 24, 25 dias, de acordo com os horários de uma tabela do Guia Levi da época.

domingo, 19 de julho de 2015

BRASIL E SEU IMENSO PATRIMÔNIO ABANDONADO

Fotos Renan - Facebook, página RMV - Rede Mineira de Viação: link

São mostrados abaixo alguns exemplos bem recentes de patrimônios históricos brasileiros não conservados. Em alguns casos, como o de Três Corações (acima), trata-se de abandono de uma ferrovia que, até cerca de oito anos atrás, funcionava precariamente, mas funcionava, e além disso, era utilizada muito menos do que deveria e do que era nos tempos de RFFSA - no caso, até 1997.

Todo esse patrimônio, em diferentes cidades do país, são certamente apenas alguns dos casos em que o que existe é muito mal aproveitado. Em alguns casos, nem haveria necessidade de uma restauração e, outros, nem de demolição.

Listo abaixo outros, dou minha opinião e os leitores concordarão ou não. Coloco links em todos para que se possa ter mais detalhes. O único problema é que alguns desses links podem não levar todos os leitores a uma publicação, principalmente os que são do facebook.

Eu realmente me desespero quando vejo o que nós, brasileiros, temos como potencial em nossas mãos e que, por desprezo, ignorância ou até falta de verba, não fazemos.

Deixamos apodrecer nosso passado e nosso futuro.

PONTA GROSSA, PR
Tratam-se de gravuras rupestres no município, em sítio arqueológico em formação rochosa próxima a Vila Velha, este sim um ponto turístico visitado constantemente. Muitas das gravuras, como as mostradas na fotografia, estão arruinadas por entalhes na pedra feitos por vândalos e imbecis que as visitam.

ITUPEVA, SP
Esta tulha de café do século XIX em uma antiga fazenda em Itupeva está para ser demolida (talvez até já o tenha sido). Ela está dentro de uma área particular em que será construído um loteamento de casas. O que algumas pessoas se perguntam (algumas, porque a maioria não liga a mínima) é: porque o loteador e construtor não a mantiveram ali, dentro do loteamento? Não acredito que se perca mais do que pouquíssimos lotes potenciais para serem vendidos. O investimento na restauração dos prédios seria feito em prol do condomínio e poderia ser utilizado como sala de estar ou salão de festas ou de jogos, valorizando o loteamento. Link

JUNDIAÍ, SP
Esta é a locomotiva número 1 da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, a mais bem sucedida estrada de ferro em terras brasileiras. Trafegou no século XIX e XX em terras paulistas. Está há anos abandonada nos depósitos que um dia foram dessa empresa e que ainda estão de pé (mais ou menos, com se pode ver pela fotografia) em Jundiaí. O complexo todo é lindo e muito maior do que esta foto mostra. Está tudo abandonado há pelo menos quinze anos e pertence à Prefeitura.

Já vi essa área toda muito melhor do que isso e já depois da desativação em 1998. Ora, a Prefeitura comprou aquilo; por que não cuida e nem dá uma decisão sobre o que quer fazer, bem clara? Se não quer cuidar das locomotivas (nota: as locomotivas ficaram ali, mas são de propriedade do Governo Federal), porque não cedem para quem as quer? Que se as leiloem ou mesmo se as dêem para uma ABPF, por exemplo. É simples. Porém, as prefeituras morrem de medo de ceder este material, porque, talvez, no futuro, possam ter uso eleitoral... desde que não o prédio não caia antes ou, no caso das locomotivas, virem ferrugem e se pulverizem.


Basicamente, é isto que se discute. A incompetência de nossos governos, sempre empurrando com a barriga, prometendo mundos e fundos e não cumprindo nada e, ainda por cima, agindo como se isso não fosse um problema. Seria melhor dar para um shopping... desde que ele mantivesse os prédios e, talvez, até cuidasse de (algumas) locomotivas que lá estão. Link

GUATAPARÁ, SP
Em Guatapará, município paulista desmembrado há cerca de 20 anos do de Ribeirão Preto, era a sede da fazenda do mesmo nome que, no início do século XX, pertencia à família Prado. Foi vendida depois e atualmente serve como plantação de cana, basicamente. Praticamente todas as construções, inclusive a bela casa-sede, foi demolida. Algumas ruínas de depósitos e até de um cinema da colônia rural ainda sobrevivem em meio ao matagal. Ficam próximos à antiga estação ferroviária de Vila Albertina e, com exceção da ponte ferroviária sobre o rio Mogi-Guaçu que aparece no canto superior direito destas fotos (de Marcelo Thomas), estão muito próximas umas das outras.

Evidentemente, o visionário aqui pensa que isso poderia ser transformado pelo proprietário em um parque, mantendo as ruínas (sem restauro, mas protegidas) em seu interior. Sem tombamentos, sem nada. Apenas por idealismo e como, talvez, fonte de algum rendimento.

Evidentemente, seus donos não pensam assim. Ah, se fosse na Europa ou nos Estados Unidos...

PARQUE NACIONAL DA SERRA DA CAPIVARA, PI
Este parque, que existe, mas que, na prática, tem verbas federais insuficientes para a sua manutenção, está cada vez mais abandonado, no distante Piauí. A equipe de Niède Guidon, de 82 anos, que preside a fundação, contava com 270 funcionários. Hoje, são 50. Segundo a arqueóloga, a demissão dos empregados remanescentes implicaria no pagamento de indenizações. Para isso, seria necessário encerrar as atividades até dezembro. Conheci Niéde há mais de vinte anos, durante uma viagem de avião dos Estados Unidos para o Brasil. Ela já lutava pelo parque. Link

Querem mais? Não é difícil encontrar fatos como este na Internet... ou até perto de suas casas. Sempre lembrando que povo sem história não constitui uma verdadeira nação.

sábado, 18 de julho de 2015

PELA VOLTA IMEDIATA DOS TRENS DE PASSAGEIROS EM SÃO PAULO!

São João Novo, na antiga Sorocabana. Finalmente vamos tirar esse mato todo e o velório do bairro vai ter de se mudar para a estação ser reativada?

Atenção, pessoal do PSDB que nos governa (o Estado de São Paulo) desde 1995!

Atenção, pessoal do PSDB cujo ex-governador, Mario Covas, entregou a preço de banana a FEPASA para uma empresa já falida, a RFFSA, que a repassou para concessionárias totalmente incompetentes!

Atenção, CPTM!

Grande oportunidade para colocar trens de passageiros nas linhas da ex-FEPASA em diversos trechos! Basta o Estado de São Paulo conseguir a concessão de volta para esses trechos e colocar nesses trechos NEM QUE SEJAM trens de passageiros. Infelizmente, vão ter de pagar mais caro, não vão poder reformar trens, porque os da CPTM não servirão, pois a eletrificação já foi para as cucuias por desleixo da própria FEPASA e das concessionárias. Também vão ter de fazer obras significativas para deixar as linhas em ordem para receber com mínima segurança esses novos trens.

Mas o que o nosso querido governo não pode fazer para dar um pouco de dignidade a seu povo, não é verdade? Sim, povo - sabem o que é isso? Aquele pessoal que só enche o saco, reclama de tudo, sempre sem razão (no que vv. acham, pelo menos), e que fica vagando pelas ruas e calçadas do Estado durante quatro anos e somente é bajulado com chaveirinhos na hora das eleições!

Atenção - grande oferta de trechos sem uso! Vou citar todos:

Amador Bueno a Mairinque (este nem precisa pedir concessão, e só re-eletrificar, pois ele já é concessionado à CPTM! Esqueceram?)
Rubião Jr. a Presidente Epitácio
Pradópolis a Colômbia
Bauru a Panorama
Ribeirão Preto a Passagem
Evangelina a São Sebastião do Paraíso, MG
Recanto a Piracicaba
São Vicente a Juquiá
Bauru a Três Lagoas, MS (esta ainda tem uns cargueirinhos, mas tudo indica que não vão durar muito)

Pena que no meio ainda há diversas linhas ocupadas por cargueiros. E pena que as antigas Cantral do Brasil, Mogiana, E. F. Araraquara e uma parte da Paulista ainda estejam em uso, senão poderiam usar também. Mas sempre se poderá fazer uma "Ponte Orca" entre as linhas de passageiros "interrompidas"... se você não sabe o que é, a CPTM sabe muito bem.

Isso dará empregos a maquinistas e chefes de trem, além de reabrir diversas estações pelo interior inteiro, o que dará muitas obras para empreiteiros (falei "empreiteirOs", não "empreiteirAs"). E ainda para cortadores de mato, que é o que não falta em nossas linhas. Claro, vão ter de comprar trilhos também, pois grande parte já foi roubada (e ninguém viu).

Claro, muitos dirão que as linhas são obsoletas e que, mesmo restauradas, ainda serão insuficientes para se dar uma boa velocidade para os trens rodarem e competirem com os amados, mas extremamente desconfortáveis, ônibus, que, para piorar as coisas, têm de passar por dentro de cidades, por lombadas e péssima pavimentação em alguns trechos.

Ora, é só irem retificando as linhas aos poucos, enquanto trafegam os trens pelas linhas refeitas para uma primeira fase. Era o que os Srs. Governadores deveriam ter feito desde a época em que estas linhas foram desativadas para passageiros. Ou seja, não desativar e, imediatamente, começar a fazer as reformas necessárias para aumentar a velocidade. Como fizeram na CPTM, lembram-se?

Aliás, só para não dizerem que meti o pau no Covas pelo que escrevi em cima, reconheço que foi ele quem começou a reforma na CPTM, transformando-a de uma máquina de moer carne em uma empresa de transporte decente.

Vamos lá, mãos à obra! Podem dar para a CPTM, que acho que ela será competente para fazer. E, para levantar o ânimo, cortem o TM e deixem somente CP. Isto deverá dar uma injeção de emoção para os funcionários. Ah, esqueceram-se do que seria CP? Companhia Paulista de Estradas de Ferro, a mais eficiente empresa ferroviária (e era privada!) que este país já teve e que foi assassinada em 1961 pelo governo paulista, que, nesse caso, não era do PMDB.

Ah! Esqueci... o país está em crise e o Estado, sem dinheiro. Ora, mostrem que vocês são melhores do que os seus rivais que estão no governo federal! Aliás, hoje em dia isto não seria nada difícil.

quarta-feira, 15 de julho de 2015

FIM DOS TANQUEIROS NA VELHA SOROCABANA

Velha tanqueiro... anos 1980 ou 90

O recente acidente de um trem tanqueiro na estação de Jumirim (próxima a Laranjal Paulista), na antiga linha da Sorocabana, levou a uma decisão não tão inesperada assim pela Rumo: não trafegar mais desses trens - que transportam combustível - pela linha até que todo o trecho Mairinque a Presidente Epitácio seja recuperado.

Para uma linha que já tem trechos totalmente abandonados e quase abandonados, e para quem conhece a história das ferrovias brasileiras, principalmente a dos últimos sessenta anos, essa decisão tem uma grande possibilidade de se transformar no funeral da linha. Além de serem quase oitocentos quilômetros de trilhos a recuperar, sabemos que essa desculpa de "recuperar trechos acidentados" já custou a vida de muitas outras linhas, atuando sempre "como uma desculpa errada na hora certa".

A linha realmente, está ruim. Basicamente, a última vez que a linha foi recuperada data entre 1944 e 1966, quando se fez uma enorme revisão no traçado, principalmente para que ele fosse capaz de ser eletrificado, entre São Paulo e a estação de Assis. O trecho final deveria ser recuperado também. Mas o final dos anos 1960 já era arriscado investir em mais duzentos quilômetros de linha até o rio Paraná.

Arriscado em um país onde a ferrovia já vinha sendo demonizada havia pelo menos uma década. Os interesses contra ela eram cada vez maiores. Certamente a indústria automobilística e seus produtos haviam ganhado uma enorme fatia no modal de transportes do Brasil, o que era previsível. Porém, foi absurda a ladeira abaixo a que se jogou a ferrovia.

Rodovias foram se enchendo de caminhões, ônibus e automóveis. Ao longo da Sorocabana, três estradas de longo percurso cada vez mais transportavam produtos que tipicamente deveriam sê-lo pela ferrovia. Não pelo fato de eu gostar de ferrovias, mas porque as rodovias foram se tornando cada vez mais perigosas.

Os combustíveis eram um desses produtos "típicos". Eram e ainda são. O que a Sorocabana transportava (como ALL), até poucos dias atrás era pouco diante do que é transportado pelas estradas que a acompanham, que servem aos mesmos locais.

Agora, suspendê-los é realmente jogar óleo na fogueira. Esses tanqueiros atendiam às cidades da Alta Sorocabana e as da Noroeste, além de boa parte do Mato Grosso (via ramal de Bauru e a antiga Noroeste do Brasil). Não é pouco. Até há relativamente pouco tempo, ainda havia trens na ex-EFS para Bauru, Ourinhos, Presidente Prudente, Araçatuba, Campo Grande e Corumbá. O trem que descarrilou em Jumirim fazia o percurso REPLAN-Araçatuba com gasolina e diesel, retornando com etanol. Portanto, não estava sendo utilizada a linha Botucatu-Presidente Prudente. Já o trecho além desta até Presidente Epitácio estava abandonada há anos.

Para recuperar uma ferrovia de quase oitocentos quilômetros, no atual sistema brasileiro de ter regras e mais regras que geralmente levam ao atraso de qualquer pequena ou grande obra, mais os problemas jurídicos, de pessoas que fazem editais malfeitos que acabam deixando margem para a atuação de órgãos como o Ministério Público, que aproveitam pequenos deslizes muitas vezes por autopromoção.

Fora isto, espero estar enganado, mas a Rumo, sucessora da ALL, não parece estar muito interessada em utilizar a velha linha-tronco da Sorocabana. Muitos já prevêem o fechamento total da ferrovia, assim como está acontecendo com a Noroeste. Parece brincadeira, mas bitola métrica não interessaria, ao que parece, à Rumo. Sobra hoje apenas um trem cargueiro, o da Fibria, que trafega de Três Lagoas, MS, divisa com São Paulo, a Bauru pela ex-Noroeste, e daí, via ramal de Bauru e linha-tronco, para Mairink e dali para Santos, via Mairink-Santos, que também era da Sorocabana. Até quando? Atualmente, esta última linha está tão congestionada que a empresa pensa em usar caminhões para descer a serra do Mar para não atrasar o transporte.

A existência de mato na entrada do pátio de Presidente Prudente e o relato de hoje que em Bernardino de Campos, trem, quando passa, é só trilheiro ou com pranchas vazias, vindo sentido capital, mas já faz cerca de 20 dias que não passa nenhum. Faz mais ou menos quatro meses que passou pela última vez por ali um  tanqueiro com cerca de 50 vagões no sentido de Ourinhos.

Parabéns aos incompetentes que tanto se esforçaram para que este dia chegasse! Afinal, a atividade econômica é a ferrovia que faz. Se a Rumo continuar agindo como a ALL agia, a ferrovia desaparece.

Então, façamos o acompanhamento de uma ferrovia quase moribunda, torcendo para que algum milagre aconteça, num país governado por gente que não respeita nem fiscaliza nada.