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sexta-feira, 18 de agosto de 2017

LEITE VIGOR E O TRANSPORTE POR FERROVIAS


Em 1926, a empresa de laticínios Vigor, fundada em 1917 em Minas Gerais (1910 ou ainda 1918 segundo algumas fontes) já era a maior fornecedora de leite na capital paulista.

A propaganda mostrada acima é desse ano, publicada em "O Estado de S. Paulo". 

O fato curioso do anúncio é a forma que ela se refere às estradas de ferro. Criticava a Central do Brasil (na verdade, já famosa por constantes, quase diários acidentes) e a Rede Sul Mineira (provavelmente estava falando do ramal de Sapucaí, que ligava a linha Cruzeiro-Varginha à Mogiana, na divisa São Paulo-Minas), enquanto, de outro lado, elogiava os serviços da Mogiana e da Paulista.

A estação que a propaganda cita, Sapucaí, era o local de união do ramal de Itapira, da Mogiana, com o ramal de Sapucaí, da Sul Mineira.

Ela dizia que iria enviar seus produtos para essa estação e, a partir daí, levar o leite a São Paulo. O caminho férreo lógico era o ramal de Itapira (Mogiana), depois Mogi Mirim a Campinas (ainda Mogiana) e, de Campinas, Cia. Paulista, até São Paulo.

Não sei a partir de quais fábrica ou fábricas a Vigor enviaria sua produção para Sapucaí, mas a propaganda é muito interessante.

A Vigor, que passou por diversos donos, neste ano completa cem anos - se, como diz a maioria das fontes, tiver sido realmente fundada em 1917.

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

1926: UM MAPA INTERESSANTE

O Estado de S. Paulo, 25/10/1926

Em outubro de 1926, o vilarejo de Itambé, próximo à cidade de Olympia, no norte paulista, foi atingida por um tornado, fato então raro na região e que quase acabou com o povoado. O fato saiu nos jornais e mereceu, inclusive, diversas fotografias, as quais ainda eram raridades nos jornais brasileiros. Note que o nome Itambé está assinalado no mapa. Hoje, Itambé se chama Ibitu.
A igreja de Itambé, destruída pelo tornado de 1926.

Porém, noventa anos mais tarde, o que mais me interessou nessa reportagem foi um mapa que foi publicado no jornal O Estado de São Paulo que mostrava a localização do vilarejo (veja a seta no centro co mapa acima).

Neste mapa, são mostradas diversas ferrovias dessa região - inclusive algumas que jamais foram construídas. De onde terá sido tirado esse mapa na época? Teria sido ele cópia de algum mapa mostrando ferrovias já existentes e operativas juntamente com projetos que acabaram não sido concretizados?

A igreja de Itambé, reconstruída e em pé em 2017.


Vejamos: as ferrovias são as linhas preenchidas intermitentemente com preto e branco. Rodovias eram raras, são apenas riscos pretos. Riscos pretos tortuosos são rios ou córregos. O maior rio que aparece é o rio Pardo. que corre a nordeste do mapa. Existe também uma linha branca tracejada que liga (São José do) Rio Preto ao rio Grande, indo no sentido de onde mais tarde estaria a cidade de Colômbia. Pode ser o projeto para alguma rodovia, de que, infelizmente, não tive como me certificar.

Do Google Maps, a mesma região, hoje

Das ferrovias aí marcadas, separemos as que já operavam: a que liga Catanduva a Rio Preto já existia desde 1912 e é a E. F. Araraquara; a que liga Pitangueiras (no canto inferior direito) a Olympia é a E. F. São Paulo-Goiaz, bem como o trecho Ibitiúva-Terra Roxa - este último ramal e o trecho Pitangueiras-Bebedouro seriam neste mesmo ano, 1926, vendido à Companhia Paulista; o trecho entre Barretos e Andes e daí para baixo era o tronco métrico da Paulista, trecho aberto em 1909; finalmente, também no canto direito inferior, o trecho que liga Luzitânia a Jaboticabal, esta última fora do mapa, também operava desde 1916, parte da pequenina E. F. Jaboticabal.

Mas há outras ferrovias aí que são "fantasmas". Quais seriam elas? Listemo-as:

 - à esquerda, no mapa, há uma linha que vem do sul e segue para noroeste - que linha era esta? Em minha opinião, há duas possibilidades. Uma, é que pertencesse à E. F. Oeste de São Paulo, ligando Taiaçu a Rio Preto e dali para próximo ao rio Grande, ao norte; outra, que fosse um prolongamento da linha de E. F. do Dourado, partindo lá embaixo e fora do mapa da cidade (ainda incipiente e sem este nome) de Novo Horizonte e dirigindo-se para uma região ainda inóspita no Noroeste paulista. A conferir. Há pouca literatura sobre os dois projetos citados. Notar que a Dourado somente chegou a Novo Horizonte, vinda de Ibitinga, em 1939, ou seja, 13 anos mais tarde. E por ali ficaria. Aliás, o prolongamento da E. F. Araraquara, que não é mostrado nesse mapa nem como projeto, foi feito no sentido de Mirassol (que aparece no mapa como Mira Sol).

 - No centro do mapa, saindo de Olympia para noroeste, a linha só pode ser a que foi aberta em 1935 pela E. F. São Paulo-Goiaz, atingindo Nova Granada - no mapa, esta cidade ainda não aparece e a continuação até Icem nunca foi feita.

 - Mais para a direita no mapa, a linha que sai de Barretos e que atingiria Colômbia, somente seria realidade em 1930. Em outubro de 1926 estava em início de obras.

 - Para finalizar, a linha que aparece ligando Luzitânia à linha da São Paulo-Goiaz à esquerda de Ibitiúva jamais foi construída.

Interessante, não? Vale notar que, de todas essas linhas, somente ainda funciona hoje a da E. F. Araraquara. O resto que aparece, projeto ou realidade, já ou não existem mais ou estão debaixo de mato (caso do trecho Pitangueiras-Bebedouro-Barretos-Colômbia, da antiga Paulista).

O defeito do Brasil é pensar que é rico demais; por isso, joga dinheiro e infraestrutura fora.

(Esta postagem foi atualizada em 13/1/2018).

segunda-feira, 31 de julho de 2017

MAPA ATUAL DAS FERROVIAS - SÃO PAULO E PARANÁ


Como já escrevi há uma semana, um novo mapa ferroviário do Brasil foi lançado pela Revista Ferroviária há algum tempo. Recentemente adquiri uma edição.

Comentarei aqui alguma coisa sobre as linhas dos Estados de São Paulo e do Paraná, conforme aparecem no detalhe desse mapa publicado acima.

Os dois Estados são hoje atendidos por três concessionárias. No Paraná, somente a Rumo/ALL - linha métrica, chamada pela empresa como "Malha Sul". Em São Paulo, mesta Malha Sul tem também suas linhas, exatamente as das antigas Sorocabana e Noroeste.

Em São Paulo, também atuam a FCA, a MRS e a própria Rumo/ALL, mas com bitola larga. 

No Paraná, lamentavelmente não há linhas de subúrbio para trens metropolitanos (extintas em 1991). Em São Paulo, a CPTM cuida deles, que, aliás, já foram discutidos na postagem de 23 de julho último.

A FCA liga a cidade de Campinas, da estação de Boa Vista, em Campinas, a Araguari, em Minas, seguindo pela antiga linha da Mogiana, continuando, de Minas Gerais, com algumas ramificações para o próprio Estado e para Goiás, que serão vistas depois. A FCA também cuida do ramal de Caldas, que liga Aguaí à estação de Bauxita, em Poços de Caldas. Seus trens prosseguem também pelas linhas da Rumo/ALL, de Boa Vista a Santos. Usa a bitola mista desta última para fazer o percurso, já que a Mogiana e as linhas mineiras e goianas têm esta largura de bitola.

A MRS e a Rumo/ALL têm bitolas largas. A primeira liga Santos e São Paulo ao Rio de Janeiro e Vale do Paraíba utilizando-se das linhas das antigas Santos a Jundiaí e do ramal de São Paulo da antiga Central do Brasil. Também entra pela linha da Rumo/ALL até a região de Bauru quando necessário.

Lembrem-se que há 4 cores no mapa: Azul mostra as linhas de concessão da ALL/Rumo; Verde, da MRS; e roxo, da Ferrooeste e carmim, da FCA.

As linhas que têm-nas pontos acompanhando significa que estão abandonadas e sem tráfego. As que têm linha-pontos intermitentes (como a azul da ALL-Rumo) mostram linhas com obras de duplicação.

A escala do mapa e a espessura das linhas prejudica um pouco a compreensão de alguns pequenos trajetos.

Algumas rodovias também são mostradas no mapa.
A Rumo/ALL, por sua vez, trafega pelas linhas de bitola larga das antigas Companhia Paulista e E. F. Araraquara. Tem a concessão entre Jundiaí e Pradópolis, Itirapina a Bauru e Araraquara até Rondonópolis, no Mato Grosso, pelas linhas da Ferronorte. E, finalmente, a linha Boa Vista-Santos, com bitola mista e que é, talvez, a linha com maior densidade de tráfego no Brasil hoje em dia que corresponde às antigas Mairinque-Santos e ramal de Campinas, ainda do tempo da Sorocabana.

Por outro lado, a concessionária abandonou a linha Bauru-Panorama, estabelecida desde 1959 (considero aqui a linha de bitola larga que substituiu as métricas do Tronco Oeste da Paulista nessa data) e agora está afirmando que vai retomá-las para atender o oeste paulista. Difícil de acreditar.

Finalmente, a "Malha Sul" da Rumo/ALL, ou seja, a bitola métrica, que, no Estado de São Paulo, liga Mairinque a Presidente Epitácio, Iperó a Pinhalzinho e Paratinga a Cajati (ambas ex-Sorocabana).

A malha métrica tem ainda a velha Noroeste (Bauru-Corumbá e Indubrasil-Ponta Porã). Parece muita linha, mas, embora a Noroeste - que chega até o Mato Grosso, na divisa com a Bolivia - tenha tráfego por toda a linha-tronco (raros comboios, está longe de atender a região como deveria ser feito), o ramal de Ponta Porã está parado desde 1997. 

E a Sorocabana? Ora, embora não sejam mostradas as "linhas-pontos" no mapa, a velha Soroca está às traças nos trechos Amador Bueno-Mairinque e no Rubião Junior (em Botucatu) a Presidente Epitácio já há cerca de 2 anos. Os trilhos também se cobrem de mato no ramal de Cajati, sem operação desde 2003. Já o trecho do antigo ramal de Itararé e Apiaí levam trens para o Paraná, cruzando Pinhalzinho, estação na divisa com o Paraná.

E no Paraná? Aqui, as linhas utilizadas são as que ligam Maringá a Paranaguá, Apucarana a Ourinhos, cidade onde se encontra com a linha em São Paulo, atravessando a ponte sobre o Paranapanema), Pinhalzinho a Ponta Grossa, Ponta Grossa a Guarapuava e ainda Curitiba a Rio Branco do Sul, Ponta Grossa a Curitiba e Ponta Grossa a Mafra.

Mas há linhas abandonadas pela concessionária, também: Apucarana-Cianorte, desde o final do século XX; Morretes a Antonina, também sem tráfego há pelo menos 10 anos e Ourinhos a Jaguariaíva, parada desde 2001 e Jaguariaíva a Ponta Grossa, abandonada desde pelo menos uns 7-8 anos. Finalmente, o mapa mostra o ramal de Monte Alegre, ou seja, a linha Piraí do Sul a Telêmaco Borba, como ativa, mas tenho sérias dúvidas: afinal, a linha onde ela desemboca (Jaguariaíva-Ponta Grossa) está no abandono.

E Paraná tem ainda a Ferroeste, que liga Guarapuava a Cascavel.

Existem ainda em São Paulo outras linhas não citadas ou mostradas no mapa: 

A Anhumas-Jaguariúna, operada já há quase 40 anos pela ABPF com trens turísticos de forma quase contínua - é parte do tronco da Mogiana construído entre 1926 e 1945 e sem tráfego de trens de passageiros ou cargas desde 1977, sendo esta a razão pela qual a ABPF conseguiu sua concessão.

A E. F. Campos do Jordão, ligando Pindamonhangaba a Campos do Jordão, ferrovia eletrificada em 1924 que tem tráfego diário praticamente desde sua abertura em 1914 (quando ainda utilizava vaporeiras). Um trem é turístico, fazendo o percurso todo, outro é regular, atendendo com 3 viagens de ida e volta por dia aos subúrbios de Pindamonhangaba. Pertence ao Estado.

Há mais duas ferrovias pequenas: a E. F. Perus-Pirapora, com apenas 16 quilômetros, parcialmente ainda com trilhos e operada ocasionalmente em parcas condições para passeios turísticos, situando-se entre os municípios de São Paulo e de Cajamar; e a velha Minas and Rio, cuja parte paulista está entre a estação de Cruzeiro e o túnel que cruza para o Estado de Minas Gerais, no Vale do Paraíba, sem qualquer tráfego desde 2001. Estas duas ferrovias não tem concessão para ninguém, até onde eu saiba. A primeira é particular e tombada pelo CONDEPHAAT; a última pertence ao espólio da RFFSA.

domingo, 23 de julho de 2017

MAPA ATUAL DAS FERROVIAS - GRANDE SÃO PAULO E REGIÃO


Um novo mapa ferroviário do Brasil foi lançado pela Revista Ferroviária há algum tempo. Recentemente adquiri uma edição.

Este mapa está bem feito e mostra infelizmente a lamentável situação das vias férreas nacionais. Minha intenção aqui é fazer alguns comentários sobre este assunto.

Na postagem de hoje, comento sobre a região do que chamei de "Grande São Paulo expandida", por conter esta região e mais alguns municípios limítrofes, como a região de Jundiaí, São José dos Campos, São Roque e da Baixada Santista.

Há três cores no mapa: Azul mostra as linhas de concessão da ALL-Rumo; Verde, da MRS; e beije, da CPTM (estas linhas, em alguns casos, têm também passagem de composições cargueiras da MRS).

As linhas que têm-nas pontos acompanhando significa que estão abandonadas e sem tráfego. As que têm linha-ponto intermitentes (como a azul da ALL-Rumo) mostram linhas com obras de duplicação.

A escala do mapa e a espessura das linhas prejudica um pouco a compreensão de alguns pequenos trajetos.

Algumas rodovias também são mostradas no mapa.

Comentários:

Linhas da CPTM (beije):

 - A linha 9, entre Grajaú (não mostrado no mapa) e Varginha, está em obra de construção, neste momento, paralisada. Entre Varginha e Evangelista de Souza, o mapa indica linha abandonada: na verdade, boa parte desse trecho, usado para passageiros até 1976 e para cargas até cerca de 2000, teve os trilhos retirados.

 - A linha 8, entre São Paulo/Julio Prestes e Amador Bueno, é hoje de uso exclusivo e concessão da CPTM.

 - A linha 7, entre Luz e Jundiaí e a linha 11, entre Luz e Rio Grande da Serra, são da CPTM e ambas têm também tráfego da MRS.

 - Finalmente, a linha 11, entre Luz e Mogi das Cruzes, e a linha 12, entre Luz e Poá via variante de Poá, são operadas pela CPTM e também nelas circulam trens da MRS em alguns trechos.

 - Quanto à linha citada como sendo da CPTM e mostrada ali no litoral, entre Paratinga (local não mostrado no mapa, mas na linha da ALL-Rumo e em São Vicente) e Santos, não sei se ainda nominalmente pertence à CPTM; parte do trecho (Barreiros-Estuário) é utilizado desde 2015 como leito do VLT Santos-São Vicente, mas não operado pela empresa. Este trecho era parte do ramal Santos a Juquiá.

- Nas linhas da CPTM, são mostradas apenas algumas das estações. Já a de Santo André está colocada afastada da linha, não entendi por que.

 - As linhas 8 (São Paulo-Amador Bueno) e 9 (Osasco-Grajaú) são operadas atualmente somente pela CPTM. Cargueiros na linha 8 deixaram de operar ali em 2015 e na linha 9, por volta de 2000.

Linhas da ALL-Rumo (azul):

 - a antiga Santos-Mairinque-Campinas, retificada nos anos 1980 e que teve trens de passageiros operando até 1975-76, faz hoje parte da linha com maior densidade de tráfego (cargas) no Estado. Há projeto de duplicação em toda a sua extensão, mostrado no mapa com os linhas-pontos intermitentes. Não conheço o atual estado das obras. O trecho Paratinga-Cubatão jamais teve trens de passageiros e foi aberto em 1978.

 - o antigo ramal de Juquiá (Santos a Juquiá) está abandonado desde 2003, quando passou ali o último trem cargueiro. Os trens de passageiros circularam de 1913 a 1997. O trecho Paraitinga-Santos desde 1996 pertence à CPTM, que operou, entre 1991 e 1998, o TIM - Trem Intrametropolitano.

 - O trecho entre Varginha e Evangelista de Souza é da ALL-Rumo mas está abandonado desde por volta de 2000, como já citado mais acima.

 - De Jundiaí para a frente, a ALL-Rumo tem a concessão. A MRS opera sob licença o trecho de cerca de 45 quilômetros até Boa Vista, em Campinas, de onde entra para Mairinque.

 - Finalmente, de Amador Bueno para oeste, a ALL-Rumo têm a concessão da linha da antiga Sorocabana. Porém, já há dois anos, o trecho entre Amador Bueno e Mairinque foi totalmente abandonado pela concessionária já desde 2015. O mapa não mostra este abandono.

Linhas da MRS (verde):

 - Além das linhas citadas, a MRS também se utiliza da Variante de Poá, de concessão da CPTM e de parte do ramal de São Paulo, também da CPTM, entre Mogi das Cruzes e Suzano.

 - Variante do Parateí (Itaquaquecetuba-São José dos Campos): linha aberta em 1952 e que teve trens de passageiros até 1998.

 - Ramal de São Paulo (trecho Mogi das Cruzes-Jacareí): linha aberta em 1875 e que transportou passageiros até 1991. Depois de Jacareí, a linha foi arrancada em 2004 entre esta estação e a de São José dos Campos. A MRS usa o ramal entre Suzano, ainda no trecho da CPTM, e São Silvestre (zona rural de Jacareí), na fábrica da Votorantim.

 - Ligação Suzano-Rio Grande da Serra: linha aberta pela RFFSA em 1971 e que nunca transportou passageiros. Originalmente faria parte do Anel Ferroviário de São Paulo, que jamais foi terminado.

 - Antiga linha Santos-Jundiaí, de Rio Grande da Serra a Santos: a MRS utiliza todo o trecho da antiga ferrovia que hoje não é utilizado pela CPTM. Trens de passageiros utilizaram esse trecho até 1995 e, no trecho Rio Grande da Serra até Paranapiacaba, até 2001.

 - Ramal de Conceiçãozinha (Cubatão-Guarujá): o trecho nunca teve trens de passageiros e funciona desde 1980.

Bom, pode haver alguns enganos no que escrevi, mas basicamente é isto. Espero que aproveitem, e que elucide mais do que complique, já que a visão não é tão simples assim para quem não conhece os locais e a região.






sexta-feira, 30 de junho de 2017

ESTAÇÕES FERROVIÁRIAS NO FIM DO MUNDO

Estações de Cravinhos: até 1964, no centro da cidade (no canto esquerdo inferior do mapa do IBGE); depois, a nove quilômetros de distância (no canto direito superior do mapa). A estrada em vermelho que cruza o mapa em diagonal ligava as duas estações e era de terra até os anos 2000.

Hoje pela manhã estava comentando uma foto postada por Eduardo da Silva no Facebook, da estação de Piramboia-nova, no Estado de São Paulo, na linha da Sorocabana.

Piramboia é um bairro do município de Anhembi, ao sul da região de Piracicaba. A linha-tronco da ex-Sorocabana passa por ali desde os primórdios da sua existência.

A estação de Piramboia original foi inaugurada em 1888. O bairro não passava de um povoado e a estação era ao lado dele. Em 1952, a estação foi fechada ao mesmo tempo em que era inaugurada outra, com o mesmo nome (chamada de "Piramboia-nova" popularmente por algum tempo) na variante recém-aberta e que ligava Conchas a Botucatu.

Esta variante, como boa parte das variantes, passava longe dali - a cerca de três quilômetros do bairro - e a nova estação ficava no meio do nada. Aliás, até hoje, mesmo em ruínas, ainda fica. O que Eduardo postou foi um video que mostrava a estação já em ruínas no início de 1996. Ainda havia trens de linha que paravam na estação - já fechada - desde que houvesse algum passageiro querendo embarcar ou desembarcar.

Ficou a discussão: ainda embarcava alguém lá, considerando-se que era um prédio deserto, sem qualquer funcionário da ferrovia, sujo, sem qualquer infraestrutura, em ruínas e distante três quilômetros do bairro? Eduardo respondia que, nesse caso, sim, havia: "nos finais de semana sempre havia alguém, como por exemplo, minha tia que meu tio levava até lá de carro. Havia uma estrada de terra que acabou por desaparecer rapidamente depois do final dos trens de passageiros no início de 1999. Até os anos 1980 ainda parava durante a noite; nos anos 1990, ele somente parava durante o dia".

As variantes nas ferrovias paulistas começaram a ser construídas nos anos 1910. Não posso garantir aqui que me lembrarei de todas, mas é interessante citar que, em 1916, a Paulista construiu uma variante em bitola larga que ligava Rio Claro a São Carlos, eliminando o trecho antigo em bitola métrica que ligava as mesmas cidades, mas subindo e descendo a serra de Corumbataí (na verdade, a linha original ainda funcionaria como ramal até 1666, quando foi desativada). As novas estações abertas em 1916 na variante eram estações melhores do que as que existiam na linha velha e com nomes completamente diferentes (exceção das estações de Itirapina e de Conde do Pinhal, que mantiveram seus nomes originais, por estarem muito próximas das antigas com os mesmos nomes), por ficarem muito distantes e até em municípios diferentes das originais.

Em 1926-29, a Mogiana abriu uma variante entre as estações de Campinas e de Carlos Gomes. As estações já existentes de Anhumas, Tanquinho e de Carlos Gomes ficaram bastante próximas das antigas e mantiveram os nomes destas. Já na variante Lagoa-Tambaú, construída no final dos anos 1940, as estações ficaram não tão próximas assim das antigas, mas foram construídas ainda nos limites da zona urbana das cidades. Casa Branca, Coronel Correa e Cocais (depois Joaquim Libânio) foram construídas com versões novas, as outras não.

Em 1952 e 1953, foram entregues as variantes da Sorocabana, entre Conchas e Botucatu e entre Rubião Junior e Avaré. Na primeira, algumas das estações novas mantiveram os nomes das da linha antiga (como a de Piramboia). As estações foram em sua maioria construídas em alvenaria e infraestrutura. Todas, no entanto, estavam distantes das estações da linha original. A mesma coisa ocorreu na segunda variante, mas, nesta, as estações foram todas construídas em madeira, como se fossem provisórias. Com exceção da de Avaré (cuja estação ficava na região norte da cidade e a nova foi construída na região sul), que depois de algum tempo (1958) foi reconstruída em alvenaria.
Como se vê, a construção de estações precárias "esperando a definitiva" começou a acontecer em 1953. As variantes construídas depois disso por Paulista e Mogiana - e, nos anos 1970 pela Fepasa -
às vezes tinham estações novas instaladas como vagões fixados numa plataforma de concreto e que às vezes eram substituídas (Mogi-Mirim e Coronel Pereira Lima são exemplos), às vezes não.

Saindo fora do estado, gostaria de citar a construção de algumas linhas novas e variantes, como a Mafra-Lajes, a Lajes-General Luz e a Apucarana-Ponta Grossa (esta, a  E. F. Central do Paraná), abertas entre os anos 1960 e 1970, construíram estações de passageiros definitivas em alvenaria, com vilas ferroviárias e outras dependências. Com exceção da primeira (Mafra-Lajes), cujas estações de passageiros funcionaram até por volta de 1978, as outras duas jamais tiveram trens de passageiros e, desde o início, as instalações não tiveram a alocação de funcionários, resultando em uma enorme quantidade de dinheiro jogada fora. Hoje tudo isso está em ruínas ou mesmo demolido. E por causa da distância muito grande (e consequente isolamento) das cidades e bairros a que atendiam, quase nenhuma chegou a ser ocupada, legal ou ilegalmente.

Claro que existem outras variantes a serem consideradas. Aqui, no entanto, lembrei-me das citadas. Mas parece-me que existia algum tipo de legislação que justificava estações de passageiros construídas em zonas desertas. Exemplos são (Engenheiro Miller, Juca Novais e Miranda Azevedo, 1953, EFS; Piramboia-nova, Eng. Romualdo-nova, Cesar Neto e Apuãs, 1952, EFS; Joaquim Libanio, 1949, Mogiana; Cravinhos-nova, 1964, Mogiana (a 7 km da cidade) e outras. Será que durante todo este tempo, já que as linhas sempre atendiam cargas e passageiros, elas não seriam obrigadas a colocarem nos seus projetos a construção de instalações adequadas para embarque e desembarque de passageiros, mesmo que eles fossem em número muito pequeno?

Poder-se-ia reclamar que as ferrovias construíssem novas linhas e variantes muito longe das zonas urbanas nos anos 1950, 60, 70 e até hoje. Porém, eram as terras mais baratas para serem desapropriadas. A compra de terrenos para ferrovias era muito mais barata no século XIX e no início do século XX. Ainda por cima, era comum fazendeiros da região até doarem as terras para a construção de linhas férreas e estações, pois tinham interesse em ter uma ferrovia próxima. A partir dos anos 1950, esta situação mudou completamente. A tecnologia para construir novas linhas, com túneis e viadutos para eliminar curvas e aumentar bitolas exigia regiões ainda semi-virgens para a passagem.

É claro que o cidadão de Piramboia ou de Cravinhos, além de inúmeras outras cidades que tiveram o local de sua estação alterado reclamavam da distância que agora precisariam percorrer para tomar o trem que antes tomavam ao lado de casa. Mas não havia solução. Ou melhor, havia - que seria a construção de estradas asfaltadas e a implementação de linhas de ônibus para a população que queria tomar o trem. Isso não aconteceu em praticamente nenhuma dos casos. Como já visto lá atrás, a estrada de Piramboia para a estação era um caminho de terra que desapareceu depois que o trem deixou de servir a região. Em Cravinhos, por exemplo, o trem acabou em 1997 e a estrada para a estação de 9 quilômetros ainda era em terra em 2000, quando estive lá! Há dezenas de outros exemplos a serem colocados neste sentido, mas não são necessários: as prefeituras jamais se importaram com a necessidade de suas populações de tomar o trem. Evidentemente, o número de passageiros que tomavam trens e que começaram a diminuir a partir dos anos 1950 tinham vários motivos para deixar de usar a estrada de ferro, e a falta de transporte até os locais de embarque certamente era um deles.

E hoje, temos o que temos: não há trens de passageiros, as estações foram abandonadas, demolidas, arruinadas...

quinta-feira, 29 de junho de 2017

PAULISTA X SOROCABANA: OS ANOS 1930

Serra da Sorocabana: construção do Viaduto 19, em 1932. Revista O Malho
Quem estuda um pouco das ferrovias paulistas sabe que nos anos 1930 a Cia. Paulista de Estrada de Ferro estava fundindo três ramais no oeste do Estado alargando a bitola da linha resultante - mais tarde chamada de tronco oeste.

Por sua vez, a Sorocabana - empresa que era estatal (do governo do Estado) desde o início do século - estava construindo a linha que uniria Mairinque a Santos.

A Paulista havia estendido o tronco Jundiaí a Colombia em 1930 com bitola larga ao mesmo tempo em que entregava uma linha retificada, mas ainda com bitola métrica (com espaço suficiente no leito para receber a bitola larga) entre Itirapina e Dois Córregos, ou seja, grande parte do ramal de Jaú. O plano desta era juntar os três ramais (Ramal de Jaú, Itirapina-Jaú), Agudos (naquele momento, Dois Córregos-Marília) e Buru (Pederneiras-Bauru) com bitola de 1,60m até meados dos anos 1930.

Já a Sorocabana havia duplicado sua linha-tronco, bitola métrica como todas as outras linhas dela, em 1929 de São Paulo até Iperó.

De 1929 até 1932, a obra da serra avançou com certa celeridade. O objetivo era entregar a linha Mairinque-Santos pronta até o final de 1933. A ideia era não depender mais da São Paulo Railway, com quem tinha de baldear mercadorias no pátio da Barra Funda para chegar ao porto de Santos.

Já a ideia da Paulista era receber cargas que vinham pelas suas próprias linhas e pela Noroeste, das regiões além-Bauru. Com isto, estas cargas, que baldeavam em Itirapina para o tronco de bitola larga, agora poderiam baldear em Bauru e chegar a Santos. Lembrar que para a Paulista não havia necessidade de baldeação em Jundiaí ou São Paulo, pois as linhas da São Paulo Railway tinham a mesma bitola. Com uma linha melhor, ela sabia que a tendência seria de aumentar seu volume de cargas, prejudicando assim seu concorrente direto - a Sorocabana - em Bauru.

Já esta última andou sondando o governo federal no sentido de conseguir comprar a Noroeste e, assim, levar vantagem sobre a Paulista, desde que tivesse sua própria linha até Santos. Uma mesma composição poderia vir do Mato Grosso para Santos diretamente, sem qualquer baldeação.

O problema era que, a um certo ponto, o governo federal endureceu o jogo e não quis mais vender a Noroeste. Ao mesmo tempo, a diretoria da Sorocabana e o governo paulista estiveram a ponto de desistir da obra da Mairinque-Santos, que, a esta altura, 1935-6, estava com as obras na serra paradas - apenas os trechos dessa linha na baixada e no planalto estavam funcionando parcialmente, sem se unirem. Motivo: falta de verbas e querela política dos governadores de São Paulo pós-revolução de 1932.

Percebendo isto, o governo do Estado atrasou a autorização das obras da Paulista entre Jaú e Bauru, de forma que a Paulista, sem essa união, continuasse a ter sua baldeação de cargas em Itirapina ou mesmo em Jaú, que não é, digamos, do "lado" de Bauru.

No fim, discussões políticas e ataques pelos jornais de pessoas pró-Paulista e pró-Sorocabana acabaram fazendo com que a Sorocabana "se virasse" e construísse a ligação pela serra (meados de 1938) e a Paulista conseguisse a autorização para chegar a Bauru com bitola larga e também linha eletrificada, embora isto somente viesse a ocorrer em 1941 (Jaú) e Bauru (1947).

Nota: com as retificações, os ramais de Jaú e de Bauru desapareceram e o de Agudos foi cortado em dois (Dois Córregos-Iguatemi e Pederneiras-Piratininga). De Piratininga para a frente, a bitola foi sendo alargada até a cidade de Panorama, a partir de 1947 até 1962. Hoje, tudo o que um dia foi o ramal de Agudos ou foi arrancado (em 166, Dois Córregos-Piratininga-Garça) ou foi desativado pelas concessionárias atuais (Bauru-Garça-Panorama).

Quando vemos hoje as discussões nos jornais para a construção de ferrovias e os seus atrasos constantes (veja-se Norte-Sul, FIOL, Transnordestina), talvez pensemos que isto é coisa que somente ocorre hoje, onde o governo mal se importa com as ferrovias que sobraram e com as ferrovias que têm de ser construídas.

Mas não. No passado era tudo assim. No fim, as obras citadas da Sorocabana e Paulista que deveriam estar prontas até 1935, ficaram prontas bem mais tarde. Culpa de quem? Do governo, que ou era indeciso com relação à sua própria ferrovia, ou prejudicava as ferrovias particulares, como ainda a era a Paulista.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

FERROVIAS PAULISTAS CEM ANOS ATRÁS

Um dos projetos que apareceram em 1917 foi a construção de uma linha de bondes elétricos de Campinas para Monte-Mor. Não vingou.

As ferrovias paulistas estão muito próximas de uma das menores quilometragens de sua história. A cada ano que passa, mais um trecho, pequeno ou grande, é abandonado pelas atuais concessionárias. No Estado, uma das últimas a ser largada ao léu foi a Sorocabana, em dois trechos: um pequeno, entre Amador Bueno e Mairinque, e outro bem longo, entre Rubião Junior e Presidente Epitácio.

Mas houve tempos em que as ferrovias cresciam a cada ano que passava, em São Paulo. Isso aconteceu em praticamente todo o período entre 1867 e 1960. A partir daí, acentuou-se a decadência.

Voltemos então cem anos no tempo. Havia cerca de 6400 quilômetros de trilhos no Estado. Eram diversas ferrovias: Paulista, Sorocabana, Mogiana, Araraquarense, Central do Brasil, São Paulo-Minas, Noroeste, São Paulo Railway, entre as maiores, e diversas outras menores, que, com o tempo, em sua maioria foram vendidas para outras estradas de ferro, como por exemplo, a Douradense e a São Paulo a Goiaz, Algumas poucas acabaram extintas sem que ninguém se preocupasse em comprá-las, como a Itatibense e a E. F. de Villa Costina.

O que se fazia em 1917 para aumentar essa malha?

A Paulista havia acabado (1916) de aumentar a bitola de sua linha principal, entre Rio Claro e São Carlos, e já estava trabalhando para eletrificá-la (ficaria pronta em 1928) e para estendê-la (a linha de bitola larga chegaria a Colômbia (no Rio Grande) em 1930. A Sorocabana tinha a ponta de sua linha-tronco em Indiana e já estava em obras para atingir Presidente Prudente - que não passava de um pequeno loteamento nessa época, sem nome definido e que seria alcançada em 1919. A Mogiana acabara de construir diversos ramais em Minas Gerais (1912-15).

E todas essas linhas, mais as que não foram citadas, operavam com trens de passageiros em diversos horários diários. Era muito comum pipocarem notícias na imprensa sobre novos projetos, tanto de ferrovias já existentes, quanto de novos empresários pensando em investir. A maioria não vingava, é verdade, mas isso mostrava o interesse pelo assunto.

Outros tempos, realmente. Era, no entanto, difícil de prever que, cem anos depois, as ferrovias paulistas e brasileiras estivessem em tão grande desvantagem em relação a esse meio de transporte no resto do mundo. Parece que só o Brasil está certo em abandoná-las e o resto, todos errados em mantê-las.

terça-feira, 20 de dezembro de 2016

COMO SE TRATA O DINHEIRO PÚBLICO NO BRASIL - A FERROVIA EM BARRETOS

Em 2002 foi entregue o contorno ferroviário de Barretos. A obra foi feita para eliminar os trilhos da região central da cidade. Estes trilhos ligavam o trecho da antiga linha-tronco da extinta Companhia Paulista de Estradas de Ferro que estavam ali desde 1909 e que vinham, do sul, das cidades de Bebedouro e Colina, e atingiam, depois de cruzar Barretos, a cidade de Colômbia, às margens do rio Grande e final da linha principal da ferrovia.
Estação nova de Barretos, construída na linha do contorno ferroviário e entregue em 2002. A foto é da época e de autoria de Rodrigo Cabredo.

Desde os anos 1970, a Prefeitura e a Câmara da cidade reclamavam pela retirada da ferrovia, por que ela supostamente atrapalhava o trânsito rodoviário da cidade, pela falta de passagens de nível, perigo nas travessias... aquelas histórias de sempre que passaram a fazer com que o país tivesse ódio pelas ferrovias nos últimos 50 anos.

Apesar de todas as pressões, a FEPASA não aceitava a retirada, pois não queria arcar com os custos. Queria que a prefeitura custeasse a obra e, esta, recusava-se a tal.

Em 1998, conseguiu-se um financiamento para tal. Afinal, os trens de passageiros que ainda serviam a cidade haviam sido eliminados em 1997. A obra foi iniciada não muito tempo depois e concluída, como já dito, em 2002.

Sem trens de passageiros e com tráfego cargueiro bastante reduzido nesta época, a obra provou ter sido inútil. Praticamente trem algum passou pelo contorno já pronto, enquanto os trilhos da linha antiga foram erradicados logo a seguir.

Agora, 14 anos depois, vem a notícia de que houve malversação de dinheiro, como mostra o texto abaixo, publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo na data de hoje e reproduzida logo abaixo.

É assim que o Brasil trata o dinheiro arrecadado. Vejam a história.

Liminar bloqueia R$ 15 milhões de Uebe Rezeck e mais 11 por improbidade na construção de ramal ferroviário

20/12/2016 – Estadão

A pedido do Ministério Público Federal em Barretos (SP), a Justiça determinou o bloqueio de R$ 14,9 milhões do ex-prefeito da cidade, Uebe Rezeck – ex-deputado estadual pelo PMDB -, dos ex-secretários municipais João Carlos Guimarães e José Domingos Ucati, de cinco ex-funcionários do DNIT, de quatro construtoras e seus representantes legais. Todos são acusados de improbidade na construção do Contorno Ferroviário de Barretos.
As informações foram divulgadas nesta segunda-feira, 19, pela Assessoria de Comunicação da Procuradoria da República em São Paulo.
(O número processual é 0001329-82.2016.4.03.6138. A tramitação pode ser consultada em http://www.jfsp.jus.br/foruns-federais/.)
A autora da ação é a procuradora da República Sabrina Menegário.
Segundo a ação, o Contorno Ferroviário de Barretos, com 12,2 quilômetros de extensão, tinha por objetivo eliminar o conflito e a interferência da linha férrea no tráfego do centro da cidade.
A obra foi dividida em quatro lotes. Em 1999, época em que Uebe Rezeck era prefeito, João Carlos Guimarães secretário de finanças e José Domingos Ducati secretário de Obras do município, foi aberta licitação para a contratação de empresas para a execução dos quatro lotes do empreendimento.
Na documentação do processo, constava como fonte de recursos única e exclusivamente a Secretaria de Obras e Serviços Urbanos de Barretos, que, segundo os gestores municipais, dispunha à época de R$ 1,1 milhões.
Segundo a ação do Ministério Público Federal, a licitação resultou na contratação de quatro empresas, uma para cada lote, com previsão de execução da obra em 12 meses. No entanto, os preços fixados na contratação das vencedoras da licitação somaram R$ 10,29 milhões, valor muito acima do que dispunha a secretaria, ‘o que já era irregular, visto que toda licitação deve contar com previsão de dotação orçamentária capaz de assegurar o pagamento das obras e serviços’.
Para obter os recursos necessários, a prefeitura firmou, em dezembro de 1999, convênio com o Ministério dos Transportes que, após quatro termos aditivos, fixou o valor total de R$ 5,69 milhões para a execução dos lotes 1 e 2, com finalização prevista para dezembro de 2002.
“Novamente, a prefeitura se comprometeu com recursos que não tinha, já que sua contrapartida neste convênio, que previa apenas dois dos quatro lotes, ultrapassaria os R$ 1,1 milhões que possuía para os quatro lotes”, sustenta a Procuradoria da República.
“Ainda assim, não visando a finalização dos lotes 1 e 2, mas para dar início aos lotes 3 e 4, a prefeitura de Barretos solicitou a celebração de novo convênio com o DNIT, em novembro de 2002”, segue o Ministério Público Federal. “Este novo acordo previa um valor total de R$ 6,9 milhões, com contrapartida do município de R$ 1,38 milhões.”
O valor deste plano de trabalho, aprovado pelo DNIT, também era diferente do valor licitado contratado para a execução dos lotes 3 e 4. “Mas, diferentemente do plano de trabalho apresentado, e também diferente do valor já contratado, em dezembro de 2002, o convênio foi firmado no valor total de R$ 1,5 milhões, valor insuficiente para a execução das obras.”
Segundo a Procuradoria, ’em nenhuma cláusula do convênio havia previsão de que a diferença dos valores seria subsidiada com outras fontes, ou que o mesmo executaria apenas partes dos serviços necessários para a implantação dos lotes 3 e 4, que também nunca foram finalizados’.
Apesar de todo o valor investido, o Contorno Ferroviário está inacabado. Pouco após o término da vigência do segundo convênio, em 2008, o próprio DNIT solicitou a elaboração de projeto executivo para a recuperação da ferrovia, ‘face às péssimas condições do que foi construído, inclusive com estado avançado de erosão’.
Nova licitação foi realizada em 2010 para a recuperação e complementação do Contorno Ferroviário, com orçamento base de R$ 16,27 milhões. “Este fato chamou atenção do Tribunal de Contas da União, que instaurou processo para avaliar a legalidade, conformidade e economicidade das obras complementares do contorno, constatando que esta nova contratação, na verdade, faria a reconstrução total da obra, que não havia sido concluída com os recursos dos convênios de 1999 e de 2002, mesmo o DNIT e o Ministério dos Transportes terem aprovado suas contas, de forma ilícita’.
A ação de improbidade ajuizada pelo Ministério Público Federal mostra que ‘ocorreu a imobilização de capital público vultoso que não serviu para nenhuma finalidade’.
Segundo a Procuradoria, ‘atualmente há necessidade de novo investimento, inclusive maior ainda, para a efetiva implantação do Contorno Ferroviário’.
“Para tanto, o ex-prefeito e ex-secretários de Barretos, bem como os responsáveis no DNIT, praticaram atos que causaram grande prejuízo ao erário, ao promover a construção de obra sem previsão de recursos suficientes e sem a fiscalização adequada. Assim como as empreiteiras contratadas tiveram enriquecimento ilícito ao incorporar os recursos públicos aos seus patrimônios, sem sequer finalizar a obra.”
Pedidos – Além da indisponibilidade dos bens no total do ‘dano causado ao erário’, R$ 14,9 milhões, já decretada pela Justiça, o Ministério Público Federal pede a condenação dos réus por improbidade, com consequente ressarcimento integral do prejuízo.

A reportagem não localizou Uebe Rezeck e seus ex-secretários municipais de Barretos. O espaço está aberto para manifestação dos acusados pelo Ministério Público Federal.


sábado, 29 de outubro de 2016

CEM ANOS DO RENASCIMENTO DA CIA. PAULISTA

Estação de Batovi, em Rio Claro, em 1916, sendo terminada para receber trilhos da bitola larga: se fosse uma foto de hoje, significaria que estava já depredada e sem trilhos. Esta escapou: já não tem trilhos, mas não foi depredada.

Em 1o de junho de 1916, cem anos atrás, a lendária Companhia Paulista de Estradas de Ferro renascia, inaugurando a linha em bitola larga entre Rio Claro e São Carlos e, assim, mostrando a que veio, com um atraso de 26 anos.

Atraso que foi causado não por causa de falta de vontade de construir a linha, mas, por que em 1880, estava com a ponta da sua linha-tronco d bitola larga em Porto Ferreira e extremamente confiante que sua linha de Rio Claro seria prolongada sem problemas até São Carlos e além.

Estavam enganados, porém. O governo não queria isso. A Rio-clarense entendeu que, se ela fizesse o que o governo provincial queria - que era seguir para São Carlos e Araraquara, mesmo que fosse em bitola métrica, passando pela Serra de Corumbataí, onde fazendeiros locais eram extremamente influentes e queriam a ferrovia passando na porta de suas fazendas - ela conseguiria fazer a linha. A disputa pelo direito de construir a linha ficou com a Rio-clarense, que, efetivamente, a faria e, em 1885, já chegava a Rio Claro, em 1886 a Brotas e em 1887 a Jaú.

A Paulista ficou com a linha parada em Rio Claro (onde era obrigada a dar saída para a linha métrica da Rio Clarense) e em Porto Ferreira, onde, o máximo que conseguiu foi desviar sua linha para o oeste, alcançando Descalvado e nada mais, porque, ali, também, seu excesso de confiança perdia o direito de chegar a Ribeirão Preto, derrotado pela Mogiana, que fez isso partindo de sua linha em Casa Branca.

A Paulista ficou 12 anos meio parada, pensando em como poderia fazer para salvar seu investimento. Conseguiu paliativos, como construir o ramal de Santa Veridiana, mesmo sob uma saraivada de balas da Mogiana, que alegava ter zona privilegiada ali. Fez também a navegação fluvial até Pontal, incentivou cidades locais a terem sua própria ferrovia e assim levarem cargas para a Paulista, como a E. F. de Santa Rita, a Descalvadense e a Itatibense, mas isso não era, realmente suficiente.

Em 1889, a Rio-clarense decidiu vender a sua ferrovia. A Paulista titubeou de novo e não comprou. A empresa ficou com os ingleses, que fundaram a Rio Claro Railway e continuaram fazendo planos para avançar, para Ribeirão Bonito, Água Vermelha, Pitangueiras, Agudos e Barretos.

Em 1892, a Paulista acordou e conseguiu comprar, agora a peso de ouro, a Rio Claro Railway.

Agora, ela ficava com os seus planos, mas teria de dispender muito dinheiro para conseguir alargar todas aquelas linhas em bitola métrica. Teria de esperar.

Só que não esperou parada. Tomou para si as obras que estavam já em andamento (Água Vermelha, Jaboticabal e Ribeirão Bonito) e assumiu os projetos (Bebedouro, Rincão e mesmo Barretos). Fez, ainda, tudo em bitola métrica, mas não se esqueceu da larga.

No início dos anos 1910, a bitola métrica ia de Rio Claro a Barretos, de Itirapina a Jaú, de Dois Córregos a Piratininga, de Pederneiras a Bauru, de Guatapará a Pontal, de Água Vermelha a Ribeirão Bonito.

Em 1916, a Paulista, depois de seis anos construindo novas estações e armazéns por todas as suas linhas, métricas e largas, mostrando poder, abria a linha de bitola larga Rio Claro-São Carlos, em trajeto diferente da que já havia (correndo a oeste da serra de Corumbataí, até Visconde do Rio Claro) mantendo todas as métricas ainda funcionando - inclusive a Rio Claro-São Carlos, que, entre Visconde e São Carlos seguia paralela à linha larga, com estações de duas plataformas!

Em 1928, a bitola larga já alcançava Rincão e estava totalmente eletrificada!

Em 1930, a larga já estava em Colômbia, às margens do Rio Grande. A métrica funcionava apenas nos 5 ramais (Água Vermelha, Ribeirão Bonito, Pontal, Jaú e Agudos) e entre Rincão e Bebedouro;  - a expansão da larga passou pela margem direita do rio Mogi, cruzando o rio duas vezes e, o ramal de Agudos já estava agora com a ponta em Marília.

Em 1941, já em plena Segunda Guerra Mundial (lembre-se que o "renascimento" de 1916 também estava, mas na Primeira!), reformou completamente o ramal de Jaú e ligou-o a Bauru, eletrificando todo o trecho Itirapina-Jaú.

Em 1947, dois anos após o término da guerra, a eletrificação chegava a Bauru. A Paulista era já há um bom tempo a melhor ferrovia do país e da América Latina. O ramal de Agudos estava em Tupã.

Até 1950, já havia comprado duas ferrovias médias, a Douradense e a São Paulo-Goiaz, e começava a investir na modernização de suas linhas principais. Em 1954, a eletrificação chegava até Cabralia Paulista. O ramal de Agudos, já tronco oeste, chegava a Adamantina em 1950 e em 1959 a Dracena.

Em junho de 1961, uma greve "sensibilizou" o governador para a encampação da que era a única ferrovia privada do Brasil e ainda a melhor da América. Neste país de absurdos em que vivíamos e ainda vivemos, nada mais surpreende.

Em 1976, a linha Rio Claro-São Carlos de 1916 foi substituída por uma variante mais moderna, que funciona até hoje com trens cargueiros, a maioria vindo de Mato Grosso..


terça-feira, 25 de outubro de 2016

QUEM PAGARÁ OS PREJUÍZOS?

Todas as fotos - por Renato Pereira da Silva - outubro de 2016

Pois é, quando a privatização chegou para a FEPASA, no final de 1998, esperava-se que pelo menos as linhas que estivessem em melhores condições (nenhuma estava, realmente, em grande forma) fossem bem aproveitadas. Eram 5 linhas-tronco grandes, muitas ainda de tempos anteriores à formação da FEPASA: Paulista (dois troncos), Mogiana, Sorocabana e E. F. Araraquara. Havia até alguns ramais mais extensos ainda funcionando (Ramal de Juquiá, da ex-EFS) e, finalmente, o famoso Corredor de Exportação, este a linha mais nova (Boa Vista-Mairinque-Santos) e a mais importante de todas.

Havia, é verdade, trechos antigos, como a linha Assis-Presidente Epitácio, construída nos anos 1910 e 1920. O próprio ramal de Juquiá era (fora o trecho Juquiá-Cajati) bem velhinho (de 1915). Mas trechos como partes da Mogiana (variante Guedes-Mato Seco e Entroncamento-Amoroso Costa) eram de 1979. Da Paulista, as variantes Santa Gertrudes-Itirapina e Bauru-Garça eram de 1976.

A EFA inteira era dos anos 1950-60, quando teve a bitola ampliada. O tronco oeste da Paulista era, do mínimo de 1941 - foi todo refeito nesse ano e depois prolongado até Panorama, onde chegou em 1962. O trecho maior da Sorocabana (São Paulo-Assis) era, basicamente, dos anos 1940-50.

Não foi exatamente o que aconteceu. Hoje em dia, apenas a Mogiana vai razoavelmente bem, obrigado, operada pela FCA/VLI nas linha Campinas-Araguari e o velho ramal de Caldas. Da Paulista, é aproveitado o tronco principal até Araraquara (e, depois, até Pradópolis, é como se fosse um desvio industrial, que vai pegar produtos na usina). O tronco oeste só é usado até Bauru e olhe lá. O resto para a frente, construído a partir de Garça, entre 1930 e 1962, praticamente acabou. Nem a famosa bicilinha tem coragem de trafegar ali hoje em dia.

Esqueci alguma coisa? A Noroeste, Central e Santos-Jundiaí não eram FEPASA. A última está quase toda na mão da CPTM, que opera bem os metropolitanos. Paranapiacaba, descida da serra até Santos é reduto da MRS. Mas opera. Central também é MRS, variante de Poá e Ramal de São Paulo, e tem a CPTM dividindo trilhos. Noroeste está à beira do buraco. Pouco tráfego e, dizem, hora certa para acabar.

O governo federal, dono de praticamente todas essas linhas, só fica olhando. Não se importa com o que acontece ou deixa de acontecer. O governo pauista somente se importa com a CPTM (e o metrô, mas este nunca foi das redes citadas acima e é relativamente novo - a linha mais antiga tem 40 anos.

O que não se pode admitir é a omissão da CPTM. Afinal, ela tem a concessão da linha  entre Amador Bueno e Mairinque e não a usa desde 1998. Só que, bem ou mal, a ALL estava usando o trecho, carregando areia e, um pouco mais para trás, cimento (até que as favelas do Jaguaré acabaram com a linha de desvios em Altino). Já desde 2014, a ALL, agora Rumo, não usam mais a linha entre Mairinque e Amador Bueno. Este trecho (27 quilômetros) e mais aquele entre Rubião Junior e Presidente Epitácio (567 quilômetros) estão totalmente abandonados. 71 por cento da Sorocabana estão virando sucata! Mais de 2/3 da ferrovia! Daqui a pouco se enchem de favelas, especialmente o trecho de Mairinque. Quem vai se responsabilizar por isto? O Governo Federal, que não fiscaliza? O Estado, que não pressiona a União a tomar providências? Afinal, dever-se-ia pressupor que o Estado tenha interesse em consertar a coisa.

E é neste trecho menor, de 27 quilômetros, que, na minha opinião, o problema é maior. Se a CPTM é a dona da concessão e não o usa (juro que não entendo por que não há trens para Mairinque já há 18 anos), deveria, no mínimo, manter a linha limpa e trafegável, com autos de linha, locomotivas de manutenção etc. Não. Não faz nada.

Hoje em dia a desculpa é: o país está quebrado. Os Estados estão quebrados. A CPTM, se não está quebrada, está, no mínimo, com dificuldades. Mas e antes, quando ainda supostamente a situação estava melhor? Por que não se fez nada, não se previu nada?

Olha, eu nem sei porque perco meu tempo escrevendo tudo isto. Vejam as fotografias, enviadas por Paulo Stradiotto, de um tour a pé feito pelos 11 quilômetros entre Amador Bueno e a estação de Mailaski, esta, antes das estações de São Roque e de Mairinque e muito próxima ao ponto em que a linha da velha Sorocabana corta, por baixo, a rodovia Raposo Tavares.


quarta-feira, 5 de outubro de 2016

FERROVIAS EM CAMPINAS E MOGI-MIRIM, 1931


Este mapa de 1931, publicado no livro de meu avô Sud Mennucci, Brasil Desunido, foi publicado inicialmente em janeiro de 1932 no jornal O Estado de S. Paulo e, logo depois, no livro citado.

Ele foi colocado no livro para ilustrar outro caso de divisão municipal, no caso, nos municípios de Campinas e de Mogi-Mirim, com as divisas que ambas as cidades tinham na época.

Primeiro, reparem que as linhas da Cia, Paulista e da Sorocabana não foram colocadas no mapa, quase que certamente porque, nessa discussão, elas não fizessem diferença. Como sabemos, a da Paulista corta o município de Campinas de sudeste a noroeste e passa praticamente pelo centro da cidade, enquanto a da Sorocabana saía do centro no sentido oeste, dobrando em seguida para sudoeste, para atingir Itu e Mairinque.

Pelo mesmo motivo, não mostra a linha do ramal de Amparo, que saía de Jaguari (hoje Jaguariúna) para atingir Amparo e Socorro.

Porém, o mapa mostra as outras linhas que existiam na época: a da Mogiana (para o norte) a da Funilense (também para norte, paralela à outra), o Ramal Férreo Campineiro, até Souzas e os ramais de Itapira (para leste, partindo de Mogi-Mirim) e de Pinhal (para nordeste, saindo de Mogi-Guaçu).

O problema era: na época, Cosmópolis ainda pertencia a Campinas, Então, qualquer situação tinha de ser resolvida na sede do município. Na época, qualquer ferrovia era melhor do que qualquer estrada de rodagem e, no caso, a ligação era direta: pegava-se o trem na estação de Cosmópolis, seguia para Guanabara ou para a estação da Sorocabana no Bonfim e pronto. Simples.

Quem morava em Souzas também não tinha problema, tomando o Ramal Férreo Campineiro até a estação da Paulista.

Já em Mogi Mirim, quem morasse em Conchal ou em Arthur Nogueira teria de procurar os serviços públicos e a sede da prefeitura no centro de Mogi, Para isto, teria de tomar o trem na estação de seu bairro, ir até Campinas e, dali, tomar outro trem até Mogi-Mirim. Dependendo do horário, podia tomar o dia inteiro.

As ferrovias, como já comenti em outras postagens, eram na época o que determinava cada estudo para mudança de divisas municipais. Estas mudanças começariam a ser feitas em 1934, depois de mais de três anos de estudos.

Hoje, além de Mogi-Mirim e Campinas, Cosmópolis, Conchal e Arthur Nogueira são municípios, além de outros, como Jaguari e Santo Antonio de Posse e ainda Paulinia e Engenheiro Coelho, estes dois últimos não assinalados, mas também na área coberta pelo mapa de 1931.

De todas as linhas ferroviárias mostradas (ou não) neste mapa, apenas a da Paulista ainda existe, A da Mogiana, de Campinas a Mogi-Mirim, deslocou-se para oeste. As outras foram extintas. Todas.

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

A HISTÓRIA DE QUE NÃO SE FALA - 1931

Mapa do município de Jaboticabal em 1931. Há 6 linhas férreas mostradas ali: o ramal de Jaboticabal (da Cia. Paulista), a linha da E. F. São Paulo-Goiaz (de Bebedouro para noroeste), a linha da E. F. Monte Alto, o ramal de Jaboticabal, da E. F. Jaboticabal (deste estação para o norte), a linha-tronco da Cia. Paulista (acompanha o Mogy-Guassu até Pitangueiras e dali a Bebedouro) e a linha Tayuva-Tayassu, que praticamente nunca operou, embora tenha sido construída e aberta em 1928). Fora essas, a E. F. Araraquara passava por Catanduva, mas não foi traçada neste mapa. Este mapa foi publicado no jornal O Estado de S. Paulo e no livro de Sud Mennucci.

A situação dos municípios paulistas (e brasileiros) era muito estranha em 1931 e bastante diferente do que é hoje. O Estado tinha pouco mais de 200 municípios (hoje tem mais de 600) e a divisão era feita de forma totalmente aleatória. Nesse tempo, as estradas de rodagem eram poucas, nenhuma pavimentada, automóvel era coisa de rico - rico, mesmo - e a opção eram os trens e andar a pé.

Então, os municípios com ferrovias eram privilegiados. Só que, na maioria deles, a ferrovia cobria apenas uma parte pequena do seu território. Portanto, distritos de municípios vizinhos, muitas vezes, tinham muito mais facilidade em ter acesso a serviços e transportes de um município ao lado.

Meu avô Sud Mennucci escreveu um livro, "Brasil Desunido", que ele lançaria em 1932, livro este que teve boa parte dele escrito no final de 1930 e no início de 1931 nas páginas do jornal O Estado de S. Paulo.

O caso de Jaboticabal foi citado por ele, com mapas, inclusive (ver o mapa acima). O livro o explica, mas a carta do morador de Catanduva, aqui transcrita, mostra claramente essa situação, mantendo-se as palavras de seu escritor, de nome Odilon Nogueira (que não é, até onde pude concluir, o autor do livro sobre ferrovias de São Paulo (1987), Odilon Nogueira de Mattos).

A partir de 1934, a situação dos municípios paulistas alterar-se-ia radicalmente, com mudanças drásticas nos seus territórios. Meu avõ Sud participou da comissão que fez essa redivisão. Há diversos tópicos neste blog (de nome "A História Secreta dos Municípios Paulistas"), postadas há cerca de 2 ou 3 anos.

A carta abaixo dava uma ideia de uma situação que ocorria na época no município de Jaboticabal (com área muito diferente da de hoje) e foi transcrita mantendo-se o português da época (aliás, notem a quantidade mínima de acentos, o que era bom).

Trecho da carta de Odilon Nogueira, escrita em 2 de janeiro de 1931 para Sud Mennucci.
"Li, com a atenção que sempre me mereceram os seus trabalhos, seu artigo de hoje no“Estado”, parte VIII da série “Brasil Desunido”.

Suas observações sobre a pessima divisão municipal do Estado, que hoje se illustraram com o exemplo de Jaboticabal, de ha muito são assunto de comentario nesta zona. É mesmo uma velha aspiração dos habitantes do distrito de Vila Novaes e sua incorporação ao municipio de Catanduva, em cuja sede se encontra o seu verdadeiro entreposto comercial. Basta dizer que a estação da estrada de ferro de que se serve esse distrito é a de Catanduva, de onde o chamado Bairro do Corrego Grande, naquele distrito, apenas dista meia duzia de kilometros, quando mais de cem, talvez, o separam da séde do municipio de Jaboticabal.

É facilimo de ver que de inconvenientes traz isso ao povo, notadamente no que concerne á distribuição da justiça.

Tambem o distrito de Palmares, no municipio de Monte Alto, faz todo seu comercio com a cidade de Catanduva e serve-se da sua estação ferrea.

As divisas de Palmares ficam bem proximas á cidade de Catanduva e entre as respectivas sedes medeiam somente 18 kilometros.

A divisão judiciaria desta zona apresenta identicos dispauterios. Assim, o municipio de Pindorama que traz suas divisas a 3 kilometros da cidade de Catanduva, de onde sua séde dista 9, pertence á comarca de Taquaritinga,a mais de 70 kilometros! O municipio de Mundo Novo, tambem tributario da estação de Catanduva, com 40 kilometros de percurso, faz parte da comarca de Itapolis, a mais d 100 kilometros.

O habitante da cidade de Mundo Novo para procurar a justiça tem de vir a Catanduva (40 kilometros por estrada de rodagem) w daqui, fazer mais 70 para alcançar Itapolis!

Urge que tudo isso seja reorganizado. E a sua campanha jornalistica nesse sentido é uma iniciativa digna de aplausos. Foi para vir apresentar-lhe os meus sinceros e efusivos, que me permiti a liberdade de escrever-lhe.

Patricio e admirador, Odilon Nogueira, Catanduva, 2 de janeiro de 1931."

sábado, 27 de agosto de 2016

RESTOS DA ESTAÇÃO DE GARÇA, SÃO PAULO


Recebi o e-mail hoje, do amigo Silvio Rizzo, que teve o desprazer de passar por Garça e fotografar a estação de "Garça-nova", aberta pela FEPASA em 1974.

"Seguem fotos tiradas esta semana da estação referida. Não tinha passageiros ou trem de carga mas sim, 2 jovens, menino e menina, na faixa de 20 anos, fumando maconha 2 horas da tarde sem o menor constrangimento com minha presença."

Havia mais fotos. Achei que estas seriam suficientes para se ter uma ideia da quantidade de dinheiro jogado fora com a construção de uma estação deste porte que não funcionou nem por 20 anos. Os desvios, muitos - o pátio era grande - foram retirados em 2001, sobrando apenas a linha principal, por onde não passa hoje em dia trem algum, fruto do enorme descaso dado pelas concessionárias e, por conseguinte, por nosso governo, às ferrovias brasileiras em geral.

Apreciem com moderação.







segunda-feira, 1 de agosto de 2016

DE JAÚ A NOVO HORIZONTE - 1947


Meu avô Sud tinha seus ídolos. Um deles era a Companhia Paulista de Estradas de Ferro, na época, considerada uma das cinco melhores do mundo - será essa colocação real?

Aqui ele escrevia um artigo (mais abaixo) para o já há muito desaparecido  Jornal de São Paulo, publicado em 2 de outubro de 1947, onde comentava algo que muito pouca gente ouviu falar, pelo menos nos dias atuais: a bitola larga de  Jaú para Novo Horizonte.


Notem que ele se refere à compra da Douradense e da São Paulo-Goiaz já efetivadas pela empresa - fatos que, oficialmente, são considerados como tendo sido concretizados, respectivamente, em 1949 e 1950.

Imagino que a linha já existisse - necessitaria, no entanto, de alterações no traçado antigo dos anos 1910 (entre Jaú e Ibitinga) e mais moderno (de 1936) de Ibitinga a Novo Horizonte, construídos pela Douradense. Isso, se as modificações não alterassem o traçado da ferrovia já existente (Jaú-Posto Rangel-Trabiju-Ibitinga-Novo Horizonte).

E ninguém entendia mais da geografia paulista do que meu avô Sud.

quinta-feira, 26 de maio de 2016

ITIRAPINA E TRÊS CORAÇÕES - AS MEMÓRIAS DAS FERROVIAS BRASILEIRAS SE DESMANCHAM

Estação de Itirapina - Foto Silvio Rizzo em 23/5/2016

Num país como o que estamos vivendo, onde uma presidente destruiu uma economia e ainda se faz de vítima, onde defensores da ex-presidenta parecem viver em um outro mundo, onde os novos governantes insistem em colocar pessoas que são investigadas pela Polícia Federal, onde exatamente por causa do aqui relatado não há dinheiro em caixa nem para fechar o ano, é racional apontar-se os problemas das ferrovias nacionais e esperar que algo seja feito?

Vamos ser sinceros e objetivos: voltar a ter ferrovias de bom padrão é uma das últimas prioridades. Manter os escombros das estradas de ferro brasileiras, então, mais para baixo ainda na linha de emergências a serem sanadas.
Estação de Itirapina - Foto Silvio Rizzo em 23/5/2016

Se nos últimos trinta anos nada se fez para voltarmos aos anos de ouro (vá, vá, de latão, que seja), certamente não será agora que alguma autoridade, que por acaso vier a ler este artigo, tomará alguma providência.

Mas eu sou teimoso.

Nos últimos dias recebi pelo menos duas notícias que me deixaram bastante chateado em relação à destruição do patrimônio ferroviário.

Uma mostra que a linha em Três Corações, MG, que passa dentro de algumas ruas da cidade, está sendo coberta com asfalto. Até alguns anos atrás, ainda passavam por ali trens cargueiros. Parte dessas linhas foram ali colocadas em 1884 e parte em 1926. A obra parece estar sendo feita sem a autorização do Governo Federal.
Trilhos em Três Corações - Foto Nutricionista Alessandra/Facebook, em 23/5/2016

Eu, que conheço o local e a cidade, pergunto: em que a presença dos trilhos atrapalha o trânsito de veículos na cidade (eu mesmo respondo: em nada). E mais: por que não se introduziu, ou pelo menos não se tentou, colocar trens metropolitanos ali, no mínimo, para atender às populações da cidade, da de Varginha e da de Carmo da Cachoeira? Finalmente: por que não asfaltar, mantendo os trilhos em seu lugar, de forma que possam ser aproveitados? Tantas cidades brasileiras têm trilhos em suas ruas, mesmo sem uso, e, infelizmente, muitas delas nada fizeram com relação às mesmas questões!
Trilhos em Três Corações - Foto Nutricionista Alessandra/Facebook, em 23/5/2016

Vale a pena ressaltar que a estação ferroviária de Três Corações está, também, em péssimo estado de conservação. A oficina de trens está em ruínas. Diversas carcaças de carros e vagões abandonadas e enferrujadas jazem no pátio.

O que a VLI, a Prefeitura Municipal de Três Corações, o DNIT, a ANTP e a Inventariança da RFFSA têm a dizer sobre o que está acontecendo?

A outra cidade é Itirapina, SP. Recebi fotografias de alguns dias atrás mostrando que a estação, outrora bifurcação das duas linhas-tronco da antiga Companhia Paulista de Estradas de Ferro, depois FEPASA, está em completo abandono e em petição de miséria. Muitos dos diversos desvios do seu pátio foram arrancados. Em 2007, uma reforma dos prédios foi iniciada, mas, como muitas obras governamentais que começam, nunca foi acabada. Resultado: dinheiro foi jogado fora e a estação e prédios do pátio estão virando ruínas.
Cabine de comando da estação de Itirapina - Foto Silvio Rizzo em 23/5/2016

Quem vai pagar o prejuízo material e o prejuízo à memória de um dos mais importantes pátios ferroviários de São Paulo e do Brasil? Apenas para quem não sabe: pela estação passam ainda trens cargueiros, nas duas linhas citadas. A cidade de Itirapina é pequena. E, como ironia do destino, neste ano comemora-se (há o que comemorar?) o centenário dessa estação e da bifurcação de linhas, mais precisamente, daqui a seis dias, em 1o de junho próximo.