terça-feira, 2 de novembro de 2010

NA COVA DOS OSTROGODOS (OU: SAUDADES DE ITIRAPINA)

Foto: Antonio Gorni

Eu não estive na Alemanha nos últimos dias. Mas meu amigo Gorni, sim. Ele registrou suas impressões ao andar de trem:

Na semana passada tive a oportunidade de fazer uma rápida viagem no InterCity Express (o TAV alemão) entre Hannover e Düsseldorf.

O percurso entre essas duas cidadas é normalmente cumprido em 2h 30 min, o que resulta numa média de 100 km/h - uma marca alucinante em termos brasileiros, mas meio pífia para os tão decantados trens de alta velocidade. Pareceu-me até inferior aos InterCity ingleses, que também não são o topo de linha. Note-se, contudo, que o número de paradas é muito grande, especialmente próximo à região de Düsseldorf, o que deve comprometer a velocidade.

Foi uma experiência bastante interessante, já que faziam 14 anos desde minha experiência com os InterCity ingleses.

Eu fui de segunda classe. A poltrona é confortável, ainda que não reclinável. A foto ilustra o interior do carro. Um ponto bastante negativo é a falta de locais para a colocação de bagagens pesadas. A rigor, elas só poderiam ser colocadas na prateleira superior do carro, o que exige um bom preparo físico do usuário. Há poucos lugares (não previstos em projeto) para acomodar malas mais volumosas no chão, ao contrário do que eu havia observado nos InterCity ingleses (havia locais demarcados no piso nas extremidades dos carros e entre assentos cujas costas se tocavam). Acabamos colocando as nossas numa área usada para pendurar casacos, que felizmente encontrava-se vazia. Mas haviam pacotes volumosos acomodados nas plataformas dos carros - algo irregular, mas comum. Se fosse aqui no Brasil, seria fácil para algum gaiato surrupiá-los do trem. Parece não ser o caso na Alemanha.

Infelizmente, no dia de minha viagem o pessoal da Deutsche Bahn estava fazendo "operação padrão", eufemismo que na prática significa "greve". Nosso trem ficou paralisado por motivos misteriosos numa estação erma a 40 minutos de Hannover por mais de 100 minutos, atraso esse que não foi recuperado posteriormente.

O jeito foi ir ao carro-restaurante - ou, no caso, "Bistro": uma espécie de lanchonete que serve sanduíches e pratos rápidos. Mas seus lugares estavam ocupados. A solução foi comprar os sanduíches e refrigerantes e comer em minha própria poltrona, a qual dispõe de uma mesinha similar à dos assentos de avião. Na extremidade de cada carro há lixeiras seletivas para reciclagem. Infelizmente os alemães não dão muita bola para elas, abandonando o lixo de seus lanches nos assentos que ocuparam. Parece que na primeira classe há um serviço de garçom, a exemplo da Classe Executiva dos trens da EFVM.

Nem apito esses TUEs interurbanos tem! Na partida, você ouve o apito para liberação do trem e, em seguida, uma campainha toca na plataforma - por sinal, quem for cinéfilo achará que ela parece com o tema dos violinos do filme "Psicose", de Hitchcock. O ruído dos trilhos é pouco, mas anódino - nada do "tátá-tátá" que se ouvia nos trens da CP, mais ou menos a cada 20 ou 25 segundos, que você acompanhava desde os carros anteriores da composição, passando pelo seu e seguindo para os posteriores. Essa sinfonia se perdeu...

OK, o serviço é razoável, mas não tem um centésimo do charme dos trens da minha infância. Não tem Jundiahy, Ityrapina e muito menos Angico. Nem cheiro de mato. Nem cafezais. Muito menos a placa "Limite para Locomotivas Eléctricas". E o frio é de matar se você sai na estação...

Eu quero ir, minha gente
Eu não sou daqui...
Eu não quero nada, nada
Quero ver Irene rir
Quero ver Irene dar sua risada!

Caetano Veloso - 1969

Gorni

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