Mostrando postagens com marcador itirapina. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador itirapina. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 26 de maio de 2016

ITIRAPINA E TRÊS CORAÇÕES - AS MEMÓRIAS DAS FERROVIAS BRASILEIRAS SE DESMANCHAM

Estação de Itirapina - Foto Silvio Rizzo em 23/5/2016

Num país como o que estamos vivendo, onde uma presidente destruiu uma economia e ainda se faz de vítima, onde defensores da ex-presidenta parecem viver em um outro mundo, onde os novos governantes insistem em colocar pessoas que são investigadas pela Polícia Federal, onde exatamente por causa do aqui relatado não há dinheiro em caixa nem para fechar o ano, é racional apontar-se os problemas das ferrovias nacionais e esperar que algo seja feito?

Vamos ser sinceros e objetivos: voltar a ter ferrovias de bom padrão é uma das últimas prioridades. Manter os escombros das estradas de ferro brasileiras, então, mais para baixo ainda na linha de emergências a serem sanadas.
Estação de Itirapina - Foto Silvio Rizzo em 23/5/2016

Se nos últimos trinta anos nada se fez para voltarmos aos anos de ouro (vá, vá, de latão, que seja), certamente não será agora que alguma autoridade, que por acaso vier a ler este artigo, tomará alguma providência.

Mas eu sou teimoso.

Nos últimos dias recebi pelo menos duas notícias que me deixaram bastante chateado em relação à destruição do patrimônio ferroviário.

Uma mostra que a linha em Três Corações, MG, que passa dentro de algumas ruas da cidade, está sendo coberta com asfalto. Até alguns anos atrás, ainda passavam por ali trens cargueiros. Parte dessas linhas foram ali colocadas em 1884 e parte em 1926. A obra parece estar sendo feita sem a autorização do Governo Federal.
Trilhos em Três Corações - Foto Nutricionista Alessandra/Facebook, em 23/5/2016

Eu, que conheço o local e a cidade, pergunto: em que a presença dos trilhos atrapalha o trânsito de veículos na cidade (eu mesmo respondo: em nada). E mais: por que não se introduziu, ou pelo menos não se tentou, colocar trens metropolitanos ali, no mínimo, para atender às populações da cidade, da de Varginha e da de Carmo da Cachoeira? Finalmente: por que não asfaltar, mantendo os trilhos em seu lugar, de forma que possam ser aproveitados? Tantas cidades brasileiras têm trilhos em suas ruas, mesmo sem uso, e, infelizmente, muitas delas nada fizeram com relação às mesmas questões!
Trilhos em Três Corações - Foto Nutricionista Alessandra/Facebook, em 23/5/2016

Vale a pena ressaltar que a estação ferroviária de Três Corações está, também, em péssimo estado de conservação. A oficina de trens está em ruínas. Diversas carcaças de carros e vagões abandonadas e enferrujadas jazem no pátio.

O que a VLI, a Prefeitura Municipal de Três Corações, o DNIT, a ANTP e a Inventariança da RFFSA têm a dizer sobre o que está acontecendo?

A outra cidade é Itirapina, SP. Recebi fotografias de alguns dias atrás mostrando que a estação, outrora bifurcação das duas linhas-tronco da antiga Companhia Paulista de Estradas de Ferro, depois FEPASA, está em completo abandono e em petição de miséria. Muitos dos diversos desvios do seu pátio foram arrancados. Em 2007, uma reforma dos prédios foi iniciada, mas, como muitas obras governamentais que começam, nunca foi acabada. Resultado: dinheiro foi jogado fora e a estação e prédios do pátio estão virando ruínas.
Cabine de comando da estação de Itirapina - Foto Silvio Rizzo em 23/5/2016

Quem vai pagar o prejuízo material e o prejuízo à memória de um dos mais importantes pátios ferroviários de São Paulo e do Brasil? Apenas para quem não sabe: pela estação passam ainda trens cargueiros, nas duas linhas citadas. A cidade de Itirapina é pequena. E, como ironia do destino, neste ano comemora-se (há o que comemorar?) o centenário dessa estação e da bifurcação de linhas, mais precisamente, daqui a seis dias, em 1o de junho próximo.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

ITAQUERI DA SERRA

Perto de Brotas, aqui no Estado de São Paulo, sediada no município de Itirapina, a vila e distrito de Itaqueri da Serra - que a placa indica apenas como sendo Itaqueri, às margens da rodovia (recentemente) asfaltada que liga a SP-225 a São Pedro - jaz ali, tranquila, com uma rua principal e mais quase nada.
Típico bairro rural organizado dentro de alguma fazenda por ali, não cresceu: tem um barzinho com a sua sinuca, uma pracinha com uma igreja, algumas poucas casas e... tranquilidade.
Ruas de terra, poeira, não havia ninguém na rua neste 31 de dezembro chuvoso. Encontrei apenas três garotos de bicicleta.


segunda-feira, 15 de agosto de 2011

UM TREM CORR(IA) PARA O OESTE

Parapuã

Parece que a lista de estradas de ferro abandonadas no Brasil é infindável. O pior é que, como já escrevi aqui, muitas delas foram dadas em concessão e mesmo assim não são utilizadas. Parafraseando Fernando de Oliveira, um trem NÃO corre mais para o oeste.

Marília

O velho tronco oeste (também chamado por muitos anos de "Ramal de Jaú") da Companhia Paulista de Estradas de Ferro ligava Itirapina, na região de São Carlos, a Panorama, numa extensão de 536 quilômetros, maior que o tronco principal (Jundiaí-Colômbia), este com 506 km.

Até o final da FEPASA, em dezembro de 1998, tinha trens de passageiros bastante cheios, pois passava por uma região (entre Bauru e Panorama) que surgiu em razão desta linha. Mesmo cargas eram ainda levadas pela FEPASA nessa época, embora já em quantidade não tão grande quanto antes.

Assumiu em 1999 a Ferroban, que largou de vez. Obrigada a manter o trem de passageiros por dois anos, entregou em péssimas condições um trem sem horário, duas vezes por semana, sujo e sem banheiros e carros- restaurante em março de 2001. Fiscalização por parte do governo, zero. Cargas desapareceram. O porto de Panorama, com formidável infraestrutura, foi completamente largado, no rio Paraná. A ALL assumiu a linha em 2006 e o máximo que fez foi chegar uma vez ou outra no ano para transportar açícar de Tupã, muito antes de Panorama.

Iacri

A linha virou mato. De quando em vez, um trem de capina química passa pela linha para inglês ver. Uma vergonha, como tudo na ALL paulista.

Rafael Asquini esteve na região nestes últimos dias e mandou fotografias de alguns locais: Marília, Iacri, Osvaldo Cruz e Parapuã. Nem nos tempos finais da FEPASA a situação era tão de abandono quanto hoje. O fato é que as prefeituras em geral também pouco se preocupam com a situação: não limpam, deixando isso para as concessionárias, que também não o fazem. E pelo visto o povo não reclama também.

Osvaldo Cruz

Somente em Osvaldo Cruz, das quatro localidades visitadas, a limpeza é razoável. Em Marília, mato, enquanto a estação, hoje centro de saúde, é mesmo assim muito mal cuidada, sendo que, do lado da plataforma, juntam-se dezenas de drogados durante todo o dia, pois as janelas do centro são vedadas para este lado.

quinta-feira, 10 de março de 2011

FOGO NOS TRILHOS

Auto de linha da antiga RFFSA incendiado por vândalos nos últimos dias em Miguel Pereira, RJ - foto AFPF - Associação Fluminense de Preservação Ferroviária
Incêndios em instalaçoes ferroviárias não são incomuns. Porém, nos últimos anos, eles se tornaram até curiosos: afinal, se incêndios vários existiram nos primórdios das ferrovias por causa das fagulhas soltas pelas locomotivas a vapor (e outras causas também, claro), como temos notícias de tantos deles nos tempos em que as ferrovias estão tão abandonadas?
O incêndio na cabina de controle e em vagões no pátio de Itirapina, em 1/5/2001 (Foto Wilson DeSantis)
É fácil: o próprio governo federal, dono ainda da maioria dos edifícios das estradas de ferro não cuida deles. Vejam o texto de ontem sobre as subestações, por exemplo. Incêndios relativamente recentes em estações e outros imóveis ao lado das ferrovias dos quais me lembro doram o da estação de Adamantina, da ex-Cia. Paulista, em 2000, o da de Dois Córregos, em 2001; o da estação de Barra Mansa, na primeira metade dos anos 1980; o do pátio de Itirapina, em 2001 (que não pegou a estação em si); o dos carros de passageiros abandonados em Presidente Altino, no ano retrasado; e agora, o de um auto de linha que era utilizado eventualmente como pequenos passeios na abandonada linha Auxiliar na região urbana de Miguel Pereira, RJ.

Praticamente todos esses incêndios foram consequência de desleixo ou de atos de vandalismo em edifícios abandonados. O de Miguel Pereira, há poucos dias, não estava abandonado, mas sua guarda, por preservacionistas, não era contínua, infelizmente. Este foi, quase que certamente, consequência de vandalismo. A estação de Adamantina era de madeira. Queimou fácil: sobraram somente a cobertura das plataformas e um banheiro que ficava separado do prédio de 50 anos de idade e muito bonito, num estilo próprio da velha e tradicional Companhia Paulista de Estradas de Ferro.
Bombeiros combatem o incêndio na estação abandonada de Barra Mansa nos anos 1980. Hoje, 30 anos depois, o prédio foi recuperado (http://ccestacaodasartes.blogspot.com)
Quem ler este artigo e costuma acompanhar o que acontece nas ferrovias brasileiras atualmente ou em sua história vai se lembrar de diversos outros incêndios. Explosões de caldeiras de locomotivas a vapor eram frequentes no passado. Em Cerquilho, linha da Sorocabana, no ano de 1948, vagões com explosivos causaram danos a todo o pátio depois de uma explosão. E um dado curioso: um aeroplano que seria utilizado para vôos de reconhecimento (pelo menos, era o que se dizia) na revolta do Contestado, no início de 1915, pegou fogo sobre um vagão, em Barra Mansa, no Rio, quando era transportado do Rio de Janeiro para União da Vitória, no Paraná. Dois aviões, mesmo assim, prestaram serviço nessa guerra: um deles caiu e matou seu piloto, em março daquele ano, o Tenente Kirk.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

QUE CIDADE ERA ESSA?


Há algum tempo, visitando uma fundação ligada ao governo do Estado de São Paulo, alguns pesquisadores que lá trabalhavam comentaram comigo que estavam tendo dificuldades em identificar determinados dados e fotografias de cidades do começo do século XX, pois os nomes não eram conhecidos. Eu disse que talvez pudesse ajudar.

Elas me mostraram uma listagem com exatamente 99 nomes de cidades e vilas da época. Identifiquei 98. Elas ficaram surpresas e agradeceram muito, pois pouparam muito tempo de pesquisas para tentar achar esses locais. Não sou nenhum gênio no assunto, mas, pesquisando história ferroviária e do próprio Estado já havia, na época, cerca de 10 anos, acabei aprendendo velhos nomes e gravando-os. Como exigir que essas pesquisadores soubessem tudo isso?

É realmente inacreditável como os nomes de localidades e logradouros mudam no Brasil com tanta facilidade e por tantos motivos. Já postei neste blog outras vezes este assunto. Mas, afinal, por que mudaram tanto os nomes? A última "onda" ocorreu no final de 1943, quando diversas cidades, municípios, estações ferroviárias e distritos foram obrigados por lei federal a mudarem nomes que eram coincidentes, para "não causar confusão". Note-se que os CEPs não existiam nessa época. Com eles, isso tudo não seria necessário.


Nesta "leva", o problema foi, primeiro, arranjar novos nomes. Em alguns casos, eles foram forçados pelas autoridades e não agradaram aos habitantes. Neste caso, muitas cidades, estações e distritos tiveram nomes novamente alterados, em agluns casos retornando ao que eram com a adição de sufixos "do sul", "do norte", "do oeste", "de São Paulo", "de Minas", "da Sorocabana", etc.

Porém, houve muitas mudanças anteriormente. No final do século XIX e início do XX, cidades mudaram porque quiseram, embarcando na "moda" de trocarem os nomes para indígenas, assanhados pela onde de nacionalismo após a proclamação da República. Morro Pellado virou Itirapina, Penha do Rio do Peixe virou Itapira e Bica de Pedra virou Itapuí - são apenas alguns exemplos da época. Enquanto isso, já desde meados do século XIX havia localidades que alteravam seus nomes por motivos os mais estranhos possíveis, ou mesmo, aparentmente, sem motivo. A Central do Brasil era mestra em alterar nomes tradicionais de suas estações para homenagear funcionários seus muitas vezes totalmente desconhecidos, por exemplo.


No meio de toda essa confusão, quem é que sabe onde ficavam nomes como Santa Cruz dos Enforcados, Faxina, Morro Pellado, Santo Antonio do Campestre, Rio Novo, Três Ranchos, Pau D'Alho, Espírito Santo da Fortaleza, Hector Legru, Rocinha, Pombal, Rebouças, Jacuba, Cascavel, Caçador, José Teodoro, Água Fria, Santa Rita do Paraíso e muitíssimos outros, para citar somente alguns nomes no Estado de São Paulo? Afinal, a memória vai desaparecendo, documentos vão sendo destruídos e perdidos etc.

Para quem não sabe, os nomes acima são hoje, pela ordem: Piratininga, Itapeva, Itirapina, Lins, Avaré, Cerqueira César, Ibirarema, Piatan, Promissão, Vinhedo, Nova Odessa, Sumaré, Hortolândia, Aguaí, Ubirajara, Martinópolis, Cajamar e Igarapava.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

NA COVA DOS OSTROGODOS (OU: SAUDADES DE ITIRAPINA)

Foto: Antonio Gorni

Eu não estive na Alemanha nos últimos dias. Mas meu amigo Gorni, sim. Ele registrou suas impressões ao andar de trem:

Na semana passada tive a oportunidade de fazer uma rápida viagem no InterCity Express (o TAV alemão) entre Hannover e Düsseldorf.

O percurso entre essas duas cidadas é normalmente cumprido em 2h 30 min, o que resulta numa média de 100 km/h - uma marca alucinante em termos brasileiros, mas meio pífia para os tão decantados trens de alta velocidade. Pareceu-me até inferior aos InterCity ingleses, que também não são o topo de linha. Note-se, contudo, que o número de paradas é muito grande, especialmente próximo à região de Düsseldorf, o que deve comprometer a velocidade.

Foi uma experiência bastante interessante, já que faziam 14 anos desde minha experiência com os InterCity ingleses.

Eu fui de segunda classe. A poltrona é confortável, ainda que não reclinável. A foto ilustra o interior do carro. Um ponto bastante negativo é a falta de locais para a colocação de bagagens pesadas. A rigor, elas só poderiam ser colocadas na prateleira superior do carro, o que exige um bom preparo físico do usuário. Há poucos lugares (não previstos em projeto) para acomodar malas mais volumosas no chão, ao contrário do que eu havia observado nos InterCity ingleses (havia locais demarcados no piso nas extremidades dos carros e entre assentos cujas costas se tocavam). Acabamos colocando as nossas numa área usada para pendurar casacos, que felizmente encontrava-se vazia. Mas haviam pacotes volumosos acomodados nas plataformas dos carros - algo irregular, mas comum. Se fosse aqui no Brasil, seria fácil para algum gaiato surrupiá-los do trem. Parece não ser o caso na Alemanha.

Infelizmente, no dia de minha viagem o pessoal da Deutsche Bahn estava fazendo "operação padrão", eufemismo que na prática significa "greve". Nosso trem ficou paralisado por motivos misteriosos numa estação erma a 40 minutos de Hannover por mais de 100 minutos, atraso esse que não foi recuperado posteriormente.

O jeito foi ir ao carro-restaurante - ou, no caso, "Bistro": uma espécie de lanchonete que serve sanduíches e pratos rápidos. Mas seus lugares estavam ocupados. A solução foi comprar os sanduíches e refrigerantes e comer em minha própria poltrona, a qual dispõe de uma mesinha similar à dos assentos de avião. Na extremidade de cada carro há lixeiras seletivas para reciclagem. Infelizmente os alemães não dão muita bola para elas, abandonando o lixo de seus lanches nos assentos que ocuparam. Parece que na primeira classe há um serviço de garçom, a exemplo da Classe Executiva dos trens da EFVM.

Nem apito esses TUEs interurbanos tem! Na partida, você ouve o apito para liberação do trem e, em seguida, uma campainha toca na plataforma - por sinal, quem for cinéfilo achará que ela parece com o tema dos violinos do filme "Psicose", de Hitchcock. O ruído dos trilhos é pouco, mas anódino - nada do "tátá-tátá" que se ouvia nos trens da CP, mais ou menos a cada 20 ou 25 segundos, que você acompanhava desde os carros anteriores da composição, passando pelo seu e seguindo para os posteriores. Essa sinfonia se perdeu...

OK, o serviço é razoável, mas não tem um centésimo do charme dos trens da minha infância. Não tem Jundiahy, Ityrapina e muito menos Angico. Nem cheiro de mato. Nem cafezais. Muito menos a placa "Limite para Locomotivas Eléctricas". E o frio é de matar se você sai na estação...

Eu quero ir, minha gente
Eu não sou daqui...
Eu não quero nada, nada
Quero ver Irene rir
Quero ver Irene dar sua risada!

Caetano Veloso - 1969

Gorni

domingo, 4 de julho de 2010

VIAGEM INACABADA

O trem em Itirapina vai partir, em 22 de março de 2000 (Foto Carlos Roberto de Almeida)

Hoje estava lendo duas mensagens que recebi do Carlos. Carlos é um velho conhecido, que adora as ferrovias e a Sorocabana - o pai dele trabalhou lá - e também, de andar de trem. É triste ler suas histórias que ele constantemente conta sobre suas viagens: elas são cada vez mais raras, pois trem de passageiros no Brasil - meus leitores estão carecas de saber disso - já é raridade e, principalmente, passado.

Hoje, Carlos se contenta com viagens quase diárias nos trens da CPTM e do metrô - que sim, são trens de passageiros, mas não no estilo clássico: o trem para toda hora, passageiros viajam (principalmente) a pé e a paisagem, salvo raríssimas exceções, é sempre urbana.

Ele comnetava que desde os 14 anos de idade já viajava de trem, usando autorização do Juizado de Menores pedida por seu pai. Ele andou principalmente no Estado de São Paulo, que, de todos os Estados brasileiros, foi o que manteve seus trens de longa distância por mais tempo, eles que acabaram somente em março de 2001, enquanto, salvo os três trens da Vale, o "semi" de Paranaguá e o do longínquo Amapá, nos outros Estados acabaram no máximo em 1996.

Ele viajou, por exemplo, no Barra Mansa-Ribeirão Vermelho, que se foi em 1996, na Noroeste, em 1993... mas o que doeu mesmo foi o relato dele da viagem que ele fez à Alta Paulista em 2000. Antes, uma explicação: os trens de passageiros da Fepasa, aqui em São Paulo, foram acabando aos poucos, com os últimos correndo até final de 1998. Digo isto porque no início de 1999 eles continuaram - menos o da Sorocabana, que, mesmo indo contra o contrato assinado entre a RFFSA e a Ferroban, que assumiu a concessão no início desse ano, parou logo em janeiro.

Só que os trens, depois de um intervalo, passaram a sair de Campinas e de Sorocaba - os primeiros, para Panorama, Barretos e Santa Fé do Sul e o segundo, para Apiaí. O contrato mandava que esses trens seguissem andando por um determinado tempo. Para que? A última coisa que a Ferroban queria eram trens de passageiros. Então, ela passou a dificultar o máximo possível para os já parcos passageiros que restavam e teimavam, insistiam em tomar os trens: abandonou de vez estações que ainda estavam abertas (Sorocaba, Torrinha e Rincão, por exemplo), diminuiu os carros, não limpava, não se preocupava com banheiro e com refeições, com horários, com nada.

Carlos resolveu testar e relata, a seguir, sua viagem em 22 de março de 2000, um ano antes do apocalipse: "O que era para ser mais uma viagem antes do fim tornou-se um transtorno. Quando embarquei em Campinas, pela manhã, algo me dizia para não fazê-lo. Estava tudo tétrico. A estação fechada, poucos passageiros e um trem para partir somente para cumprir com o contrato. Mesmo contrariando o
instinto que me dizia para não ir, fui.

Alguns percalços pelo caminho, retenção aqui e ali, partimos de Bauru por volta das 16h00. No trecho entre Bauru e Garça, novo e com dormentes de concreto, o trem desenvolvia velocidade máxima. Aí a viagem começou a ficar interessante. Só que de repente, não mais que de repente (como alguns dizem), o maquinista aplicou emergência e o trem começou a reduzir velocidade.

Pensei em várias situações, como um atropelamento, por exemplo. Só que o impensável para nós, naquele momento, se tornou realidade. O trem parou repentinamente e todos foram arremessados de seus lugares. Como o trem já estava quase parando, a uns 20/30 por hora, a pancada não foi tão violenta. Havia um enorme bloco de arenito no meio dos trilhos. Com o impacto, a locomotiva saltou dos trilhos e ficou atravessada
pela força dos carros.

Fomos socorridos a Garça e depois cada passageiro foi levada de carro a seu destino. Eu voltei a Bauru, onde dormi e, no dia seguinte retornei a São Paulo de ônibus, pago pela Ferroban. E a boca doendo prá caramba. Levei dois pontos.

Pena. Foi minha última viagem num trem de bitola larga no estado de
São Paulo".

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

BROTAS

Bela casa em Brotas - foto Ana Maria Linhares Giesbrecht

Hoje no final da tarde eu e minha esposa chegamos de Brotas, interior de São Paulo. Aliás, bem interior mesmo: a cidade fica praticamente no centro geográfico do Estado. Era ali que Maluf queria construir a “nova capital” durante seu mandato como governador entre 1979 e 1982.

Ficamos na fazenda de meu cunhado, mas na verdade vamos sempre à cidade. São cerca de 10 km de carro pela SP-225. Hoje cedo, aliás, resolvi fazer um percurso maluco, indo para a cidade não pelo asfalto, mas por uma estrada que passa ao sul do asfalto, seguindo “por fora” do curso do Jacaré-Pepira. Ou seja: enquanto o asfalto cruza o rio uma vez, justamente ali na entrada da fazenda de meu cunhado, a estrada “por fora” e de terra não cruza nenhuma vez, a ponte fica somente na entrada da zona urbana, junto à antiga usina de força na parte baixa da cidade.

Com exceção de uma velha fazenda, de cujo nome neste instante não me lembro, onde a estrada passa por dentro dela, todo o resto do caminho dessa “estrada alternativa” não tem nada para se ver, nenhuma casa, pessoas, nada. Ela atravessa canaviais, pastagens e mesmo matas, mas somente bem perto da entrada da cidade é que aparecem as primeiras casas.

A população de Brotas não é das maiores: tem menos de 25 mil habitantes (2009). Porém, na cidade informaram-me (não conferi) que o município seria o quinto do Estado em extensão. É, realmente, grande: a velha linha da Companhia Paulista que cruza o município de leste a sul, passando pelo limite do centro urbano, tem cinco estações ferroviárias na sua área (quer dizer, tem estações abandonadas e duas demolidas). A SP-225, que liga Apiaí a Ourinhos, portanto cruzando boa parte do Estado, tem pelo menos 35 quilômetros dentro do município, de leste a oeste.

A cidade é bonita: foi fundada e se tornou município ainda no século XIX. Quando o trem chegou nela, em 1886, já encontrou uma cidade razoavelmente formada e rica, com café para todos os lados — plantação rara por ali, hoje em dia. Hoje, em matéria de trens, é um município praticamente morto: trens de passageiros não existem há nove anos e os cargueiros passam pouco. A linha, que vem de Itirapina e segue para Panorama, era a segunda em importância para a Paulista, mas hoje é apenas um curto ramal com pouco movimento para a ALL, cujos cargueiros que por lá passam em sua grande maioria vêm de Pederneiras, cidade relativamente próxima a Brotas.

Fora isso, Brotas, hoje, vive também do turismo: jovens enchem a cidade em fins de semana e feriados para andar de botes infláveis por um bom pedaço do rio Jacaré-Pepira, embarcando na cidade, junto à velha usina e desembarcando ali perto da fazenda de meu cunhado. Hotéis, que até 10 anos atrás, quando existiam, eram um lixo, hoje existem em profusão na cidade. São pequenos, mas há vários bons. E há pousadas.

A cidade, basicamente, ainda é aquela do velho esquema português “rua de cima-rua do meio-rua de baixo”, praça com a igreja e uma rua, a Rui Barbosa, que segue para a velha e hoje inútil estação ferroviária. Curiosamente, ainda existem (e são placas relativamente novas) placas de indicação para a “estação ferroviária”, coisa rara hoje em dia, pois as estações estão quase sempre fechadas ou têm outro uso — caso de Brotas.

Do outro lado da linha férrea e da rodovia SP-225, pouca zona urbana. A urbanização foi-se alastrando mais para o outro lado do córrego que corta o vale e também delimitava a cidade antigamente, córrego chamado pelos habitantes de “Pitu-aceso”, ou algo assim.

Casas antigas ainda existem várias, dando aquele charme de cidade de interior. Que não mudem muito as coisas no futuro.