Abro os jornais e vejo artigos assinados por professores e escritores falando acerca da reforma ortográfica recentemente sancionada no Brasil e pelos outros países que falam a língua. Na televisão, diversas reportagens pipocam falando da reforma. Algumas pessoas são a favor, outras contra. Umas tentam justificar o porquê de sua opinião. Outras apenas tentam explicar que o trema não existe mais, que os ditongos abertos não têm mais acento, que a dupla vogal também não e quando existe o hífen e quando não. Devo ter-me esquecido de alguma, mas não faz mal.
Desde que nasci, ou melhor, desde que comecei a ler, com 6 anos de idade, em 1958, já vi acontecer pelo menos duas reformas ortográficas: melhor do que minha mãe, que está com 86 anos e já viu umas cinco. Quando eu era pequeno, os dicionários mostravam as palavras e antes de darem seu significado, mostravam como era escrita a palavra antes da reforma anterior (no tempo de Vargas, por volta de 1940), isso se a palavra fosse escrita de forma diferente. Lembro-me, por exemplo, agora, de algumas, como cavalo (cavallo), ontem (hontem)... elas, no dicionário, estavam escritas assim mesmo, tendo entre parênteses a forma anterior.
Hoje em dia e já há muito tempo isso não mais acontece. Acho que teriam de marcar até quatro ou cinco formas diferentes, e desistiram. Depois, para quê complicar? Bom, para mim, que leio inúmeros textos antigos em minhas pesquisas históricas sem fim, vejo em textos escritos de 60 a 200 anos atrás formas totalmente diferentes de se escrever as palavras: muitas vezes, na mesma época e, às vezes, na mesma nota escrita no mesmo dia pela mesma pessoa – quando dá para entender a letra. Isto deve significar que, se em 1840 existia uma regra ortográfica – dizem que sim, mas começo a ter dúvidas – e a pessoa escrevia “cita” e “sita”, significava que pelo menos uma delas estava errada. Ou seja, já não se sabia escrever português naquela época. Havia também formas curiosas de abreviaturas, como 7bro, 8bro, 9bro e 10bro – setembro, outubro, novembro de dezembro, estas não necessariamente erros.
Em 1920, mais de setenta por cento da população brasileira era analfabeta. Não sabiam ler nem escrever. Hoje, dizem que mais de oitenta por cento são alfabetizados: portanto, mais de 150 milhões de brasileiros sabem ler e escrever. Sabem mesmo? É inacreditável a quantidade de e-mails que recebo hoje com formas escritas como: voçê; conheçe; mais em lugar de mas; ae em lugar de aí; seje; esteje; teje em lugar de “esteja”; sejem; estejem; haviam casos em que...; Embú; geito; envia-mos e não enviamos; exelente; adiquirir; prefirido; concerteza; coencidência; “pra mim fazer”; exitar; inhaberto e não “em aberto”; apartir e não “a partir”; começa-se e não começasse; mandaria-o; naum em lugar de não; andarão no lugar de andaram. “A” craseado, então, no lugar de onde deveria estar somente um “A” (ou “ÀS” no lugar de “AS”), nem se fala. Os erros, no entanto, estão também nos jornais, nas revistas, nas propagandas e em diversos outros locais.
O que estou tentando dizer é que não há nenhum sentido em fazer reforma ortográfica num país que afirma ter menos de vinte por cento de analfabetos (o que, aliás, não é pouco) e onde os alfabetizados escrevem “como o nariz”, como dizia minha mãe. Os literatos acham mesmo que a maioria dos brasileiros vai se preocupar se a palavra tem hífen ou não tem, numa regra cheia de complicações? Vai se preocupar em saber o que é ditongo aberto? Vai deixar de pôr o trema onde ele acha que tem e onde não tem? Na verdade, tudo isso somente vai complicar a vida de quem já escreve hoje, bem ou mal, e não vai mudar nada para a maioria da população. Não é o meu caso, mas eu sou uma exceção! E olhe, ainda faço erros, com certeza – e farei muitos, com uma regra de hífen tão confusa que, até eu memorizá-la, já terei morrido! Por favor, percam seu tempo com coisas mais importantes, como dar educação a quem precisa. Podem acreditar, são muitos. E não importa se o livro que eles venham a ler na escola tem os hífens nos locais certos – importa mesmo é que se os ensine a gostar de ler.
terça-feira, 24 de março de 2009
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