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sábado, 11 de junho de 2016

BREVE HISTÓRIA DA RUA DA CONSOLAÇÃO


Acima, a rua da Consolação em 1930, trecho início até a rua Caio Prado (Sara Brasil)

A rua da Consolação é uma das ruas mais antigas da cidade de São Paulo, sendo provavelmente anterior à sua fundação. Historiadores citam-na como sendo parte da Trilha Tupiniquim, que ligava São Vicente a Assunção, no Paraguai - parte dos caminhos do Peabiru, construído por indígenas pre-colombianos.

Se é que se poderia chamar de rua uma trilha estreitíssima no meio da selva fechada utilizada apenas por índios caminhando a pé que provavelmente tinham de avançar 
constantemente quebrando galhos de árvores e arrancando grandes touceiras.

Por volta de 1810, a rua foi aberta oficialmente, tomando esse nome por ligar o Piques, no largo da Memória, à igreja da Consolação e dali para a frente para Pinheiros e Sorocaba. Por boa parte do século XIX, a rua da Consolação tinha este nome até a igreja. Com a construção do Cemitério da Consolação, em 1858, o nome acabou sendo estendido até ele. 

Acima, a rua da Consolação em 1930, trecho cemitério até alameda Franca (Sara Brasil)
Dali para a frente, sabe-se que já tinha o nome de rua da Consolação no final do século XIX o trecho onde terminava a avenida Paulista a partir de 1891. Já o trecho entre este ponto e a rua Estados Unidos já existia em 1905 e possivelmente surgiu com o loteamento da Villa America, em terrenos da antiga Fazenda Caaguassu. O nome deste trecho, de largura sempre menor do que a rua original, principalmente depois que esta foi duplicada, mantém sua largura igual às paralelas (Bela Cintra, Haddock Lobo) até hoje e resistiu a investidas nos anos 1960 e 1970 de tentativas de mudanças de nome, sempre rejeitadas pelos moradores. 


Até os anos 1990, ainda podia ser vista pelo menos uma placa - não me lembro em qual esquina, possivelmente da alameda Franca ou Tietê - com o nome proposto, Rua Padre Donizetti Tavares de Lima. Aliás, a rua inteira é muitas vezes chamada na imprensa de Avenida da Consolação, devido ao alargamento que houve no final dos anos 1960, mas permanece o nome de rua da Consolação.

Com a implantação dos bondes elétricos pela Light na cidade de São Paulo em 1900, a rua da Consolação logo ganhou suas linhas também, embora já as possuísse com bondes a tração animal antes disso - eram bondes que subiam pela Brigadeiro Luiz Antonio, entravam pela Paulista e desciam a Consolação e vice-versa. Com os bondes elétricos, mais linhas surgiram, desaparecendo todas até 1966. 


Em 1947, as linhas foram encampadas pela CMTC - Companhia Municipal de Transportes Coletivos. Trafegavam pela rua, em suas linhas duplas, os seguintes bondes (ano de 1936): 3-Avenida; 29-Pinheiros; 36-Angelica; 38-Angelica (Guia Levi, maio de 1936). As linhas e seus números eram alterados de acordo com a época, entre 1900 e 1966.

Para entender a numeração antiga da rua da Consolação, que vigorou até a segunda metade dos anos 1930, quando foi substituída pela numeração métrica de hoje, saiba que: o nº. 2 estava junto à rua Braulio Gomes; o
nº. 18, junto à São Luiz; nº. 35, à rua Major Quedinho; nº. 64, à rua Araújo; o nº. 84, à rua Martinho nº. 111, à rua Olinda (atual Guimarães Rosa); o nº. 127, junto à Caio Prado; o nº. 152, junto à rua Maria Antonia; o nº. 192, junto à rua Marquês de Paranaguá; o nº. 216, junto à rua Visconde de Ouro Preto; o nº. 215, junto à rua Sergipe; o nº. 226, à rua Piauí; o nº. 237, junto à rua Pedro Taques; o nº. 346, à rua Maceió; onº. 369, à rua Fernando de Albuquerque; o nº. 391, junto à rua Santa Cruz (hoje Matias Ayres); nº. 417, à rua Antonio Carlos. 

Elas não seguiam nenhuma lógica de métrica, o número do outro lado da rua poderia estar muito mais acima ou abaixo do que o seu fronteiriço, mas a numeração era sempre crescente e, como hoje, os números pares ficavam ao lado direito a partir do início da rua. Estes dados foram obtidos a partir do Almanach para 1916 de O Estado de S. Paulo.

A numeração da rua foi, finalmente, alterada para a atual em maio de 1939, agora obedecendo a uma sequência métrica. Os números antigos foram todos mudados e a lista de cada imóvel que existia então está acima.


Finalmente, as residências, escritórios e lojas em 1962, de acordo com a Lista Telefônica da CTB (abaixo).





quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

DESCENDO A REBOUÇAS E PENSANDO

Avenida Rebouças. Data e autor desconhecidos. A pista da esquerda sobe, a da direita desce. A rua que sai em diagonal é a rua Melo Alves
.
Não se trata de uma velha música do Ronnie Cord (Alguém se lembra? Alguém conheceu esta figura da Jovem Guarda dos anos 1960?), onde ele cantava: "Subi a rua Augusta a 120 por hora, botei a turma toda do passeio pra fora" e por aí afora.

Trata-se de descer a Rebouças nos anos 2010, mais precisamente, no ano 2014 e, mais especificamente ainda, ontem. E enquanto Ronnie Cord subia (ou descia) a Augusta, a cinco quarteirões da Avenida Rebouças, de carro, eu desci de ônibus. E de dentro dele, em pé, na ladeira entre a rua da Consolação e a Henrique Schaumann, quem corria mais era o ônibus.

A faixa exclusiva, no meio da pista, junto ao canteiro central, feita como deve ser e não como aquelas feitas nas coxas e do lado direito das ruas pelo cidadão que ocupa o Gabinete do Prefeito já há dois anos fazendo bobagens atrás de bobagens - com o nosso dinheiro, claro - , essa faixa permite que os ônibus sejam os únicos que desçam e subam a avenida a uma velocidade decente - talvez próxima de 50 e 60 por hora. 

Deu desespero ver os automóveis nas duas ou três faixas que lhes sobram parados quase todo o tempo, de vez em quando andando a 2-3 km para avançar alguns metros, ou mesmo centímetros. É evidente que a faixa os atrapalha, pois toma-lhes espaço. Porém, essa faixa realmente facilita o tráfego do transporte coletivo. Certamente desci a Rebouças muito mais rápido do que se estivesse de carro e praticamente na mesma velocidade do metrô que passa muito próximo dali, por baixo da terra (linha 4, Luz-Butantan).

No lado contrário da avenida, os ônibus subiam rapidamente também e os automóveis conseguiam ter mais liberdade de ação. Subiam a, digamos, 20 a 30 km/hora, sem grandes paradas, exceto pelos semáforos. De qualquer forma, a situação da Rebouças era triste e posso garantir que na mesma hora (cerca de 4 da tarde), várias outras ruas e avenidas estavam na mesma situação que a pista descendente onde eu estava.

Então, pergunto: o que pensavam o inventor do automóvel, ou os inventores, cem, cento e dez anos atrás, quando os lançaram no mercado? Em glória? No futuro da humanidade com eles? Em dinheiro? Teriam eles certeza de que o automóvel iria ser um sucesso e não um fracasso? Certamente pensavam em glória e em ganhar dinheiro. Tinham eles condições de prever os congestionamentos do futuro? E, se tivessem, preocupar-se-iam com isso? Se se preocupassem (o que, pelo meu modo de pensar, era pouco provável), teriam eles vindo a pensar o que fazer para evitar o caos nas grandes cidades que existe hoje?

Na verdade, embora todos gostem de seu carro e deter um, e de sempre querer ter um melhor, mais novo e, se possível, mais caro e potente, é meio ridículo olhar 'a vota e perceber que a maioria dos automóveis têm apenas uma pessoa dentro, mas ocupa o lugar de pelo menos oito? (embora isso não seja o que aconteça, como cabem duas sobre o capô e mais duas sobre o capô traseiro, podemos pensar nas oito pessoas - quando não nove.)

Se tivermos o mesmo número de pessoas que ocupam um carro - e aí vamos falar no máximo que podem ocupar internamente, o que geralmente são cinco - e pusermos-las na rua, andando, o espaço vai ser menor do que os ocupados pelos carros - e elas vão andar em uma velocidade baixa - no máximo, 5 km por hora sem correr - mas não estarão satisfeitos, porque vão se cansar. Porém, chegarão antes no seu objetivo do que se estivessem dos carros.

O correto seria tentar evitar tudo isso, não se permitindo (de que forma? Sei lá!) que cidades como São Paulo, ou mesmo menores, fossem formadas. A alta concentração de pessoas por metro quadrado, ou por quilômetro quadrado, que seja, já provou não trazer grandes vantagens, pelo menos para a grande maioria das pessoas que nelas vivem.

Seria o ideal que isto houvesse sido previsto e que se estabelecessem determinadas normas que limitariam as cidades a áreas específicas não muito grandes e com no máximo um determinado número de habitantes? (300 mil no máximo?)

Enfim, algo tarde para se pensar - mas as pessoas que vão mudar os próximos cem anos com novas invenções, sejam lá o que for, podiam pelo menos tentar fazer. É extremamente difícil prever o futuro, mesmo o muito próximo, qualquer um sabe disto. Mas pode-se tentar pensar mais em possíveis consequências do que fazemos para "melhorar o mundo".

Seria difícil para nós se subitamente fomos transportados de volta para 1880. Porém, o ambiente era muito menos poluído, em todos os termos que você pode imaginar para poluição. A terra era muito menos impermeabilizada - muito pouco, mesmo, com ruas de terra, casas que nem piso tinham, jardins imensos, fazendas imensas. Havia suas vantagens. Afinal, o ser humano já existe há (é isso mesmo?) milhões de anos e sobreviveu a todas as ameaças.

A avenida Rebouças existia há 400 anos atrás e era a Trilha Tupiniquim, Caminho para Sorocaba, Caminho para Pinheiros. Pense nisso. (Nota: lembre-se que quando falo no velho caminho de Pinheiros, falo da trilha que seguia pela atual Rebouças, entrava pela rua de Pinheiros e seguia pela rua Butantan, cruzando o rio e entrando pela atual Vital Brasil, Corifeu de Azevedo Marques etc. A Rebouças como existe hoje não existia há cem anos atrás. O que existia era apenas o trecho rua da Consolação-rio Verde, ou seja, o cruzamento dela com a rua Henrique Schaumann).

Chega de filosofia barata por hoje.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

COMO ERA SÃO PAULO EM 1378 D.C.?


Eu estava aqui, pensando... sempre lendo sobre o Brasil, a Europa (principalmente) e ainda outros lugares, continentes, países...

A Europa sempre me impressionou, li e leio muito sobre ela, mas quantas vezes estive lá? Tenho sessenta e dois anos e fui à Europa apenas duas vezes em minha vida, onde passei não mais do que duas semanas por vez. Os países em que mais tempo estive, pela ordem, foram Itália, Alemanha, Inglaterra, Holanda, Austria e Espanha. Nenhum outro. Em média, foram 2,7 dias em cada país.

É pouquíssimo, considerando a área da Europa, pouco maior do que a do Brasil, e o número de países que a formam. Fui muito mais aos Estados Unidos, mas não me impressiono tanto com a história deles.

A última vez que estive nos Estados Unidos foi em 1994. Na Europa, em 1995 e neste caso sempre a serviço.

Depois disso, por uma série de fatores, não saí mais do Brasil. Meu passaporte expirou em 1993 e somente renovei-o na semana passada. Foram onze anos sem precisar de passaporte. Porém, agora, tenho uma filha morando na Itália, então... falta só o dinheiro e tempo para ir.

Não saindo mais do Brasil a partir de 1995, comecei a viajar por ele, a serviço ou não. Ainda estou longe de conhecer todo o Brasil e provavelmente nunca o conhecerei. Mas posso dizer que gostei da maioria dos locais que conheci nestes últimos dezenove anos.

O que me impressiona na Europa é a civilização, bem antiga. Há inúmeras cidades que são mais do que centenárias, até milenares.

E por aqui? As cidades mais antigas têm pouco mais de 500 anos e mesmo assim há dúvidas sobre essas datas. (Itanhaém, Cananeia, São Francisco, em Santa Catarina, por exemplo). O primeiro município brasileiro criado pelo governo português tem menos de 500 anos. É São Vicente, em São Paulo, de 1532. A cidade já existia antes. E olhe - como se caracteriza uma cidade, vila ou povoado? Difícil, não?

E é nisto que eu "estava aqui, pensando"... São Paulo foi fundada em 1554. Foi mesmo? Os jesuítas chegaram aqui no planalto em 1554. Há quem diga, burocraticamente, que São Paulo foi fundada mesmo em 1553. Como? Ora, em 1553 João Ramalho, aquele português que andava com os índios do litoral havia décadas foi quem resolveu subir a serra e fundar Santo André da Borda do Campo (nada a ver com a atual Santo André)..Só que, em 1560, a sede do município (caracterizada pela forca e pelo pelourinho) foi mudada de Santo André para São Paulo (municípios nessa época eram chamados de villas).

Ora - o raciocínio é "lógico": se São Paulo passou a ser a sede de uma vila fundada em 1553, então ele teria um ano a mais! Está bem, vamos aceitar a teoria. Mas, podemos?

São Paulo estava num ponto estratégico, no alto de uma colina de onde se via o rio Tamanduateí e até, ao longe, o Tietê. Tinha-se uma boa vista da planície por onde chegavam os inimigos - outros índios. Daí o nome da rua da Boa Vista, que somente tinha casas do lado esquerdo de quem seguia do Colégio para a aldeia do Cacique Tibiriçá (Largo de São Bento). A partir da hora em que começaram a construir casas do lado direito, e mais recentemente, prédios encostados um nos outros, a Boa Vista acabou - ficou o nome da rua. Milagrosamente não o trocaram, como fizeram com tantas ruas mais do que centenárias de São Paulo.

Os meus pensamentos, no entanto, vão mais além - Tibiriçá não era nenhum mocinho quando foi encontrado ali em sua taba. Já estava ali havia um bom tempo. Ele também estava na parta alta, olhando o rio Anhangabaú lá em baixo, esperando os inimigos. Quantos deles Tibiriçá terá derrotado? Ou nenhum, por que eles talvez nunca tenham aparecido?

Se a taba de Tibiriçá não estava isolada, e não deveria estar, aquilo não poderia ser considerado um povoado, uma cidade? Teria um nome? Piratininga, talvez? Há quanto tempo estavam ali a família, os antepassados de Tibiriçá? Dois anos? Trinta anos? Cem? Quinhentos? Os guaianazes, chefiados por Tibiriçá, eram nômades? Ou já havia povoações ali faria tanto tempo quanto as havia nas cidades europeias?

O modo de vida era completamente diferente de um europeu e de um guaianá, mas a verdade era que ambos eram seres humanos e ambos precisavam de um teto para se proteger do frio, do calor, da chuva.

Sabe-se que a rua da Consolação passou a ser o caminho para Pinheiros a partir da época em que esta aldeia foi fundada, em 1560. Depois, para Sorocaba, pois ia-se por ali também. Mas a trilha Tupiniquim, parte da rede de estradas chamada Peabiru, já existia desde... quando? A Trilha Tupiniquim, dizem historiadores, era a própria rua da Consolação - sem a largura de hoje, sem as construções de hoje, sem os trilhos de bondes que vieram e foram embora, sem canteiro central. Depois, o caminho seguia pela atual Rebouças, depois pela rua de Pinheiros, depois pela rua Butantan, Vital Brasil, Corifeu e depois estrada de Itu, que depois se bifurcava para Cotia e Sorocaba... e para o Paraguai, para o Peru.

Não tirei o que escrevi aqui da minha imaginação. Tirei de literatura que li durante décadas. Podem estar corretas ou não - mas não podem estar tão erradas.

Então, nós, que hoje levamos a pé umas duas horas para ir do centro a Pinheiros, mas não fazemos isso porque temos de subir uma enorme ladeira na ida e porque temos automóveis e preferimos ficar parados no trânsito - talvez até em mais de duas horas, dependendo do dia, de qual é o protesto do dia - nós, que hoje podemos pegar o metrô, que segue o Peabiru até a igreja de Pinheiros, ou o corredor de ônibus da Rebouças e Consolação, que a partir do rio Verde (esquina da Rebouças com a Brasil), deixa de seguir o Peabiru, pois não segue pela rua de Pinheiros, nós, que precisamos percorrer hoje uma cidade monstruosa que tem doze milhões de habitantes e que, se existisse no ano 1000 (será que não existiria?) teria quantos habitantes?

Impossível calcular. Quantas aldeias desaparecidas podem ter ocupado a área entre o ano 1000 e 1554? Quantas respostas jamais teremos? É até frustrante, mas nada podemos fazer, a não ser que alguma surpresa apareça de forma surpreendente (juntamos aqui duas surpresas) e nos revele como era São Paulo na primeira metade do segundo milênio depois de Cristo.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

O TELEFONE FANTASMA


Eu e a Ana Maria compramos um terreno em Alphaville em 1979, no município de Santana de Parnaíba. Um ano depois, eu deixei a Shell e fui trabalhar na DuPont, que, na época, estava no início da rua da Consolação, em frente à Biblioteca Nacional.

Na época que eu entrei lá, nós já havíamos decidido construir uma casa no terreno. É a casa em que moramos até hoje. Entrar na DuPont foi coincidência: eu não sabia que eles também estavam construindo no mesmo bairro - só que no lado de Barueri.

Em julho de 1981, mudamos de escritório. Saímos do centro de São Paulo para trabalhar no isolado mundo de Alphaville, Barueri. Agora, eu, que já estava construindo desde o início do ano, poderia facilmente ir todos os dias à obra. Eu, nessa época, estava morando no bairro do Sumaré. Trânsito nas Marginais e na Castelo Branco? Nem pensar, nunca era problema nessa época. Para ir do escritório à obra, então, eram cinco minutos.

Eu havia comprado um telefone pelo plano de expansão da Telesp no final do ano anterior. Perspectiva de instalação? Sem informações. Garantiam apenas que em dois anos seria instalado. Porém, Santana de Parnaíba, na época, não tinha telefone de sete algarismos e muito menos DDD.

Em agosto, eu precisei verificar um probleminha da obra na prefeitura de Parnaíba. Porém, ir até lá pela Estrada dos Romeiros demorava cerca de meia hora a partir do escritório da DuPont. A estrada atual que liga Alphaville a Parnaíba era praticamente inexistente. Pedi para a telefonista da empresa que ligasse para lá, ao que ela me respondeu: "Parnaíba? É na Bahia, não é"? Respondi-lhe: "olhe pela janela para aquelas montanhas no fundo. Do outro lado é Parnaíba". Surpresa, ela me perguntou por que o eu não ligava pelo DDD? "É tudo 011, não é?" Respondi-lhe que não havia o sistema lá. "Passe o telefone", disse ela. Eu falei: "256". Ela disse: "e o resto?" Finalizei: "acabou". Incrédula, ela tentou a ligação. Cinco minutos depois, disse-me que a conexão demoraria meia hora e ela me chamaria.

Desisti. Peguei o carro e fui até a prefeitura. Afinal, não havia o trânsito de hoje. Resolvi o problema e voltei, uma hora e pouco depois.

Em setembro, a Telesp apareceu no terreno e instalou o telefone no barraco de obras. No residencial, deveria haver naquele momento cerca de nove obras apenas; nenhuma casa pronta ainda. Eles disseram que o telefone deveria funcionar apenas quando a central telefônica da cidade ficasse pronta, o que deveria ocorrer em novembro e levaria meu telefone e os da cidade a passar a utilizar da nova estação 424. Na semana seguinte, eu resolvi tentar telefonar do Sumaré para a obra, usando o telefone que eu já sabia qual era: 424-1261. Surpreendentemente, um dos pedreiros atendeu. Funcionava!

A conta não veio quando esperada. A cidade de Parnaíba continuava com seus telefones de três algarismos, mas o meu telefone funcionava. Liguei para a Telesp para perguntar quando viria a conta, ao que eles responderam que tal somente ocorreria quando o telefone funcionasse. Eu falei: "já funciona, estou falando dele". Responderam que isso não era possível e que eu deveria estar enganado. Deixei para lá. A primeira conta somente veio um mês depois da abertura da estação no final do ano. A cidade ganhava um telefone decente, mais de dez anos depois da implantação do DDD no estado.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

UMA PRAÇA QUE (COMO OUTRAS) NÃO EXISTE

Passei hoje no final da tarde de ônibus pela praça Clemente Ferreira. Como? Onde é esta praça? Ora, é uma das inúmeras praças de São Paulo que tem nome, mas não são praças, são somente um jardinzinho um pouco mais largo do que outros de calçadas ou de canteiros centrais de avenidas. Somente me lembro do nome porque, de repente, bati com os olhos na placa azul.

Esta, no entanto, tem este nome desde tempos mais antigos, quando ela era efetivamente uma pracinha. Eu me lembro dela, ainda sem aquele viaduto em cima, que efetivamente, deixou apenas um mini-jardim ao lado de uma enorme coluna de concreto. Este logradouro fica entre as avenidas Rebouças e Doutor Arnaldo, no local exato em que elas começam, pouco antes do Hospital das Clínicas, para quem vem da rua da Consolação.
Em 1930, a praça Clemente Ferreira não tinha nome nem tinha o canteiro triangular que nos anos 1960 possuía. Ela está na bifurcação das avenidas Rebouças e Doutor Arnaldo; não confundir com a outra pracinha ao lado, entre a Rebouças e a Consolação, com a alameda Santos
Até 1967-68, quando começaram as obras para se fazer o túnel que hoje liga a avenida Rebouças com a avenida Doutor Arnaldo e rua Major Natanael (aquela ladeira que sai da frente do Instituto Emílio Ribas e desce para o Estádio do Pacaembu), essa pracinha - que, como disse, já tinha esse nome - era em "campo aberto" e triangular. Funcionava como uma espécie de "rotunda" ou "balão", como nós paulistanos a chamamos.

Quem vinha da rua da Consolação (ainda estreita na época) para a Doutor Arnaldo seguia para esta costeando a praça pela direita, na parte alta. Os trilhos do bonde acompanhavam esse caminho. Nesse início da Doutor Arnaldo, a rua era pista simples. Para esses carros que vinham do centro e queriam descer a Rebouças, eles entravam à esquerda no lado menor da pracinha triangular, na época, reto e não em arco como é hoje e entravam à direita na pista que descia a Rebouças.

Para quem vinha da Rebouças de Pinheiros, bastava seguir reto pela hipotenusa da praça (que era a continuação da Rebouças e tinha duas pistas com um canteirinho central, como o resto desta avenida) e entrar na Consolação direto para o centro. As duas pistas tinham a mesma mão, para cima, já que ali já era a Rebouças, em desnível com a Doutor Arnaldo.

As obras dilapidaram tudo isso. A Rebouças manteve suas duas pistas, agora rebaixadas e a que segue para Pinheiros é acessada por um túnel que tem as outras bocas na Paulista e na Consolação. A praça, como escrevi, praticamente sumiu, mas manteve o nome, de forma a atrapalhar quem quer se localizar. O túnel foi mal feito, de forma que uma curva muito fechada para a direita na saída da Major Natanael tornou-se, e o é até hoje, uma curva perigosíssima, onde as marcas de raspagens de automóveis na parede esquerda do túnel após a bifurcação interna são sempre visíveis.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

EM JANEIRO DE 1918...


O Colégio São Luiz anunciava a sua mudança de Itu e chegada à avenida Paulista...


A balsa do Guarujá (ferry-boat), que a ligava a Santos começava a operar...


A rua Bartira, então no subúrbio de São Paulo denominado Perdizes, já possuía água encanada e eletricidade e até banheiro das casas...


Cultivavam-se uvas na rua Tobias Barreto, na Quarta Parada...


Na rua da Consolação, esquina com a Paulista, existia um barracão que tinha um desvio da Light (ou seja, da linha de bondes elétricos, para carregamento)...


E em plena rua Conselheiro Furtado, centro da cidade, havia um local chamado "Buraco da Onça".

São lembranças de uma cidade que não existe mais.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

CONGELADO NO TEMPO

O prédio do Colégio Des Oiseaux, barbaramente associado há mais de 40 anos na rua Caio Prado.

Bem, o título é um pouco exagerado. Porém, estive hoje na Praça Roosevelt, mais especificamente na rua Olinda, hoje chamada de João Guimarães Rosa, também nas ruas Gravataí e Caio Prado. Estava a pé. Saí da rua Augusta, subi a Olinda. Reparei que, salvo engano, todas as construções que existiam no final de 1969, quando terminei o último ano (terceiro) do curso científico do Colégio Visconde de Porto Seguro, ainda estão ali.

O edifício da esquina com a Augusta, o prédio do colégio, hoje ocupado pelo Caetano de Campos, construído em 1913, o prédio ao lado que o Colégio ocupou por algum tempo (estudei ali em 1968), este totalmente em ruínas... mas um belo prédio. Acredito que originalmente tenha sido uma residência particular. Deve ter sido construído na primeira década do século XX, pelo estilo. Logo depois, uma casinha menor, bem velha também, mas razoavelmente conservada. Até a esquina com a Gravataí, tudo igual.

Em frente, a Praça Roosevelt, ainda como era em 1969, logo após completarem sua reforma. Reforma, não: antes não havia nada ali, apenas uma enorme área asfaltada, que se enchia de pombos durante quase todo o tempo, exceto nas quartas e sábados, quando havia uma feira livre que ocupava toda a área, menos, claro, a Igreja da Consolação. Hoje, a praça está cercada, pois vai passar por uma grande reforma. Quando? Sei lá, é promessa de político, sabem como é.

Entrando na rua Gravataí à esquerda, as construções são as mesmas. Mudaram algumas funções, mas é como se o tempo tivesse congelado. Vejo que há um teatro ali: esse teatro, na verdade, era a área que pertencia ao Porto Seguro, era o auditório. Minha formatura foi ali. Entrava-se pela Gravataí e pelo pátio mais baixo da escola, onde estava a quadra de basquete. Não sei se ainda está.

Ao longe, avisto a única grande mudança: um prédio de apartamentos novo - creio ter no máximo uns 3 anos - construído na Caio Prado, entre a Gravataí e a Augusta. Ele dá fundos para o enorme pátio, (ainda) arborizado do ex-Porto Seguro. Na esquina da Gravataí com a Caio Prado, os terrenos que eram vazios em 1969 continuam vazios. Servem hoje como estacionamento.

Na Caio Prado, em frente, vejo o vazio deixado pela demolição do antigo Colégio Des Oiseaux, construção de 1907 de Vitor Dubugras. Ele havia sido demolido em 1974. Quando deixei o Porto Seguro, ainda estava em pé. Era um prédio lindíssimo, cercado de vegetação. Até hoje nada foi feito ali, apesar de vários planos de hotéis, espigões, etc. Parece que hoje já não se pode construir mais ali, mas o terreno hoje não serve para nada, vive fechado.

Seguindo por esta rua até a rua da Consolação, tudo está como era, prédios mais altos, mas baixos e um belo casarão pouco antes do cruzamento, do lado direito, muito bem mantido há anos.

Enfim, um raro pedaço muito próximo ao centro da cidade que ainda se mantém praticamente igual ao que era por mais de 40 anos. Até quando?

(Página atualizada em 20/11/2017)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

MEMÓRIAS DOS TEMPOS DA ESCOLA

Rua da Consolação em 1956. Folha de S. Paulo

Meu pai todos os dias me apanhava na escola. Bons tempos em que era possível isso. Eu estudava na rua Olinda, mais precisamente a rua lateral da Praça Roosevelt onde ficava o Colégio Visconde de Porto Seguro, um belo prédio de arquitetura única no Brasil, remetendo ao tempo do Kaiser Guilherme II da Alemanha. Era esse colégio em que eu estudava.

Ele acordava todo dia bem cedo, por volta das seis horas da manhã. Eu morava na rua Tefé, no Sumaré, e ele, quando eu me levantava, já estava na cozinha fazendo café da manhã. Era bem "dietético" o que ele me preparava: torrada, ovos com bacon e um copo de Toddy, Kresto ou Nescau. Por volta das sete, sete e pouco, saíamos de carro. Nos primeiros anos, um Studebaker 1951. Era 1959 até 1961. Ele ia pela Doutor Arnaldo e ao entrar na rua da Consolação, parava em frente ao SirvaSe, no mesmo local onde hoje é o Pão de Açúcar, ali, e comprava o jornal no garoto que os vendia na calçada.

Eu ia folheando o jornal até chegar na escola, descendo a rua da Consolação, desviando dos bondes numa rua estreita pavimentada com paralelepípedos e ainda com alguns casarões. Papai entrava na rua Olinda à direita e me deizava na frente da escola. Era cedo, eu normalmente ficava esperando os outros chegarem. Muitas vezes não havia ninguém no pátio, as crianças iam chegando depois, aos poucos.

Na saída, às vezes eu tinha de esperar bastante. Todo mundo ia embora de ônibus ou de bonde. A maioria dos meus colegas morava para os lados dos Jardins e de Santo Amaro. Papai me levava e buscava pois era caminho para ele para o trabalho, na alameda Glette. Ou melhor, desviava um pouco, mas ele gostava disso. Enquanto esperava nos bancos de cimento na lateral da rampa que descia do pátio interno para a calçada da rua Olinda, eu via a praça.

Às quartas e sábados, havia ali a feira. Nos outros dias, somente um enorme estacionamento, público, sobre um mar de asfalto. Nada mais havia ali. O guarda civil, de capacete, estava ali todas as manhãs ajudando as crianças a atravessarem a rua. Eu sabia o nome dele, mas não me lembro mais. Era sempre o mesmo, e ficou por ali pelo menos uns oito anos, posso garantir isso. Eu às vezes seguia até a esquina da rua Gravataí, onde havia um sorveteiro num carrinho da Kibon, e às vezes comprava um picolé.

Nos dias de feira, era difícil esperar o carro em frente ao colégio. Eu tinha de descer para a rua Gravataí ou para a rua Augusta, pois a feira ocupava não somente a praça, mas também o leito da rua Olinda (hoje Guimarães Rosa). Havia uma banca de jornal por algum tempo no começo da rua Gravataí, mas era daquelas que não tinha muita coisa, então, dava para comprar figurinhas só e olhe lá. Com o tempo, a praça começou as obras da sua reformulação. Foi um tempo, em 1967-8, em que o bate-estacas funcionava o dia inteiro, dando para ouvir pelas janelas na sala de aula. Com o tempo, nós nos acostumamos ao ruído.

Na época das obras na praça, papai não me buscava mais. Ele levava e daí ia para a Cidade Universitária, para onde a Faculdade de Química se mudou no final de 1966. Ele ainda almoçava em casa, mas não dava mais para me apanhar na escola. Eu ia, entõ, ou de carona com alguns colegas, ou de ônibus. Era difícil de esperar o ônibus na rua da Consolação, que na mesma época estava sendo alargada: parecia uma praça de guerra. Já não havia mais bondes, e eu tinha de tomar o ônibus. Só que o ponto mudava de lugar quase todos os dias e o ônibus (e eu) tínhamos de adivinhar onde ele estava, nomeio de uma rua de terra, esburacada e com pedaços de guias e trilhos jogados no leito. O ônibus chegava sacolejando em cima daquela estrada rural em que se tornou a rua da Consolação.

Bons tempos, bons tempos. A gente fala sempre a mesma coisa, não é mesmo?

quinta-feira, 22 de abril de 2010

O HOMEM QUE NÃO DEVIA MORRER

Rua da Consolação sendo duplicada, em 1967. Foto Diário de S. Paulo

Um de meus amigos de infância tinha um sogro que se chamava Irineu. Era um grande sujeito: conheci-o há uns 35 anos e ele faleceu há uns quatro, infelizmente. Era um excelente marceneiro, além de empresário. Nasceu na rua Conde de Irajá, na Vila Mariana. Esta era a rua que, pelo menos quando ele era menino, dividia a rua Vergueiro da Estrada do Vergueiro. Hoje é tudo rua Vergueiro.

Quando se casou foi morar numa casa com sua esposa, na avenida Nove de Julho. Uma casa de estilo normando, telhado alto e "pontudo", para que, se caísse neve, escorreria tudo para o chão sem fazer peso — como se aqui nevasse, mas era o estilo, fazer o quê? Não me lembro direito, mas creio que a casa era da família da esposa dele e esta, sim, passou a infância lá. Ele — ou ela — contava que a rua era estreita (era a Salvador Pires), depois foi alargada (em 1942) para se fazer a avenida que saía do túnel alcançar a Brasil. Ela andava de bicicleta na rua.

Quando eu os conheci, já era difícil entrar com o carro na garagem, com os ônibus subindo a avenida e encostando na traseira do seu carro, que tinha de quase parar para fazer uma curva de noventa graus para entrar na garagem. Quando outras pessoas iam lá e entravam na garagem para estacionar o carro, havia que se telefonar antes para que eles abrissem os portões enormes de madeira e a gente pudesse entrar rápido com o carro antes de levar uma bordoada por trás.

Durou anos, mas por volta do ano 2000 eles conseguiram vender a casa e se mudar para São José dos Campos, onde estavam morando a filha e o genro já havia uns dez anos. No lugar da casa e de mais uma vizinha pelo menos, foi construído o hotel Formule 1 entre a Lorena e a rua Estados Unidos, lado ímpar da Nove de Julho.

São estes relatos comparativos de tempos em tempos de um mesmo local que me fascinam. Como seria se os homens vivessem mais e pudessem acompanhar determinados locais durante os últimos duzentos anos? A rua da Consolação, por exemplo. Até onde me lembro neste momento, ela foi aberta em 1808 (posso estar enganado, mas creio que é isto).

Admitindo que um homem que tivesse uns 220-230 anos de idade hoje e conseguisse manter a lucidez, ele teria visto uma picada no meio da mata tornar-se uma rua mais larga para a passagem de um ou outro carro de bois ou de burros (essa rua, antiga estrada de Pinheiros ou de Sorocaba, existe desde tempos imemoriais como a trilha Tupiniquim, parte do "complexo viário" indígena do Peabiru) para depois ser prolongada até o topo do Caaguassu, junto à então futura avenida Paulista. Depois, no final do século XX, receberia seus primeiros trilhos para bondes a burros, substituídos no início do XX para trilhos mais robustos para os bonde elétricos.

Em meados dos anos 1960 seria duplicda e receberia um canteiro central. Enquanto isso, os bondes acabaram e os ônibus a invadiam cada vez mais, juntamente com automóveis e motocicletas. Se alguém pudesse ter acompanhado isto e contar histórias comparativas hoje para nós, imagine o que não seria!

É o que as fotografias tentam fazer. Porém, a fotografia mais antiga que já vi da rua da Consolação não é nem do início do século XX. É mais recente. O que posso contar sobre a rua é que eu a conheci bem mais estreita — largura equivalente a uma das pistas que tem hoje — com paralelepípedos e duas linhas de bonde, uma subindo e outra descendo, no centro da rua. Eu a vi tendo as casas de um dos lados sendo demolidas desde a Biblioteca Municipal até a avenida Paulista. Vi-a em obras de duplicação — outro dia vi fotografias destas obras e da avenida recém-aberta, em 1967/8.

Tenho, assim como muitas outras pessoas, diversas memórias de pontos de São Paulo. Só que o homem que não morreu — aquele, sim, morreu, mas não deveria — não existe e não pode contar duzentos anos de história nem ter fotografias de 200 anos, porque esta tecnologia nem existiu por todo esse tempo. Agora é fuçar as gavetas e impedir que memórias fotográficas sejam atiradas ao lixo por descaso ou qualquer outro motivo.

terça-feira, 13 de abril de 2010

AVENIDA PAULISTA E SUAS REMINISCÊNCIAS

A boca do túnel da Nove de Julho nos anos 1940 e o Trianon em cima dele. No meio das árvores no topo, a avenida Paulista não pode ser vista. Como falo abaixo, construir as colunas do MASP onde?

Andar de ônibus em qualquer lugar, desde que sentado e não espremido, tem afinal algumas vantagens. Na avenida Paulista, por exemplo, eu estava reparando, com o ônibus trafegando lentamente pela sempre congestionada avenida, que ao cruzar a Brigadeiro Luiz Antonio dá para ver que ela tem uma característica diferente das outras ruas que cruzam a Paulista.

Além de ser uma rua bem comercial, que no seu último quarteirão entre a São Carlos do Pinhal e a Paulista ainda conserva algumas casinhas antigas, ela é "torta": ou seja, ela não é paralela às outras ruas que cruzam o espigão que na verdade, em seus 800 metros de altitude, separa as bacias do Tietê e do Pinheiros.

Ela é a antiga estrada de Santo Amaro. Cento e vinte anos atrás, quando a Paulista e suas transversais ainda estavam em construção no meio da mata do Caaguaçu, ela era o ponto inicial da avenida e era a única rua que já existia ali, além da estrada de Pinheiros (rua da Consolação), que era o final da avenida. Sim, a Paulista original corria entre as estradas de Santo Amaro e a de Pinheiros.

Era a única rua, além da Consolação, que já tinha algumas construções. Torta, por que essas antigas estradas estradas dificilmente seguiam um caminho reto — embora a Brigadeiro, quando desça para a várzea do Pinheiros seja uma estrada quase que reta. Fiquei imaginando aquela rua que vinha desde o Piques e seguia para o largo 13 de Maio, no centro do extinto município de Santo Amaro, um caminho de terra com tráfego de carros rudimentares, substituídos pelos bondes dez anos depois e finalmente pelos automóveis e ônibus não muito tempo depois.

Por ela chegaram os trilhos para a avenida Paulista, que seguiam para a rua da Consolação e desciam para o centro velho. Mais tarde, a Paulista ganhou prolongamentos dos dois lados, um até a praça Osvaldo Cruz, seu atual "marco zero" no bairro do Paraíso e do outro lado até a barranca do vale do córrego Pacaembu, na atual rua Minas Gerais.

Seu prolongamento para as cabeceiras do córrego Pacaembu foi projetado nos anos 1920, descendo em curvas para onde hoje está o estádio do Pacaembu e seguindo pelo vale no que hoje é a avenida Pacaembu. Tal não aconteceu.

Do outro lado, a avenida se encontrava com a rua do Paraíso. Quem vinha por ela e por esta rua seguia até a rua Vergueiro — o antigo Caminho do Carro para Santo Amaro — e entrava à direita, seguindo pela rua Domingos de Moraes para dali ir para os limites da cidade, antes da Saúde.

Fico só imaginando. Não há fotos, há apenas dados e reminiscências. Por esses caminhos passaram figuras importantes da história do Brasil, para o bem ou para o mal. Os velhos casarões dos chamados barões do café (e não somente deles) foram construídos um atrás do outro a partir de 1892 até os anos 1930. Dali para a frente acabou seu ciclo, e um foi sendo demolido atrás do outro. Hoje em dia três são tombados e uma ou outra casa mais recente ainda sobra de pé com usos não residenciais.

Uma muralha de prédios de apartamentos e de escritórios margeia a avenida. Fora o Museu de Arte de São Paulo, o MASP, construído sobre as ruínas do Palácio Trianon, demolido em 1951. Aquelas colunas vermelhas sustentam o maior vão em concreto armado do mundo (é isto mesmo?). Reparei nas colunas e penso que não havia outra forma de se o fazer - não sei se estou certo. Afinal, aquele ponto da Paulista foi aterrado durante a sua construção, Ali eram as nascentes do Saracura, mas a altitude era bem menor do que a do resto da avenida, daí a necessidade do aterro. Em 1940 sob ele se construiu o túnel da Nove de Julho. Fazer as colunas sobre o túnel? De jeito nenhum, a fundação tinha de ser funda, pois era aterro... então foram feitas duas de cada lado de cada túnel...