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domingo, 18 de janeiro de 2015

A DESTRUIÇÃO DAS FERROVIAS EM RIO CLARO, SP

Avenida Brasil, Rio Claro, em 15/1/2015. Ao fundo, sentido São Paulo. Atrás do fotógrafo (eu), sentido Analãndia. Os trilhos do progresso viraram um caminho abandonado para bicicletas
.

Desculpem-me meus fieis leitores (Se é que os tenho), mas volto a explicar que escrever um artigo não criticando as ferrovias brasileiras é muito difícil. Por isso, aí vai mais um.

Três dias em Rio Claro nesta semana levaram-me a tirar três fotografias que ilustram as decadentíssimas ferrovias na cidade paulista de Rio Claro.

É certo que a estação central ainda está de pé, externamente em boas condições. Porém, ficou anos no semi-abandono até ser transformada em estação... rodoviária. Para ônibus dentro da cidade e nãi intermunicipais.

Mais longe da cidade, as estações de Batovi e Itapé continuam em pé, sem trilhos (Eram da linha de 1916 desativada em 1980), Ajapi (antigo Morro Grande, é residência e mal pode ser vista da estrada por ter uma enorme fila de árvores encobrindo-a) e Ferraz está no "bico do corvo". Guanabara, a Rio Claro-nova, que funcionou muito pouco como embarque e desembarque de passageiros, não serve para nada, apenas o pátio é usado para manobras e como depósito de sucatas de vagões.

Acima, a linha vermelha mostra a linha de 1976; a cor-de-rosa, a de 1884; a amarela, de 1916 e a azul, a de 1884, no trecho que foi retirado por volta de 2008.
O mapa tirado do Google Maps mostra como estão as linhas e ex-linhas do município. De cada uma das três linhas que o município teve, tirei uma fotografia de cada uma (precisava mais?) para se ter uma ideia das mesmas.

A foto do topo do artigo mostra o local da linha métrica que funcionou de 1884 a 1966. Foi essa linha
(arrancada em 1966 mesmo) que deu origem à estrada de ferro na cidade, instalada que foi pela Cia. Rio Clarense Estradas de Ferro. Ligava Rio Claro, em bitola métrica, a Araraquara, com um ramal para Jaú. Esse sistema de linhas foi vendido para a Rio Claro Railway, uma empresa inglesa com ligações com a SPR (São Paulo Railway) em 1889 para que o Conde do Pinhal, acionista principal, pudesse levantar dinheiro através de um banco que ele fundou nesse mesmo ano para financiar o pagamento dos empregados de sua fazenda, pois os escravos haviam sido liberados no ano anterior (Lei Aurea de 1888).

A primeira linha que havia sido construída na cidade, no entanto, funciona até hoje. Aberta em 1875, liga Santa Gertrudes (vindo de São Paulo) às oficinas de Rio Claro, no centro da cidade, na avenida 8. A ALL ainda usa as oficinas.
Junto à rua M15, no norte da cidade, uma ponte sem trilhos e com dormentes podres é o que resta da linha entre Rio Claro-nova e Batovi, construída em 1916 e desativada por volta de 1908
.

Em 1892, a Cia. Paulista de Estradas de Ferro comprou a RCR e passou a operar a lin ha Jundiaí-Araraquara com baldeação de passageiros e cargas na estação de Rio Claro, devido à fiferença de bitola das duas ferrovias.

Em 1916, a Paulista alargou e retificou a linha da Rio Clarense (de métrica para larga, 1,60 m), mantendo, no entanto, a métrica com o nome de ramal de Anápolis (antigo nome de Analândia), por onde a linha passava. O trem da métrica continuou usando a linha antiga, que, a partir da estação de Visconde do Rio Claro (aquela, que se vê até hoje à margem esquerda da Rodovia Washington Luiz, mais ou menos em seu quilômetro 210), passava a correr paralela à linha de bitola larga até a cidade de São Carlos, onde acabava - a linha até Araraquara foi eliminada, substituída pela da Paulista de bitola larga.

Em 1941, o trecho que ligava a estação de Anápolis a Visconde do Rio Claro foi retirado, pois era por demais acidentado, mesmo tendo sofrido retificações e melhorias em 1916. O trem da métrica passou a seguir num "bate-volta" de Rio Claro a Analândia somente.
ACIMA: A linha de 1976, construída pela FEPASA. Para a direita, o cargueiro da ALL segue para São Paulo. Para a direita, a linha dirige-se a Guanabara e a São Carlos. Este cruzamento sobre a Washington Luiz está ainda no município de Santa Gertrudes, e a foto foi tirada por mim da divisa de Rio Claro, em 13/1/2015
.

Quanto à linha de 1916, a Paulista, entre Rio Claro e São Visconde do Rio Claro, refê-la em outro traçado bem diferente da antiga, passando agora à esquerda do que hoje é a pista da rodovia Washington Luiz. Novas estações foram construídas com nomes diferentes das que estavam na linha antiga, devido à distância: Batovi, Itapé, Graúba, Ubá, Itirapina e Visconde do Rio Claro, esta a única que, em outro local (o atual), substituiu a outra desativada. Era uma ferrovia mais plana. A estação de Colonia, útima antes de São Carlos, teve o nome alterado para Conde do Pinhal e passou a atender as duas linhas, tanto a métrica quanto a larga.

Em 1976, nova modificação: uma nova linha foi feita já pela FEPASA (mas projetada pela Cia. Paulista) entre a estação de Santa Gertrudes (antes de Rio Claro para quem vem de São Paulo) e a de Itirapina. Com isso, manteve a linha velha que passava por Rio Claro entre a bifurcação logo após a estação de Santa Gertrudes e a união das duas próximo a Batovi, para que os trens de passageiros pudessem utilizar a estação de Rio Claro-velha (muito melhor do que a nova, que era praticamente uma plataforma com cobertura) e também as oficinas do pátio de Rio Claro.

Finalmente, por volta 2008 (realmente, não me lembro em que ano ocorreu), os trilhos entre as oficinas (ao lado da estação, após esta para quem vem de São Paulo) foram arrancados, transformando Santa Gertrudes a Rio Claro em um simples ramal: o ramal das oficinas.

Com tudo isto, a cidade perdeu muito. Enquanto São Carlos, Araraquara cresceram muito, Rio Claro ficou meio que estagnada por um tempo. A avenida por onde passavam os trilhos do ramal de Analândia é hoje chamada de Avenida Brasil. O canteiro central é realmente largo, mas mal cuidado, com exceção de pequenos trechos. Parece que retiraram os trilhos ontem e não há quarenta e nova anos. Uma enorme faixa abandonada, tendo no centro uma faixa para bicicletas, exatamente onde passava a linha singela dos trilhos da velha Rio Clarense. A área, que devia ser coberta de mata ou de fazendas e sítios na época da extinção do ramal, hoje é chamada de Distrito Industrial.

domingo, 11 de janeiro de 2015

A CIA. RIO CLARENSE EM 1885

A Provincia de S. Paulo, 1885
.

Em 1880, o café já era o carro-chefe das exportações brasileiras. Principalmente em Minas Gerais, Rio de Janeiro. Espirito Santo e São Paulo, era ele que determinava o caminho que as ferrovias percorreriam para os portos. Não era coincidência que três dessas quatro províncias liderassem a construção de estradas de ferro no Brasil.

Como todas nasciam particulares (embora muitas rapidamente fossem absorvidas pelo Governo, não por que este as quisesse, mas porque ele não podia deixá-las deixar de operar por má administração ou previsão financeira mal feita), havia não só a preocupação de se fazer o melhor possível, como também fatores políticos internos. Em alguns casos, vencia o que era lógico (como na Paulista e na SPR), em outros. a política ou escolhas inviáveis triunfavam.

A Paulista em 1880 estava em Rio Claro e queria dali seguir para São Carlos e Araraquara. Em outro ramal, estava em Porto Ferreira e queria seguir para Ribeirão Preto. Nos dois casos, não conseguiu. Como ela queria ir para Rio Claro via Itirapina, caminho mais lógico e barato, fazendeiros da região de Analândia e Corumbataí e mesmo as partes mais altas do município de Rio Claro bateram-se contra, pois queriam que o café por eles produzidos fosse recolhido no  alto da serra de Corumbataí. Não atendidos, fundaram a Cia. Rio-clarense, liderados pelo Conde do Pinhal, de São Carlos e ganharam uma ferrovia só para eles, que, além de percorrer um caminho mais longo e por demais acidentado e, ainda por cima, com bitola métrica (a Paulista tinha a bitola larga, mais estável e rápida). E com isso, passou a haver baldeação em Rio Claro, de uma ferrovia para outra. Em Porto Ferreira, a Mogiana, que estava em Casa Branca, conseguiu por influência política, ganhar  trecho para Ribeirão Preto.

Isto obrigou a Paulista a rever completamente seus planos, criando, para combater a Rio-clarense, a navegação fluvial até Pontal, e, no caso da Mogiana, construiu o ramal de Santa Veridiana. Ambas as medidas, no entanto, eram insuficientes.

Em 1892 a Paulista comprou a Rio Claro Railway, sucessora da Rio-clarense. E, aos poucos, no século XX, foi tirando tráfego da Mogiana de Ribeirão Preto de outras formas. Mas isto é assunto para outras histórias.

O fato é que enquanto a Rio-clarense reinava absoluta na região, ela chegou a São Carlos em 1884 e a Araraquara em 1885. Festas e mais festas no dia em que este último fato aconteceu mostram, nos jornais da época (no caso, A Província de S. Paulo, hoje O Estado de S. Paulo) o que significava a chegada de uma linha a uma cidade florescente como Araraquara .

Na verdade, quando hoje se inaugura uma estação da CPTM ou do Metrô na cidade de São Paulo, ainda existem pequenas festas, quando o Governador e diversos puxa-sacos pegam o trem na estação anterior e viajam por cerca de dois minutos até a estação seguinte (a nova) e vão embora à francesa, mas sem bandinhas, sem oferecimento de "copos d`água" ou qualquer outra coisa. Mas a importância, creiam ou não, e a mesma. Não que se compare o isolamento de uma pequena cidade como Araraquara em 1885 a uma estação de metrô na rua Fradique Coutinho (em Pinheiros) em 2014 num local que é parte de uma cidade gigantesca, cerca de 2 mil vezes maior do que Araraquara o era em no final do Império, mas hoje temos uma situação diferente, que é a dificuldade da mobilidade em uma cidade praticamente parada por congestionamentos. Se dependesse disto, a festa hoje talvez devesse ser maior do que a de 1885.

Voltando a Araraquara de cento e trinta anos atrás, estavam presentes na festa da inauguração (dia 18 de janeiro) o Presidente da Província (cujo nome não foi citado) na reportagem publicada em 19 de janeiro desse ano, o engenheiro fiscal Miranda de Azevedo,o Coronel Estanislau de Oliveira, a Directoria da Companhia, o dr. A. (Andreas) Schmidt, inspector-geral, o dr. José Scorrar, engenheiro-chefe da construcção, representantes da imprensa da capital, "grande numero de convidados" e empregados ca Companhias, e.. o povo.

O Conde do Pinhal e os convidados de São Paulo haviam ido da Capital a Rio Claro em trem especial e almoçaram na cidade. Dali partiu o trem inaugural (havia baldeação, lembram-se? As bitolas eram diferentes)  às 10 horas e 3/4 e chegou (em Araraquara) às 4 horas. Ali houve "grande enthusiasmo, musica, foguetes e discursos. Seguiu-se um lauto jantar offerecido pelo povo araraquarense e á noite houve baile".

Eram, na época, 128 quilômetros de Rio Claro a Araraquara. Alguns dados citados pelo jornal: declividade máxima 2%, alinhamentos rectos 61,32 da extensão total da qual 46,30% em nível. No mesmo dia foram abertas a estação de Visconde do Pinhal (a 48 km de São Carlos) e de Fortaleza, a 34 km. As obras de anrte mais "notaveis" foram citadas como sendo as pontes sobre o rio Monjolinho, a ponte do Cancan, a do Chibarro e a do Ouro.

Notas: o trecho Rio Claro-Visconde do Rio Claro aberto em 1884 (entre Rio Claro e São Carlos) foram erradicados parte em 1941 (Analandia-Visconde) e parte em1966 (Rio Claro-Analandia). A partir de 1916 esse trecho inteiro foi mantido em funcionamento como ramal de Analandia, ainda em bitola métrica. Analandia e o ramal passaram a ter esse nome em 1943; até aí, era Anápolis. A estação de Visconde do Rio Claro de 1885 mudou de local em 1916, passando para a bitola larga do trecho construído pela Paulista e mantendo o nome, com 36 anos de atraso, entre Rio Claro-Itirapina. O prédio da estação original ainda existe e, descaracterizado,serve como moradia.

Andreas Schmidt, citado acima, foi o construtor da estação de Valença, da E. F. Valenciana, RJ (depois ramal de Jacutinga da Central do Brasil), em 1871. Mais tarde, tornou-se acionista da Rio-clarense e depois da Cia. Paulista, tendo falecido em 1910, quando morava em Rio Claro e seu filho ocupava o mandato de prefeito na cidade. Como curiosidade, ele é trisavô de meu concunhado, que, não por coincidência, chama-se Andreas Schmidt. Aliás, este é também descendente direto do Visconde de Rio Claro. O engenheiro-fiscal Miranda Azevedo tornou-se nome de duas estações da linha-tronco da Sorocabana no município de Itatinga (a "velha" e depois a "nova"), ambas hoje demolidas.

A estação de Visconde de Pinhal passou mais tarde a se chamar Ibaté e nos anos 1940 mudou de local dentro do atual município deste nome, numa retificação de linha. Hoje está abandonada. Já a de Fortaleza foi fechada em 1922, tendo sido aberta bem próxima a ela uma outra estação de nome Chibarro. Ambos os prédios estão hoje abandonados.