Parte do município de Cruzeiro em 2014 e o distrito (ainda o será hoje?) de Itagaçaba, do outro lado do rio Paraíba e com uma ponte apenas de passagem para o centro da cidade. Não cresceu muito, realmente. (Google Maps)
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Como apresentado em um artigo publicado neste blog há dois dias, meu avô, Sud Mennucci, participante da Comissão que estudava a redistribuição, criação e extinção de municípios em São Paulo, escreveu uma série de pareceres, alguns referentes a eventualmente alterar modificações já feitas pela Comissão em 1934, outros, para fazer as originais.
Os pareceres abaixo referem-se ao município extinto de Jataí e às cidades de Cruzeiro e de Cachoeira Paulista. São três, em datas diferentes. Todos escritos e assinados por meu avô naquela época. O primeiro data de 18 de janeiro de 1934:
"Como se vê do memorial dos moradores do distrito de paz de Itagaçaba, município de Jataí, têm estes toda a razão no que se refere á incapacidade de Jataí a continuar como séde do município. Faltam-lhe todos os requisitos para isto:
1o - As rendas, que, em 1932, de acôrdo com o relatorio oficial, publicado pelo Departamento de Administração Municipal, não atingirem a rs. 3:500$000;
2o - a população, que é de 5.003 almas para todo o município, das quais apenas 53 na séde;
3o - o numero de predios, que não chegam a 20, na séde, quando a lei organica de 1917 exigia, no minimo, 100."
No texto acima, a extinção de Jataí já estava praticamente decidida. É interessante notar que, comparando-se com o artigo sobre outras cidades, reproduzido no artigo de dois dias atrás, o português de época apresenta algumas variações. Ele era de 1925. "Distrito", que aqui se escreveu como "distrito", foi escrito como "districto" em 1935, ou seja, houve uma reversão de algumas palavras ao termo antigo. Meu avô não errou: ele seguia estritamente o português da época e seguia as modificações com extremo rigor. Itagaçaba, por sua vez, é a parte ao sul do rio Paraíba no atual município de Cruzeiro. Mas, continuando com o texto:
"Não se explica a manutenção de um municipio nessas condicões. Mas, os moradores de Itagaçaba já não têm razão quando pedem que a séde seja transferida para esta última localidade. Embora muito mais desenvolvida do que Jataí, tambem não possue os requisitos indispensaveis. Falta-lhe a população de dez mil habitantes, pois êles reconhecem que o municipio tem apenas 5.003, somando os dois distritos. E a renda é a mesma para todo o municipio.
"A solução, portanto, tem de ser outra, isto é, a solução que propôs esta Comissão no processo acerca da elevação de Cruzeiro a comarca; a) suprimir o municipio de Jataí; b) anexar o distrito de paz da séde do municipio e comarca de Cachoeira, de que dista apenas seis quilometros pela estrada estadoal Rio-São Paulo; c) anexar o distrito de paz de Itagaçaba ao municipio de Cruzeiro, a cuja sede fica fronteiro, separado apenas pelo rio Paraíba. Pela Comissão (a) Sud Mennucci."
Em 22 de fevereiro de 1935, portanto, pouco mais de 13 meses depois, foi emitido outro parecer por Sud:
"É justamente a solução mais absurda a que se propõe neste processo para o caso intrincado dos districtos de paz de Jatahy e Itagaçaba, que formavam, até maio de 1934, o municipio de Jatahy, e pertencem hoje ao municipio de Cachoeira. (...) Mas Itagaçaba fica a 12 kms. de Jatahy e está localizado em frente á cidade de Cruzeiro, de que está separado apenas pelo rio Parahyba. A solução era, como não se tem cansado de o repetir esta Comissão, a sua annexação a Cruzeiro. Solução racional em todo o sentido: entre Cruzeiro e Itagaçaba ha tres balsas funccionando diariamente para o transporte de passageiros (e ha uma velha ponte, sempre promettida, sempre atacada, e sempre... protelada)."
Notar que o português volta a ser o anterior a 1934, como no caso do artigo anterior publicado dois dias atras.
"Dos dois districtos, Jatahy e Itagaçaba, não ha grau de comparação entre o primeiro e o segundo. Itagaçaba tem muito maior população ( séde conta cerca de 600 habitantes) e o povoado, em virtude de sua posição fronteira e uma grande cidade commercial como Cruzeiro, está em franco florescimento.
"Jatahy é um arraial em ruínas. A população do agglomerado mal chega a 100 almas. Não tem elementos para sustentar uma unica escola publica.
"Pois, é o escrivão deste districto que propõe a extincção do districto de Itagaçaba e sua annexação a Jatahy
"A solução, a ser razoavel, seria a inversa. Mas nem a reciproca cabe no caso. Porque entre Jatahy e Itagaçaba nunca houve estrada de rodagem que merecesse esse nome. Havia e ha um caminho de cabritos montezes por onde só passam cavaleiros atarefados, que não têm outro recurso. E nessas condições, annexar uma a outra dessas duas povoações seria sempre, em qualquer sentido, cometter a injustiça cuja repetição abusiva, pelo Estado inteiro, determinou, da parte do Governo, fosse nomeada a Commissão que dá este parecer.
"A Commissão, depois de examinar a questão propõe o seguinte
PROJECTO DE DECRETO
Art. 1o - Fica extincto o districto de paz de Jatahy do municipio e comarca de Cachoeira, passando as suas terras a pertencer ao districto de paz da séde.
Art. 2o - É annexado ao municipio e comarca de Cruzeiro o districto de paz de Itagaçaba, óra, pertencente ao municipio e comarca de Cachoeira.
Art. 3o - A divisa entre os municipios de Cachoeira e Cruzeiro, na parte a leste do rio Parahyba, passam a ser as seguintes: começam no rio Parahyba, onde faz barra o corrego de Dona Fausta, sobem pelo rio, até a barra do ribeirão do Alegre, continuam por este acima até encontrar a antiga estrada de rodagem que de Jatahy vae a Itagaçaba e vão deste ponto em recta até a barra do ribeirão do Paiol no rio Itagaçaba, já nas divisas do municipio de Silveiras.
Art. 4o - As divisas internas entre o districto de paz de Itagaçaba e o da séde do municipio e comarca de Cruzeiro, a que aquelle passou a pertencer, far-se-á, como até aqui pelo rio Parahyba, em toda a extensão da area municipal. (...)"
Outro parecer foi redigido pela Comissão em 15 de março de 1935 referindo-se ao mesmo assunto do de 22 de fevereiro, com as mesmas exatas conclusões, para, ao que parece, confirmar "na marra" uma possível oposição de partes interessadas em diferentes modificações. Mas o que foi escrito nestes pareceres prevalece até hoje, basicamente, salvo modificações mais recentes de pouca importância.
domingo, 17 de agosto de 2014
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Eu sempre soube dessa história do bairro Itagaçaba, tanto que o que é contado aqui foi a troca com cachoeira.
ResponderExcluirMas nunca tinha ouvido falar desse Jatai.
Belo artigo.
Bruno - Jataí era um municipio que foi instalado em 1884 e extinto em 1934 por que sua sede era um nada. Tanto que nem como distrito foi mantido. A antiga sede, com meia duzia de construções, existe ainda na estrada Dutra-Silveiras, com uma construção antiga de um andar que hoje é uma escolinha mas que anteriormente foi o predio da prefeitura. Pouca gente hoje chama aquele lugarejo - se é que se pode chamar de lugarejo - de Jatai. Tem outro nome, Sapé, hoje. Veja tambem http://blogdogiesbrecht.blogspot.com.br/2009/04/onde-esta-jatai.html
ResponderExcluirMuito bacana! Pelo jeito ele era em Santa Cabeça!
ExcluirAntes da Santa Cabeça para quem vem da Dutra.
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