Uma das demolições da Paulista. 1984, Av. Paulista com alameda Joaquim Eugênio de Lima. Essa casa, que passou por uma enorme reforma quando foi adquirida pelos Lotaif, pertenceu em sua arquitetura original a Henrique Schaumann (Época SP)
Aquele sujeito que nasceu em 1876 e que tem hoje 135 anos de idade costuma dizer para seus amigos que nasceu ali mesmo, numa cabana de sapé na rua Real Grandeza. Sim, aqui mesmo, em São Paulo, Capital.
Para quem não sabe (embora alguns neguem sua existência, quem estará correto?), a rua Real Grandeza desapareceu em 1991, quando foi aberta a avenida Paulista, entre a Estrada de Santo Amaro (av. Brigadeiro Luiz Antonio) e a rua da Consolação. O resto veio depois.
Então, o tal sujeito, que nunca deixou de morar na Real Grandeza, quero dizer, Paulista, começou a trabalhar como jardineiro ali na avenida nova. Com 15 anos, já era hora de ganhar a vida sozinho. As casas foram brotando, os terrenos de matas, virando casas e jardins.
A casa dele foi arrasada logo na época do loteamento dos terrenos (não, ninguém perguntou nada para ele nem para os pais dele, que também usavam o barraco), mas ele passou a morar então nos fundos dos terrenos para os quais fazia trabalhos de capina. Uma das casas sempre lhe deixava passar a noite ali. Afinal, ninguém é de ferro.
Seu Agapito - esse era o seu nome - teve muito serviço. Com 35 anos de idade, as casas já ocupavam praticamente toda a avenida, que, nessa época, já ligava a Praça Osvaldo Cruz à rua Minas Gerais, lá no mirante no fim da Paulista. Os jardins eram bem cuidados, São Paulo era uma cidade cada vez maior e mais rica.
Com 60 anos de idade, em meados dos anos 1930, Seu Agapito viu chegarem aqueles prédios que já existiam em número razoável no centro da cidade chegando cada vez mais perto. Um belo dia, o primeiro se instalou na avenida, tendo que, para isso, derrubar um dsos casarões. Seu Agapito não gostou muito, mas, enfim... era um só.
Quando Seu Agapito completou 90 anos, em 1966, os prédios continuavam a brotar, fazendo uma mansão cair atrás da outra. Com 110 anos, em 1986, o velhinho já não conseguia mais achar facilmente uma casa. Quase todas caíram para prédios enormes nascerem em seu lugar. Ele não gostava. Era muita sombra na rua, havia pouquíssimos jardins para cuidar. Ele ainda vagava pela rua e dormia no parque "em frente ao tar do museu". Achava que os artomóvis faziam muito barulho". Sentia saudade dos bondes, que ele viu nascer e morrer.
Dez anos depois, com seus 120 anos, viu a casa dos Matarazzo ser derrubada. Até ela, meu Deus? Mas ali, não fizeram prédio. Encheram de carros. Ele às vezes pulava na piscina da mans"ao de madrugada, escondido, para ninguém ver. Hoje a piscina estava aterrada. Alguém o convidou por essa época para catar mato no palacete das Rosas, um dos poucos jardins e casas que sobreviveram.
Outro dia - por esses dias agora, neste mês de outubro do ano da graça de Nosso Senhor de 2011 - ele viu um movimento estranho naquela casa que ainda existe ali perto da rua Leôncio de Carvalho. Foi ver o que era. Soube então que vão derrubar para construir um prédio. De deiz andar. Não entendeu. Cumé qui pode, sô? Tanto prédio! Pricisa memo de maizum? Quem seria a anta que havia autorizado isso? Bem aqui, onde ele costumava jogar bola lá por 1901, 1902...
A anta, Seu Agapito, foi o prefeito, um tar de Kassab. Ele não enxerga o óbvio: a cidade não aguenta mais... ainda mais na Paulista, já com trânsito caótico e falta de verde, excesso de concreto... O velhinho ficou perplexo. Disse aos amigos que "tá na hora de eu morrê, num tá? A burrice invadiu o mundo, sô! Que fizeram da mata que me cercava quando nasci"?
Seu Agapito pode até ser uma lenda. Mas a demolição de mais um casarão da Paulista para a construção de mais um edifício não é. Inacreditável como se destrói uma cidade e não se percebe, e, quem percebe não toma nenhuma providência para impedir.
quinta-feira, 20 de outubro de 2011
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Veja que interessante. Já pensou se a Paulista tivesse preservado?
ResponderExcluirhttp://www.guiadebage.com.br/colunas/turismo/memoria/index.html
MEU CARO RALPH A ESTAÇÃO FERROVIARIA DE SUCANGA ESTA SENDO TOTALMENTE RESTAURADA, JÁ TEMOS FOTOS DA RESTAURAÇÃO E POÇO POSTAR MAIS TARDE PARA VC PARA PODER TROCAR ESSA FOTO QUE ESTA MUITO ANTIGA NO SEU BLOG. UM GRANDE ABRAÇO LUCIANO.
ResponderExcluirLuciano: onde é a estação de Sucanga? São tantas, não consigo localizar no site (e não blog).
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