domingo, 31 de março de 2013

CENAS DO CREPÚSCULO DA FEPASA - 1996

V-8 com trem de passageiros em Vinhedo - 1996 - foto Vanderley Zago
Em 1996, ou seja, há dezessete anos, a FEPASA já era uma empresa com seu destino traçado. Deveria ou ser privatizada ou ser dada quase de graça para a RFFSA para pagar as dívidas do BANESPA feitas por governos irresponsáveis. O governador Mario Covas, tão endeusado por parte da imprensa paulista, se fazia de responsável, mas, pelo menos neste caso específico, o que ele determinou foi algo lastimável: o fim da FEPASA, de uma forma ou de outra.

Hoje, há gente que venera a memória da "grande FEPASA", ao contrário do que acontecia nesse não tão longínquo ano de 1996. Olhando hoje, porém, vemos claramente que a situação das ferrovias paulistas não era nem de perto a desgraça que é hoje - embora também não fosse nem de perto o que era a época pré-FEPASA, ou seja, antes de 1971.

Eu já caminhava pelos trilhos e ainda via estações funcionando mais ou menos como antigamente, algumas em condições bastante razoáveis (Torrinha, Rincão) e outras em estado lastimável - mas funcionando (Boa Vista-velha, Brigadeito Tobias), outras ainda vendendo bilhetes de trens de longa distância nas bilheterias centenárias (Luz, Sorocaba, Julio Prestes). Porém, fora estas, ainda havia outras, mas posso dizer que eram bem raras. Boa parte delas, grandes e pequenas, haviam sido fechada nos últimos vinte e cinco anos, aos poucos. As que eu citei nominalmente foram as que eu vi naquele início de pesquisas ferroviárias, quando eu havia partido do nada em termos de conhecimento, nesse mesmo ano.
Carro-restaurante entre Luz e Rio Claro - 1996 - autor desconhecido
Mostro aqui duas fotos colhidas ao acaso nos últimos dias no Facebook. Uma, não sei o autor. A outra, sim - basta ler suas legendas para saber. É interessante. Na da composição passando pela estação de Vinhedo, a V-8 prateada que ali aparece havia sido acabada de ser pintada naquela nova cor. Como, se a FEPASA estava para desaparecer e iso não era mais segredo para ninguém? Pois é. Havia facções dentro da empresa que lutavam contra sua extinção, com boas intenções ou mesmo somente para manter seus empregos.

A outra fotografia mostra um carro-restaurante da FEPASA na ex-linha da Paulista entre a Luz e Rio Claro. Vejam que ainda havia carros-restaurantes e que sua aparência era bastante razoável, danco a impressão de limpeza.

Afinal, ainda corriam trens nas maiores linhas de São Paulo: de São Paulo para Presidente Epitácio, de São Paulo para Santos, para Barretos e para Panorama, de Campinas para Araguari, em Minas Gerais, de Santos para Juquiá e também para Embu-Guaçu, além dos trens metropolitanos da já existente mas ainda longe de ser eficiente CPTM.

Isso tudo acabou quase de uma só pincelada nos dois anos seguintes. Houve uma sobrevida de três anos ridículos, para inglês ver, até 2001, mas que foi simplesmente vergonhosa. Nem tenho vontade de escrever sobre ela hoje.

Hoje, temos o que temos. Temos o que vemos. A CPTM, que era então bem pior do que as cenas aqui mostradas em trens de longa distância, hoje, é muito boa, enquanto os trens de longa distância desapareceram para sempre.

sexta-feira, 29 de março de 2013

BRASIL DESUNIDO


Sud Mennucci (Piracicaba, 1892 - São Paulo, 1948), meu avô materno, escreveu diversos livros sobre também diversos assuntos.

O comentário sobre dois de seus livros acima, ambos lançados em 1932, foi feito na revista "O Malho" e quem o "descobriu" foi o meu amigo Daniel Gentili, de Lins, que imediatamente mandou-me-o por e-mail.

Um dos livros, o "O que fiz e pretendia fazer" relata a (má) experiência que ele teve como Diretor-Geral do Ensino de dezembro de 1931 a junho de 1932, quando teve toda a imprensa contra ele por causa de suas ideias postas em prática para resolver os crônicos problemas do ensino estadual na época. Sei os problemas, mas nunca fui muito a fundo na leitura desse livro, bastante técnico e hoje possivelmente superado (será mesmo?).

Já o livro "Brasil Desunido" é uma pérola. Muito bem escrito e de leitura fácil e que faz com que não queiramos deixar de lê-lo até ele acabar, ele é realmente um livro hoje superado; porém, é um documento do Brasil de oitenta anos atrás e que mostra as ideias de Sud que, em sua opinião, resolveriam o problema da má distribuição de renda nos Estados - nesse tempo, era aquela história de que o país era um trem puxado por uma locomotiva que era São Paulo e por vinte vagões vazios, o número de Estados na época - e isso o torna muito interessante, mesmo que você não concorde com o escritor.

Se alguém quiser lê-lo, ele existe à venda no site http://www.estantevirtual.com.br/.

segunda-feira, 25 de março de 2013

ABRA A CERCA, O TREM (NÃO) VEM AÍ!

Ferrovia cercada em Magé. Foto Luiz Eduardo/Facebook, postada em 25/3/2013

Pois é, uma "descoberta" interessante sobre as ferrovias brasileiras... e, no caso, esta tem a concessão governamental para ser operada pela Ferrovia Centro-Atlântica - FCA.

Mas por que eu teria escrito "descoberta" assim, entre aspas? Porque, na verdade, não é a primeira vez que vi isso acontecer nos últimos anos. A fotografia colocada no Facebook por Luiz Eduardo - o qual não conheço - mostra uma cerca colocada sobre os trilhos por algum dono de terras da linha entre Magé e a estação de Visconde de Itaboraí, que faz parte da antiga linha do Litoral da saudosa E. F. Leopoldina.

Essa linha foi construída em diversas partes por diversas ferrovias pequenas e antigas desde os anos 1870 e nas décadas seguintes foram sendo juntadas umas às outras pela Leopoldina, que as comprava uma após a outra. Com isso, a velha ferrovia, que faliu nos anos 1890 e foi comprada por uma empresa inglesa que as teve nas mãos até 1950, construiu sua imensa malha, que cobria boa parte de Minas Gerais, Rio de Janeiro, o então Distrito Federal e o Espírito Santo, enquanto ainda estava inteira, até o início dos anos 1960.

Porém, a linha do Litoral, que ligava Niterói e o Rio de Janeiro a Macaé, Campos, Cachoeira do Itapemirim e Vitória, somente foi ligada ao Rio de Janeiro em 1927, quando foi construído justamente esse trecho entre Magé e Visconde de Itaboraí. Tal ligação permitiu aos trens que saíam da cidade do Rio de Janeiro. então Capital Federal, a seguirem diretamente para as cidades do Norte Fluminense e para o Espírito Santo.

O que acontecia até então era basicamente a viagem por barcas entre a Praça Mauá, no Rio, e Niterói, onde se tomava o trem para Campos em Maruí. Havia outras possibilidades, mas que demandavam baldeações, onde se tomava o trem na Praia Formosa (até 1926) e Barão de Mauá (depois disso), seguindo para Petrópolis, Três Rios, Recreio e dali a Campos outras cidades. Era mais fácil usar as barcas.

A partir de 1927, nem as barcas eram mais necessárias - mas, sem dúvida, era mais curto usá-las do que sair de Barão de Mauá, dar a volta pela baía da Guanabara e juntar com o trem vindo de Niterói em Visconde de Itaboraí, onde as duas linhas se juntavam.

A partir de 1960, o trem Cacique foi um passo à frente em conforto para uma longa viagem até Campos e /ou Vitória. Quando ele acabou, vinte e dois anos depois, já estava no bagaço, como o resto das ferrovias brasileiras.

Na linha do Litoral hoje somente rodam trens metropolitanos até Magé, pela Supervia. E rodaram até 2007, pela nefasta CENTRAL - empresa de trens metropolitanos do governo fluminense que hoje já não opera nada, embora ainda exista - trens de Niterói a Itaboraí. Dali para o norte fluminense, não mais desde os anos 1980.

A linha toda foi concessionada para a FCA em 1997. Ela até que operou cargas por algum tempo, mas já faz alguns anos que parou com tudo. Segundo informações recebidas, apenas autos de linha rodam hoje na linha - mais precisamente. de Itaboraí a Vitória. Ah! E não nos esqueçamos do trem turístico que roda próximo a Vitória, no belo trecho de serra capixaba, em finais de semana, patrocinado pela Serra Verde, empresa cuja especialidade é gerenciar e operar esse tipo de trens.

Ou seja, hoje a linha é uma linha praticamente fantasma, com grande potencial de transporte, mas que, como outras em território tupiniquim, não interessam às próprias concessionárias que detêm a licança para nelas operarem. E que hoje, em alguns trechos, têm seus trilhos cercados por outros interesses, sem que a FCA, no caso, se importe com o fato. É o Brasil-sil-sil, gente!

sábado, 23 de março de 2013

A CONSTRUÇÃO DE UMA AUTO-ESTRADA PAULISTA

Pedagio no dia da abertura em 1952: km 37 ou km 80?

A rodovia Anhanguera foi construída... bem, foi construída em partes, como muitas outras e muitas ferrovias. Hoje a Anhanguera liga São Paulo a Igarapava, continuando por dentro de Minas Gerais depois de atravessar o rio Grande e mudar de nome.

Em 1955, a Anhanguera já ligava São Paulo a Ribeirão Preto, em teoria. Na prática... bem, na prática era um pouco complicado afirmar isto. Em meados desse ano, o asfalto de uma rodovia que tinha pista única na maior parte do percurso chegava até pouco depois da cidade de Leme. Dali para a frente era terra, e de Cravinhos até Ribeirão Preto era um desastre, que em época de chuvas se transformava numa via impossível de ser utilizada.

Havia nessa época também três desvios: um em Campinas, outro em Araras e outro em Leme, partes sem asfalto ou aterros, que obrigavam os motoristas a passar por dentro dessas três cidades.

O desvio de Araras dava-se mais ou menos no km 164, onde existe um viaduto sobre a linha férrea da Cia. Paulista, o ramal de Descalvado, que ali passava entre a estação rural de Remanso e a estação central de Araras. Tirei pelo menos duas fotografias de cima desse viaduto nos últimos 15 anos, uma comtrilhos e outra já sem trilhos - que foram retirados ali no início do ano de 2002, depois de anos sem utilização do saudoso ramal.
Viaduto sobre o ramal de Descalvado: faltavam os aterros

A fotografia de 1955 mostra a linha e sobre ela um pedaço de viaduto, que aguardava os aterros - era por isso que ali havia um desvio.
Posto Lemense, em 1955

Outra fotografia do mesmo ano mostra um posto de gasolina, o Posto Lemense, citado na propaganda como sendo "o último posto de abasrecimento no trecho asfaltado". Dali para a frente era o inferno, pelo jeito.

Essa narrativa acima baseia-se em notícias do jornal Folha da Manhã da época. Por este jornal (e certamente também por outros), sabemos, salvo falhas de reportagem, que em 1952, por exemplo, haviam sido inaugurados dois pedágios: um no Gato Preto (km 37) e outro no km 80 (em Valinhos).
Construção da ponte sobre o Piracicaba em 1952

Ainda nesse mesmo ano, estava em construção a bela ponte de arcos sobre o rio Piracicaba, no km 130. Esta ponte foi demolida há não muito tempo. Acompanhei essa demolição numa época em que passava várias vezes pela rodovia, sei que não faz muito tempo, mas não consigo lembrar-me da data. Por volta do ano 2000, talvez?

Pena que as fotografias estejam tão mal reproduzidas no site do jornal... a que se salva mesmo é a propaganda do posto.

quinta-feira, 21 de março de 2013

A EFÊMERA FERROVIA DE CIANORTE, PR

Cianorte foi mais uma das cidades do norte do Paraná fundadas pela Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, neste caso, quando já não estava mais na mão dos ingleses, mas de paulistas, que a compraram em 1942.

Vale a pena clicar sobre o anúncio e lê-lo. Foi publicado em 9/7/1955.
Fundada em 1953, seu projeto seguiu a linha do urbanista inglês Ebenezer Howard e seu conceito de "garden cities" (cidades-jardim), o mesmo princípio que inspirou a Companhia City de São Paulo e seu vitorioso Jardim América da capital paulista, em 1913.

Se o desenho que aparece nesse anúncio publicado na Folha da Manhã de 1955, é o projeto real da cidade, não posso afirmar; porém, essa propaganda, feita dois anos após a fundação de Cianorte (cujo nome era uma abreviação que usava o nome da empresa que a construiu) foi publicada com o intuito de, claro, promover e vender lotes de terrenos na então novíssima cidade.

Note-se que aparecem o trem e o avião como meio de transporte. Se as casas que ali aparecem realmente já existiam, também não posso afirmar. Mas há automóveis, que, claro chegaram ali por rodovias.
A estação de Cianorte em 2011 (A Tribuna de Cianorte)
Cianorte hoje tem cerca de 83 mil habitantes. Porém, certamente não deve ela ao trem de passageiros esse crescimento, ao contrário, por exemplo, de Londrina e mesmo de Maringá. A linha prometida pela Rede de Viação Paraná-Santa Catarina em 1953 somente chegou a Cianorte em 1973, vinte anos depois de sua fundação e como ponta de linha - que deveria continuar até Umuarama, mas tal jamais aconteceu.

O primeiro trem correu nesse ano; quem fosse à cidade, no entanto, tinha de baldear para um trem menor em Maringá, até onde seguiam os trens que vinham de São Paulo via Ourinhos. Era, inclusive, um trem misto. Não durou muito. Para se ter uma ideia, quando acabaram os trens de passageiros para Londrina e Maringá, em 1982, a exten~soa para Cianorte já não funcionava.

A estação logo foi abandonada. Hoje, o pátio é inútil, trem cargueiro nenhum segue até ela, parando mesmo pelos lados de Maringá.

segunda-feira, 18 de março de 2013

NOSSO PORTUGUÊS VAI (MUITO) MAL


Os trechos abaixo foram recolhidos por mim durante quatro meses em e-mails, notícias de internet e posts no facebook e mostram a quantas anda nosso português.

Todas as frases abaixo têm pelo menos um erro. Algumas têm dois. E não são, nitidamente, erros de datilografia, não.

Todo mundo é sujeito a erros. Eu também. Mas erros destes tipos dão uma boa amostra de como anda o nosso português.

Decidi colocar os erros em vermelho. São 33 frases (ou pedaços de frases) no total. Divirtam-se.

1. Estou indo Rio Claro quase todos os meses

2. Nosso código de transito prevê multa para os que assim procedem, mais cadê os agentes?

3. pois viagei até de Maria fumaça nos idos de 56

4. Bernardo Figueiredo, afirmou que a operação do trem

5. Prezado Fornecedor, segue o demonstrativo de pagamento efetuado em 18/12/2012:
Total da Fatura;   Retenção de Imposto;         Total à Pagar;         Moeda
Total à Pagar :
Contas à pagar

6. Santos pretere Robinho à nova investida em Montillo

7. Estou super ancioso para a chegada.

8. QUEM VER PRIMEIRO, COMPRA!

9. Em vez de se vestirem de palhasos 

10. como se um navio ao largo encomodasse tanto assim 

11. o governo deveria dar uma olhada no trexo 

12. aguentavam mais o acedio 

13. destruirão a historia e a excelência (NOTA: ele estava se referindo ao tempo passado – “destruíram”)

14. devolvendo algo que nunca tinha deveria ter sido tirado 

15. que corta a cidade de extremo à extremo.

16. corta o município e o perímetro urbano sentido leste oeste

17. A realização do contorno, custaria aproximadamente

18. se eu ascender um cigarro eu explodo

19. Com áreas privatizadas e outras abandonada assim estão às antigas estações ferroviárias

20. Bom dia á todos

21. Talves foi uma das primeiras do Brasil

22. FELIS ANO NOVO A VC E FAMILIA

23. local onde aconteçeu a emboscada!

24. Que trageto seria esse?

25. A presidente Dilma e seu ministro Guido Mantega ficam se perguntando aonde erraram.

26. saiu do ostrasismo que estava

27. Subistituido não, pois em outra foto

28. tendo participado das investigações orgões de polícia

29. eu me precavio observando se os filtros

30. esqueçem - ou preferem não ver - a quantidade de

31. o procimo dece me chama em (NOTA: três erros em 6 palavras. O “em” é “hein”)

32. Fomos ensinados a não valorizar-mos como coletividade

33. Os posts ficam sugeitos a curtidas

domingo, 17 de março de 2013

VIAJAR DE TREM ERA ASSIM


Pois é, em abril de 1955, semana da Páscoa, quinta-feira, em frente à estação Julio Prestes formava-se uma multidão de pessoas para embarcar ou mesmo para comprar passagens no trem da Sorocabana para o interior de São Paulo.

Itapetininga, Sorocaba, Botucatu, Ourinhos, Assis, Presidente Prudente, Curitiba, Ponta Grossa, Londrina eram destinos muito procurados. E muitos outros, claro, afinal, somente em São Paulo eram mais de 800 quilômetros só de linha-tronco dessa ferrovia, fora os ramais e as conexões para o sul do País em Ourinhos e em Iperó.

É verdade, a ferrovia já dava sinais de decadência, mas a procura ainda era grande - afinal, as estradas eram em sua maioria de terra (como boa parte da Raposo Tavares, fora que a Castelo Branco nem existia) e o avião, caríssimo.

Se essa fotografia tivesse sido tirada hoje, o "bando de gente" à frente da estação não seriam passageiros - mas provavelmente noias e habitantes da infame cracolândia. A estação está bem ali no centro dessa desgraça. Lembremos, entretanto, que ali ainda é uma estação, embora dos trens que seguem para Itapevi, da CPTM. Só que o embarque e desembarque tem muito pouco movimento, tão pouco que os passageiros ou compradores de passagens dirigem-se para aquele último prédio da esquerda, baixo, que é a gare de embarque. Os escritórios da Sorocabana já sumiram dali há anos - como FEPASA, ocupou-os até 1998 - depois viraram escritórios do CONDEPHAAT e parte virou um teatro.

Eu ainda prefiro, de longe, as filas de 1955.

sexta-feira, 15 de março de 2013

CARTA DE LEO VAZ (1912)

Leo (esquerda) e Sud no parque do Guapira em 1920.

Leo Vaz foi redator e mais tarde chefe de redação do jornal O Estado de S. Paulo. Nasceu em Capivari, SP e foi grande amigo de meu avô Sud Mennucci, dos tempos em que esteve morando em Piracicaba. Morou em outras cidades, como Monte Alegre (hoje do Sul). Nos anos 1940, devido a divergências no jornal O Estado de S. Paulo, onde Sud também trabalhou e foi diretor na época da intervenção (1941-1945), romperam. Sud morreu em 1948. Leo morreu mais tarde.

Aqui, reproduzo uma carta de Leo a Sud, em 1912. Interpretem como quiserem. Vale pelo português da época e pelos assuntos, como a Alemanha pré- Primeira Guerra. Segue abaixo.

"Monte Alegre, 23/9/1912

Caro Sud.

Abraços.

Já andava, ha dias, com a penna na mão para repetir a dose enviada na minha ultima carta, suppondo que a não tivesses recebido por teres sahido de Piracicaba antes que ella lá fosse ter. Mas, antes que o fizesse, cá veio ter a tua carta de 28. Mais uma razão pois para por de parte a indolencia e executar a ideia.

Foi para mim uma surpreza ver no “Jornal” e na “Gazeta” a noticia da tua nomeação e partida para Dourado. Porque foi esse um projecto de que nunca me fallaste e que eu não suspeitava siquer que tivesses na cachola. Porque diabo abandonaste a Piracaia? Julgava-te definitivamente installado na Pedantopolis onde me parecia estares muito a gosto de teu genio mordaz e ironico: - tantos typos... É verdade que delles ha em todo o globo e, por certo, não os encontrarás em menor quantidade nesse Dourado, que por signal não sei onde fica e vou consultar a Geographia para descobrir a estrada de ferro que ahi vae ter.

Tens razão quando affirmas que conheço perfeitamente esse nosso proximo... Mormente agora que vim dar neste lugarejo onde esse senhor encontra todas as condições favoraveis para florescer. Tal qual como o da tua descripção, ha aqui um proximo adoravel. Desses mesmos que chegaram, em materia religiosa á nobre conclusão de que “a religião é indispensavel, porque é um freio!...” Mas eu me fiz accessivel a todas estas boas pessoas entre as quaes me divirto, observando-as em todas as faces da sua banalidade. De resto, teem para mim a serventia de se fazerem optimos parceiros para o bilhar, onde me proclamaram, graves e profundos, o primeiro taco! E acham, de certo, que me proporcionam, com isso, a suprema felicidade! Imagina agora, tu que o sabes, onde vão ter as aspirações litterario-philosophicas de um mortal, num recanto destes – na ponta de um taco!

Resta-me porem o consolo do trato diario com os nossos amigos invariaveis – os livros. E por fallar em tal, aproveito a occasião para completar a digestão de alguns que acabo de ler e dos quaes sinto necessidade de fallar com alguem que me entenda. E desses alguens bem conheces a abundancia...

Li, como ja te fallei noutra carta, as “Notas” de Eça. Deste livro nada tenho a accrescentar, pois que ja bem me conheces a opinião sobre o autor. A proposito – tinhas me promettido collaboração para o artigo sobre Eça, publicado pelo “Jornal” e, afinal vi-o sahir tal como o mandei. Porque te abstiveste de completar a parte referente ás obras que me faltam ler? É verdade que o mandei um pouco atrazado; mas, enfim, isso não constitue, absolutamente, um obstaculo.

Pois, palavra que não achei mais graça no artigo, sem a tua ajuda, porque, certo de que o farias, deixei ao teu cuidado as ultimas demãos. Mas é claro que alguma razão tiveste para assim proceder, portanto, vamos adiante. Li a “Origem do Homem” de Haeckel. O resultado dessa leitura, bem como da ultima que fiz da “Antiga e Nova Fé” de Strauss, foi o dar base scientifica ou philosophica a concepções velhas acerca dos factos e das coisas do Universo, concepções que, talvez por intuição, já eu tinha, como sabes, de me ter ouvido já, como sucedeu com Büchner e outros de que me fallaste, ha tempos, em cartas. A respeito porem, de Strauss, não posso deixar de te communicar a minha má impressão, vendo um allemão tão infantilmente allemão, ao lado do philosopho. Como julgo que se deu comtigo, foi para mim uma perfeita descahida a ultima parte dessa obra de Strauss em que elle se põe a prégar a monarchia e a endeusar a Allemanha, os allemães e, synthese de ambas as cousas – os Hohenzollern. Lembrei-me daquella passagem de Eça, quando diz existirem na Allemanha escolas philosophicas cujo fim é explicar, analysar, decifrar e, sobretudo, impor o Kaiser ás consciencias...

Com effeito, depois de se manter tão bem na primeira parte do livro, Strauss, para mim, infantilisou-se saxoniamente. Talvez o sangue latino seja quem me leva assim a fazer tal juizo ao autor que não perde vasa para depreciar o carater dos franceses. Seja! Mas si é esse preconceito de raça que me domina neste caso, elle é sobremaneira desculpavel diante do chuvinismo estreito e tolamente ingenuo da parte de um philosopho da envergadura de Strauss. Tambem não pude tragar o traductor da obra que, a todo instante oppõe notas aos conceitos do autor, levado por um tambem estreito sectarismo positivista. Depois desta leitura accendeu-se-me o desejo de ver o mesmo assumpto tratado por um latino, francez de preferencia. Indica-me pois, tu que tens lido mais do que eu nesse campo, um autor que, pelo menos seja razoavel. 

Quanto ao Positivismo, já que nelle tocamos, sempre o considerei uma doutrina tão secca, arida e estreita como toda outra religião e que, por isso mesmo que é uma Escola, me repugna ao espirito, porque sempre tive uma invencivel tendencia ao Livre-pensamento, mas tomado na sua exacta expressão, isto é, completa independencia no modo de encarar e resolver os problemas, sem me filiar a doutrina nenhuma, embora bebendo os principios naquellas que me parecem mais justas."

A carta não acabava aqui, mas a segunda folha desapareceu nas brumas do tempo.

quinta-feira, 14 de março de 2013

SEM FERROVIA, CASA BRANCA É UMA CIDADE DECADENTE

A estação de Casa Branca-nova, no Desterro.
A cidade de Casa Branca, no norte do Estado de São Paulo, é uma das cidades mais antigas da região, tendo aparecido por volta de 1810 nas proximidades do antigo Caminho dos Goiases, estabelecido no século anterior e que ligava a cidade de São Paulo à capitania de Goiás.
Trilhos em Casa Branca em 1934
Quando a Companhia Mogiana de Estradas de Ferro chegou à cidade em 1877, ou melhor, perto dela, contam os antigos que no final desse ano o Imperador Dom Pedro II, convidado para a inauguração da estação, ficou frustrado: as chuvas daquele ano atrasaram as obras e ele e sua comitiva tiveram de descer na estação do Aterradinho, a cerca de 6 quilômetros da entrada da cidade, e de lá seguir por carruagem em meio ao barreiro que se havia formado. Os trilhos paravam ali.
Trilhos em Casa Branca em 2000

A estação da cidade foi realmente inaugurada apenas em janeiro de 1878. Curiosamente, a linha passava pelo Aterradinho e seguia para a cidade, mas não por muito tempo. As obras para continuar a linha até Ribeirão Preto começariam em 1880 e a partir exatamente dessa estaçãozinha perdda no meio do nada. Com o ramal de Ribeirão Preto pronto em 1883, os trens agora vinham de Campinas, seguiam pelo Aterradinho até Casa Branca, voltavam pela mesma linha e seguiam, depois de parar novamente na estaçãozinha, seguiam para Ribeirão. 
A estação de Casa Branca-velha
Em 1887, o Aterradinho desapareceu e a linha passou a fazer uma grande curva para entrar na cidade e dali seguir para Ribeirão Preto. A estação de Aterradinho desapareceu, o trem agora seguia direto. Em 1887, um novo ramal da Cia. Ferrea Ramal do Rio Pardo, para São José do Rio Pardo, passou a sair da cidade, bifurcando-se da linha logo depois da estação de Casa Branca e seguindo para leste. 

O Ramal Ferreo foi comprado pela Mogiana no ano seguinte e posteriormente foi esticado até Mococa e Canoas, esta na divisa com Minas, com um ramal para Guaxupé.
Casa Branca já teve rotunda, derrubada há muito tempo.
No final dos anos 1940, uma variante, a Lagoa Branca-Tambaú, alterou o traçado de 1887. A linha-tronco passou a seguir para Ribeirão pelo sul da cidade, sendo construída uma estação nova no bairro do Desterro (Casa Branca-nova). A estação velha passou a fazer parte do ramal de Mococa, que passou a ter seu ponto inicial no Desterro.

Em 1991, o ramal de Guaxupé foi extinto. O de Mococa havia-o sido em 1966. A estação velha passou a ser a ponta de um curtíssimo ramal mantido apenas para o movimento de trens entre as estações velha e nova. Hoje, essa pequena linha também não existe. Não há ligação entre as duas estações. 

Quanto a Casa Branca, com seus enormes armazens de café e entroncamento de um ramal bastante movimentado e que se unia com a Rede Mineira de Viação já em Minas, não tem mais nada disso. É hoje uma cidade decadente, não tendo nem de longe a riqueza e importância que teve na primeira metade do século XX. A falta da ferrovia a matou.

quarta-feira, 13 de março de 2013

A PRESIDENTE DA REPÚBLICA GANHA PRÊMIO DE FERROVIÁRIA DO ANO - ALGUÉM EXPLICA POR QUÊ?


Nossa presidente foi eleita pela Revista Ferroviária, de meu amigo Gerson Toller, como a "Ferroviária do Ano".

Realmente, uma escolha política (que não foi do Gerson, mas o resultado de uma votação) lamentável.

Não vem ao caso aqui eu gostar ou não gostar da Presidente Dilma ou de seu partido político. O que eu fico  muito, mas muito surpreso mesmo, é que alguém que não entende coisa alguma de estradas de ferro, nem tenha conseguido até agora completar qualquer obra ferroviária sob sua responsabilidade, tenha sido eleita com esse título neste ano da graça de 2013.

A Trasnordestina caminha a passos de tartaruga. A Norte-Sul está parada. A ferrovia Oeste-Leste não sai do papel. Outras obras não-ferroviárias, mas não menos importantes, sendo a principal delas a transposição do São Francisco, ou não avançam a velocidade nem razoável ou estao paradas. Muitas estão atrasadas.

A Sra. Dilma Rouseff foi eleita como sendo uma "gerentona", que gerenciava com mão de ferro as obras do PAC - Plano de Aceleração do Crescimento, plano criado durante o governo do seu antecessor, Luiz Inacio da Silva. Se era naquela época uma gerentona, eu não sei. Hoje, ela certamente não é.

Dirão muitos que o cargo dela não é de fiscalizar obras. Pode até ser. Mas ela teria então a obrigação de colocar gente que entenda do riscado para tocar as obras importantes de infra-estrutura. Ela não faz isso. Se fizesse, não estaria tudo do jeito que está.

Teria ela ganhado por insistir com o TAV? Mas só insistir não adianta. Há quatro anos, o TAV está na berlinda e os editais e licitações são apenas empurrados sempre um ano para a frente, todo santo ano. Em termos concretos, não avançou nada. E talvez nunca venha a avançar.

Escolher a presidente do Brasil para ser a Ferroviária do Ano só desmerece e desvaloriza o prêmio da Revista Ferroviária. E desmoraliza também as ferrovias brasileiras mais ainda, como também outras obras pendentes.

Há cerca de treze anos, a mesma revista escolheu o Governador Mario Covas como Ferroviário do Ano. E ele havia acabado de entregar a FEPASA, empresa estadual e a segunda maior ferrovia do País, à RFFSA, que na época estava moribunda e quase em estado de liquidação, e a um valor ridiculamente baixo. Foi preço de sucata. E por mais que queiramos exagerar, a FEPASA estava mal das pernas por absoluto abandono, mas não era realmente sucata. São Paulo perdeu suas ferrovias e jamais as recuperou. As concessionárias pouco se lixam para o Estado, que é praticamente um estado de passagem para as linhas que sobraram.

Mario Covas foi outro vexame em termos de ganhar esse prêmio.

Deus salve o Brasil.

terça-feira, 12 de março de 2013

POBRE BAURU


Leonardo Bloomfield, fotógrafo de ferrovias, admirador de trens e antigo funcionário da RFFSA, escreveu, para a foto acima de sua autoria, que mostra o pátio da estação de Bauru por volta de 1960: "Esta foto fui eu tirei da janela do meu quarto, num pequeno hotel que me hospedava sempre em Bauru, e de onde eu controlava o movimento ferroviário. A linha a esquerda é da Sorocabana, com destino a Rubião Júnior e Botucatu, para São Paulo. A do meio é da Paulista, rumo a Marília e Panorama. E a em curva, é da Noroeste. Infelizmente nada mais disto existe. Já foi tudo depenado e o mato tomou conta".

Bauru, Estado de São Paulo, foi por muito tempo chamado de maior entroncamento ferroviário do Brasil. No duro, não era. Mas era um entroncamento raro, que reunia três ferrovias diferentes e grandes: Noroeste, Paulista e Sorocabana. Bauru cresceu muito por causa dele.

A Sorocabana chegou primeiro, em 1905, construiu uma estação mirradinha, mas típica dessa ferrovia em termos de arquitetura, estaçãozinha de fazenda. Embora por muito tempo Bauru tenha sido a estação terminal da linha-tronco dessa ferrovia, ela jamais amploiu o prédio. A linha-tronco, a partir dos anos 1930, passou a correr de Botucatu para Presidente Epitácio e, em 1939, a Noroeste resolveu construir uma estação só para as três ferrovias.

A Paulista, que também tinha a sua estação, nenhuma grandiosidade mas bem maior do que a da Sorocabana, também largou seu prédio ali para fins administrativos após 1939.

Hoje, os três prédios, as três estações continuam lá. A única realmente abandonada é justamente a maior, a da Noroeste. Este prédio tem vários andares e era também onde ficavam os escritórios centrais da E. F. Noroeste do Brasil. Em 1993, acabaram os trens de passageiros que dali saíam para o Mato Grosso, mas ficaram os que chegavam de São Paulo pela antiga Paulista - FEPASA, então. Em 2001, melancolicamente, tudo acabou. O prédio já estava abandonado.

Hoje, poucos trilhos, poucos desvios. Poucos trens, até. Todos cargueiros, da ALL. As três linhas da antiga ferrovia ainda estão ali, mas é tudo passagem apenas. Chegam da linha da Paulista e da Sorocabana e entram para a Noroeste. Para a Alta Paulista, não mais. Uma tristeza. Tudo no abandono, tudo uma enorme sujeira.

segunda-feira, 11 de março de 2013

DESERTO, PI: UMA FERROVIA ESQUECIDA


Eu jamais fui à estação ferroviária de Deserto, no Piauí. Provavelmente nunca irei, não por não querer, mas pela distância de tudo. Investiguei a estação para meu site e obtive praticamente nada. Porém, recentemente dois colaboradores mandaram-me, um, fotos da estação e da antigo depósito (que virou igreja com torre e tudo) e outro, fotos do Google que mostram do alto um enorme triângulo ferroviário - sei lá se com trilhos ou não.

Em frente à velha estação, pelo menos, há trilhos. Dá para ver nas fotos. Os trens não passam há pelo menos quinze anos... talvez mais. A linha foi totalmente abandonada, e há pedaços que foram roubados. Essa velha linha, da E. F. Central do Piauí, começou a ser construída no final dos anos 1910 e foi terminada somente em 1967, quando se uniu à linha que unia o oeste do Ceará à capital piauiense, Teresina. Até então, era uma linha isolada, que ligava o pequeno litoral do Estado, em Parnaíba, ao interior do Piauí, num beco sem saída.

Em 1950, a localidade possuía cerca de 55 casas e cerca de 300 habitantes. Hoje, pelo menos pelo que se olha no Google, possui bem menos. Há uma rodovia que cruza a vila bem no meio do triângulo - veja a figura. A estação está abandonadíssima: é de 1923 e somente está ainda de pé porque Deus assim o quer. Já o vilarejo sobreviveria de que? Está no meio do deserto, se não de areia, de gente, de tudo. Pertence ao município de Piracuruca... talvez. Pode ser outro. Não encontrei nenhuma indicação que diga a quem pertence esta terra perdida.

Suponho que seja um lugar muito quente. Não saberia dizer se teria eletricidade, realmente. Talvez não. Baixo em relação ao mar (167 metros de altitude), deve ser um forno. Se alguém conhecer a cidade ou a região, poderá dizer-me se estou falando bobagem ou não. E - olhem - existiu uma outra estação com o mesmo nome, na antiga Funilense, em São Paulo, região de Paulínia. Desta, não encontrei traços.

Agradecimentos a Roosevelt Reis, que me enviou as fotos, a Jansenn Arco Verde, que tirou as fotos, e a uma terceira pessoa que me enviou o Google, mas que não consegui identificar na mensagem.

sábado, 9 de março de 2013

A PRIMEIRA FERROVIA DO PAÍS, MORIBUNDA - E QUEM SE IMPORTA?


No último dia 7 de março, o Diário de Petrópolis publicou a seguinte notícia:

"MPF denuncia ex-prefeita de Magé por aterrar parte da primeira ferrovia do país

Rio de Janeiro - O Ministério Público Federal (MPF) de São Gonçalo, na região metropolitana do Rio, ofereceu denúncia contra a ex-prefeita de Magé, Núbia Cozzolino, e o então secretário de Manutenção Pública do município, Paulo Afonso Abreu de Oliveira, por dano ao patrimônio cultural.

Em 2009, os dois autorizaram obras no distrito de Piabetá que aterraram parte dos trilhos da Estrada de Ferro Mauá, bem tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Inaugurada em 1854 pelo imperador dom Pedro II, a ferrovia foi a primeira do país.

De acordo com a denúncia do procurador da República Lauro Coelho Junior, encaminhada à 1ª Vara da Justiça Federal de Magé, a infração foi constatada pelo Iphan em fiscalização feita em 14 de julho de 2009. Na ocasião, as obras foram embargadas e o município de Magé multado. Embora o Iphan tenha determinado a recomposição do trecho aterrado, a prefeitura de Magé não paralisou as obras.

No dia 27 do mesmo mês, o Iphan fez nova fiscalização, em conjunto com o Ibama e a Polícia Federal, verificando que os trilhos permaneciam aterrados para posterior pavimentação da área. Presente no local, o ex-secretário Paulo Afonso de Oliveira confirmou a intenção de construir no local um terminal de vans e um acesso direto ao centro de Piabetá.

Para o MPF, os denunciados desrespeitaram a legislação que protege os bens tombados e persistiram no dano mesmo após o embargo imposto pelo Iphan. Na denúncia, o MPF propõe a Paulo Afonso de Oliveira a suspensão condicional do processo, uma vez que a pena mínima prevista para o crime é de um ano. O mesmo benefício foi concedido a Núbia Cozzolino, contra a qual tramitam diversos processos judiciais. 

Membro de uma família que dominou por décadas a política em Magé, Núbia Cozzolino foi deputada estadual e prefeita do município por dois mandatos, a partir de 2004. Com uma gestão marcada por denúncias de corrupção e processos, ela foi afastada do cargo pelo Tribunal de Justiça em setembro de 2009. Núbia teve o mandato cassado e os direitos políticos suspensos por cinco anos.

Quase quatro anos depois do dano à Estrada de Ferro Mauá, o Iphan tem hoje uma relação completamente diferente com a prefeitura de Magé, no que se refere à preservação do patrimônio cultural. Segundo informou à Agência Brasil a assessoria de comunicação do órgão, no último dia 28 representantes do Iphan se reuniram com o atual prefeito, Nestor Vidal.

Do encontro resultou a assinatura de um termo de cooperação técnica entre a prefeitura, o Iphan e a Secretaria do Patrimônio da União (SPU), prevendo a recomposição do trecho aterrado e a revitalização de toda a linha e do museu que conta a história da ferrovia histórica."

Meu Deus do Céu, neste país se faz mesmo o que se quer. E apesar da tal Nubia ter perdido o mandato (se é que perdeu mesmo, pode ter recorrido e ficado com ele), o que é que ela realmente sofreu? Nada, pois nem foi para a cadeia (se bem que mante-la na cadeia nem resolve, o que resolveria seria arrancar os bens dela até a última gota de forma que pagasse todos os prejuizos e tivesse de morar debaixo da ponte).

Bom, assombros meus à parte, volta o problema: de que adianta manter a linha e a estação se não há policiamento? Esta linha vai continuar sendo roubada e a estação vai continuar sendo depredada (já perdi a conta de quantas vezes ela foi "reinaugurada". O lugar, embora eu nunca o tenha visitado, parece ermo o suficiente para permitir que as hordas de ignorantes e pobres sem esperança (este é o grande problema deste país, a falta de esperança, perigo potencial enorme e que ninguém do governo pareceu até hoje com ele se importar).

Qual a solução para isto? A solução seria um trem de linha, não turístico, para servir à população da área, rodando constantemente pela linha e diminuindo a possibilidade de ataques ao seu patrimônio. Um trem de linha que jamais deveria ter sido retirado em 1962 justamente por atender um local tão carente.Um trem turístico, que faz viagens apenas em finais de semana, não seria suficiente para conter o vandalismo.

Para finalizar: será que nós, defensores de ferrovias e por tabela da memória nacional, estamos corretos em teimar em manter locais "sagrados" como este e outros mais? Afinal de contas, parece-me que somos uma minoria tão pequena que não percebemos que a grande maioria pouco se importa com essas coisas e cuja opinião em boa parte das vezes é "eu quero que a ferrovia, que a memória, que essas velharias, que essas porcarias se lixem". Por fim, podem acabar com tudo!". Parece-me, realmente, que os errados somos nós. 

Agradecimentos a Antonio Pastori.

terça-feira, 5 de março de 2013

MAIS TRENS DE PASSAGEIROS PARA O BRASIL: MAIS PAPO FURADO?

Trem chinês de alta velocidade
O jornal Valor Econômico de hoje apresenta uma reportagem falando sobre "Planos para trens de passageiros envolvem 9 Estados". Chamam-nos de "trens de passageiros intermunicipais" ou de "trens regionais". Realmente, nomes interessantes e pertinentes, mas, convenhamos, mais um delírio jornalístico?

Como sempre, eu, cá em minhas preces, gostaria muito se tal acontecesse - mas, como sempre, estou descrente dessas iniciativas. Os nove estados em questão são: Goiás, Minas Gerais, Maranhão, Piauí, Bahia, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.

A reportagem, longa (pode ser vista aqui) e passa por um histórico: "Depois de um levantamento do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que apontava 64 trechos potenciais de ferrovias que poderiam receber passageiros, o Ministério dos Transportes escolheu 14 trechos prioritários para estudos em 2011. Depois de dois anos, seis estão em execução pelo órgão e um pelo governo de Minas Gerais e devem ser concluídos até o fim do primeiro semestre. Depois dos estudos, serão feitas consultas públicas e a intenção do Ministério dos Transportes é lançar os editais até o fim do ano para que as obras comecem no início de 2014".

Essa história do BNDES vem desde o ano 2000. São treze anos já. Por que acreditar que os editais saiam todos em 2014? Nestes últimos anos, o governo do PT, já há dez anos instalado no país, não aprendeu ainda a gerenciar obras: nem ferroviárias, nem rodoviárias, nem da famosa transposição do São Francisco, para citar algumas somente. Será que, de repente, aprenderiam?

Contra tudo isso, há vários entraves: a má vontade das concessionárias cargueiras, não somente nas linhas operativas quanto nas abandonadas, porque "pode ser que venhamos a usá-las"; o mau estado das linhas operativas (quem cuidará delas? As concessionárias cargueiras ou o concessionário do trem de passageiros? Lembramos sempre que a manutenção para passageiros tem de ser bem mais rigorosa que para os cargueiros)...

Enfim, Deus sabe a resposta. As linhas citadas são: Londrina-Maringá (linha operativa), Bento Gonçalves-Caxias do Sul (linha abandonada há pelo menos dezessete anos, São Cristóvão-Laranjeiras (SE - linha semi abandonada), Recife-Caruaru (PE- linha arrancada), Campos-Macaé (linha semi-abandonada), Itajaí-Rio do Sul (linha arrancada há 42 anos), Campinas-Araraquara (linha de alto tráfego cargueiro), Brasília-Goiânia, Brasília-Luiziânia, Santa Cruz-Mangaratiba (linha com alto tráfego de carga), e Bocaiúva - Janaúva (linha cargueira).

 Os projetos prevêem ainda que os trens atinjam de 80 a 140 quilômetros por hora para encurtar, em alguns casos, o tempo de percurso atual. Se olharmos o que eles pretendem fazer, veremos que, para isso, as linhas já existentes não poderão ser utilizadas - são muito antigas para permitir tal velocidade. Cita ainda Salvador-Praia do Forte (BA), Recife-Porto de Galinhas (PE), Natal-Praia da Pipa (RN) e Fortaleza-Canoa Quebrada, linhas novas, que teriam de ser construídas. Sinceramente, parece mais uma notícia saída de uma tese universitária, onde os alunos põem a imaginação para girar...

segunda-feira, 4 de março de 2013

CHINA X BRASIL, A FERRARI CONTRA O JEGUE


É realmente decepcionante ver o que o Brasil não está fazendo na questão ferrovias.

Não sei quanto a China está investindo nas ferrovias dela, mas é muito dinheiro e como uma rapidez muito maior do que nós tartaruguinhas aqui.

Tudo o que sei é que, quando eu era moleque, nos anos 1960, a China era um país atrasado, com um ditador comunista comandando um regime retrógrado e fazendo extermínios em massa. Convém dizer que no início do século XX a China não tinha um regime desses, mas estava muito atrasada em relação aos europeus.

O Brasil, nos anos 1960, por sua vez, começou a investir pesado na sua industrialização, principalmente na parte automobilística, enquanto começava a arrasar suas ferrovias. Ainda assim, somando-se tudo, vislumbrava-se para este país um futuro muito mais brilhante do que para os chineses.

Eis que, cinquenta anos depois, os chineses estão aí ameaçando a supremacia americana no mundo. Somente para citar as ferrovias, eles estão investindo tudo o que as duas fotos que aqui publico sugerem. Trata-se da estação e do pátio ferroviário do trem que liga Beijing, a antiga Pequim, a Shanghai. Sim, é um trem-bala, construído no mesmo tempo em que aqui o governo faz estudos e estudos para o trem-bala São Paulo-Rio e não chega a conclusão nenhuma, porque nem licitação sabe fazer direito.

Tudo o que o Brasil conseguiu nos últimos anos em termos de trens foram algumas linhas turísticas de curtíssimo percurso, muitas delas conduzidas por máquinas a vapor centenárias. É uma vergonha.

sábado, 2 de março de 2013

A BARONESA DE ARARY

O palacete da Baronesa de Arary (desenho)

Então... corria o ano de 1951 e a Baronesa de Arary morreu em sua casa na avenida Paulista, esquina com a rua Peixoto Gomide, ao lado do Parque Siqueira Campos e muito próximo ao Trianon. A família imediatamente vendeu o terreno para uma construtora, que ali erigiu um enorme prédio de apartamentos residenciais que levou o nome da baronesa.

O Trianon desapareceria na mesma época, dando lugar, quatorze anos depois, ao Museu de Arte de São Paulo - o MASP.

Duas construções que desapareceram e não deveriam.

O Trianon era da Prefeitura, que podia muito bem ter mantido o casarão utilizado para festas, em estilo típico do início do século 20. A casa da Baronesa era de sua família. Talvez até precisassem tê-la vendido, realmente não sei. Os herdeiros nem sempre se mantêm ricos. Mas qual a razão que leva alguém a vender uma obra dessas, de arquiteto famoso (no caso, Victor Dubugras) e arquitetura realmente bonita (para meu gosto, pelo menos)?
O prédio, como apareceu na propaganda de lnaçamento das obras. Ele ainda existe e é isso mesmo. Vejam a reprodução de uma demolição no canto esquerdo superior (deve ser o que restava do palacete) e também a avenida Paulista... cujos trilhos do bonde existiam, mas não foram desenhados. A rua que saí à direita é a Peixoto Gomide.

Pode ser necessidade de dinheiro, ou mesmo o recebimento de uma oferta "irrecusável". Não acredito que naquele tempo o IPTU da avenida Paulista fosse caríssimo como é hoje, fato que levou muita gente a vender casarões anos mais tarde na mesma avenida. Seja qual for, qual seria a alternativa?

Realmente, viver em uma casa como essa, com o tamanho que tinha, não é fácil hoje em dia. Mesmo em 1951 já não era. A criadagem necessária para mantê-la já não recebia o salário de fome da virada do século, e eram muitos. Hoje, então, nem falar. Creio eu que as únicas alternativas para manter a casa seriam: 1) transformá-la em um museu, como os castelos da Europa; 2) transformá-la em um hotel caríssimo (teria de ser, pois o número de quartos seria pequeno). 3) fazer o que muita gente faz nos Estados Unidos, por exemplo: reformar o interior da casa para transformá-la em um condomínio de apartamentos. A parte externa, as fachadas, são sempre mantidas inalteradas.

Hoje, algumas pessoas ainda pensariam nisso. Em 1951, dificilmente qualquer uma dessas ideias passaria pela cabeça da família e mesmo da prefeitura. Vejam o que aconteceu com o Trianon.

Só para completar: uma construção de esquina, provavelmente dos anos 1910, teve uma de suas fachadas derrubada por ela mesmo na avenida da Liberdade, esquina da rua Condessa de São Joaquim, há dois dias atrás. Era um bar; talvez tenha sempre o sido, com exceção do segundo andar, que deveria ser originalmente pequenos apartamentos para o dono viver ou alugar. O prédio era bonito, mas dele somente restavam as fachadas - a parte interna estava sendo totalmente reformada. Hoje ele foi demolido por apresentar risco de cair (o que sobrou). Não seria fácil mantê-lo, pois estava tudo muito instável, mas a cidade perdeu outro belo exemplar. Nada tão bonito, no entanto, quanto o Palacete da Baronesa de Arary.

E respeitosamente, devo lamentar a morte de um pedestre de 50 anos que era a única pessoa que por ali passava quando a parede ruiu. Que fique em paz.

sexta-feira, 1 de março de 2013

CRAVINHOS-VELHA E CRAVINHOS-NOVA

Placa da estação de Cravinhos-nova

A placa acima é da estação de Cravinhos. Cravinhos-nova, quer dizer, antes dessa, houve uma outra em outro lugar. Mais precisamente, junto à cidade de Cravinhos, estação que foi a responsável pela existência dessa cidade paulista.

Cravinhos-nova foi aberta em 1964, desativando a Cravinhos original, situada a nove quilômetros dali. Sim, Cravinhos-nova era - e ainda é - isoladíssima. É evidente que depois dessa troca, pois a linha mudou de lugar, os habitantes de Cravinhos passaram a se utilizar cada vez menos do trem da Mogiana. Afinal, para chegar nessa estação, ao contrário da velha, encostada no centro, era preciso condução. Condução que não havia, em uma estrada de terra.
Cravinhos-nova (Dimas Ornellas)

O mínimo que se podia esperar, já que a variante, chamada de Bento Quirino-Entroncamento, teria de passar muito longe dali para ser uma linha melhor e mais vantajosa para a Mogiana, era que a empresa ou a cidade se preocupasse em colocar condução conveniente para o horário dos trens, de três a quatro por dia, e uma estrada decente. Nada disso. Tudo isso ficou na promessa. Resultado: o trem desapareceu para Cravinhos como opção de transporte.

Cravinhos-nova foi por algum tempo a estação E-2. Como E-1 era Canaã-nova, E-3 era Engenheiro Souza Mendes e E-4 era Evangelina-nova. Vejam que havia outras estações com versões novas. Só que o que está escrito na placa hoje - trens de passageiros não passam ali desde 1997 - é provavelmente diferente do que originalmente estava escrito na placa que está fotografada lá no alto deste artigo.
Cravinhos-velha

Reparem na placa. Para um lado, São Simão. Originalmente, havia entre essas duas estações a de Canaã-nova. Significa que, depois de algum tempo, esta última foi fechada por falta de movimento. O mesmo aconteceria com Engenheiro Souza Mendes, que ficava entre Cravinhos-nova e Evangelina-nova. Desta, nem fotos existem. Foi demolida há muitos anos e ficava também em local bastante isolado. Para se chegar a este pátio hoje, só com gente que conheça as estradinhas rurais por ali. São poucos.

E assim, por atitudes como estas, de uma empresa que já não se importava mais com seus passageiros, mesmo ainda correndo com seus trens, que estes foram se acabando. Até chegar a como estamos hoje: sem nada.