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sexta-feira, 16 de setembro de 2016

A HISTÓRIA DE QUE NÃO SE FALA - 1931

Mapa do município de Jaboticabal em 1931. Há 6 linhas férreas mostradas ali: o ramal de Jaboticabal (da Cia. Paulista), a linha da E. F. São Paulo-Goiaz (de Bebedouro para noroeste), a linha da E. F. Monte Alto, o ramal de Jaboticabal, da E. F. Jaboticabal (deste estação para o norte), a linha-tronco da Cia. Paulista (acompanha o Mogy-Guassu até Pitangueiras e dali a Bebedouro) e a linha Tayuva-Tayassu, que praticamente nunca operou, embora tenha sido construída e aberta em 1928). Fora essas, a E. F. Araraquara passava por Catanduva, mas não foi traçada neste mapa. Este mapa foi publicado no jornal O Estado de S. Paulo e no livro de Sud Mennucci.

A situação dos municípios paulistas (e brasileiros) era muito estranha em 1931 e bastante diferente do que é hoje. O Estado tinha pouco mais de 200 municípios (hoje tem mais de 600) e a divisão era feita de forma totalmente aleatória. Nesse tempo, as estradas de rodagem eram poucas, nenhuma pavimentada, automóvel era coisa de rico - rico, mesmo - e a opção eram os trens e andar a pé.

Então, os municípios com ferrovias eram privilegiados. Só que, na maioria deles, a ferrovia cobria apenas uma parte pequena do seu território. Portanto, distritos de municípios vizinhos, muitas vezes, tinham muito mais facilidade em ter acesso a serviços e transportes de um município ao lado.

Meu avô Sud Mennucci escreveu um livro, "Brasil Desunido", que ele lançaria em 1932, livro este que teve boa parte dele escrito no final de 1930 e no início de 1931 nas páginas do jornal O Estado de S. Paulo.

O caso de Jaboticabal foi citado por ele, com mapas, inclusive (ver o mapa acima). O livro o explica, mas a carta do morador de Catanduva, aqui transcrita, mostra claramente essa situação, mantendo-se as palavras de seu escritor, de nome Odilon Nogueira (que não é, até onde pude concluir, o autor do livro sobre ferrovias de São Paulo (1987), Odilon Nogueira de Mattos).

A partir de 1934, a situação dos municípios paulistas alterar-se-ia radicalmente, com mudanças drásticas nos seus territórios. Meu avõ Sud participou da comissão que fez essa redivisão. Há diversos tópicos neste blog (de nome "A História Secreta dos Municípios Paulistas"), postadas há cerca de 2 ou 3 anos.

A carta abaixo dava uma ideia de uma situação que ocorria na época no município de Jaboticabal (com área muito diferente da de hoje) e foi transcrita mantendo-se o português da época (aliás, notem a quantidade mínima de acentos, o que era bom).

Trecho da carta de Odilon Nogueira, escrita em 2 de janeiro de 1931 para Sud Mennucci.
"Li, com a atenção que sempre me mereceram os seus trabalhos, seu artigo de hoje no“Estado”, parte VIII da série “Brasil Desunido”.

Suas observações sobre a pessima divisão municipal do Estado, que hoje se illustraram com o exemplo de Jaboticabal, de ha muito são assunto de comentario nesta zona. É mesmo uma velha aspiração dos habitantes do distrito de Vila Novaes e sua incorporação ao municipio de Catanduva, em cuja sede se encontra o seu verdadeiro entreposto comercial. Basta dizer que a estação da estrada de ferro de que se serve esse distrito é a de Catanduva, de onde o chamado Bairro do Corrego Grande, naquele distrito, apenas dista meia duzia de kilometros, quando mais de cem, talvez, o separam da séde do municipio de Jaboticabal.

É facilimo de ver que de inconvenientes traz isso ao povo, notadamente no que concerne á distribuição da justiça.

Tambem o distrito de Palmares, no municipio de Monte Alto, faz todo seu comercio com a cidade de Catanduva e serve-se da sua estação ferrea.

As divisas de Palmares ficam bem proximas á cidade de Catanduva e entre as respectivas sedes medeiam somente 18 kilometros.

A divisão judiciaria desta zona apresenta identicos dispauterios. Assim, o municipio de Pindorama que traz suas divisas a 3 kilometros da cidade de Catanduva, de onde sua séde dista 9, pertence á comarca de Taquaritinga,a mais de 70 kilometros! O municipio de Mundo Novo, tambem tributario da estação de Catanduva, com 40 kilometros de percurso, faz parte da comarca de Itapolis, a mais d 100 kilometros.

O habitante da cidade de Mundo Novo para procurar a justiça tem de vir a Catanduva (40 kilometros por estrada de rodagem) w daqui, fazer mais 70 para alcançar Itapolis!

Urge que tudo isso seja reorganizado. E a sua campanha jornalistica nesse sentido é uma iniciativa digna de aplausos. Foi para vir apresentar-lhe os meus sinceros e efusivos, que me permiti a liberdade de escrever-lhe.

Patricio e admirador, Odilon Nogueira, Catanduva, 2 de janeiro de 1931."

terça-feira, 28 de outubro de 2014

A HISTÓRIA SECRETA DOS MUNICÍPIOS PAULISTAS - PARTE VII (MARÍLIA)

O Estado de S. Paulo, 4/4/1929
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Este artigo é a continuação da parte VI do tema, postada em 26 de outubro. A data do escrito original - um parecer de meu avô, Sud Mennucci, bastante longo, daí a divisão em partes - e fala sobre a cidade de Marília, fundada em 1928 e elevada a município já em 1929, separada de Campos Novos. Ele escreveu o parecer sobre Marilia assim:

"MARILIA - É um municipio, hoje, enorme (nota deste autor: o longo parecer foi escrito em 1 de fevereiro de 1935), rico e prospero, mas que o avanço da Companhia Paulista (de Estradas de Ferro), tirando-lhe a regalia de "ponta dos trilhos", vae obrigar a seccionar, como aconteceu a todos os seus irmãos em identica situação.

Os seus dirigentes pleitearam e obtiveram, para o districto de paz da séde, a faixa compreendida entre os rios Tibiriça e Caingang, incidindo assim na forma geographica que está atualmente dando dores de cabeça a Jaboticabal. Os municipios que apresentam esse aspecto não estão nunca seguros de poder manter a sua integridade territorial porquanto a população que reside nessa esguia nesguia de terreno, invariavelmente situadas mais proximas de outras entidades - neste caso é Pompéa - têm sempre de lutar com o azedune dos seus juridicionados, descontentes com a divisão territorial.

Em compensação, toda a larga faixa de terra que vae do ribeirão Mombuca até o espigão Rio Novo-Santo Ignacio, na margem esquerda dos rios do Alegre e do Peixe, que deveria, sem a menor objecção, pertencer a Marilia e no entretanto continua inexplicavelmente com Campos Novos, precisa ser  urgentemente transferida para o pujante municipio da Alta Paulista, não só porque constitue isso a melhor solução como comunidade das populações, como tambem para compensar Marilia do rude golpe que lhe leva Pompéa, coma sua improrrogavel elevação a municipio.

O mesmo criterio de compensação a Marilia, dentro do espirito de justiça, fez a Commissão conceder-lhe o alargamento das divisas, ao norte, pelo rio Padua Salles."

Aqui, o dificil é saber onde estão esses rios citados. Rios mudam de nome com o tempo, especialmente numa época em que ekes cada vez menos deixam de ser referência, à  medida que as matas vão desaparecendo e em seu lugar grandes fazendas de gado, canaviais e urbanizações. De acordo com Fabio Vasconcellos, o ribeirão do Alegre é hoje conhecido como Rio da Garça. Desagua no Rio do Peixe, próximo do ponto onde passa a atual BR-153. O Padua Salles mantém essa nomenclatura e é atualmente a base para a divisão dos municípios de Marília e Guaimbê. O Rio Santo Inácio corre pelos lados de Lupércio.

(Continua...)

sábado, 1 de setembro de 2012

VELHAS RIXAS FERROVIÁRIAS

Estação de Cruzeiro, em 2010 - foto Thiago Henrique Teixeira

Quando neste país as ferrovias eram respeitadas e tinham todas elas seus trens de passageiros circulando noite e dia, surgiam as velhas rixas entre cidades, causadas pelo orgulho de cada uma delas tinha de sua cidade, sua estação, seus trens.

Até os anos 1950/60, quando começou a era do "automóvel mais barato para todos", ruas pavimentadas e ônibus circulando para as áreas mais afastadas, as cidades brasileiras eram pequenas em geral e com um povo que delas gostava. Aquela área que se chamava de área urbana e que muitas vezes terminava bruscamente num portão de fazenda, numa grande fábrica ou depósito ou mesmo na linha do trem e sua estação era a cidade realmente.

Até hoje, não é muito difícil, mesmo para quem não conheceu essa época, delimitar a "cidade velha", cujos limites pouco se alteraram entre a fundação e os anos 50 do século 20. Basta olhar as casas, a saída de ruas tortuosas, velhas estradas rurais, o limite da linha do trem ou da área rural que em muitos casos ainda sobrevive.

Nos anos 1910 e 1920, a Cia. Paulista de Estradas de Ferro começou a expandir sua linha-tronco para o rio Grande, primeiro colocando a bitola larga entre Rio Claro e São Carlos no ligar da bitola métrica oriunda ainda da Rioclarense. Em 1928, a linha estava alargada até Rincão, próxima ao rio Mogi-Guaçu.

Desta estação, saíam duas linhas métricas: uma, que seguia para Guatapará, onde cruzava o rio e dali para Pitangueiras, onde começava a São Paulo-Goiaz. Também saía outra que se mantinha à margem esquerda do mesmo rio e seguia para Bebedouro e Barretos. Durante os anos 1920 a Paulista recebeu inúmeros apelos da prefeitura da cidade de Jaboticabal, que pertencia à linha-tronco métrica que seguia de Rincão para Barretos a oeste do Mogi-Guaçu, para que a linha fosse alargada por ali. Era o que parecia lógico e o que se esperaria.

Porém, no final, alegando motivos de melhor localização da linha e de topografia mais favorável, a Paulista acabou por decidir-se por seguir pela margem leste do rio, comprando para isso o trecho da São Paulo-Goiaz entre Passagem e Bebedouro e alargando a linha de forma a cruzar duas vezes o rio Mogi: uma vez em Guatapará e outra em Passagem, o que a fez reconstruir essas duas pontes. O alargamento seguiu até o rio Grande, em Porto Cemitério, hoje Colombia.

A cidade de Jaboticabal não se conformou com isso. Alegou que a linha somente passou pelo outro lado por causa das terras dos Prado, na época os maiores acionistas da ferrovia. A cidade de Bebedouro, que no final teria bitola larga qualquer que fosse o caminho escolhido, lançava inúmeras provocações caçoando de Jaboticabal. A Paulista foi praticamente excomungada e amaldiçoada nesta cidade.

Até meados dos anos 1940, a cidade tentou ter a sua linha alargada, pois, depois de 1930, essa linha métrica passou a ser o "ramal de Jaboticabal", ligando Rincão a Bebedouro, desvalorizando os terrenos e investimentos na cidade. Em 1946, a cidade pediu à Paulista o alargamento, também não concedido. No final, em 1969, o ramal foi eliminado.

Também em Cruzeiro, linha da Central do Brasil, neste mesmo ano de 1946, havia um trem de passageiros chamado de "Expressinho" (ou, oficialmente, o trem SP-5), que ligava a cidade a São Paulo, saindo de lá às 5 da manhã e chegando de volta à meia-noite. Este trem era parados, ao contrário do Cruzeiro do Sul, na época o trem Rio-São Paulo de luxo da Central.

Veio então a ferrovia e mudou o ponto inicial da linha para Valparaíba (que era como se chamou a cidade de Cachoeira Paulista por um curto espaço de tempo nos anos 1940), 15 km além, sentido Rio. A cidade se revoltou, dizendo que não havia motivo para isso, que era um absurdo o trem chegar mais tarde em Cruzeiro, que o movimento na outra cidade era muito menor etc. A Central dizia que tal alteração havia sido consequência de seus estudos, ao que a cidade retrucava que eles estariam loucos.

Enfim, há mais exemplos. Tempos em que o orgulho de ser cidadão de uma ou outra cidade era forte e gerava rixas e conflitos.

Hoje, não temos mais nem trens de passageiros nem o velho orgulho. As cidades se parecem cada vez mais umas com as outras. As áreas fora das velhas zonas urbanas são cada vez mais iguais umas às outras e as próprias áreas urbanas sofreram inúmeras descaracterizações. O Brasil da primeira metade do século XX definitivamente está agonizante e vivendo com instrumentos, se já não morreu.

domingo, 29 de julho de 2012

UM ESTUDO SOBRE A MALHA FERROVIÁRIA DE JABOTICABAL

O município de Jaboticabal como era por volta de 1930

O declínio das ferrovias em São Paulo e no Brasil é fácil de ser verificado por quem estuda o assunto.

A estranha forma do município de Jaboticabal no início dos anos 1930 mostra a rede ferroviária que existia em toda a sua área, que, aliás, era bem maior do que é hoje. Foi bem maior antes disso - chegava a atingir o rio Paraná no início do século XX.

De toda a malha ferroviária de 1930, hoje nada sobra dentro do que é a área municipal de Jaboticabal hoje e, mesmo fora dele, somente a linha que vem de Guatapará acompanhando a margem direita do rio Mogi-Guaçu - e que dobra em Pitangueiras à esquerda, para em Bebedouro seguir para o norte até Colômbia - sobrevive hoje e é pouquíssimo utilizada.
O município de Jaboticabal como é hoje, estando todo ele concentrado no canto direito inferior da figura acima

Os dois mapas que aqui aparecem mostram as linhas que já foram abandonadas: a E. F. Monte Alto (findou operações em 1956), o ramal de Jaboticabal da Cia. Paulista (aparece no mapa antigo o trecho de Córrego Rico a Bebedouro), extinto em 1966/69, a São Paulo-Goiás, na época ramal de Nova Granada (no mapa, de Bebedouro até além de Monte Alto, desativada em 1969), a E. F. Jaboticabal (comprada mais tarde pela Paulista, tornou-se o ramal de Lusitânia, desativado em 1966) e a linha Taiuva-Taiassu, que era o trecho inicial da E. F. Oeste de São Paulo, que funcionou por pouquíssimos anos entre 1928 e 1932 e foi erradicada logo em seguida.

Notar também que a linha de Bebedouro a Colômbia já funcionava desde 1909 até Barretos e desde 1929 até Colômbia e não aparece no mapa antigo. Notar ainda que no mapa de 2012, extraído do Google Maps, nessa resolução a única linha ainda existente (citada acima, Guatapará-Pitangueiras-Bebedouro-Colômbia) nem sequer é tracejada nessa resolução.