terça-feira, 8 de novembro de 2011

DE NOVO: REFORMA ORTOGRÁFICA PARA QUE?


Vou insistir no tema: para que houve reformas ortográficas? Sim, no plural. Afinal, no século XX houve pelo menos duas (uma nos anos 1930-40 e outra em 1971), se é que não houve mais, de alcance menor. Nunca me detive para estudar o caso a fundo.

No início dos anos 1960, os dicionários dos quais me recordo mostravam, entre parênteses e ao lado das palavras, a forma como ela era escrita antigamente (ou seja, até o início da reforma que valia na época). Na maioria das vezes, apareciam palavras com k, y, w, ph, com letras duplas e as com h no meio de vogais. Com letra dupla era o que mais havia. Era kilometro, Ytu, wagão, pharmacia, cavallo... das palavras com h entre vogais (como Jahu) somente sobrou o Estado da Bahia, que, mesmo assim, por algum tempo, foi escrito como Baía.

Alguns comentários sobre a escrita antiga, da qual eu tenho algum conhecimento, porque leio inúmeros textos pós-1950. O primeiro é que as palavras em geral quase não tinham acento nenhum (com exceção do til, que era como é hoje), o que facilitava muitíssimo a escrita. O festival de acentos veio com a reforma de 1930-40.

Com relação a esta reforma, eu ainda não consegui realmente saber quando ela efetivamente foi concluída e entrou em vigor. O fato é que nos anos 1920 se escrevia diferente dos anos 1930, mas nesta última década ainda existiam letras duplas (como em "aquella"), aspecto se escrevia "aspeto"... os exemplos são muitos. Ou seja, parece que houve um período intermediário onde se tinha dúvidas de como se escrever... basta notar que nos anos 1940 há uma grande diferença tanto para a escrita dos anos 1930 quanto para a escrita dos anos 1950. Eu aprendi a escrever e a ler em 1958, portanto, já peguei a escrita diferente dos anos 1940.

Em 1971, tiraram os acentos diferenciais e esta foi, pelo que me lembro, a principal parte da reforma. Mantiveram-no em pouquíssimas palavras, como por e pôr, para e pára. Era, realmente, difícil lembrar que se devia pôr acento em tôda por que há um pássaro chamado toda e em fôr por que existe uma preposição antiqui-quíssima "for". Isso, portanto, caiu.

Agora, com a (mais) nova reforma, tiraram acentos como "idéia" - va bene, que seja (desde que algum esperto não queira pronunciar "idêia" - mas, afinal, ainda se escreve "também" com acento agudo e ninguém pronuncia "tambéim") - mas a tal regra de onde há hífen e onde não há, para mim, beira a imbecilidade. Para que decorar regras de onde colocá-los? Sinceramente, eu não sabia a regra anterior e agora não sei a regra nova. Da forma que se escreve, todos entendem. Ou fazem como o alemão, que tem palavras enormes porque juntam tudo sem hífen (algo como se escrever "aguaquepassarinhonãobebe") ou se dê a liberdade de se pôr ou não o hífen.

Agora, convenhamos: tirar o acento diferencial de para (preposição) e "pára" (do verbo parar) foi realmente insano, Há poucos dias atrás escrevi o título de uma postagem neste blog da seguinte forma (errada, pela nova ortografia, mas fi-lo de propósito): "Roubo de fiação pára trens da CPTM", por que, se não puser o acento, fica dúbio.

No fim das contas, para que serve uma reforma ortográfica para uma população que escreve: seje, esteje, menas, pareçe, voçê, conhesse, estavão, caza, que conjuga o verbo haver no sentido de existir ("haverão oportunidades"), mixto, chícara, que começa frases com pronome oblíquo
(dói na vista ler "Lhe ofereço isto", "me dá"), "nós se conheçe" e por aí afora?

Caiamos na realidade. Voltamos a escrever como no século XVIII e XIX, quando se escrevia da forma que se achava que era. Mas, afinal, essa época tinha seu charme: setembro, outubro, novembro e dezembro escrevia-se como 7bro, 8bro, 9bro e 10bro...

Um comentário:

  1. Ralph... penso exatamente como você! Fui alfabetizado em 1964 e já sofri com a reforma de 1971: não entendi os motivos de sumirem com tantos acentos que já faziam parte da nossa vida. O cafèzinho (com crase) era muito mais saboroso... o sòzinho não parecia tão solitário... mas, enfim, fazer o quê? Igualmente, acho absurda a atual falta do acento no para, assim como sinto uma dor no ouvido cada vez que o William Bonner diz que alguém foi pégo de surpresa!
    Pois é, num País com tanta coisa para se preocupar, temos que engolir isso!
    Parabéns pelo artigo!

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