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quarta-feira, 9 de agosto de 2017

1926: UM MAPA INTERESSANTE

O Estado de S. Paulo, 25/10/1926

Em outubro de 1926, o vilarejo de Itambé, próximo à cidade de Olympia, no norte paulista, foi atingida por um tornado, fato então raro na região e que quase acabou com o povoado. O fato saiu nos jornais e mereceu, inclusive, diversas fotografias, as quais ainda eram raridades nos jornais brasileiros. Note que o nome Itambé está assinalado no mapa. Hoje, Itambé se chama Ibitu.
A igreja de Itambé, destruída pelo tornado de 1926.

Porém, noventa anos mais tarde, o que mais me interessou nessa reportagem foi um mapa que foi publicado no jornal O Estado de São Paulo que mostrava a localização do vilarejo (veja a seta no centro co mapa acima).

Neste mapa, são mostradas diversas ferrovias dessa região - inclusive algumas que jamais foram construídas. De onde terá sido tirado esse mapa na época? Teria sido ele cópia de algum mapa mostrando ferrovias já existentes e operativas juntamente com projetos que acabaram não sido concretizados?

A igreja de Itambé, reconstruída e em pé em 2017.


Vejamos: as ferrovias são as linhas preenchidas intermitentemente com preto e branco. Rodovias eram raras, são apenas riscos pretos. Riscos pretos tortuosos são rios ou córregos. O maior rio que aparece é o rio Pardo. que corre a nordeste do mapa. Existe também uma linha branca tracejada que liga (São José do) Rio Preto ao rio Grande, indo no sentido de onde mais tarde estaria a cidade de Colômbia. Pode ser o projeto para alguma rodovia, de que, infelizmente, não tive como me certificar.

Do Google Maps, a mesma região, hoje

Das ferrovias aí marcadas, separemos as que já operavam: a que liga Catanduva a Rio Preto já existia desde 1912 e é a E. F. Araraquara; a que liga Pitangueiras (no canto inferior direito) a Olympia é a E. F. São Paulo-Goiaz, bem como o trecho Ibitiúva-Terra Roxa - este último ramal e o trecho Pitangueiras-Bebedouro seriam neste mesmo ano, 1926, vendido à Companhia Paulista; o trecho entre Barretos e Andes e daí para baixo era o tronco métrico da Paulista, trecho aberto em 1909; finalmente, também no canto direito inferior, o trecho que liga Luzitânia a Jaboticabal, esta última fora do mapa, também operava desde 1916, parte da pequenina E. F. Jaboticabal.

Mas há outras ferrovias aí que são "fantasmas". Quais seriam elas? Listemo-as:

 - à esquerda, no mapa, há uma linha que vem do sul e segue para noroeste - que linha era esta? Em minha opinião, há duas possibilidades. Uma, é que pertencesse à E. F. Oeste de São Paulo, ligando Taiaçu a Rio Preto e dali para próximo ao rio Grande, ao norte; outra, que fosse um prolongamento da linha de E. F. do Dourado, partindo lá embaixo e fora do mapa da cidade (ainda incipiente e sem este nome) de Novo Horizonte e dirigindo-se para uma região ainda inóspita no Noroeste paulista. A conferir. Há pouca literatura sobre os dois projetos citados. Notar que a Dourado somente chegou a Novo Horizonte, vinda de Ibitinga, em 1939, ou seja, 13 anos mais tarde. E por ali ficaria. Aliás, o prolongamento da E. F. Araraquara, que não é mostrado nesse mapa nem como projeto, foi feito no sentido de Mirassol (que aparece no mapa como Mira Sol).

 - No centro do mapa, saindo de Olympia para noroeste, a linha só pode ser a que foi aberta em 1935 pela E. F. São Paulo-Goiaz, atingindo Nova Granada - no mapa, esta cidade ainda não aparece e a continuação até Icem nunca foi feita.

 - Mais para a direita no mapa, a linha que sai de Barretos e que atingiria Colômbia, somente seria realidade em 1930. Em outubro de 1926 estava em início de obras.

 - Para finalizar, a linha que aparece ligando Luzitânia à linha da São Paulo-Goiaz à esquerda de Ibitiúva jamais foi construída.

Interessante, não? Vale notar que, de todas essas linhas, somente ainda funciona hoje a da E. F. Araraquara. O resto que aparece, projeto ou realidade, já ou não existem mais ou estão debaixo de mato (caso do trecho Pitangueiras-Bebedouro-Barretos-Colômbia, da antiga Paulista).

O defeito do Brasil é pensar que é rico demais; por isso, joga dinheiro e infraestrutura fora.

(Esta postagem foi atualizada em 13/1/2018).

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

CONJETURAÇÕES SOBRE AS ESTAÇÕES FERROVIÁRIAS DE PITANGUEIRAS E OLÍMPIA

Estação de Pitangueiras.

No ano de 1906, a Câmara do município de Pitangueiras expediu uma concessão para que fosse construída uma pequena ferrovia que ligasse a sede do município à estação ferroviária então chamada de Pitangueiras da Companhia Paulista, que ficava junto à margem direita do rio Mogi. Com a construção da linha e a abertura de uma estação na sede do município, a estação da Paulista passou a se chamar Passagem; a abertura da estação de Pitangueiras deu-se por volta de 1908.

A Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Goiaz começou a operar em 1911, com a intenção de levar os trilhos até Goiás, partindo da estação de Bebedouro. As linhas inicialmente seguiriam dessa estação da Cia. Paulista até a estação de Passagem, às margens do rio Mogi-Guaçu, isto depois de a CEFSPG ter adquirido a ferrovia de Pitangueiras e usar seu leito.

Em 1914, a CEFSPG faliu e em 1916 foi constituída a partir da sua massa falida, que continuava operando, a Cia. Ferroviária São Paulo-Goiaz. Nessa altura, a linha já seguia de Passagem a Villa Olímpia (Olímpia), passando por Bebedouro, com um ramal saindo de Ibitiúva a Terra Roxa.
Estação de Olimpia.

Em 1927, a Paulista comprou todo o trecho entre Passagem e Bebedouro, incluindo o pequeno ramal; a CFSPG passou a operar apenas o trecho Bebedouro-Olímpia, que em 1931 foi esticado até Nova Granada. A ferrovia, de bitola métrica, que deveria cruzar a fronteira e o rio Grande próximo a Icem, na Cachoeira do Marimbondo, nunca passou de Nova Granada nem chegou a Goiás.

Em 1950, a Cia. Paulista a adquiriu e a transformou no ramal de Nova Granada. Este ramal, depois de receber pesados investimentos durante os dez anos seguintes, acabou por ter seu trecho final (Olímpia-Nova Granada) suprimido pela Paulista, esta então já estatal, em 1966 e, em 2/1/1969, toda a linha restante foi extinta. Os trilhos e as propriedades foram arrancados e vendidos pouco tempo depois. Dela pouca coisa restou, tendo a grande maioria das estações sido derrubada.

Escrevi tudo isto, pois constatei que a estação de Pitangueiras, que ainda hoje existe com outro uso tem o mesmo estilo arquitetônico que a estação de Olímpia. Ambas eram da São Paulo-Goiaz e foram adquiridas pela Paulista em época diferentes. A primeira, construída em 1912, passou para a Paulista em 1925. A segunda havia sido construída em 1916 e foi transferida em 1950.

Em minha opinião, não é coincidência, claro, pois foram projetadas pela mesma empresa. Isto significa, portanto, que elas não foram modificadas quando a Paulista as comprou, mesmo em duas épocas diferentes. Teriam sido estas as únicas estações que sobreviveram cerca de um século e ainda estão em pé? Pode ser, mas existe pelo menos mais uma estação dessa época ainda inteira: a de Rosário de São Paulo que foi aberta no ano de 1911. Ela é simples e não tem os arabescos das outras duas, que, no entanto, eram sede de distritos ou de cidades. Rosário era e é apenas um pequeno bairro rural. E, embora não tenha provas que esta última foi construída no ano de sua abertura (1911), ela é bastante antiga também. Provavelmente, se abriu com algum prédio provisório e pequeno, não demorou muito para ter sido substituído por um de alvenaria – possivelmente já o atual.


sexta-feira, 15 de agosto de 2014

A HISTÓRIA SECRETA DOS MUNICÍPIOS PAULISTAS - PARTE I

Monte Azul Paulista (direita) e Severínia (esquerda). Marcondesia ficava entre elas, mas bem mais perto de Monte Azul e também próxima à SP-265, estrada de rodagem que as une hoje - Google Maps, 2014)
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Durante o Império e a República Velha, a elevação de povoados a distritos de paz a vilas (municípios de menor importância política) ou cidades (municípios de maior importância política) eram feitos por critérios nem sempre muito claros.

O que predominava então era a influência política dos dirigentes quase feudais que existiam nas aglomerações. Não que isto não exista nos dias de hoje - mas existem algumas regras e normas que devem ser seguidas para a implantação de distritos ou municípios (hoje não há mais a diferenciação entre vilas e cidades), embora nem sempre sejam seguidas à risca.

Houve, porém, um tempo em que começaram a se implantar normas. Isto aconteceu com a subida de Getúlio Vargas ao poder, no final de 1930. Uma de suas inúmeras modificações no sistema da República Velha começaram com estudos sobre uma redivisão do Brasil. Em termos dos Estados existentes (além do então único território federal, o Acre), isto provou ser extremamente difícil.

Criaram-se inúmeras sugestões sobre a redivisão brasileira, sugerida tanto por amadores quanto por gente mais esclarecida e capacitada para este estudo. Meu avô se "jogou de cabeça" nesse estudo, graças ao imenso conhecimento de geografia que ele possuía, principalmente da paulista. Ele chegou a escrever um livro sobre isto, em 1932, com o nome "Brasil Desunido". Porém, as rivalidades estaduais, que basicamente remontavam a quatrocentos anos anos com a criação das Capitanias Hereditárias, empurraram as modificações - que se resumiram à criação de territórios em regiões pouco povoadas e desmembradas quase sempre de Estados grandes - para quase treze anos mais tarde, em 1943. Mesmo assim, dos seis territórios criados (Amapá, Rio Branco, hoje Roraima, Guaporé, hoje Rondônia, Fernando de Noronha, Iguassu e Ponta Porã), os dois últimos duraram apenas três anos, revertendo suas áreas aos Estados originários, enquanto Fernando de Noronha foi reintegrada a Pernambuco em 1988.

O que deu mais certo acabou sendo a criação de novos municípios, ou a redivisão ou ainda a supressão de alguns (em 1935, por exemplo, Santo Amaro e Araçariguama foram incorporados a municípios vizinhos, respectivamente São Paulo e São Roque, além de alguns outros). Essas mudanças foram implantadas por uma comissão que tinha como líderes meu avô Sud e seu amigo Djalma Forjaz, no Estado de São Paulo, que começou a trabalhar em 1931 e apresentou suas conclusões em 1934, de forma que, nesse ano e em 1935, uma série de mudanças no nosso Estado.

As comissões não se baseavam em pressões políticas nessa época. Meu avô, por exemplo, recebia a visita de inúmeros prefeitos do interior que discordavam das conclusões tiradas por Sud e que eventualmente criavam prejuízos para alguns municípios; segundo uma testemunha ainda viva, minha mãe, filha de Sud, este rebatia os pedidos, mostrando com mapas e um imenso conhecimento de geografia e de história os pedidos dos políticos. Porém, sei de alguns casos que apesar dos pareceres emitidos pela comissão, as modificações não saíram. Por que isto teria havido? Provavelmente por que havia ainda políticos com uma força que conseguiam virar a cabeça não da comissão, mas do interventor do Estado.

Existiram comissões em outros Estados também. Realmente, não sei se em todos. As comissões deveriam se reunir e apresentar resultados de cinco em cinco anos. Portanto, os municípios, pelo menos os paulistas, eram criados em 1938, 1943, 1948, 1953, 1958 e 1963. A partir daí, com a revolução de 1964, praticamente nenhum município foi criado em São Paulo até a promulgação da (desastrosa) Constituição de 1988, atualmente em vigor. Atualmente, inclusive, as modificações são criadas depois de um referendo entre a população do município e baseadas em termos bem diferentes dos dos anos 1930.

Voltando aos pareceres, eu herdei boa parte deles - não sei qual teria sido o número total - datilografadas por meu avô para a comissão. São, na verdade, cópias em carbono de textos datilografados. Vamos ver um e analisar algumas conclusões, tiradas para os municípios de Monte Azul Paulista e de Cajobi, datado de 17 de maio de 1935. Pelo que pesquisei, parece que, neste caso, as modificações realmente aconteceram. E mais: este parecer foi criado a partir da representação de moradores do município de Monte Azul (não tinha ainda o sufixo "Paulista"), que pediam a incorporação do distrito de Marcondésia a Monte Azul, retirando-o de Cajobi. São cidades do norte do Estado e que eram atravessados pela Estrada de Ferro São Paulo-Goiaz, em 1950 comprada pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Dizia o texto do parecer, mantendo o português da época:

"Marcondesia está a menos de 10 kilometros de Monte Azul, ao qual está ligado pela estrada de ferro da Companhia São Paulo-Goyás, por meio de dois trens diarios,ao passo que dista mais de 20 kilometros, por estrada de rodagem, de Cajoby. Os habitantes de Marcondesia, para attingir a séde de seu municipio, têm de ir, por via ferrea, até a estação de Monte Verde (20 kms.) e fazer depois cerca de uma legua, sem estrada de ferro, até Cajoby".

Notar que ainda se utilizava o termo "legua", hoje praticamente desaparecido (cerca de 6 quilômetros). Monte Verde era onde ficava a estação da São Paulo-Goias, um distrito de Cajobi. Essa estação chegou a se chamar Cajobi por algum tempo, mas voltou o nome para o original, pois era muito longe da sede da cidade. Voltando ao texto:

"O simples exame desses dados revela que aos moradores de Marcondesia é uma solução incomparavelmente mais vantajosa pertencerem a Monte Azul e não a Cajoby.
Distância de Cajobi (em baixo) a Monte Verde (no topo da foto) - Google Maps, 2014
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"Aliás, as reclamações do teor desta de Marcondesia serão permanentes e inevitaveis emquanto se persistir na pratica de amarrar a séde de municipios colocados fóra de estradas de ferro districtos e povoações servidas por esse meio de transporte. Porque evidentemente não se compreende que lucro havia fazer Marcondesia, situada ás barbas de Monte Azul, com quem mantem todas as suas ligações economicas, pertencer a Cajoby, que fica muito mais longe e fóra de mão.

"A comissão é de parecer que se effective a transferencia que os habitantes de Marcondesia pleiteiam.

"Quanto á Cajoby, a melhor solução seria levar a séde do municipio para o districto de paz de Severinia (hoje Luiz Barreto) desmembrando-se este de Olympia para vir a constituir a nova entidade administrativa juntamente com Cajoby e a povoação de Monte Verde. Isso comtudo será assumpto de outro estudo, se o Governo do Estado houver por bem deteminal-o." (...)

Note-se que a atual Severínia, também detentor de uma estação de trem, chamava-se Luiz Barreto nessa época; mais tarde, readquiriu seu nome. Hoje é municipio, realmente desmembrou-se de Olimpia. O final do texto dizia:

"Propomos, assim, o seguinte projecto de decreto:
Art. 1o - O districto de paz de Marcondesia, do municipio de Cajoby e comarca de Olympia, fica pertencendo ao municipio de Monte Azul, comarca de Bebedouro.
Art. 2o - Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrario.
A Comissão."

Por aqui, vê-se que, pelo menos no parecer de meu avô, as ferrovias ainda apresentavam uma importância muito grande na economia dos municipios e distritos. Vale ressaltar que hoje, quase oitenta anos depois da data deste parecer, nada mais existe: a estrada de ferro foi erradicada em 1969 e as estações de Monte Verde, Severínia, Monte Azul e Marcondesia foram todas demolidas. Somente a de Olímpia se mantém, com outros usos, claro.