quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

E SE A SOROCABANA PASSASSE PELA AVENIDA 9 DE JULHO?

Parada de Cotia em 1877. Está localizada onde hoje está a estação de Itapevi, que se desmembrou de Cotia em 1953 e ficou com a estação. Aliás, Itapevi existe por causa dessa estação. Por outro lado, a Sorocabana deixou de passar pelo município de Cotia.

O velho livro de Antonio Francisco Gaspar coloca certas histórias bem interessantes.

Uma delas é que a Sorocabana construiu três túneis em seu percurso original: Pinheirinhos, Inhaíba e dos Simões (este, no km 91). Não que isso seja uma novidade, mas esse túnel dos Simões não resistiu à primeira modificação da linha, realizada em 1908. Em 1927, quando estavam sendo feitas as obras da segunda modificação (a que retificou alguns trechos e duplicou toda a linha de São Paulo a Santo Antonio - hoje Iperó), o túnel já era ruínas. Há uma fotografia no livro que as mostra.

Outra coisa interessante foi a definição das estações da linha: Ipanema (hoje Varnhagen), Sorocaba, São Roque e São Paulo. Só.

A linha passava por apenas cinco municípios, naqueles tempos de 1872: Sorocaba, São Roque, Cotia, Parnahyba (Santana de Parnaíba) e São Paulo. As estações estariam, então, nas sedes dos municípios, exceto de Cotia e de Parnahyba. Estas duas somente foram definidas durante a construção da linha (a de Parnahyba se chamava Baruery, pois estava muito próxima ao bairro rural de Aldeia de Baruery). Cotia acabou ganhando somente uma parada modestíssima. Baruery ganhou uma estação, mesmo. Por que ela sim e Cotia não, não se sabe. E Ipanema estava em Sorocaba, mas localizada dentro da fábrica de ferro.

Barueri acabou se tornando município, desmembrando-se de Parnahyba em 1949.

Mas a maior história, para mim, é a da alternativa de trajeto que não vingou. Não vingou, mas foi a primeira a ser aceita pelos diretores. Eles estavam preocupados que os pântanos da várzea do rio Pinheiros (ainda longe de estar retificada) poderia causar maiores despesas na construção da linha do que o esperado.

Por isso, escolheram um trajeto que, depois de cruzar o rio Bussocaba (hoje, Osasco), seguiria para o sul e cruzaria o rio Pinheiros próximo ao ponto em que a Estrada de Sorocaba cruzava este rio - ou seja, a veja, na velha ponte de ferro de Pinheiros. De lá, com uma inclinação de 1,5%, cruzaria o morro do Caaguaçu (que eles também chamaram de Morro do Cemitério) numa baixada, na chácara do Capitão Benedito. A única baixada que este morro, que é por onde passa hoje a Avenida Paulista tinha era onde hoje está o Museu de Arte, que em fins do século XIX foi aterrado para impedir que a Paulista tivesse ladeiras.

Dali, passaria pela Chácara do Dr, Freitas, no Largo do Arouche e chegaria à estação da Luz (mais ou menos por onde hoje passa a avenida Duque de Caxias) a Estação da Luz, próxima do qual seria construída a estação da Sorocabana.

Do que se pode imaginar que o provável caminho da linha seria pelo vale do córrego da Várzea (hoje entubado debaixo das ruas Prof. Arthur Ramos, parte da av. Cidade Jardim e avenida Nove de Julho até o Caaguaçu), depois o vale do Saracura (avenida Nove de Julho do túnel até a cidade) e dali seguindo até o largo do Arouche e Duque de Caxias.

Vale ressaltar que nenhuma das ruas citadas existia na época - os córregos corriam a céu aberto. Nem a rua Duque de Caxias, depois avenida, existia.

Este trajeto mudaria totalmente a conformação da cidade como existe hoje.

Porém, logo após a aprovação desta alternativa, alguém a vetou - possivelmente por causa do Caaguaçu - e então a linha como o é hoje acabou sendo aceita e construída.

11 comentários:

  1. Eles preferiram cortar o rio Pinheiros já praticamente na foz. Hoje a ponte da ex-Fepasa (de concreto), construída no local onde era a antiga ponte da Sorocabana (que era de aço), fica muito perto do Cebolão. Eu só não entendi por que sair do fundo do vale do Saracura/Anhangabaú e subir para o largo do Arouche. Não seria mais fácil seguir por onde, muito depois, foi aberta a avenida Prestes Maia e fazer a estação próxima da Luz (só que do lado oposto em relação à Júlio Prestes)?

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  2. Sim, isso é conhecido. Os motivos, se foram explicados em algum lugar, nunca vieram à tona, pelo menos que eu os encontrasse.

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  3. Mas a ponte da estrada para Sorocaba não era na rua Butantã? Será que a estrada não seguiria por onde hoje é a avenida Rebouças e a rua da Consolação? Esta sim sairia bem perto do largo do Arouche.

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  4. Carlos, tudo isso que escrevi baseia-se em um provável traçado. Não dá para afirma com certeza que ela passaria pela atual 9 de Julho, mas as duas principais dicas são: "cruzaria o rio Pinheiros mais para o sul (do que a ponte que realmente foi construída, quase na foz no Tietê)"; "próxima à ponte sobre o rio Pinheiros" (na época, era a única ponte sobre esse rio) e "cruzaria o Caaguaçu numa baixada que ele tem". A única baixada no Caaguaçu de forma a atingir o Arouche (que é citado também como passagem) era a baixada que foi aterrada no final do século XIX (1898, se não me engano) na altura do parque Trianon. Como a 9 de Julho passa por dois vales (rio Saracura e rio da Varzea), este seria um traçado bem provável. O rio da Varzea tem a foz na linha da rua Professor Artur Ramos, não tão longe assim da ponte do rio Pinheiros. Se quiser sugerir outro, esteja à vontade.

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    1. Morro do Cemitério só pode ser do Cemitério da Consolação. Eu tinha um tio que nasceu em 1920, morava na Bela Cintra e estudava no Colégio São Luiz. Ele dizia que onde hoje é a avenida Rebouças havia um buraco muito fundo. Quando a bola caia lá ninguém tinha coragem de descer para buscá-la.
      Será que entre a Paulista e a Dr.Arnaldo não havia uma depressão? Porque, onde hoje é o túnel da 9 de Julho o que havia eram 2 grotas, uma de cada lado do Caaguaçu. Não era uma depressão.

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    2. As diversas histórias que li da avenida Paulista jamais citaram outra depressão que foi aterrada - apenas a do Trianon. Além disso, a depressão que c. fala do final da Paulista é, na verdade, a descida do morro do lado do Tietê. O espigão do Caaguaçu faz uma curva entre a Paulista e a Dr. Arnaldo, portanto, se a linha da EFS subisse a Rebouças e descesse a Consolação, teria de galgar todo o morro. Morro do Cemitério realmente é o Caaguaçu, claro, mas isso não significa que ele subisse e descesse o morro exatamente onde era a rua da Consolação. Fico ainda com a 9 de Julhjo, embora reconheça que é muito difícil ter certeza de que é a minha teoria e não a sua, assim como o contrário. Precisaríamos de novos dados. Talvez em relatórios da ferrovia, mas eu já os li diversas vezes e jamais vi nada sobre esta alternativa de se entrar em SP cruzando o Pinheiros mais para o sul.

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    3. É verdade, Ralph. Pela Consolação é claro que não daria para descer porque, além do declive, ali já existia a estrada de Sorocaba. Mas poderia seguir, por exemplo, por onde hoje ficam as ruas Itápolis, Bahia e Veiga Filho, já saindo diretamente no largo do Arouche.
      Mas o melhor caminho para ir do Butantã até a Júlio Prestes seria, na minha opinião, pela Rebouças, vale do rio Verde e avenida Sumaré até o leito (verdadeiro) da Sorocabana/CPTM, com um pequeno túnel onde hoje fica a estação Sumaré do Metrô.
      Meros exercícios de "passadologia". Um abraço.

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  5. Sim, poderia mesmo. Eu só não entendo porque a EFS não quis fazer tuneis no Caaguassu - afinal, ela fez tres na linha-tronco original

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  6. Ralph, a SPR também tinha um projeto que, se implantado, mudaria a história urbana de São Paulo. Segundo carta publicada no Estadão de 10.03.1916, na seção Queixas e Reclamações (página 7), houve plano de se construir, pela planície do rio Pinheiros, um desvio para trens de carga que iam do interior para o porto de Santos e que, desta maneira, não precisariam passar pela estação da Luz e pelas porteiras do Braz e da Moóca (as outras não são citadas na carta). Ou seja, há um século a SPR já pensava em fazer uma espécie de anel ferroviário que até hoje não foi feito. Meio século depois, quem construiu um ramal ferroviário pelo vale do Pinheiros (já retificado) foi a Sorocabana. Mas a finalidade desse ramal era cortar caminho entre a Capital e a Mairinque-Santos.
    O missivista reclamava que a Light não urbanizava a "várzea do Caaguaçu, ou melhor, a de Santo Amaro como é mais comumente conhecida" e que a construção da linha férrea, pela SPR, levaria o progresso para a região:
    http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19160310-13590-nac-0007-999-7-not/tela/fullscreen

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  7. Talvez a Light tenha comprado a ferrovia que ligava Santo Amaro a São Paulo, no início do século XX, para garantir zona de interesse e impedir a passagem da SPR. Ou então a SPR engavetou os planos por causa da Primeira Guerra. Terminada a guerra o cenário havia mudado: já existia o Jardim América e as terras tinham se valorizado inclusive por causa da linha de bondes para Santo Amaro, inaugurada em 1913.

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  8. Ralph, o missivista não estava reclamando da Light, mas da Cia. City: "O principal proprietario daquelles terrenos, que, ao que me consta, é uma poderosa companhia estrangeira, envez de alli estar abrindo ruas delineando parques e outras coisas do luxo a que o terreno não se presta pela sua posição baixa e talvez alagadiça, melhor faria se aproveitasse esse local para o fim que expuz;" (a abertura de industrias).
    A City também era uma companhia estrangeira e, de fato, era grande proprietária de terras na região. No último 06.03, domingo, uma reportagem do Estadão sobre a crise do Jockey Club, dizia que o hipódromo mudou-se em 1941 para o local atual em terreno de 600.000 metros quadrados doado pela Cia. City que pretendia, assim, valorizar os terrenos "do outro lado do rio". Quem tinha uma área dessas para doar é porque tinha mesmo muita terra na região.
    As coisas do luxo a que se referiu o missivista seria o atual Jardim América.

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