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quinta-feira, 1 de junho de 2017

A AFPF ACUSA: LEOPOLDINA NO LIXO!

Na foto acima, do INFORMATIVO AFPF, o processo de desmonte (roubo) de trilhos segue a todo vapor

Transcrevo abaixo, entre aspas, o EDITORIAL do INFORMATIVO-AFPF de Junho de 2017 - no. 164, que mostra o caos que se instalou já há vários anos nas ferrovias que um dia fizeram parte da RFFSA e da FEPASA. No caso, o artigo versa sobre linhas da antiga rede da Leopoldina e da Rede Mineira de Viação.

É tudo uma vergonha, um descalabro sem fim.

"Editorial: 758 km da malha ferroviária fluminense em bitola métrica está indo pro vinagre!

Duas notícias terríveis confirmam isso: a 1ª revela que 106 km de linhas entre Angra dos Reais e B. Mansa, podem virar ciclovia. A 2ª informa que a ANTT aprovou o IV Termo Aditivo ao Contrato de Concessão com a FCA-Ferrovia Centro Atlântica, referente à devolução de ~3.800 mil km dos chamados trechos operacionais de baixa densidade e rentabilidade (res. ANTT 5.101/16), sendo 758 km no Estado (vide quadro mais abaixo). O fato é que grande parte da indenização pela destruição devida pela FCA deverá será aplicada pela própria concessionária em outras áreas, longe do nosso Estado. Pergunta-se: uma vez a FCA, ANTT e DNIT foram incapazes de preservar e manter em condições de uso a malha concedida, patrimônio do povo brasileiro em terras fluminenses, que deveria estar nas mesmas condições de trafegabilidade quando da Concessão, em 1996, quem vai pagar por isso? Eu quero meus 758 km de volta!

O quadro acima foi elaborado com base na DR-Declaração de Rede 2016 da FCA, um relatório que informa à ANTT a situação da malha em seu poder (INFORMATIVO AFPF)

A malha ferroviária fluminense foi de grande importância histórica para o desenvolvimento de dezenas de cidades e localidades no Estado do Rio, muitas das quais hoje ainda sofrem com a estagnação econômica desde a erradicação dos trilhos, iniciada em 1964. O ERJ, que já teve mais de 2.600km de trilhos em bitola métrica, tem hoje apenas 40 km (5%) operacionais para transporte de calcário para CSN, através da FCA. Sabe-se que certos trechos já foram entregues para algumas prefeituras, que vão arrancar os trilhos e transformar as vias férreas em estradas vicinais ou
ciclovias; poucas pensam em implantar trens turísticos, regionais ou pequenos trens cargueiros (short lines). Erradicar linhas ociosas é de uma burrice incomensurável e pode nos custar muito caro no futuro. Na Europa, antigas linhas foram preservadas e hoje operam muitos trens turísticos, regionais e short lines, gerando emprego e renda.

Vagões têm de ser transportados agora por carretas, por falta de linhas em condições de prover transportes (INFORMATIVO AFPF)

Os trens são sem dúvida alguma o meio de transporte mais seguro, eficiente e de fundamental importância para melhoria da mobilidade urbana, para redução dos acidentes de trânsito e da poluição atmosférica. Nesse momento de crise que vive o ERJ, a implantação de trens turísticos, regionais ou short lines poderia muito contribuir para alavancar o Turismo, o desenvolvimento regional e a geração de emprego e renda, além de proteger o Patrimônio. Será que o povo fluminense - e seus representantes - vão aceitar passivamente a subtração de 758 km, sem exigir nenhuma compensação? O custo médio de implantação de uma nova via férrea oscila entre seis a dez milhões de reais/km.
Portanto, teríamos a receber, considerando uma média de R$ 8 milhões/km, uns R$ 6 bilhões da FCA! Oremos, pois.


Trens na Suiça (
INFORMATIVO AFPF)
Enquanto que em terras brasilis vão destruindo antigas ferrovias, na Suíça, antigas linhas inauguradas em 1908 continuam transportando milhares de turistas. Constamos isso em abril quando estivemos por lá explorando as ferrovias desse país montanhoso, cuja malha tem apenas 4.533 km. Fizemos um passeio maravilhoso em um fantástico trem turístico-panorâmico, o Bernina Express, de Chamonix (altitude de 1.774m), passando por Ospizio Bernina, nos Alpes (2.253m), descendo até Tirano na Itália (429m). A ferrovia opera em simples aderência, com rampas de até 7% e muitas curvas sinuosas, lembrando as linhas de bitola métrica do Brasil, as quais expertos tecnocratas querem destruir sob pretexto de serem antigas e antieconômicas. Na Suíça, todos os trens são elétricos e convivem de forma harmoniosa, em linhas obsoletas, com trens de passageios e cargueiros. Não
sei como conseguem ser tão eficientes, pois lá não tem FCA, DNIT, ANTT, Res. 4.131, Medida Prov. 752, PIL-Ferrovias, etc..."

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

COMO A ANTT TRATA O PATRIMÔNIO FERROVIÁRIO BRASILEIRO

Ponte ferroviaria em Videira - linha Itararé-Uruguai - foto Herculano H. Riffei

Mensagem recebida do amigo Paulo Stradiotto e que mostra claramente a atenção - nenhuma - dada Às ferrovias brasileiras pela ANTT. O IBAMA não libera o corte de mato da via permanente da ferrovia e por isso não se corta o mato... só pode ser piada!!!! Segue a transcrição do textro e, mais baixo, do ofício do órgão inútil.

Prezados.

Que fique registrado anexo uma resposta enviada pela Ouvidoria da autarquia ANTT sobre o abandono do trecho da linha Itararé-Uruguai da RVPSC (nesse trecho também chamada popularmente de Ferrovia do Contestado) - que é agora mais uma das inúmeras respostas que tenho arquivadas aqui em meu escritório...

Sempre o mesmo texto, apenas mudam algumas palavras e datas, mas, na essência, sempre o velho blá,blá,blá... Copio e repasso no Ministério Público para que em futuro breve nenhuma autoridade venha alegar desconhecimento do assunto "perda irreparável do Patrimônio Público" que compõe esse trecho ferroviário abandonado há anos pela concessionária Rumo/ALL Malha Sul.

Ainda tenho esperança que apareça alguma autoridade de "saco roxo" e tome a iniciativa dos rigores da Lei. Mas infelizmente por hora VIVEMOS NUM PAÍS NADA SÉRIO, frase dita pelo grande estadista francês Charles DeGaulle no início da década de 1960. Registre-se: querem porque querem gastar bilhões de reais no projeto de uma ferrovia Leste-Oeste planejada no Estado de Santa Catarina, recursos estes de que o país não dispõe. Profetizo que será uma obra estilo Ferrovia Transnordestina, da qual nem preciso dar mais informações aos amigos, onde se gastou bilhões e a mesma não avança. Com um detalhe: está na lista negra do TCU-Tribunal de Contas da União,

 Na mesma resposta enviada, estou expedindo um despacho particular comunicando ao técnico que me respondeu que está na hore de a agência tomar providências, pois, desde 2010, os consertos estão sendo postergados indefinidamente. Um dos absurdos que dizem é que o IBAMA ou algo parecido não libera verba para cortar o mato na faixa de domínio da ferrovia. Só aqui no Brasil, um país, tão atrasado nestes assuntos pode dar uma resposta burocracia e inútil como essa, que só atrapalha o desenvolvimento da nação. 

Segue texto do oficio recebido para conhecimento
Na resposta diz que o trecho ferroviário é periodicamente inspecionado. Última inspeção ocorrida na data de 23/07/2015, dando prazo de recuperação dos trechos abandonados: no prazo compreendido entre janeiro/2015 - dezembro/2016, de toda a extensão da linha (Porto União Vitória/SC - Passo Fundo/RS); Estamos em Agosto de 2016. Ou seja, isso só pode ser uma piada!

Prezado(a) Senhor(a)
Mensagem cadastrada sob:Número de protocolo de atendimento: 3395288-ANTT Brasilia/DF
Em atenção à mensagem de V. Sª., registrada sob o protocolo nº. 3388499, retransmitimos os esclarecimentos que esta Ouvidoria obteve da Gerência de Controle e Fiscalização de Serviços de Infraestrutura de Transporte Ferroviário de Cargas – GECOF.
O referido trecho ferroviário é periodicamente inspecionado pela Coordenação de Fiscalização ferroviária do Rio Grande do Sul - COFER-RS, sendo a última inspeção ocorrida na data de 23/07/2015, entre os municípios de Porto União Vitória/SC - Marcelino Ramos/RS;
Foram inspecionados a Via Permanente, onde se constatou diversas irregularidades como: drenagem deficiente, erosão no talude de corte, água retida na plataforma da via, excesso de mato/galhos, lastro contaminado, dormentes inservíveis; a Ponte Rodoferroviária sobre o rio Uruguai (Piratuba/SC - Marcelino Ramos/RS); os Pátios Ferroviários de Nova Galícia, Matos Costa, Calmon, Presidente Pena, Caçador, Rio das Antas, Gramado, Videira, Tangara, Herval Doeste, Capinzal, Piratuba;
No que tange à conservação e manutenção da via permanente, foram constatadas irregularidades que incorreram na lavratura do Auto de Infração nº 0440/Bloco018;
Sobre os Pátios Ferroviários, as condutas infratoras ensejaram lavratura do Auto de Infração nº 0438/Bloco018, tendo a ANTT enviado Ofício nº 061/2015/COFER-URRS, determinando a Concessionária ALLMS apresentar no prazo de 30 dias cronograma para realizar, em até 180 dias, reparações, melhorias, substituições e modificações necessárias à correção das várias deficiências descritas no Relatório de Inspeção;
Nessa inspeção ferroviária realizada entre Porto União Vitória/SC - Marcelino Ramos/RS, que compreende o trecho citado pelo Sr. Paulo Roberto (Porto União Vitória/SC - Piratuba/SC), foi observado o cumprimento da Deliberação ANTT nº302/12, que determina à Concessionária ALL/MS a recuperação dos trechos abandonados no prazo compreendido entre janeiro/2015 - dezembro/2016, de toda a extensão da linha (Porto União Vitória/SC - Passo Fundo/RS);
Portanto, informamos que esta Agência Reguladora tem procedido com suas prerrogativas legais de promover a intervenção no domínio econômico através da regulação e fiscalização do setor de transportes terrestres, sempre respeitando o ordenamento jurídico brasileiro vigente.
Finalmente, informamos que os cidadãos podem colaborar com o aprimoramento da atuação da ANTT por meio de contribuições apresentadas presencialmente ou por e-mail nos eventos de participação e controle social realizados pela Agência, tais como audiências e consultas públicas. Sua sugestão é muito importante. Acompanhe os eventos já realizados e os que estão em andamento 

terça-feira, 15 de março de 2016

QUEM SE INTERESSA POR ESTRADAS DE FERRO NO BRASIL?

Acidente em Bueno de Andrada, Araraquara, SP, há cerca de um mês (Autor desconhecido).

Afora eu, cujos artigos no blog falam, sei lá, 80 por cento das vezes, em ferrovia, quem mais está interessado em ferrovias no Brasil?

Há umas cem, duzentas pessoas que conheço, pessoalmente ou não, que são como eu. E existe uma série de pessoas das quais nunca vi que certamente também gosta.

Agora, com poder de perceber que ferrovias fazem bem a um país e não mal, como está arraigado no povo brasileiro desde os anos 1940, essas pessoas são poucas e não são sérias... Vejam como as concessionárias estão fazendo. Sem nenhuma fiscalização por parte da ANTT, a agência governamental, as ferrovias estão cada vez mais abandonadas. A gente percebe isso nas viagens que faz, nas notícias que lê, nas fotografias que tira.

Para piorar, na situação horrorosa por que o país passa, onde políticos corruptos brigam entre si para manter cargos e fugir à cadeia, no país não há governo. Pelo menos, na área federal, que é, claro, a mais crítica.

O desemprego come solto. A situação é crítica. Todos os dias se lê que determinada (s) indústrias (s) fecharam. A situação do país é motivo de piadas e de descrença nos países mais ricos, investidores. Não há seriedade nas promessas feitas todos os dias pelo governo federal, principalmente na área econômica, justamente a que mais influencia. As áreas de saúde, educação e segurança, as mais importantes para o país já que influem claramente no seu futuro, estão no mais total abandono, tanto na parte federal quanto nas estaduais.

E querem que o Brasil se importe com ferrovias?

Por isso, sinto-me cada vez mais um idiota em insistir com este tema em meu blog.

sábado, 16 de janeiro de 2016

EXISTIRÃO FERROVIAS NO BRASIL DAQUI A DEZ ANOS?

A água das chuvas dos últimos dias levou o aterro da ponte. Segundo foi-me informado, trata-se do ramal de Itararé. É um ramal em que há tráfego. Vão consertar?

Comecei a escrever este blog há quase sete anos. A intenção era escrever um artigo diariamente e, na maioria das vezes, diariamente.

Depois de dois anos, percebi que estava difícil manter os artigos diários. E os espaços entre eles foram aumentando. Atualmente escrevo em média dois a três vezes por semana atualmente. A inspiração, especialmente nos últimos dois meses, tem estado meio que ausente.

Quanto às ferrovias, meu tema preferido, estão atualmente em péssima situação em São Paulo e no país.

O governo federal não consegue terminar uma ferrovia que seja. As obras, quando avançam, avançam em passo de tartaruga, ou caracol, o que quiserem. Vejam a Norte-Sul, a Transnordestina, a FIOL, na Bahia. No fundo, são estas as que estão sendo construídas hoje. Segundo o cronograma original, neste início de ano de 2016, todas elas já deveriam estar totalmente prontas.

Pior ainda estão as ferrovias da Rumo-ALL. A Rumo assumiu o lugar da ALL no ano passado e suspendeu, ou deixou claros sinais de que vai suspender, o tráfego ferroviário em quase todas as suas linhas de bitola métrica. Há sérias suspeitas de que no Rio Grande do Sul não vai sobrar tráfego nenhum de cargueiros e toda as linhas ainda existentes serão fechadas.

Dizem as más línguas que somente sobrarão operando, na bitola métrica, a linha Ourinhos-Apucarana-Ponta Grossa-Curitiba-Paranaguá e a linha do São Francisco, esta em SC.

Na Noroeste, o tráfego do único cargueiro que hoje faz Três Lagoas a Santos será desativado assim que acabar o contrato existente. As linhas da Sorocabana não terão mais serventia. Falo da linha-tronco, ramal de Itararé e ramal de Bauru. Na linha-tronco, aliás, hoje somente correm trens onde há bitola larga ou mista, ou seja, o trecho inicial que é operado pela CPTM, o trecho Rubião Junior a Mairinque e, fora estes, o ramal de Bauru. O ramal de Itararé ainda tem algum movimento. Resta lembrar que as grande chuvas dos últimos dias causou problemas no ramal de Bauru e no ramal de Itararé, alguns de grande monta (queda de aterros).

O governo está assistindo passivamente a tudo isto. Aparentemente, não importa nem a ele e muito menos à Rumo o que está acontecendo - que, para resumir, é praticamente o fim da estrutura ferroviária do Estado de São Paulo. Sobrarão apenas a linha Santa Fé do Sul-Araraquara-Campinas-Mairinque-Santos, toda de bitola larga e que traz a soja do Mato Grosso. Até quando?

Não se trata de querer que a ferrovia seja mantida porque gosto delas. Trata-se de acabar com a maior parte da infra-estrutura de transportes deste Estado e do País. Este governo não é sério.

Além disso, ficam as linhas urbanas da Capital, atendidas pela CPTM e que são as linhas antigas, modificadas através das épocas para atender o serviço de trens metropolitanos da capital, junto com as linhas mais novas do metrô. É muito pouco para o que precisamos para não depender somente de caminhões, aviões e dutos.

Para ter lucros sem grandes esforços, as concessionárias (e particularmente a Rumo-ALL) das linhas existentes simplesmente se fixam em alguns trens de cargas que, em São Paulo, resumem-se apenas a trens de grãos. Cargas carregadas dentro do Estado, ainda e de longe o mais rico da nação, são praticamente zero. A grande maioria segue para Santos vinda de fora: Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais e Rio de Janeiro.

Construções de novas linhas por aqui? Nem pensar. Fala-se da Norte-Sul cruzando o Estado no seu extremo-oeste, entrando por Estrela do Oeste, onde se cruzará com a antiga E. F. Araraquara. Mas quando? Será mesmo?

Reativação das antigas Santos-Juquiá, ramal de Piracicaba, São Paulo a Minas, Bauru-Panorama, ramal de Sertãozinho, Pradópolis-Colômbia? Nem pensar. Esqueçam.

Na semana passada, mais uma das oficinas ferroviárias paulistas foi fechada na área da Sorocabana. Muitos funcionários foram para a rua, despedidos por um patrão que se acomodou com seu lucro e não se importa em crescer ou mesmo em manter suas linhas. Sobra ainda a de Mairinque - até quando?

Fora das concessionárias cargueiras, falemos dos trens metropolitanos em regiões que ainda precisam deles? São muitas... Só com linhas novas e novos traçados, ou, pelo menos, com remodelação total dos traçados antigos: cito Campinas, Santos (este, pelo menos, está com o novo VLT, que segue o leito inicial da antiga Santos-Juquiá), Ribeirão Preto e Piracicaba.

E. claro, das linhas em construção ou projeto na Grande São Paulo, do metrô e da CPTM. Estas continuarão, sempre atrasadas.

E espero, também, que a cada problema que a CPTM ou o metrô apresentem - que não são tão frequentes quanto a imprensa diz - não seja apresentada com as frases "o transporte urbano em São Paulo é uma porcaria - trens, metrôs e ônibus" é uma porcaria, frase alardeada com exaustão nos últimos dias pelo repórter de televisão e não por coincidência pré-candidato a prefeito de São Paulo, José Luiz Datena. Ele certamente está se esquecendo de como eram os trens da CPTM nos anos 1990. Aquilo, sim, é uma porcaria.

No fim, a pergunta é a do título: ainda existirão trens cargueiros no Brasil daqui a dez anos?

domingo, 18 de outubro de 2015

TRENS DE PASSAGEIROS EM CRICIÚMA?

Trem de carga passa no trecho que se pretende usar - fotografia publicada em site da rádio Eldorado

Nesta semana li uma notícia que chegou a mim através do site da Revista Ferroviária.

Originalmente publicada no dia 15, no site da Engeplus Telecom, dizia que um trem com capacidade para duzentas pessoas seria testado a partir do dia 19 de outubro (uma segunda-feira) por duas semanas, para transportar estudantes da cidade de Içara para Criciúma, dois municípios de Santa Catarina, num trecho de cerca de doze quilômetros. Ele usará a linha da E. F. Teresa Cristina, ferrovia de mais cento e vinte anos que hoje é operada pela concessionária, que manteve o nome básico da velha ferrovia.

Pelas informações que tenho - não conheço infelizmente o local - nem Criciúma nem Içara têm mais suas estações ferroviárias. Ambas foram demolidas, a primeira, em 1975 e a segunda, em data incerta. Segundo também li, o trajeto deverá ser feito até Pinhalzinho, em Criciúma, local que também possuía uma estação e que também não mais existe.

Os trens de passageiros acabaram na ferrovia por volta de 1974. A estação de Criciúma teria sido reconstruída nos últimos anos, mas em local diferente do original. Não está mais ao lado da linha. Cito tudo isto, pois não sei onde serão os pontos de embarque e desembarque, mas estes são os mais fáceis de se providenciar.

Procurei por mais algum material sobre esta ideia surpreendente e achei duas reportagens, uma de março do ano passado e outra de março deste ano.

Isto mostra que a ideia já tem pelo menos um ano e meio e até agora não foi posta em funcionamento, o que, esta semana, foi previsto para amanhã. Na verdade, é algo simples, que depende de se ter material rodante (o trem que deverá começar a rodar amanhã, dia 19 de outubro, deverá ser composto por uma locomotiva diesel da Teresa Cristina e cinco carros para quarenta passageiros) e aprovação do governo federal (ANTT e DNIT) para poder operar, pois a ferrovia tem somente a concessão para trens cargueiros - embora opere também, em outro trecho um trem turístico durante alguns finais de semana. Aliás, as prefeituras terão de ter também a concordância daprópria  ferrovia para operar este trem.

O que mais me surpreende é a postura do prefeito de Içara, diferente do da maioria dos prefeitos de cidades brasileiras, que, quando vêem uma linha querem arrancá-la para fazer uma avenida: "A ideia é chamar a atenção do Governo Federal, principalmente da Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) para permitir a concessão do transporte de passageiros, porque não faz sentido nós ficarmos estrangulados na SC-445, tendo essa ferrovia para ligar Içara a Criciúma. Ela fica em um ponto estratégico, é de fácil acesso aos passageiros nos dois municípios”.

O que facilita as coisas é que a linha corre pelo canteiro central, ajardinado, cuidado e limpo, entre as duas cidades. Santa Catarina é outro mundo, mesmo. Porém, mesmo assim, a velocidade prevista para o trecho é de apenas trinta quilômetros por hora e o trajeto, de trinta e cinco minutos - muito, para a pressa dos dias de hoje. O pessoal no Brasil pensa que trem é para andar dessa forma, "é perigoso",,, nem parece que convivemos com eles por mais de cem anos.

Mesmo com todo esse comprometimento, o projeto ficou sem resultados durante os últimos dezoito meses. Como se enrolam e dificultam as coisas simples neste país. 

Bom, o meu apoio, pelo menos, eles têm.

sábado, 2 de maio de 2015

MPF ATUA NAS FERROVIAS A DEVOLVER

Acervo Hugo Caramuru
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Em geral, a grande população não sabe e nem quer saber de mais um malfeito feito pelo governo brasileiro, como o caso das ferrovias que se propõe sejam devolvidas à União pelas concessionárias - pode pedido da União.

O caso vem do ano passado (2014) e é, para quem acompanha a via-crucis das estrradas de ferro do Brasil, simplesmente absurda.

Vejam abaixo o teor da recomendação do MPF à ANTT. Não precisa entender muito do assunto para se revoltar. Sugiro lerem. (Nota deste autor: num país como o Brasil, deficiente de ferrovias e principalmente de infra-estrutura, é melhor usar uma ferrovia velha do que não usar nenhuma. Reafirmo que não acompanho o assunto há dez anos simplesmente porque gosto delas, mas porque creio que elas fzem falta ao país e porque parece que o mundo inteiro está errado, somente o Brasil está certo, pois o resto do mundo considera ferrovia como prioridade na sua infraestrutura.) Agradeço o envio do texto à ANPF - Rio de Janeiro.



MPF recomenda que ANTT anule atos que favorecem concessionária

Segundo a recomendação, agência tem privilegiado interesses privados em detrimento do patrimônio público
30/04/2015

Belo Horizonte. O Ministério Público Federal (MPF) recomendou à Diretoria-Geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) que anule a Resolução nº 4.131, expedida em 3 de julho de 2013, que autorizou a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) a desativar e devolver determinados trechos ferroviários na Malha Centro-Leste, que é operada pela empresa mediante concessão pública desde o ano de 1996.

Com base nessa resolução, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), órgão responsável pela administração dos trechos operacionais da extinta Rede Ferroviária, firmou com a FCA um termo de devolução e recebimento de trechos desvinculados da concessão, na condição e estado em que se encontram.

Para o MPF, a Resolução 4.131 já nasce de uma singularidade, que é a de devolver trechos em total desrespeito ao contrato de concessão. Mais surpreendente ainda é que a empresa devolverá trechos classificados por seus próprios critérios como economicamente viáveis, além, é claro, dos que considerou economicamente inviáveis.

Surpreendentemente, mesmo em relação a trechos considerados economicamente viáveis, a União autorizou a FCA a desmontar e retirar toda a superestrutura atualmente instalada em até 1.760 km de via férrea. A única contrapartida da empresa será o compromisso de reempregar quantidade equivalente nos segmentos que subsistirem.

De acordo com o MPF,  "se os trechos são economicamente viáveis, por que permitir a desmontagem da superestrutura, ignorando-se eventuais futuras operações, como a operação de trens turísticos e regionais, além de colocar em risco um patrimônio de potencial valor histórico?"

"Além disso, o que se constata é que a resolução e os atos administrativos subsequentes à Resolução 4.131 contemplaram tão somente os interesses da concessionária, com total desrespeito ao interesse público", afirma o procurador da República Fernando Almeida Martins. "Não há qualquer demonstração dos princípios da motivação, do interesse público e da finalidade obrigatórios em todo ato administrativo".

O procurador da República alega que, na prática, o que vai ocorrer não é uma devolução de linhas férreas, mas sua destruição pura e simples. "A ANTT está autorizando uma empresa privada a colocar seus interesses à frente dos interesses do povo brasileiro".

No caso da devolução dos trechos antieconômicos, a situação não é melhor. A ANTT autorizou a FCA a empregar os recursos relativos à desativação das linhas em suas próprias operações.

"Ao invés de indenizar o patrimônio público pelos prejuízos que serão causados com a desativação de 742 km de linhas férreas que a concessionária não deseja operar nem manter, ela é beneficiada, deturpando-se totalmente o caráter indenizatório que deveria recair sobre a interrupção das operações", afirma Fernando Martins.

Ele ainda sustenta que a própria avaliação sobre o que seria economicamente inviável depende de inúmeros fatores, que não foram levados em consideração pela ANTT.

"Tal avaliação poderia sofrer modificações em virtude do operador, da taxa de retorno esperada, da ampliação dos tipos de carga ou mesmo da exploração de trens de passageiros. Além disso, em momento algum foram considerados os bens ferroviários de potencial caráter histórico, que foram abandonados pela concessionária ao longo da vigência do Contrato de Arrendamento, e devolvidos em grande parte sem nenhuma referência à sua importância para a sociedade onde estão inseridos", diz.

Grupo de Trabalho constituído pela própria ANTT para acompanhar os procedimentos relativos à desativação e devolução das linhas ferroviárias registrou "evidente insatisfação" da sociedade com a desativação de alguns trechos pertencentes à malha da FCA. A equipe chegou a registrar que foram feitas sugestões de que eles pudessem ser mantidos para a operação ferroviária de pequenas cargas, pequenos trajetos ou para o transporte de passageiros, em viagens regulares ou turísticas.

Outra suspeita sobre os atos que envolveram a edição da Resolução 4.131/2013 recai sobre os cálculos efetuados para valorar os trechos a serem desativados.

Segundo estudo feito pela ANTT, a FCA deverá pagar um valor de 760 milhões + 15% a título de vantajosidade pelos 742 km antieconômicos que serão "devolvidos".

Acontece que estimativa feita pelo Programa de Investimentos em Logística (PIL), iniciativa voltada à reestruturação de rodovias e ferrovias no âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Federal, considerou que o custo inicial de cada km a ser construído será de 8 milhões.

"Portanto, tomando-se por base o valor estimado pelo próprio governo, a conta não fecha. Além disso, não se pode esquecer que esses 760 milhões mais os 15% não serão pagos aos cofres públicos, que bancaram a construção da malha ferroviária atualmente existente, mas sim convertidos em investimentos na própria malha que a FCA continuará operando, ou seja, será investido no próprio negócio. Significa dizer que como a empresa vai perder receita por deixar de operar nos trechos que ela mesma quer devolver, terá de ser compensada, o que é um contrassenso", questiona Fernando Martins.

Regras do contrato - O MPF lembra ainda que a supressão e desativação dos trechos ferroviários viola o contrato de concessão firmado em 1996.

Isso porque as Leis 8987/95 e 9074/95, que disciplinam as concessões e permissões de serviços públicos, expressamente determinam que o concessionário deve garantir a continuidade na prestação dos serviços públicos, ficando obrigado a cumprir fielmente as cláusulas previstas nos respectivos contratos. No caso, o contrato de concessão da FCA, em sua cláusula Décima, inciso III, prevê unicamente a ampliação da prestação do serviço prestado, jamais sua supressão.

Além disso, existe uma resolução da própria ANTT (Resolução nº 44) segundo a qual, para a suspensão, supressão ou desativação, temporária ou definitiva, do transporte ferroviário de carga, a concessionária deverá, além de dar ampla publicidade ao fato, comunicar previamente sua intenção aos usuários dos serviços no trecho alcançado pela medida, às demais concessionárias que venham a ser afetadas direta ou indiretamente, ao proprietário dos bens arrendados, quando for o caso, e aos prefeitos municipais das cidades envolvidas, o que não foi feito pela Ferrovia Centro-Atlântica.

"Mais grave ainda é que a ANTT omitiu-se em aplicar penalidades pela inobservância deste procedimento", afirma o procurador. "Em virtude de todas essas irregularidades, recomendamos a anulação também dos atos consequentes da resolução, que são o Termo de Devolução e Recebimento firmado entre o Dnit e a FCA, assim como do termo aditivo ao contrato de concessão, que incluiu trechos não previstos no contrato original.

Foi dado prazo de 15 dias corridos para que a Diretoria-Geral da ANTT informe se irá acatar a recomendação.

Assessoria de Comunicação Social
Ministério Público Federal em Minas Gerais
Tel.: (31) 2123.9008 / 9010
No twitter: mpf_mg

sábado, 11 de fevereiro de 2012

OS TRILHOS DO MAL (VII) - O MPF ACERTOU!

A estação do Barracão, de onde saem os trilhos do ramal de Sertãozinho em Ribeirão Preto desde 1899

A prefeitura de Ribeirão Preto, aquela que derrubara há quarenta e quatro anos sem nenhuma necessidade a estação ferroviária construída oitenta anos antes, agora está maluca para arrancar os trilhos do ramal de Sertãozinho, desativado pelas concessionárias privadas logo depois da entrega da linha da FEPASA a elas, no final de 1998.

O MPF - Ministério Público Federal -, que normalmente interfere em muita coisa, sendo que muitas vezes por mera politicagem ou sem fundamentos melhores do que os usados pelos "interferidos", desta vez entrou em ação com fundamentos muito bem colocados e com toda a razão do mundo.

Nas quatro cartas abaixo reproduzidas por mim - o texto é longo, mas, sinceramente, vale a pena lê-los, pois especialmente o primeiro, apesar de em alguns pontos ser repetitivo, mostra algumas posições muito clras até para leigos. Posições, que, no entanto, não parecem nada claras para as concessionárias - no caso, a FCA - nem para o governo municipal, estadual ou federal.

Leiam abaixo e vejam que, desta vez, o procurador que as emitiu está de parabéns pela serenidade e clareza. A primeira carta é a mais longa. Os grifos são deste blogueiro. Há citações de fontes que aqui eliminei, para não sobrecarregar demais.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM RIBEIRÃO PRETO (SP)

DECISÃO - Peças informativas nº 1.34.010.000323/2011-10

As presentes peças informativas têm por objetivo apuração da denúncia, trazida a este órgão ministerial pelo presidente do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, Denis Willian Esteves, e também veiculada em matérias jornalísticas1, de que o MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO (doravante MUNICÍPIO) estaria planejando eliminar ramais ferroviários em desuso da antiga Companhia Mogyana, situados na zona urbana, ou dar-lhes nova afetação. Para tanto, a concessionária FERROVIA CENTROATLÂNTICA S.A. (doravante FCA) devolveria as áreas de tais ramais à UNIÃO, que, por meio do DEPARTAMENTO DE INFRAESTRUTURA DE
TRANSPORTES – DNIT, cedê-las-ia ao MUNICÍPIO. Em contrapartida, a UNIÃO custearia a construção de um novo ramal, mais afastado das concentrações populacionais.

Ocorre que o negócio ostenta, pelo menos, três sérios inconvenientes, a saber:
- sem justa causa, oneraria o MUNICÍPIO e desoneraria a concessionária FCA, ao carrear para o primeiro a responsabilidade, em princípio da segunda, pela recuperação dos ramais abandonados e a desocupação de suas margens, atualmente ocupadas por construções irregulares de famílias de baixa renda. Nesse ponto, merece destaque o seguinte trecho da reportagem constante da f. 79: “Segundo José Osvaldo Cruz, coordenador de relações institucionais da FCA, o trecho se tornou inviável por causa das intervenções urbanas”;
- sem justa causa, oneraria a UNIÃO e desoneraria a concessionária FCA, ao carrear para a primeira a responsabilidade de custear a construção de novo ramal em razão de o ramal já existente não ter sido devidamente aproveitado ou recuperado pela concessionária;
- inviabilizaria o projeto de trem histórico-cultural, que o MUNICÍPIO, por sua Secretaria da Cultura, afirma encampar.

Com o fito de evitar lides judiciais e prevenir responsabilidades acerca desse contexto fático, este subscritor, por meio de ofício, participou sua visão desses inconvenientes ao DNIT, ao MUNICÍPIO e à Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, ao mesmo tempo em que requisitou informações sobre o andamento de eventuais tratativas entre as partes.

Em resposta, a ANTT esclareceu que o inciso XIV da cláusula 9.1 do contrato de concessão2 abrange a obrigação da concessionária FCA de impedir ocupações irregulares (favelas e congêneres) nos terrenos marginais aos ramais ferroviários. Todavia, ressaltou que a construção de vias férreas fora dos contornos urbanos visa a evitar prejuízos para a população, que pode sofrer, por exemplo, com a poluição sonora e com o risco acidentes, acrescentando ainda que a construção de contorno ferroviário pela UNIÃO não desoneraria a FCA, pois esta última pagaria a devida indenização à primeira.

Por sua vez, o MUNICÍPIO esclareceu que:
(i) as tratativas para a reportada cessão de áreas realmente existem, mas não foram formalizadas;
(ii) foi firmado com a FCA protocolo de cooperação (trazido por cópia em versão com lacunas e não assinado), segundo o qual esta e o MUNICÍPIO envidarão esforços conjuntos para implementação de projetos e investimentos urbanos e ferroviários;
(iii) não há projeto oficial
quanto ao uso dos terrenos que poderão ser recebidas pelo MUNICÍPIO; e
(iv) quanto à remoção das ocupações nos terrenos marginais, seriam elas incluídas no programa municipal de desfavelização.

Finalmente, o DNIT informou que
(i) o MUNICÍPIO demonstrou interesse no recebimento das áreas dos ramais, solicitando
análise quanto à viabilidade do negócio;
(ii) houve uma reunião em Brasília/DF na qual se discutiram questões relativas ao transporte ferroviário em Ribeirão Preto/SP (foi trazida cópia da ata);
(iii) a responsabilidade de remover as favelas dos terrenos marginais é da FCA, sob fiscalização da ANTT;
(iv) não foi realizado nenhum estudo sobre a conveniência de construção de novo ramal, em vez de reativar o já existente;
(v) o traçado atual está muito antigo, o que pode trazer riscos à população;
(vi) após análises, constatou-se que, para reativar a malha ferroviária, seria necessário fazer um contorno fora do perímetro urbano.

É o relatório.

Antes de tudo, repise-se que estas peças informativas tiveram início com denúncia, feita por entidade privada vocacionada para a preservação da memória ferroviária, de que o MUNICÍPIO estaria planejando eliminar ramais ferroviários em desuso da antiga Companhia Mogyana, situados na zona urbana, ou dar-lhes nova afetação. O fato assim definido, sem maior contextualização, não ostenta nenhuma ilicitude. Tanto que foi, nesses mesmos termos,
confirmado pelas partes que a ele dão curso (MUNICÍPIO, DNIT e FCA).

O problema reside nas implicações desse fato e no modo como ele venha a se perfazer. Daí porque o caso é de relativa complexidade, merecendo atenção para sutilezas e detalhes. Não se tratando de fato ilícito prima facie, carece este órgão ministerial de razões para impugná-lo de plano. Afinal, não cabe ao Ministério Público ditar ao administrador a destinação a ser dada a bens em desuso. Porém – e aqui ingressamos no âmago da questão – , em se tratando de bens de extraordinário potencial de uso em prol do tecido social, notadamente no que diz respeito à mobilidade urbana, não pode ser destinado sem maior critério. E, por critério, compreendam-se não apenas decisões políticas, mas estudos e análises cientificamente respaldados, lançados sobre premissas objetivas tendentes a divisar, no longo prazo, os mais proveitosos empregos em favor da comunidade.

É claro que haverá margem para opções políticas, para a inequívoca discricionariedade administrativa. Até porque – veja-se! – a opção até aqui engendrada foi o abandono, teoricamente a pior de todas. Porém, nem de longe isso significa que qualquer outra opção seja válida. Afinal, o abandono de determinado bem não gera despesa direta; quando muito, depender de sua natureza, gera depreciação que, exacerbada, aí sim pode caracterizar malversação. A destinação pretendida pelos atores das negociações até aqui encetadas, ao contrário, gera despesa direta de considerável valor e, mais que isso, cria uma afetação com nota de definitividade.

Se assim é, se o que se pretende até aqui (novo ramal fora da cidade e transformação dos atuais em corredores de ônibus) são transformações de grande monta e elevado custo, que aderem ao solo e que ditam a conformação do entorno no longo prazo, é impensável que qualquer movimento, ainda que de mera cessão de áreas, seja feito sem grande segurança quanto à finalidade, calcada esta em razoabilidade e proporcionalidade.

A razoabilidade, no caso, implica ter certeza quanto à adoção de uma opção eficaz em termos de aproveitamento; e a proporcionalidade, por sua vez, expressa relação de custo/benefício que
não seja perniciosa para o poder público. Pelo menos até este momento, essa segurança
finalística apoiada em razoabilidade e em proporcionalidade não se faz presente. A impressão que se tem é que as deliberações, até aqui, foram de cunho estritamente político; que pouco ou nada transitaram pelo universo técnico.

Um protocolo de cooperação (juntado a estes autos em forma incompleta e sem assinatura) e a notícia de uma reunião em Brasília e de uma singela visita técnica que resultou num croqui,
obviamente, estão aquém do necessário para deflagrar o processo, com a cessão dos imóveis da UNIÃO ao MUNICÍPIO.

Com efeito, não existe demonstração técnica sobre a inviabilidade operacional dos atuais ramais. O DNIT informa que, em inspeção técnica, constatou que “o traçado ferroviário no trecho urbano encontra-se técnica e operacionalmente inviável por ser um traçado antigo, com raios e rampas inadequados, e com muitas passagens de nível, tornando-se assim um risco à população”. Deveras, não convence. Muitas perguntas podem ser arrostadas a essa assertiva. Só como exemplo:

- Raios e rampas inadequados não podem ser objeto de adequação?
- Passagens de nível não podem ser desniveladas, principalmente para o tráfego de pedestres (passarelas)?
- Quanto aos veículos, qual o inconveniente de semáforos, queexistem às centenas pela cidade?
- Traçado antigo, por si só, é um óbice insuperável? Por que?

Todos sabemos que, nos países mais civilizados do planeta, notadamente na Europa, o transporte ferroviário convive em harmonia com as cidades há muitas e muitas décadas. Será que todos os
traçados são novos? Que justamente lá não existem traçados antigos? Grandes estações ferroviárias estão presentes, muitas vezes, no centro das principais aglomerações urbanas. A despeito disso, a notícia que se tem é a de que as cidades europeias são as que oferecem maior mobilidade e segurança para seus habitantes.

Veja-se, nesse sentido, a seguinte reportagem, voltada para viajantes brasileiros na Europa:
Quem viaja pelo mundo já sabe que os passes de trem são uma das melhores formas de percorrer a Europa. O STB – Student Travel Bureau, que comercializa bilhetes de trem e
passagens aéreas para destinos europeus, com diferenciais para cada faixa etária e para quem viaja sozinho ou em grupo, faz um comparativo das vantagens e desvantagens das viagens de trem ou avião entre esses países. Segundo o gerente de Travel do STB, Henrique Braga,
na Europa existem 240 mil quilômetros de trilhos conectando 20 países, com muita praticidade e vantagens para os viajantes. (…)

Braga ressalta ainda outras vantagens das viagens de trem: geralmente as estações situam-se muito próximas aos centros das cidades, facilitando o deslocamento. Ombreando a ausência de conclusão segura sobre a inviabilidade operacional dos atuais ramais está a inexistência de estudos técnicos sobre a economicidade dos negócios pretendidos (relação custo/benefício para o poder público). Aqui as perguntas são ainda mais renitentes, tanto quanto básicas, como as seguintes:
- Quanto custará para a UNIÃO construir o novo ramal para uso da FCA?
- Como será a UNIÃO indenizada?
- Quais serão, concretamente, as vantagens econômicas do novo ramal? Quem as auferirá?

Semelhante ausência de respostas firmes e técnicas pode ser apontada quanto à pretensão do MUNICÍPIO de remover os ramais para, em seu lugar, erigir corredores de ônibus. Nesse passo, calha também notar que um dos ramais que se pretende eliminar corre, em boa medida, próxima e paralelamente a via pública de larguíssimo calibre, a Avenida Eduardo Andrea Matarazzo.
Começa a se tornar notório, mesmo entre os leigos, o fracasso da opção de favorecer o transporte sobre rodas, em vez do transporte sobre trilhos. Viadutos, contornos ou complexos viários, elevados, pontes, túneis, semáforos inteligentes, rodízio de veículos, horários para circulação, nada disso foi capaz de deter a semi-paralisia que afeta cidades como São Paulo, que, ao longo de décadas, deram primazia ao asfalto.

Ademais, obras viárias de grande porte como essas não raro têm o deletério efeito de “desumanizar” as cidades, “rasgando-as”, agredindo sua paisagem, servindo de painel para pichadores, de fonte de barulho para moradores e de tantas outras mazelas, sem falar no favorecimento à poluição pela queima de combustíveis fósseis. Basta lembrar que, agora,
quarenta anos depois de ter sido erguido e de ter produzido forte degradação urbana ao seu redor, o “Minhocão”, como é conhecido o Elevado Costa e Silva, em São Paulo, é objeto de um projeto de demolição da prefeitura.

O terrível vezo político da ausência de planejamento de longo prazo para mobilidade urbana não deve prevalecer numa cidade que já ultrapassou a marca dos 600 mil habitantes, sob pena de estes, no médio e longo prazos, serem submetidos a diuturno desgaste para deslocamentos, pondo-se a perder boa parte da chamada “qualidade de
vida” interiorana.
Também é absolutamente impensável que o MUNICÍPIO adquira a área em questão sem saber ao certo o que fazer com ela. Ou, pior, que a adquira com um intuito momentâneo que, implementado às pressas ou sem maior reflexão, precise ser alterado futuramente, por não se revelar adequado, o que remete ao triste exemplo do Minhocão. Ora, uma vez eliminados os ramais – assim entendidos não apenas os dormentes, trilhos e demais equipamentos férreos, mas principalmente a adequada conformação do solo e do terreno –, sua reposição, após constatar-se que o corredor de ônibus não passa de uma quimera política, afigurar-se-ia no mínimo canhestra.

A indagação primeira seria: por que retirar para depois repor, se tanto tirar quanto repor é
caro? Se é que o modal férreo representa a melhor solução técnica para o local, por que não adaptar, modernizar ou reconfigurar o que se tem? É evidente que, para se duplicar uma rodovia, não é necessário fazer desaparecer a pista simples preexistente. Muito ao contrário, haverá grande aproveitamento da obra anterior.

Como se vê, as questões que não calam nesse aspecto do pretendido negócio são:
- O MUNICÍPIO realmente necessita de corredores de ônibus no local onde hoje estão os ramais abandonados? Onde está o embasamento técnico para essa conclusão?
- O transporte por meio de ônibus é mesmo a melhor alternativa de aproveitamento das áreas para a mobilidade urbana? Não seria o caso de se aproveitarem, além das áreas, os próprios ramais nelas existentes, para a implementação de um modal ferroviário, dando-se início à inversão da lógica claramente nociva da primazia do asfalto?

Outra questão a ser ponderada é a remoção das ocupações irregulares nas áreas em tela, às margens dos ramais. De acordo com o contrato de concessão e segundo a visão da própria ANTT,
essa incumbência pertence à concessionária de transportes ferroviários. Ora, se a responsabilidade por tão oneroso mister recai sobre a FCA, qual a justa causa para o MUNICÍPIO assumi-la sem nenhuma contrapartida? Simplesmente afirmar-se que a região pode ser incluída no programa de desfavelização soa como uma tremenda minimização do problema. Por mais que o programa exista e seja efetivo, a inclusão de novas áreas obviamente onera o erário municipal, ainda que de forma pouco clara à primeira vista.

Por fim, mas não menos importante, não se pode perder de vista a legítima e valorosa pretensão da sociedade civil, por meio do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, de preservar a memória ferroviária da cidade e da região. Por força de provocação dessa mesma e combativa
associação, este órgão ministerial intentou ação civil pública (autos nº 0010837-73.2010.403.6102; 1ª Vara Federal de Ribeirão Preto) na qual se prolatou liminar que bloqueou indevida transferência de bens ferroviários de valor histórico para outra urbe, ameaça que adveio de concerto entre o DNIT e o município que almejava receber esses bens.

Tendo sido o ponto de partida destas peças informativas, a advertência do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, que tem revelado extrema vocação para o fim associativo a que se propõe, é no sentido de que a eliminação dos ramais em foco pode pôr a perder antigo anseio de criação de museu ferroviário nesta cidade, que a Secretaria da Cultura afirma encampar em caráter prioritário (f. 34, 43/47 e 52/56). Isso porque a realidade tem mostrado que museus ferroviários só se tornam atrativos quando oferecem para seus frequentadores a opção de passeio em trem histórico-cultural (f. 49), que, no caso de Ribeirão Preto, só poderia ser viabilizado em algum ponto dos ramais atuais (f. 6).

É notório que o transporte ferroviário de passageiros já foi usado em larga escala neste Estado, tendo experimentado grande apogeu em meados do século passado. As ferrovias eram instituições de grande envergadura e prestígio. Daí a importância da preservação dos bens
remanescentes em museu: revelar às atuais gerações a capacidade de nosso povo de erigir instituições grandiosas, extremamente úteis e dotadas de soberba tecnologia, como foi a Companhia Mogyana, instigando assim, nas pessoas, o senso cívico e de coletivismo – tão desbotado e que, desafortunadamente, só tem aparecido em tempos de copa do mundo de futebol.

Como fica fácil perceber, a legitimidade do Ministério Público para, a despeito da discricionariedade administrativa – e sem prejuízo dela – , questionar o pretendido negócio é ampla e apresenta vários flancos de abordagem.

Tal qual na tentativa de remoção de bens históricos narrada quatro parágrafos acima, não se furtará o parquet federal a, sendo necessário, solicitar ao Judiciário que impeça ou corrija eventual lesão aos interesses públicos primários que o caso suscita. Daí porque, com o escopo máximo de se evitarem lides desnecessárias, que atravanquem o atendimento das demandas político-sociais, afigura-se conveniente recomendar-se aos atores do
pretendido negócio que não ignorem ou minimizem nenhuma das relevantes variáveis mencionadas nesta decisão, sob pena de embargo judicial imediato.

Nessa hipótese, não se poderá alegar que o Ministério Público ou a Justiça estão a impedir a consecução de anseios e projetos favoráveis à coletividade. Afinal, a própria Administração é que, tendo sido expressamente advertida, ter-se-á colocado em posição de dar causa a tal
impedimento. Aliás, essa proposição seria verdadeira ainda que recomendação não houvesse, pois é dever do administrador proceder com razoabilidade e proporcionalidade, independentemente de ser instado nesse sentido.

Diante do exposto, expeçam-se as recomendações que preparei ao MUNICÍPIO (chefia do Poder Executivo), ao MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES e ao DNIT. Dê-se ciência ao representante, a cada um dos vereadores deste Município, à Secretaria da Cultura municipal e ao promotor de Justiça responsável pelas questões urbanísticas. Anualmente, renovem-se, com as necessárias
adaptações, as requisições de f. 90/93 e 94/97.

Ribeirão Preto, 18 de janeiro de 2012.

A segunda carta:

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM RIBEIRÃO PRETO (SP)
RECOMENDAÇÃO PRM/RP Nº 03/2012

Excelentíssima Senhora
DÁRCY VERA
Prefeita Municipal
Ribeirão Preto – SP

EMENTA: Ramais ferroviários em Ribeirão Preto. Antiga Companhia Mogyana. Plano da Administração municipal de eliminação ou de nova afetação desses ramais, após cessão das áreas pela União. Pretensão de instalação de corredor de ônibus. Ausência de embasamento técnico para o negócio. Riscos para o patrimônio histórico-cultural e para o erário municipal.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio, do Procurador da República que esta subscreve, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fundamento nos artigos 127 e 129, caput, III, da Constituição Federal, bem como no artigo 6º, caput, XX, da Lei Complementar nº 75/1993, segundo os quais deve expedir recomendações para preservação
de direitos por ele tutelados e:

CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição
permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a
defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis (CF, art. 127);

CONSIDERANDO que são funções institucionais do
Ministério Público zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos
serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição,
promovendo as medidas necessárias a sua garantia (CF, art. 129, caput, II);
bem como promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos,
coletivos e individuais indisponíveis (CF, art. 129, caput, III);

CONSIDERANDO que tramitam neste órgão ministerial as peças informativas nº 1.34.010.000323/2011-10, instauradas em razão de representação formulada pelo presidente do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, entidade privada, sediada nesta cidade, vocacionada para a preservação da memória ferroviária;

CONSIDERANDO as fundadas razões contidas na decisão lançada nas folhas 180/185 de referido procedimento, datada de 18 de janeiro de 2012, que segue em anexo e constitui parte integrante e indissociável deste ato;

RESOLVE RECOMENDAR ao MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO que não contrate com a UNIÃO, a título gratuito ou oneroso, a aquisição das áreas onde situados os ramais desativados da antiga Companhia Mogyana enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a utilidade desses bens para o MUNICÍPIO.

A presente recomendação é expedida nos autos do procedimento administrativo nº 1.34.010.000323/2011-10, de caráter público. Cópia de peças desses autos pode ser obtida, mediante recolhimento de taxa própria, na Procuradoria da República em Ribeirão Preto, situada na Rua Conde Afonso Celso nº 904, Sumaré, Ribeirão Preto (fone 16-3602-5700).

Ribeirão Preto, 18 de janeiro de 2012.

A terceira carta:

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM RIBEIRÃO PRETO (SP)
RECOMENDAÇÃO PRM/RP Nº 04/2012

Excelentíssimo Senhor
PAULO SÉRGIO OLIVEIRA PASSOS
Ministro dos Transportes
Brasília – DF
PRM-RAO/SP

EMENTA: Ramais ferroviários em Ribeirão Preto. Antiga Companhia Mogyana. Plano da Administraçãomunicipal de eliminação ou de nova afetação desses ramais, após cessão das áreas pela União. Pretensão de construção de novo ramal, a ser custeado pela
União. Ausência de embasamento técnico para o negócio (cessão) e para as obras (eliminação de
ramais antigos e construção de novo). Riscos para o patrimônio histórico-cultural e para o erário federal.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio, do Procurador da República que esta subscreve, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fundamento nos artigos 127 e 129, caput, III, da Constituição Federal, bem como no artigo 6º, caput, XX, da Lei Complementar nº 75/1993, segundo os quais deve expedir recomendações para preservação de direitos por ele tutelados e:

CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127);

CONSIDERANDO que são funções institucionais doMinistério Público zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia (CF, art. 129, caput, II); bem como promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis (CF, art. 129, caput, III);

CONSIDERANDO que tramitam neste órgão ministerial as peças informativas nº 1.34.010.000323/2011-10, instauradas em razão de representação formulada pelo presidente do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, entidade privada, sediada nesta cidade, vocacionada para a preservação da memória ferroviária;

CONSIDERANDO as fundadas razões contidas na decisão lançada nas folhas 180/185 de referido procedimento, datada de 18 de janeiro de 2012, que segue em anexo e constitui parte integrante deste ato;

RESOLVE RECOMENDAR ao MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES

(i) que não aprove a cessão ao MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO, a título gratuito ou oneroso, das áreas onde situados os ramais desativados da antiga Companhia Mogyana enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a impossibilidade de aproveitamento de tais ramais e (ii) que não aprove a construção de um novo ramal em substituição aos já existentes enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a necessidade dessa obra.

A presente recomendação é expedida nos autos do procedimento administrativo nº 1.34.010.000323/2011-10, de caráter público. Cópia de peças desses autos pode ser obtida, mediante recolhimento de taxa própria, na Procuradoria da República em Ribeirão Preto, situada na Rua Conde Afonso Celso nº 904, Sumaré, Ribeirão Preto (fone 16-3602-5700).

Ribeirão Preto, 18 de janeiro de 2012.

A quarta e última carta:

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM RIBEIRÃO PRETO (SP)
RECOMENDAÇÃO PRM/RP Nº 05/2012

EMENTA: Ramais ferroviários em Ribeirão Preto. Antiga Companhia Mogyana. Plano da Administração municipal de eliminação ou de nova afetação desses ramais, após cessão das áreas pela União. Pretensão de construção de novo ramal, a ser custeado pela
União. Ausência de embasamento técnico para o negócio (cessão) e para as obras (eliminação de ramais antigos e construção de novo). Riscos para o patrimônio histórico-cultural e para o erário federal.

Ilustríssimo Senhor
JORGE ERNESTO PINTO FRAXE
Diretor-Geral do DNIT
Ministério dos Transportes
Brasília – DF
PRM-RAO/SP

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio, do Procurador da República que esta subscreve, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fundamento nos artigos 127 e 129, caput, III, da Constituição Federal, bem como no artigo 6º, caput, XX, da Lei Complementar nº 75/1993, segundo os quais deve expedir recomendações para preservação de
direitos por ele tutelados e:

CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127);

CONSIDERANDO que são funções institucionais do Ministério Público zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia (CF, art. 129, caput, II); bem como promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis (CF, art. 129, caput, III);

CONSIDERANDO que tramitam neste órgão ministerial as peças informativas nº 1.34.010.000323/2011-10, instauradas em razão de representação formulada pelo presidente do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, entidade privada, sediada nesta cidade, vocacionada para a preservação da memória ferroviária;

CONSIDERANDO as fundadas razões contidas na decisão lançada nas folhas 180/185 de referido procedimento, datada de 18 de janeiro de 2012, que segue em anexo e constitui parte integrante deste ato;

RESOLVE RECOMENDAR ao DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES – DNIT
(i) que não aprove a cessão ao MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO, a título gratuito ou
oneroso, das áreas onde situados os ramais desativados da antiga Companhia Mogyana enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a impossibilidade de aproveitamento de tais ramais e

(ii) que não aprove a construção de um novo ramal em substituição aos já existentes enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a necessidade dessa
obra.

A presente recomendação é expedida nos autos do procedimento administrativo nº 1.34.010.000323/2011-10, de caráter público.

Cópia de peças desses autos pode ser obtida, mediante recolhimento de taxa própria, na Procuradoria da República em Ribeirão Preto, situada na Rua Conde Afonso Celso nº 904, Sumaré, Ribeirão Preto (fone 16-3602-5700).

Ribeirão Preto, 18 de janeiro de 2012.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

AVACALHAÇÃO NAS FERROVIAS BRASILEIRAS

Americana, 2009 - Foto André B. Benetti

O artigo abaixo foi-me enviado hoje pelo engenheiro Paulo Ferraz, do Paraná. Não sei a fonte, mas foi aparentemente publicado hoje em algum jornal e/ou site de notícias. Como sempre, nada no Brasil é feito de forma séria. Leiam:

É OBRIGATÓRIA A MANUTENÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO EM TODOS OS
TRECHOS FERROVIÁRIOS

Segundo o artigo 175 da Constituição Federal, “incumbe ao Poder Público, na
forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre
através de licitação, a prestação de serviços públicos”. E continua
“Parágrafo único. A lei disporá sobre: I - o regime das empresas
concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial
de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade,
fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II - os direitos dos
usuários; III - política tarifária; IV - *a obrigação de manter serviço
adequado*.

Conforme o § 1º do artigo 6º da Lei nº 8.987/95, que dispõe sobre o regime
de concessão da prestação de serviços públicos, e que regulamentou o artigo
175 da Constituição Federal, estabeleceu que o serviço público adequado “é
o que satisfaz as condições de* regularidade, continuidade*, eficiência,
segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade
das tarifas”.

Em março de 2009 o Diretor Geral da ANTT concedeu entrevista a Revista
Ferroviária admitindo na ocasião que dois terços da malha ferroviária
concedida a empresas privadas já estavam subutilizadas, ou seja o serviço
público concedido de transporte ferroviário de cargas já não estava sendo
prestado pelas concessionárias de forma adequada, pois não era regular e
contínuo.

Na época, segundo o Relatório da Auditoria Interna da ANTT nº
02/OA/AUDIT/2009, referente à auditoria realizada de 02/03/09 a 31/03/2009
na Unidade Regional do Rio Grande do Sul da ANTT, a concessionária da Malha
Sul da ex-Rede Ferroviária Federal, a America Latina Logística Malha Sul,
por exemplo, já não realizava a prestação de serviços públicos concedidos
em 1.996 quilômetros de ferrovia concedida para a empresa, de um total de
6.913 quilômetros da Malha Sul, ou seja, em 28,44% da malha ferroviária sul
a concessionária já havia desativado todo o transporte ferroviário.

Abaixo as tabelas com os trechos desativados extraídas do Relatório da
Auditoria Interna da ANTT nº 02/OA/AUDIT/2009: (nota minha: esta tabela não veio na mensagem).

Um exemplo do abandono da ferrovia pela Concessionária são os 80
quilômetros que ligam São Borja até Unistalda, no Rio Grande do Sul, onde
não existe mais a linha ferroviária. Os dormentes, os trilhos e até as
pedras do lastro de linha sumiram. O pátio da estação de São Borja foi
totalmente invadido pelas populações de baixa renda.

A Resolução da ANTT nº 44 de 04 de julho de 2002 estabelece diversos
procedimentos relativos às solicitações de suspensão e supressão de
serviços de transporte ferroviário e de desativação de trechos, pelas
concessionárias de serviço público de transporte ferroviário, com
fundamento no art. 6º da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, nos
arts. 3º e 4º do Regulamento dos Transportes Ferroviários, aprovado pelo
Decreto nº 1.832, de 4 de março de 1996, e nos contratos de concessão.

As Concessionárias ferroviárias entretanto vem ao longo dos quinze anos de
concessão, realizando a suspensão e supressão de serviços de transporte
ferroviário e a desativação de trechos por iniciativa própria e sem cumprir
quaisquer procedimentos legais.

A ausência da prestação de serviço público de transporte ferroviário de
carga, entretanto já tinha sido identificada como uma irregularidade por
outros órgãos públicos, inclusive pelo Juiz Federal Mauro Spalding, de
Jacarezinho/PR, conforme a sentença emitida em 31 de outubro de 2007,
refente a Ação Civil Pública nº 2006.70.13.001025-3/PR, que trata do
abandono das ferrovias pelos entes privados.

Na sentença, Mauro Spalding afirma que “não se pode olvidar que nos
contratos de concessão a continuidade da prestação dos serviços é princípio
fundamental norteador da aplicação das avenças pactuadas pelo Poder Público
com o particular-concessionário. Com efeito, o Estado transfere ao
particular o exercício do serviço público, continuando na titularidade do
referido serviço, motivo pelo qual o concessionário deve respeitar as
condições estabelecidas em lei e no contrato de concessão”.

Com base nisso, Mauro Spalding concluiu: “é evidente, pela dicção legal,
que o concessionário não pode furtar-se de manter em funcionamento o
serviço público, dentro dos padrões de segurança, eficiência e conservação”.

Com referência ao estabelecido nos contratos de concessão das malhas
ferroviárias, estão previstas várias obrigações para as concessionárias,
tais como: prestar serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários,
assegurar a prestação de serviço adequado e manter a continuidade do
serviço concedido.

O contrato de concessão também prevê que é direito dos usuários receber
serviço adequado.

No caso do descumprimento das obrigações previstas, o contrato prevê que a
concessionária deve ser multada pela agência fiscalizadora, a Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), podendo o valor da multa
alcançar o valor de quase 500 mil reais para cada ocasião em que se
constatar o descumprimento da obrigação. Isto mostra que o contrato de
concessão tem possibilidades de penalização da concessionária, capaz de
fomentar a manutenção dos serviços de transporte de cargas.

O descumprimento do contrato compromete até mesmo a lisura do processo
licitatório, pois sem o cumprimento das obrigações previstas, o lance que
arrematou o leilão poderia ter sido muito maior.

Na mesma sentença, Mauro Spalding afirma que “a documentação juntada pelo
MPF - particularmente as fotografias de fls. 209/243 - demonstram a
ineficiência da atuação da ANTT em seu papel de fiscal”.

Pela lei a ANTT deve fiscalizar e exigir que as concessionárias
ferroviárias cumpram o contrato de concessão que nada mais é que uma
transcrição do edital de licitação que norteou a disputa das várias
empresas privadas pelo direito de prestar o serviço público em nome do
Estado brasileiro. É missão institucional da ANTT assegurar aos usuários a
adequada prestação de serviços de transporte terrestre e exploração de
infraestrutura rodoviária e ferroviária outorgada.

Aliás, tal premissa genérica foi instituída com a publicação da Lei nº
10.233/2001, que reestruturou os transportes aquaviários e terrestres,
criando o Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte, a
Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, a Agência Nacional de
Transportes Aquaviários – ANTAQ – e o Departamento Nacional de
Infraestrutura de Transportes – DNIT.

A ANTT é responsável, além de outras determinações, pela fiscalização
direta do cumprimento das cláusulas contratuais de prestação de serviços
ferroviários e de manutenção e reposição dos ativos arrendados (inc. IV),
além de contribuir para a preservação do patrimônio histórico e da memória
das ferrovias, orientando e estimulando a participação dos concessionários
do setor (inc. VII).

A responsabilidade é da Diretoria, sobretudo do Diretor-Geral, a quem cabe
a representação da ANTT e o comando hierárquico sobre pessoal e serviços
(art. 26, da Resolução nº 001/2002).

Segundo o Ministério Público Federal, entretanto, conforme a representação
feita junto ao TCU, a ANTT não tem cumprido seu papel como ente regulador.

Segundo o MPF, “é visível a postura leniente da direção da Agência, que tem
evitado a aplicação de qualquer penalidade à América Latina Logística S/A.
O trabalho de seus próprios administrados é dificultado. Assim, infringem
claramente as Resoluções que tratam especificamente do Auto de Infração”.

Segundo contrato de concessão e o art. 21 do regulamento anexo à Resolução
nº 442/2004 da própria ANTT, “o auto de infração será lavrado no momento em
que verificada a prática da infração”. Segundo o MPF, entretanto, a ANTT
não autoriza seus agentes a emitirem diretamente Autos de Infração. Os
funcionários são instruídos a emitirem apenas e tão somente relatórios
sobre as Inspeções Técnicas realizadas, conforme se a Ordem de Serviço
estabelecida no Memorando Circular nº 18/SUCAR, de 27 de janeiro de 2010. A
determinação da Ordem de Serviço é: “Em caso de problema grave, em que haja
proposta de aplicação de penalidade à Concessionária, deverá ser elaborada
Nota Técnica e enviada à GEFER junto ao relatório.

É flagrante a irregularidade e ilegalidade na determinação feita pela ANTT
aos seus servidores, favorecendo as concessionárias ferroviárias, uma vez
que as mesmas não são penalizadas com as pesadas multas prevista nos
contratos de concessão, configurando um total descompasso com a legislação
vigente que determina que os Técnicos devem lavrar autos de infração no
local que verifica a irregularidade.

Dessa forma, o Governo Federal vem pagando bons salários aos técnicos da
ANTT, mas impedindo que eles trabalhem em favor dos interesses do país.

Tais fatos confirmam por que a ANTT permite que as concessionárias
literalmente abandonem trechos ferroviários, permitindo o sucateamento e a
destruição de bens públicos sem tomar as providências que determina a
legislação e proibindo que os técnicos em regulação assim o façam.

As concessionárias desoneram-se do ônus contratual da manutenção e
conservação de aproximadamente 2/3 da malha ferroviária brasileira;
desoneram-se, também, da obrigação contratual de oferecer serviço público
de transporte de cargas aos usuários; descumprem elas, como determina a lei
de concessões, a obrigação de assegurar a continuidade do serviço público.
Dito de outro modo, minimizam custos em detrimento/prejuízo do patrimônio
público e do desenvolvimento nacional e sobretudo regional.

Embora não tenha providenciado a penalização das infrações contratuais
durante os 15 anos de concessão, a diretoria da ANTT reconheceu pelos menos
o dever contratual das Concessionárias de zelar pelos bens vinculados à
concessão, mantendo-os em perfeitas condições de funcionamento e
conservação, através da Deliberação ANTT N.o 124, de 6 de julho de 2011.

Nesta Deliberação a Diretoria da ANTT determinou as concessionárias
condições e prazos para regularizar a situação dos 5.544 km de trechos e
ramais ferroviários sem tráfego de cargas, de forma a adequá-los para o
transporte de cargas, no mínimo nas mesmas condições previstas quando da
celebração dos respectivos Contratos de Concessão e de Arrendamento.

Os trechos citados na Deliberação são:

I - Trecho: Pradópolis - Barretos; Extensão: 131 km; Concessionária: ALL
Malha Paulista;

II - Trecho: Bauru - Tupã; Extensão: 172 km; Concessionária: ALL Malha
Paulista;

III - Trecho: Tupã - Adamantina; Extensão: 72 km; Concessionária: ALL Malha
Paulista;

IV - Trecho: Adamantina - Panorama; Extensão: 155 km; Concessionária: ALL
Malha Paulista;

V - Ramal de Piracicaba; Extensão: 45 km; Concessionária: ALL Malha
Paulista;

VI - Trecho: Maringá - Cianorte; Extensão: 92 km; Concessionária: ALL Malha
Sul;

VII - Trecho: Santo Ângelo - Cerro Largo - São Luiz Gonzaga; Extensão: 106
km; Concessionária: ALL Malha Sul;

VIII - Trecho: Santiago - Dilermando Aguiar; Extensão: 142 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

IX - Trecho: Entroncamento - Livramento; Extensão: 156 km; Concessionária:
ALL Malha Sul;

X - Trecho: Presidente Epitácio - Presidente Prudente; Extensão: 104 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

XI - Trecho: Morretes - Antonina; Extensão: 16 km; Concessionária: ALL
Malha Sul;

XII - Trecho: Cabo - Propriá; Extensão: 549 km; Concessionária:
Transnordestina Logística;

XIII - Trecho: Ribeirão Preto - Passagem; Extensão: 63 km; Concessionária:
Ferrovia Centro-Atlântica;

XIV - Trecho: São Francisco - Propriá; Extensão: 431 km; Concessionária:
Ferrovia Centro-Atlântica;

XV - Trecho: Paripe - Mapele; Extensão: 8 km; Concessionária: Ferrovia
Centro-Atlântica;

XVI - Ramal de Ladário; Extensão: 5 km; Concessionária: ALL Malha Oeste;

XVII - Trecho: Santiago - São Borja; Extensão: 160 km; Concessionária: ALL
Malha Sul;

XVIII - Trecho: Varginha - Evangelista de Souza; Extensão: 21 km;
Concessionária: ALL Malha Paulista;

XIX - Trecho: Indubrasil - Ponta Porã; Extensão: 304 km; Concessionária:
ALL Malha Oeste;

XX - Trecho: Barão de Camargos - Lafaiete Bandeira; Extensão: 334 km;
Concessionária: Ferrovia Centro-Atlântica;

XXI - Trecho: Cavaru - Ambaí; Extensão: 143 km; Concessionária: Ferrovia
Centro-Atlântica;

XXII - Trecho: Salgueiro - Jorge Lins; Extensão: 595 km; Concessionária:
Transnordestina Logística;

XXIII - Trecho: Paula Cavalcante - Macau; Extensão: 479 km; Concessionária:
Transnordestina Logística;

XXIV - Trecho: Ambaí - Santo Bento; Extensão: 18 km; Concessionária:
Ferrovia Centro-Atlântica;

XXV - Trecho: Marques dos Reis - Jaguariaíva; Extensão: 210 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

XXVI - Trecho: Passo Fundo - Cruz Alta; Extensão: 194 km; Concessionária:
ALL Malha Sul;

XXVII - Trecho: Mafra - Porto União; Extensão: 242 km; Concessionária: ALL
Malha Sul;

XXVIII - Trecho: Porto União - Passo Fundo; Extensão: 173 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

XXIX - Trecho: São Luiz Gonzaga - Santiago; Extensão: 115 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

XXX - Ramal de Cachoeira do Sul; Extensão: 6 km; Concessionária: ALL Malha
Sul;

XXXI - Trecho: Biagipólis - Itaú; Extensão: 165 km; Concessionária:
Ferrovia Centro-Atlântica;

XXXII - Trecho: General Carneiro - Miguel Burnier; Extensão: 84 km;
Concessionária: Ferrovia Centro-Atlântica;

XXXIII - Trecho: Barretos - Colômbia; Extensão: 54 km; Concessionária: ALL
Malha Paulista.

A malha ferroviária no país atualmente é de 28,2 mil quilômetros. Os
Estados Unidos têm 270 mil quilômetros de ferrovias, e a China, 90 mil.
Segundo o diretor-executivo da ANTF (Associação Nacional dos
Transportadores Ferroviários), Rodrigo Vilaça, em entrevista à Folha.com em
22/02/2011, o Brasil deveria ter atualmente 52 mil quilômetros de ferrovias
para atender à demanda de transporte, sobretudo de minérios e de grãos.

Por tudo isso não se pode entender como o Governo Federal abriu mão de mais
de 5.000 km de ferrovia que foram sucateadas e não estão sendo usadas.



*ANEXOS – EXTRATO DOS DOCUMENTOS EXAMINADOS*

* *

*ENTREVISTA DE BERNARDO FIGUEIREDO A REVISTA FERROVIÁRIA EM MARÇO DE 2009*

RF: Quantos quilômetros da malha brasileira estão hoje subutilizados? Cinco
mil, sete mil?

Bernardo - Eu acho que é mais do que isso.

RF: Mais?

Bernardo - Dois terços da malha ferroviária brasileira estão subutilizados.
E o critério que eu uso para chegar a essa definição é o seguinte: uma
ferrovia em que não passa pelo menos um trem por dia está subutilizada, não
é?



*DELIBERAÇÃO ANTT N.o 124, DE 6 DE JULHO DE 2011*

CONSIDERANDO o dever contratual das Concessionárias de zelar pelos bens
vinculados à concessão, mantendo-os em perfeitas condições de funcionamento
e conservação, delibera estabelecer condições e fixar prazos para
regularizar a situação de 5.544 km de trechos e ramais ferroviários sem
tráfego de cargas, de forma a adequá-los para o transporte de cargas, no
mínimo nas mesmas condições previstas quando da celebração dos respectivos
Contratos de Concessão e de Arrendamento.

*CONTRATOS DE CONCESSÃO *

*CLAUSULA NONA: DAS OBRIGAÇÕES DAS PARTES*

*ITEM 9.1 – DAS OBRIGAÇÕES DA CONCESSIONÁRIA*

*VIII) Prestar serviço adequado *ao pleno atendimento dos usuários, sem
qualquer tipo de discriminação e sem incorrer em abuso de poder econômico,
atendendo às condições de regularidade, continuidade, eficiência,
segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade
das tarifas.

X) Promover a reposição de bens e equipamentos vinculados à CONCESSÃO, bem
como a aquisição de novos bens,* de forma a assegurar prestação de serviço
adequado.*

XIV) Zelar pela integridade dos bens vinculados à CONCESSÃO, conforme
normas técnicas específicas, mantendo-os em perfeitas condições de
funcionamento e conservação, até a sua transferência à CONCEDENTE ou à nova
CONCESSIONÁRIA.

*XXIV) Manter a continuidade do serviço concedido*, salvo interrupção
emergencial causada por caso fortuito ou força maior, comunicando
imediatamente a ocorrência de tais fatos à CONCEDENTE.

CLAUSULA DÉCIMA-PRIMEIRA – DOS DIREITOS E OBRIGAÇÕES DOS USUÁRIOS

São direitos e obrigações dos usuários:

*I) Receber serviço adequado; *

CLAUSULA DÉCIMA-TERCEIRA – DAS INFRAÇÕES E PENALIDADES

Parágrafo 15º - A concessionária será multada quando infringir qualquer das
obrigações do Grupo III, descrito a seguir:

- incisos XIX a XXI, XXIV a XXVI do item 9.1 da clausula nona.

Parágrafo 18º - O valor básico unitário da multa será equivalente ao da
maior parcela fixa dentre as tarifas de referência homologadas para a malha
expressa em reais por tonelada. Ficam estabelecidos os seguintes valores de
multa:

Grupo II: 10.000 (dez mil) vezes o valor básico unitário;

*Grupo III: 30.000 (trinta mil) vezes o valor básico unitário.*

(OBS: valor básico unitário aproximado de R$ 16,00)

*SENTENÇA DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº 2006.70.13.001025-3/PR*

*JUSTIÇA FEDERAL*

* A concessão é instituto que representa crucial importância
para a prestação dos serviços públicos à população. Nesse contexto, não se
pode olvidar que nos contratos de concessão a continuidade da prestação dos
serviços é princípio fundamental norteador da aplicação das avenças
pactuadas pelo Poder Público com o particular-concessionário. Com efeito, o
Estado transfere ao particular o exercício do serviço público, continuando
na titularidade do referido serviço, motivo pelo qual o concessionário deve
respeitar as condições estabelecidas em lei e no contrato de concessão.*

Não obstante, a Lei nº 8.987/95, que regulamentou o artigo 175 da
Constituição Federal, estabelece:

"Art. 6º (...)

§ 1º - Serviço adequado é o que satisfaz as condições de
regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade,
generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.

§ 2º - A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do
equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e
expansão do serviço.

É evidente, pela dicção legal, que o concessionário não pode
furtar-se de manter em funcionamento o serviço público, dentro dos padrões
de segurança, eficiência e conservação.

*Neste passo, revela-se descabida a alegação da ANTT de que teria cumprido
seu mister. A farta documentação juntada comprova, de fato, o trâmite de
procedimentos administrativos com imposição de penalidades. Mas a
documentação juntada pelo MPF - particularmente as fotografias de fls.
209/243 - demonstram a ineficiência da atuação da ANTT em seu papel de
fiscal.*

*REPRESENTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL CONTRA A ANTT JUNTO AO
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO*

É visível a postura leniente da direção da Agência, que tem evitado a
aplicação de qualquer penalidade à América Latina Logística S/A. O trabalho
de seus próprios administrados é dificultado. Assim, infringem claramente
as Resoluções que tratam especificamente do Auto de Infração.

O art. 21 do regulamento anexo à Resolução nº 442/2004 dispõe que “O auto
de infração será lavrado no momento em que verificada a prática da
infração, seja em flagrante seja no curso de procedimento de fiscalização”
(grifou-se), e prevê a seguinte exceção: “Salvo motivo de força maior,
devidamente justificado, nos casos de flagrante e de fiscalização, o auto
de infração será lavrado no local em que verificada a falta, ainda que o
infrator não seja estabelecido ou domiciliado no local” (§ 1º, art. 21),
bem como que o Autor de Infração (AI) deverá obedecer os modelos aprovados
pelas Superintendências de Processos organizacionais competentes, sendo
numerado e lavrado com observância da sequência numérica do talonário (art.
22).

Ou seja, a regra é de que o agente fiscalizador deverá lavrar o Auto de
Infração no momento em que constatar a prática infratora, e a exceção se
refere à possibilidade de o fazer em momento posterior, desde que
devidamente justificada.

Por seu turno, os termos do art. 2º da Resolução nº 442/2004 determinam que
“a autoridade que tiver ciência de infrações legais ou contratuais, ou de
indícios de sua prática, é obrigada a promover a sua apuração imediata,
mediante instauração de procedimento de averiguações preliminares ou de
processo administrativo, assegurados, nesta hipótese, o contraditório e a
ampla defesa”. No entanto, conforme exposto na reunião do dia 22/04/2011 na
sede da ANTT, pelo Grupo de Trabalho Transportes da Terceira Câmara de
Coordenação e Revisão – Consumidor e Ordem Econômica, da Procuradoria Geral
da República, informações dão conta de que a ANTT não vem lavrando Autos de
Infração no momento da constatação da infringência contratual pela
concessionária ferroviária, em alguns casos nunca os lavrando, e em outros
só o fazendo após a instauração de procedimento administrativo,
contrariando as normas editadas pela própria Agência.

A ANTT não autoriza seus agentes a emitirem diretamente Autos de Infração.
Os funcionários são instruídos a emitirem apenas e tão somente relatórios
sobre as Inspeções Técnicas realizadas. Essa tema foi objeto de recente
RECOMENDAÇÃO expedida pelo Grupo de Trabalho responsável também pela
elaboração deste documento, que segue em anexo.

Tais comandos partiram do Memorando Circular nº 18/SUCAR, de 27 de janeiro
de 2010. Uma das determinações da Superintendência é de que:

“Em caso de problema grave, em que haja proposta de aplicação de penalidade
à Concessionária, deverá ser elaborada Nota Técnica e enviada à GEFER junto
ao relatório (...)” (grifou-se).

Como se vê, determinou-se que sejam emitidos relatórios, que deverão ser
acompanhados de Notas Técnicas, e jamais lavrados Autos de Infração.

A assertiva acima poderá ser confirmada nos autos do processo
Administrativo nº 50520.006968/2010-29, aberto em virtude de recomendação
de aplicação de penalidades por especialistas da área.

É flagrante a irregularidade/ilegalidade na determinação da SUCAR, que
proíbe a emissão de Autos de Infração por Especialistas em Regulação da
ANTT em desfavor das concessionárias ferroviárias, em descompasso com a
legislação vigente que autoriza os Especialistas em Regulação de Serviços
de Transportes Terrestres e Técnicos em Regulação de Serviços de
Transportes Terrestres (Lei nº 10.871/2004) a lavrarem tal infração.

Tais fatos confirmam que o Poder Concedente permite que as concessionárias
literalmente abandonem trechos ferroviários, permitindo o sucateamento e a
destruição de bens públicos sem tomar as providências que determina a
legislação e proibindo que os técnicos em regulação assim o façam.

As concessionárias desoneram-se do ônus contratual da manutenção e
conservação de aproximadamente 2/3 da malha ferroviária brasileira;
desoneram-se, também, da obrigação contratual de oferecer serviço público
de transporte de cargas aos usuários; descumprem elas, como determina a lei
de concessões, a obrigação de assegurar a continuidade do serviço público.

Dito de outro modo, minimizam custos em detrimento/prejuízo do patrimônio
público e do desenvolvimento nacional e sobretudo regional.