quarta-feira, 3 de junho de 2009

CULTURA PRIORIDADE ZERO

Aqui do leito do hospital em São Paulo, esperando por uma operação arterial, nada contente com isso e com o fato de ir ficar pelo menos mais dez dias por aqui, eu pelo menos consigo usar meu laptop e manejar uma Internet do tipo cai-não-cai. Por algum motivo lembrei-me da terra natal de meu avô Hugo.

Em 20 de dezembro – já são mais de cinco meses – fui a Jaguariúna pela última vez. Foi a quarta vez em que cheguei lá à noite. Continua uma cidade pequena, onde a área central é a velha Vila Bueno que não tem mais esse nome, mas que é a cidade original construída por meu bisavô Guilherme Giesbrecht em 1894 a pedido do Coronel Amâncio Bueno. Cheguei ali pouco antes das 20 horas e fui à Casa da Memória, atrás da Igreja Santa Maria e que seria inaugurada nessa noite. Fui convidado para o evento e também para o lançamento do livro sobre a cidade.

O teatro Municipal fica na frente da Casa da Memória. Às 20 horas começou o evento, que durou duas horas. Não foi mau. Falou-se principalmente do Padre Gomes, um padre que viveu quase 60 anos na cidade, falecendo cinco anos atrás. Eu nunca havia ouvido falar dele, mas sem dúvida, a julgar pela exposição, uma grande pessoa.

O livro, distribuído depois, é muito bom e estranhamente pouco fala dele; fala mais de Guilherme, que, afinal, ficou muito menos na cidade – uns 4 anos – foi-se ao final do serviço e provavelmente nunca mais voltou. É verdade que meu avô Hugo, seu filho mais velho, nasceu lá em 1894, mas também se foi sem poder conhecer a cidade onde nasceu. Existiria a cidade sem Guilherme? Se não fosse ele, seria outro engenheiro? Era ele que estava lá no momento; outro teria de ser trazido de fora.

No fim, olhando o mapa que ele deixou e ainda existente, a cidade tem o mesmo arruamento até hoje. Mudou o quê? Existe uma avenida que corre hoje pelo leito dos trilhos da linha velha e da linha nova da Mogiana – ambas desaparecidas. A linha passa hoje fora da cidade. Outra linha extinta foi o ramal de Amparo, que seguia para Pedreira e Amparo.

Eu conhecia o mapa, mas foi somente desta vez que, conversando com a Suzana, a responsável pela festa e escritora do livro, eu percebi realmente onde estavam essas ruas. Fui depois do evento a uma pizzaria além da avenida citada acima e localizada ainda dentro da área do loteamento original, mas em quarteirões que foram povoados somente 50 anos depois: já a região próxima à biblioteca – que era um dos onze prédios, além da igreja, construídos por Guilherme. Outros bairros mais novos foram aparecendo depois dos anos 1960, quando por todo o Brasil houve expansão de cidades pequenas e grandes.

Jaguariúna é bonita à noite. A volta dos trilhos – parte deles, somente a ligação entre a ponte de 1945 e a estação nova, do mesmo ano –, eliminados em 1983, deram uma característica simpática à cidade. Eles foram repostos três anos atrás e a cidade percebeu o que isso mudou. A visão da estação e de sua plataforma cheia de gente em mesas com as luzes em volta são magníficas. Em visitas anteriores, fui descobrindo o interior da igreja da qual meu pai, Ernesto, sempre dizia: “na igreja de Jaguariúna há uma placa que diz que quem construiu a igreja foi meu avô”. Nunca vi essa placa, nem sei se realmente existiu, mas era um dos orgulhos de papai, que nem era um católico fervoroso. São histórias que ouvimos e guardamos desde criança.

Veio o dia 1º de janeiro, novo prefeito assumiu e, como sói acontecer em todo o Brasil de políticos de visão curta, livrou-se de quem trabalhou no mandato anterior: todos os que colaboraram para a Casa da Memória foram sumariamente demitidos. Cultura: prioridade zero no Brasil.

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