sexta-feira, 5 de julho de 2013

REQUIÉM PARA AS FERROVIAS BRASILEIRAS

Poucos metros antes da bifurcação da linha Salvador-Mapele que dava saída para Candeias e Cachoeira (para a esquerda, acompanhando o fundo da Baía de Todos os Santos) e para Simões Filho e Camaçari (para a direita), em 2006, isto já não era mais possível. Foto minha

A notícia surgida ontem que a ANTT - órgão federal totalmente incompetente e que não fiscaliza coisa alguma - autorizou a FCA, Ferrovia Centro-Atlântica e empresa do grupo da Vale, a devolver trechos de ferrovias a ela concessionada desde 1997 é a falência praticamente definitiva das ferrovias do país.

As concessões foram feitas para recuperar as estradas de ferro brasileiro do abandono e desleixo em que se encontravam, de forma a recuperar cargas perdidas por anos e anos de total desinteresse da moribunda RFFSA e tentar aumentar a participação das ferrovias do transporte de cargas no país.

Não demorou muito para se perceber que o órgão fiscalizador, justamente a ANTT, não atuava, dando margem a que as ferrovias somente passassem a transportar o que lhe interessava e não o que era necessário ser transportado por interesse de clientes potenciais.
Foto da estação de Mapela, já sem acesso por trilhos em 2006, foto minha

 Os investimentos realizados foram mínimos, quase sempre na compra de locomotivas usadas do exterior e na reforma de máquinas de até sessenta anos de uso e já em mau estado. A via permanente somente era reformada quando não havia mais jeito. As prometidas variantes de melhoria de percurso passaram a ser empurradas com a barriga, sempre se esperando que o governo oferecesse suas famosas tetas para que nelas mamassem as concessionárias.

Cada vez mais, linhas que ainda eram usadas - mesmo quando apenas por autos de linha para uma limpeza porca - pela RFFSA e FEPASA até as vésperas das concessões, foram postas totalmente de lado, dando margem a canibalismo (arrancamento de trilhos para serem levados para substituir outros em pior estado, mas em linhas com interesse para as ferrovias) e até a roubo de trilhos por bandidos que os vendiam a sucateiros.

A eletrificação foi totalmente abandonada, com fiação e postes roubados para posterior venda. As subestações elétricas ficaram às moscas e foram depredadas e o material inteiro de cobre e outors metais foram também furtados. As estações e depósitos ferroviários que interessaram às concessionárias foram em grande parte usados somente em uma ou outra sala, ficando o resto exposto ao total abandono.

Aliás, uma propaganda publicada hoje no jornal O Estado de S. Paulo mostra em meia página a ALL orgulhando-se de ter sido eleita a "ferrovia do ano" ou algo do tipo. Quem votou nela para ganhar tal prêmio ou está cego ou tem algum interesse nisso. Basta citar que esta é a concessionária que mais aparece na mídia com acidentes após acidentes.

Os trens de passageiros não entraram nas concessões, apenas a Vale os manteve em duas de suas linhas (Carajás e Vitória-Minas), o resto acabou, as concessões nem os previram. Hoje, se alguém se interessar em ter uma delas, vai ter de construir linhas novas, dado o estado lamentável das linhas que estão sendo utilizadas para cargas e, mais ainda, das que não estão sendo utilizadas para nada, mas têm geralmente sua cessão negada quando alguém, por interesse político ou não, aparece pedindo-as, geralmente para os inútios trens tur~isticos de fim-de-semana.

Transcrevo então agora o que a ANTT exigiu que a FCA faça com as linhas que não quer mais e que estão, em sua enorme parte, totalmente abandonadas, cobertas de terra e mato e em muitos casos á sem trilhos.

"A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) autorizou a concessionária Ferrovia Centro-Atlântica S.A. (FCA) a desativar e a devolver ao Poder Público trechos ferroviários que explorava nos Estados da Bahia, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Sergipe. A decisão, que está em resolução publicada no Diário Oficial da União desta sexta-feira, abrange tanto trechos considerados "antieconômicos" quanto trechos economicamente viáveis.
Vista de Paripe, sentido de Aratu e Mapele, já totalmente abandonada em 2006. Foto minha

Os trechos antieconômicos a serem desativados são: Paripe (BA) - Mapele (BA; Ramal do Porto de Salvador; Sabará (MG) - Miguel Burnier (MG); Barão de Camargos (MG) - Lafaiete Bandeira (MG); Biagípolis (SP)- Itaú(MG); Ribeirão Preto (SP) - Passagem(SP); e Cavaru (RJ) - Ambaí (RJ).

Já as vias economicamente viáveis que serão devolvidas são: Alagoinhas (BA)- Juazeiro (BA); Alagoinhas (BA) - Propriá (SE); Cachoeiro de Itapemirim (ES) - Vitória (ES); Barão de Angra (RJ) - Campos dos Goytacazes (RJ) - Cachoeiro de Itapemirim (ES), incluindo trecho Recreio - Cataguases; Visconde de Itaboraí (RJ) - Campos dos Goytacazes (RJ); e Corinto (MG) a partir do km 1.015 + 000 - Alagoinhas (BA)."

Praticamente todas estão sem conservação há anos. Pela concessão, elasdeveriam ser devolvida em perfeito estado à União. Porém, vejamos o que disse a desleixada ANTT:

"A ANTT determinou que o valor devido pela concessionária em função da degradação das vias férreas será convertido em investimentos, a serem efetuados pela FCA na Malha Centro-Leste, no montante de R$ 760 milhões, acrescidos de 15% a título de vantajosidade para o setor público. A União poderá autorizar o pagamento parcelado dessa indenização.

O órgão determinou ainda que a desativação dos trechos deverá atender a cronograma aprovado pela ANTT para interrupção do atendimento aos usuários e que a FCA fará a retirada dos materiais não passíveis de reaproveitamento, responsabilizando-se pela sua guarda pelo período de um ano, ou até que o Departamento Nacional de Infraestrutruta de Transportes (DNIT) promova sua devida destinação. A concessionária também deve retirar o material metálico dos trechos a serem devolvidos, em montante correspondente a 1.760 km de via férrea, comprometendo-se a efetivar seu reaproveitamento nos segmentos remanescentes da Malha Centro-Leste."

Isto, em resuno, significa que, se alguém se interessar em utilizar estes trechos por meio de nova concessão, não os terão mais, seja para trens de passageiros ou de cargas, agravados pelo fato de que a invasão desses leitos, com ou sem trilhos, pela favelização será dificilmente reversível. Trechos como o Mapele-Paripe, por exemplo, que já há muito poderiam estar sendo utilizados pela CBTU para transportar passageiros para o polo petroquímico de Camaçari ou para as cidades suburbanas de Candeias, Santo Amaro e Cachoeira, no Recôncavo baiano, vão ter imensas dificuldades para tal. Convém ressaltar que as rodovias que partem de Salvador para essas localidades bastante populadas tanto por moradores que trabalham em outras cidades como por trabalhadores que vêm das cidades vizinhas estão em mau estado. E os trens que serviam as cidades citadas foram cancelados no início dos anos 1980, sabe-se Deus por que, mantendo-se somente o trecho mais do que centenário Salvador-Paripe, apenas.

E ainda tem gente que acha que o governo de seu Lula e da "presidenta" Dilma foram os melhores que este pobra país já teve. Meu Deus, os que fizemos para merecer essa trempa de incompetentes?

Nota: não vou comentar linha por linha aqui neste texto, porque senão certamente vararia a noite. Fica para outra vez. Afinal, já começaram o desmonte das ferrovias mesmo e não vai ser um texto escrito por um ilustre desconhecido como eu que vai mudar isso.

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