Ruínas da estação de Cachoeira Paulista atualmente (Foto Pino Rossi)
As fotos que me vão chegando dia a dia mostram pouca coisa de novo em termos de manutenção da memória brasileira. Mais especificamente, da memória arquitetônica de nosso país. E, mais especificamente ainda, a memória ferroviária. Durante esta semana que passou, chegaram-me às mãos três casos que me interessaram.
Enquanto em Cachoeira Paulista um grupo de moradores da cidade luta para tentar impedir a queda das paredes que restam da velha, magnífica e enorme estação ferroviária da cidade, em Franca, no norte do Estado, uma estação da Mogiana que serve como estação rodoviária desde o seu fechamento como ferroviária em 1980 recebe, pela enésima vez, promessas de restauro e instalação de um centro cultural.
Reportagem sobre a estação de Franca (O Estado de S. Paulo, 3/4/2013)
Centros culturais, aliás, são os destinos mais comuns das velhas estações, embora estações rodoviárias também sejam instaladas em algumas - se observarmos bem, uma coisa não difere muito da outra, embora a quantidade de ônibus seja maior do que a de trens quando estes existiam.
Já a foto recebida de Bauru mostra um abandono cada vez maior da estação da cidade e seu pátio, bem como de locomotivas da antiga Companhia Paulista que deveriam estar há muito preservadas, mas que se deterioram dia a dia por falta de recursos para seu restauro.
O grande problema é: se a estação de Cachoeira já apresentava, segundo relatos que ouvi já há anos, sinais de deterioração nos anos 1970, quando ainda existia dentro dela alguma atividade, como e por que se deixou chegar este prédio à situação em que ele está hoje?
Detalhe do pátio da estação de Cachoeira Paulista: notar a inscrição no ferro das oficinas da E. F. D. Pedro II, em 1877 (Fotp Pino Rossi)
E se a ex-estação ferroviária de Franca já serve como rodoviária há vários anos, por que não se cuidou dela para ser um ponto de embarque de ônibus em bom estado?
E a estação de Bauru, que acumulava em seus três andares a administração da antiga E. F. Noroeste e que para isso foi construída em 1939? Fechada em 1996, virou depósito de lixo e em 17 anos jamais recebeu qualquer manutenção. Sua propriesdade é alvo de disputa entre a ferrovia, a Prefeitura e credores daquela. Em 17 anos não houve possibilidade de acordo ou é desinteresse das partes envolvidas mesmo? A foto desta semana mostra que nada ali mudou desde a última vez em que lá estive (cinco anos atrás) - e se mudou foi para pior.
Estação e gare de Bauru; em primeiro plano, uma locomotiva elétrica "Russa" da velha Cia. Paulista (Foto Fernando Dias)
As mesmas três perguntas acima podem ser feitas a inúmeras estações que hoje estão abandonadas ou mal cuidadas em São Paulo e no Brasil.
Um dos problemas que levaram a esta situação, além do motivo óbvio (a retirada da ferrovia e/ou dos trens de passageiros da linha que as servia), teria sido não a falta de preocupação das prefeituras e dos moradores da cidade a que ela servia, mas sim a falta de algo muito importante: dinheiro. Do outro lado, há prefeituras que preferiam que o prédio caísse ou fosse demolido (houve muitas que foram demolidas durante a noite sem autorização de ninguém pelas municipalidades) e certamente a maioria da população das cidades não se importa a mínima com a existência de uma estação que não serve mais para o que foi construída, de forma a preferir que ela não existisse (é a popular "minoria silenciosa").
Quem perde, no fim, é a memória brasileira. O nosso povo já não é um grande amigo da cultura em geral: velharias são velharias, vamos viver o presente e olhar (ou não) para o futuro, o passado já passou.
Estação de Cachoeira Paulista em 1998: ainda com telhados, portas e janelas, mas já abandonada havia anos (Foto Carlos R. Almeida)
O fato de o passado não voltar mais não é algo que deva ser incinerado na fogueira; na verdade, o passado é o que dá a experiência a um povo no sentido de ter orgulho de seus antepassados e de seu passado, que é o que exatamente forja uma nação. O Brasil, em minha opinião, está longe de ser uma nação no sentido europeu ou norte-americano da palavra. E o fato de não ser uma nação, mas apenas um país onde os habitantes falam a mesma língua, mas é tão grande que os seus habitantes não têm exatamente os mesmos costumes, afeta nosso desenvolvimento, nossa educação e, claro, nosso futuro.
É por isso que bato tantas vezes na tecla de conservarmos a nossa memória, custe o que custar. Parabéns a quem luta por esse velho prédio de 1877 de Cachoeira Paulista, por um velho prédio de 1938 em Franca e, claro, por outras centenas de construções ferroviárias ou não pelo resto do Brasil afora. Já a Bauru, não muitos a cumprimentar neste momento.
domingo, 7 de abril de 2013
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário