Estação de São Manuel, 2011
Durante anos e anos... décadas... era sempre festa. As ferrovias chegavam a uma nova cidade, a uma nova fazenda e festejava-se a chegada do progresso. A liberação das correntes. Agora, todos podiam conhecer o mundo! Para se ir de uma cidade a outra não eram mais dias de viagem. Eram, dependendo da distância, apenas horas e com conforto. Pelo menos, algum conforto, não o de carro de boi, de uma mula, um cavalo, mas um carro com assentos e que era puxado por uma máquina bem mais rápida do que um animal.
Tinha banda (sempre), tinha discurso, tinha banquete para os figurões ou um copo de água para os curiosos... tinha o presidente, o imperador, o governador, o prefeito... quem não gosta de ver os figurões, mesmo quando eles são uns pulhas que só sabem pisar no povo? Tinha o vigário, o bispo... tinha festa - em Piracicaba, em 1877, foram dois dias de festa para a chegada do trem!
É verdade que em um mundo onde não havia muita coisa para se fazer, ouvir a banda e o político falando com voz empostada era uma forma de se passar o tempo. Nem pensar em televisão, computador, rádio, i-pad, cinema.
Estação de Sapucaí, 2010
Aos poucos, eles foram aparecendo. Mesmo assim, ainda era um grande programa ir esperar o trem passar, mesmo que não houvesse ninguém dentro dele que você conhecesse. Principalmente nas estaçõezinhas de "meio de caminho", ali na fazenda ou no lugarejo de dez casas no meio do nada. Isso não existe mais. O trem de passageiros não passa mais. Está bem, passa - na Vitória-Minas e em Carajás, mas é quase só. Na CPTM e no metrô ninguém espera o trem se não precisa dele. Ali tem gente demais, todos estão com pressa.
Ademais, chegaram a TV, o cinema, o rádio, o computador, o telefone celular. Piracicaba em 1877 não tinha nada disso. Se fosse hoje, uma inauguração de estação de trem para novamente receber trens de São Paulo por exemplo somente atrairia fanáticos como eu ou algum curioso que passasse por ali por acaso nesse momento. Os discursos, se houvesse, seriam curtos, por que ninguém hoje em dia os aguenta, nem aguenta uma bandinha.
Hoje, as estações estão com outras funções, pois o trem de passageiros não passa mais. Em alguns lugares, nem o de carga. E em alguns outros, nem trilhos há mais. Entre "outras funções", inclua também o abandono, a depredação, a demolição, o completo desaparecimento. Às vezes somente uma plataforma, às vezes nada, absolutamente nada, é até difícil localizar onde ela estava em seus dias de glória.
Ainda em Piracicaba, há 15 anos atrás - vinte anos depois do fim dos trens, eu perguntei a uma guarda civil onde era a estação ferroviária. A resposta dela: eu nem sabia que aqui tinha trem... Em São José do Rio Preto, o motorista do táxi disse a um amigo meu que nem imaginava que a cidade tivesse tido trens de pássageiros um dia... e isso vai ficando cada vez mais comum, num país sem cultura e cada vez mais sem trens.
Plataforma da estação de Caiubi, 2005
Em algumas cidades, a estação local ainda segue abandonada. Um exemplo? São Manuel. Está ali, junto à cidade, em frente a uma praça. Do lado do armazém e de uma casa de turma, também abandonados. Isso, fora o bebedouro de animais antigo para os cavalos que vinham trazer os passageiros. De vez em quando, passa um cargueiro da ALL. Até param nos desvios. Ninguém liga. O prédio da estação é lindo. Mas a população não se importa, provavelmente quereria vê-lo no chão. Não têm nenhuma intenção de verem restaurado um prédio que ainda é belo apesar do vandalismo. Ele, novo, como fizeram em Agudos, somente valoriza a cidade. Mas há uma diferença clara entre essas duas cidades tão próximas. Elas têm estações de mesma tipologia - e dentro desta, a de São Manuel é mais bonita - mas Agudos cuida e São Manuel não. Agudos tem diversas casas antigas muito bem conservadas. São Manuel não.
Pior ainda são as estações de bairros rurais, de povoados. Quando sobreviveram, estão geralmente abandonadas. O que fazer com um prédio isolado, que, restaurado, provavelmente logo estará pichado e vazio? É um problema, mesmo. Há muitos exsmplos. Um dos que me lembro neste instante é o de Sapucaí, em Minas, divisa com São Paulo.
Este texto é somente para pensarmos em cuidar mais de nosso patrimônio. De grão em grão, talvez um dia a galinha encha o papo.
quinta-feira, 29 de dezembro de 2011
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NOSSA ESSE TEXTO É MAGNIFICO,MEUS PARABÉNS,FIQUEI MUITO EMOCIONADO,UM ABRAÇO ESPECIAL.
ResponderExcluirJá o ouvi dizer que seu gosto por ferrovias não tem motivação de nostalgia, mas nesse post ficou aquele 'ar' de muitas saudades. Concordo em dizer que seu texto ficou excelente!
ResponderExcluirEla sempre teve o gosto da nostalgia. No entanto, quando se fala sobre o que se deveria fazer hoje, não se pode basear em nostalgia!
ResponderExcluirQue bom é 'ouvi-lo' dizer isso! Assim não me sinto um nostalgico solitário :). Mas entendo perfeitamente quando diz que para se fazer algo pelas ferrovias "nao se pode basear em nostalgia".
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