A estação de George Oetterer em 1998 - aparentemente melhor do que a reportagem fala como estava em 1985
Em 1985, os céus já eram negros para as ferrovias nacionais. Negros com raios, relâmpagos e trovões. Para os trens de passageiros, os que ainda restavam, já estava chovendo pesado. Os jornais, que até os anos 1940 - talvez até os 1950 - contavam sobre os grandes investimentos em linhas para passageiros, agora escreviam sobre os problemas das viagens com trens.
Como neste artigo de O Estado de S. Paulo sobre os trens da Sorocabana nesse ano, ou seja, trinta anos atrás. Começavam falando dos "trens de luxo da Sorocabana que não existiam mais" - leia-se o Expresso Ouro Verde. Lembravam também o leitor que a FEPASA estava em "franca decadência na região de Sorocaba" (na verdade, já era no Estado inteiro) e "poderá desaparecer a curto prazo" (fato que demorou quase quatorze anos para acontecer).
A estação em 1998 - sobra muito pouco dela (Foto Hugo Augusto Rodrigues)
Falavam de ônibus que embarcavam quatro mil passageiros em duzentos ônibus diariamente e que havia apenas seis trens diários indo e voltando com pouco mais de 200 pessoas cada um. E que eram vagarosos, ultrapassados e sujos. Em minha opinião, exagerava-se quando se falava que eram ultrapassados: ainda tinham muito o que dar - o problema era realmente a falta de manutenção de máquinas, carros e vias.
A ferrovia "é hoje um amontoado de vagões velhos e estações em ruínas". Porém, o que o jornal não constatava é que ainda era algo recuperável e que muitos prédios estavam em ruínas porque o pessoal necessário para se manter uma ferrovia naquela época já era bastante menor do que o que se precisava para os mesmos serviços trinta ou quarenta anos antes. E que, devido ao êxodo rural (no qual o declínio da ferrovia teve sua participação), muitas das estações já não se justificavam.
Não havia como competir com os ônibus, afirmavam. Mas havia. O que se necessitava era de investimento. Muito menor do que é necessário hoje para se recuperar as mesmas linhas. E começava o texto sobre a viagem feita pelo jornalista José Maria Tomazela, a quem invejo por ter feito essa viagem:
"Quando o PS-1, um dos melhores trens de passageiros que param em Sorocaba (vindos de São Paulo), apita à distância alertando os poucos passageiros na hore do embarque, começa para eles uma viagem rotineira e invariavelmente sem nenhum conforto. A partida é lenta, o velho trem já não tem a velocidade de antigamente. (não tenho tanta certeza disso - a velocidade pouco variou nos quarenta anos anteriores). Os vagões são sujos, mal conservados e à noite tornam-se quase totalmente escuros, Em George Oetterer, a primeira estação no sentido Sorocaba-interior, o que se vê é um prédio semi-depredado e deserto. (desta estação, hoje, somente sobra a carcaça: o telhado caiu, o madeirame foi roubado) O trem pára em vão: ninguém some, ninguém desce. É o começo de uma viagem para um mundo em ruínas.
Em Bacaetava, o trem não para mais, pois a pequena estação foi completamente destruída. Passa Varnhagem, chega Iperó, antigo centro ferroviário, importante eixo da ferrovia para o sul do país. Há movimento na estação, mas o quadro de abandono é o mesmo: o mato alto crescendo no pátio, imensa quantidade de sucata enferrujada espalhada por todo lado.
O PS-1 segue sem pressa em direção a Boituva e Cerquilho. O passageiro de Sorocaba que desembarca nesta cidade pagou pela passagem de primeira classe Cr$ 3.300,00. menos do que a passagem de ônibus que custa R$ 4.800,00. O tempo gasto até aí, uma hora e meia, é praticamente o mesmo levado pelo ônibus. Mas o desconforto, sim, é maior. Inclusive na estação de Cerquilho, cujos sanitários estão sempre fechados.
O velho PS-1 segue adiante. Vem Jumirim, cuja estação é usada agora como depósito de café, Maristela, Pereiras, Conchas, Juquiratiba, Anísio de Morais (a ordem não está correta), pequenos pontos perdidos no mapa, comunidades que a ferrovia ajudou a formar e que agora lutam para não morrer com ela."
A reportagem continua mais um pouco, com o depoimento de pessoas que se lembram do Ouro Branco (não falam do Ouro Verde, que era o antecessor do PS-1 - o Branco havia sido transferido havia anos para a linha da praia (Santos-Juquiá) e a essa altura já havia sido desativado, possivelmente até sucateado.
O jornalista não fala até onde foi com o trem. Mas pelo que escreveu, já deu para vir que o abandono dos imóveis da ferrovia já vem desde essa época - na verdade, vinha já dos anos 1960 e 1970.
Porém, nada se compara com o que é a linha-tronco que foi da Sorocabana (São Paulo - Sorocaba) hoje em dia. Apenas funciona o trecho Julio Prestes - Amador Bueno, usado pelos trens metropolitanos da CPTM, e o trecho Mairinque - Iperó, usado pela concessionária cargueira. Para a frente, o abandono total.
sábado, 14 de novembro de 2015
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