segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A MEMÓRIA BRASILEIRA

Antiga estação ferroviária de Vitória, atual Vitoriana, construída em 1911 para substituir a estação original. Sem trilhos desde 1954, funciona hoje como escola (Daniel Gentili, 2011)
.

A memória de um país não é perdida somente quando se põe abaixo uma velha casa, igreja ou estação ferroviária. Perde-se a memória quando simplesmente são mudados os nomes de um local qualquer, nome tradicional, às vezes de centenas de anos, nome que, muitas vezes tinha uma razão para existir e não somente era um nome dado sem motivo para homenagear alguém que jamais ali pisou.

Os exemplos são inúmeros. Neste artigo, coloco apenas dois, um como bom, outro como mau exemplo.
A rua do Emissário, vista do seu início na avenida Rebouças (Google Maps)
O bom exemplo está nesta minúscula rua de apenas dois pequenos quarteirões existente entre aquele trecho final e escondido da avenida Rebouças, construído nos anos 1940 e hoje um exemplo de arborização de logradouros, e a avenida Eusebio Matoso: a rua do Emissário.
 Mapa da região onde hoje existe a aenida Eusebio Matoso. Notar a ausência de ruas; a Rebouças se chamava Boaventura Rosa; a Sampaio Vidal, Doutor Rosa; a atual Faria Lima era a estreita rua Iguatemi. Notar o emissário de esgotos à esquerda
Não é esta uma homenagem a algum emissário, um portador de notícias, mas sim, a um emissário de esgotos a céu aberto que ali existiu até o início dos anos 1940, quando a região era mais um pântano do que qualquer outra coisa. Basta comparar os dois mapas aqui colocados. O emissãrio talvez até exista, mas está hoje escondido debaixo do asfalto dessa rua. A sua existência, no entanto, ficou na memória.
A mesma região vista no mapa de 1930, hoje. A rua do Emissário está à esquerda, onde está assinalado com o balãozinho (Google Maps).
O mau exemplo vem de estações construídas pela Ytuana nos anos 1880, que mais tarde passaram a ser da Sorocabana. Estavam no chamado ramal de Porto Martins a Igualdade, trecho isolado de linha que somente podia, nessa época, ser atingido pela navegação fluvial da própria Ytuana e que partia do porto João Alfredo (que, depois, mudou de nome também).


O nome "Victoria", assim como os outros dessa linha, foi dado como referência à rixa entre a Ytuana e a Sorocabana, resolvida somente quando da encampação da primeira pela segunda em 1892: "Igualdade", "Treze de Maio" e "Redempção". Infelizmente, a mudança para Vitoriana em 1945 apagou de vez a tênue memória da origem da denominação. A de Redempção também teve seu nome alterado. As outras se mantiveram, milagrosamente. Porém, eram um conjunto de nomes que tinham um motivo para existirem. A modificação de dois deles cortou a emória e a poesia de sua existência.

Em Vitoriana, no entanto, hoje um bairro rural de Botucatu, a igreja continua com seu nome original: Santa Maria das Vitórias.

Um comentário:

  1. vi você no Bom dia! Que bom que aparentemente a imprensa está começando a se preocupar com o assunto

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