segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

CHIADOR: UM MONUMENTO EM RUÍNAS

 A estação em ruínas (Foto Gutierrez L. Coelho)
Para a estação de Chiador, em Minas Gerais, o fim chegou há muito tempo.

Chiador é uma pequena cidade mineira na divisa desse estado com a cidade de Três Rios, no Rio de Janeiro. Quando digo pequena, é pequena mesmo: sua população não chegava a 3 mil habitantes em 2010. Por acaso, foi essa cidade que recebeu a primeira estação ferroviária construída no estado, estação que hoje fica a cerca de 4 1/2 quilômetros da pequenina sede do município.
 A distância entre a estação e a cidade. A estação está perto do rio Paraíba, na curva da estrada (Google Maps)
A estação está à beira da antiga Linha Auxiliar da também extinta Central do Brasil; quando construída, no entanto, ficava no ramal de Porto Novo, de bitola larga e que ligava a cidade de Três Rios a Além Paraíba, em Minas. Mais tarde teve a bitola reduzida para a métrica para poder ser utilizado pelos trens da Leopoldina, que assim poderiam alimentar cargas e passageiros em Além Paraíba. Os tempos mudaram, a situação das ferrovias também, e hoje essa linha somente serve para trazer o minério bauxita de Cataguases para o porto do Rio de Janeiro. Os trens passam por Chiador cheios e voltam vazios para buscar mais minérios. E só.
A estação ainda inteira e o casarão (sem data)
Os trens de passageiros que passavam por ali e iam para a cidade de Leopoldina, Cataguazes e até Nova Friburgo de há muito deixaram de passar por ali. Mais precisamente, em 1984-85. Porém, a orgulhosa estação de Chiador, a primeira de Minas Gerais, já neste longínquo 1985 estava abandonada, já sem telhado. Hoje, vinte e cinco anos depois, está pior: somente as paredes estão em pé. Não há mais telhas nem madeirame. Nem pisos. Tudo a sol e chuva abertos.

A triste verdade é que a estação funcionou ali com pessoal para receber passageiros e cargas até a época em que eles existiam. Na verdade, deixaram de existir por dois motivos: a falta de interesse das pessoas de embarcarem a si próprias ou suas cargas ali e a falta de vontade da ferrovia em se modernizar e ir atrás deles para recuperá-los ou deixar de perdê-los. Tais fatos ocorreram pelo Brasil inteiro, sabemos disso.

No entanto, a situação ali era pior: a estação, como já dito acima, ficava a quase cinco quilômetros da cidade por estrada não asfaltada; o laticínio que ali existia fechou; o casarão ainda existe e hoje é moradia; as outras pouquíssimas pessoas que por ali viviam foram embora - quase não havia casas ali. Em algum ponto, provavelmente ainda durante os anos 1970, com falta de cargas e com pouca gente tomando o trem ali ou ali descendo, a decisão da RFFSA foi certamente "eles que se danem, que desçam ou peguem o trem na plataforma, só precisam que o trem pare, o pessoal de apoio não é mais necessário" - e a estação foi fechada.

Por isto, mesmo ainda com trens passando, ela foi totalmente abandonada. Como a sua manutenção já deveria ser precária, um dia o teto caiu - pode até ter havido algum incêndio, criminoso ou não - e aí, virou um monte de ruínas.
Ruínas da estação e plataforma à sua frente (Foto Gutierrez L. Coelho)
Alguns se lamentaram, a maioria certamente não ligou, como sempre - até que, um dia, alguém pensou que "era uma pena um prédio tão bonito e grande ali assim, abandonado" - e algum político local resolveu que a estação deveria ser recuperada. Pelo que sei, há cerca de três ou quatro anos, a RFFSA cedeu o prédio à Prefeitura e eles agora poderiam fazer o que quisessem com ele. Fizeram até uma festa nas ruínas, com a presença do Imperador Pedro I (um ator, claro), que era o pai do Imperador que a inaugurou em pessoa no impensável ano de 1869 - época que nem pode ser bem assimilada em nossas limitadas mentes de hoje, cento e quarenta anos depois.

Porém, a enorme distância para se chegar em local tão isolado e abandonado, próximo ao rio Paraíba do Sul, que somente tem a tranquilidade cortada por um comboio de bauxita que passa por ali seis a oito vezes por dia, essa enorme lonjura continua ali, pois a cidadezinha-sede não cresceu. E continua sendo um município que não tem dinheiro para nada, vivendo de produção agrícola e de leite. Não tem dinheiro para uma restauração caríssima num prédio tão grande, talvez o maior do município.
Ruínas da estação (Foto Gutierrez L. Coelho)
Recentemente, o Ministério Público foi atrás dos construtores da Usina de Simplício, ainda não pronta, mas que está sendo construída ali pertinho, afirmando que eles seriam obrigados a restaurar o prédio (não sei realmente por que, visto não terem sido eles os responsáveis pelo abandono da velha estação). E eles não estão, realmente, nem um pouco a fim de fazer a obra. Sabem que, num futuro próximo, tudo o que for feito ali vai ser abandonado de novo. A prefeitura fala, como sempre, em "centro cultural". Mas como? Isolado ali, ele não tem futuro algum. Quem vai se abalar de Três Rios ou de Chiador para ir ver um centro cultural tão distante?

Políticos e ao MP falam que "a estação ferroviária de Chiador constitui um exemplar arquitetônico do século 19 e um espaço considerado lugar de memória, de significativo valor cultural para a comunidade local e para a sociedade mineira" e -->afinal, restaurar significa manter e isto posso garantir que não acontecerá em um local tão distante.

Já eu, blogueiro e pobre mortal, que resido a quatrocentos quilômetros da estação e da cidade e que, apesar de ter muita vontade, jamais até agora consegui arranjar um tempinho para conhecer ambas, sugiro algo que deveria ser feito e que possivelmente teria mais impacto que uma restauração - que, na realidade, se houvesse, seria mesmo era uma reconstrução, dado o estado atual do prédio mais que centenário.
Local da estação. O telhado ao norte da linha é o casarão. Na sua frente, a estação mal pode ser vista, pois não tem telhado mais (Google Maps)
Proponho que a prefeitura, se realmente estiver interessada em fazer algo com a estação (desde que não seja derrubá-la ou deixar que caia), deveria ir atrás de um projeto de escoramento decente do prédio, por dentro e não por fora (digo isso porque hoje há lá um escoramento feito nas coxas, por fora, e que não resolveria nada em caso de forte ventania, ou mesmo sem ela), o menos aparente possível (creio que isto é possível) e que, depois de limpa a estrutura, passe-se um tipo de resina que impediria a infiltração de água e, portanto, manteria a estrutura sólida e também, pelo menos por algum tempo, livre da sujeira que sempre se fixa nas construções por causa da rugosidade. A partir daí, que se mantivesse gramado o seu entorno, talvez iluminado com a luz de holofotes durante parte da noite.

Ou seja, seria ali mantida como uma espécie de monumento ao descaso nacional, reconhecendo, no entanto, o valor e a beleza de uma estrutura que, mesmo destruída como está hoje,continua a ser belíssima.

Isto seria feito a custo baixo - talvez próximo de zero, se fosse possível à Prefeitura ou a quem quer que seja apresentar um projeto de estrutura gratuito, como gratuitos seriam feitos o (bom) escoramento e o tratamento da superfície. Fora isso, haveria de se pagar um ou mais guardas para manter a estrutura longe de vândalos e um jardineiro para manter a grama cortada.

Afinal, a cidade e a prefeitura não podem ser considerados os culpados pelo abandono dos últimos quarenta anos, mas têm, sim, a responsabilidade de se fazer algo por uma das poucas atrações turísticas - senão a única - que Chiador deve ter. Afinal, o laticínio ao lado da estação voltou a ser usado para o fim a que se destina, após alguns anos de abandono e o casarão tem pessoas morando. O local voltou a ter alguma vida.

Que tal seguir o conselho do palpiteiro aqui e pôr mãos à obra? E não adianta esperar que o trem de passageiros volte. É mais fácil o rio Paraíba secar. 

4 comentários:

  1. Olá, Ralph!
    Depois de também visitar o local no sábado, dia 29 de dezembro, para uma sessão de fotos no que ainda resta da estação de Chiador, afirmo que o cenário é desolador.
    Vinha pensando nas propostas que vem sendo apresentadas para a estação - ou o que sobrou dela - e concordo com você em gênero e grau: não creio que Furnas vá reformar aquilo que dificilmente será usado de forma concreta e efetiva.
    Também penso que é muito simples responsabilizar Furnas pelo abandono de um prédio cuja responsabilidade pelo mesmo abandono foi principalmente do governo federal ao longo de todos estes anos que se passaram desde o fim da RFFSA.
    Acho muito boa a sua idéia! E principalmente viável!
    É apenas questão de bom senso, coisa que infelizmente passa bem longe daqueles que tem o poder de decidir e buscar uma solução viável para o problema.
    Aproveito para dizer que no mesmo dia que estive em Chiador, passei também pelas estações de Penha Longa, Serraria, Ericeira, Santana do Deserto, Laticínios e Sossego.
    Em breve, postarei matérias no site otremexpresso.webnode.com.br sobre elas.
    Grande abraço e Feliz 2013!

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  2. Amarildo, a gente sempre acha que tem as melhores ideias do mundo e que é o dono das verdades. Porém, neste caso, acho que seria uma boa solução para ser pelo menos tentada. Senão, aquilo vai ficar ali até cair. Ou, se restaurada, vai voltar ao abandono pelas razões expostas. Feliz Ano Novo para você.

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  3. Ralph, a situação desta estação é realmente lamentável. Passo por lá mais ou menos de um em um ano (ou pouco mais) para ir do estado do Rio a Mar de Espanha e sempre reparo no triste estado de conservação deste belíssimo prédio (e que para mim ficou ainda mais belo agora, sabendo que foi a primeira estação ferroviária de Minas!).
    Suas paredes muito mal escoradas criam um grande pessimismo em relação ao futuro próximo desta beleza. Na primeira vez em que parei para registrar a estação (2009), embora já em péssimas condições, ela ainda não estava com pedaços de paus segurando suas paredes (http://www.flickr.com/photos/viniciusfs/4239377274/in/photostream).
    Sua ideia é ótima e tomara que adotem-na. É preciso preservar! É a história!

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