Na foto de 1912, muita festa e alegria na inauguração da estação de Cajuru: hoje, cem anos depois, tudo é indiferença.
Neste ano da graça de 2012, deveriam ser comemorados os centenários de diversas estações ferroviárias pelo Brasil. Diga o que disser sobre as ferrovias brasileiras, elas e suas estações trouxeram o progresso durante pelo menos cem anos e transformaram este país no que ele é hoje. No entanto, muitas destas estações, como as que descrevo abaixo, são hoje nada: uma delas demolida, outra tão descaracterizada que não lembra em quase nada sua arquitetura original e três em semi-abandono, não estão nenhuma delas à margem de linha férrea alguma: linhas que foram retiradas sem nenhum motivo claro para terem seu tráfego transferido para estradas próximas - algumas nem isso - hoje perigosas e repletas de acidentes por excesso de tráfego e falta de manutenção, fora o fato que priorizam o transporte individual e não mais o coletivo.
Abaixo, cito algumas dessas estações centenárias - cinco, ao todo, quatro da Mogiana, uma da Paulista, nomes também que vão desaparecendo com o tempo. Os textos foram adaptados das páginas sobre essas estações de meu site www.estacoesferroviarias.com.br.
Esta primeira estação relacionada faria centenário exatamente no dia de ontem, 8 de dezembro; as uotrsa quatro já o teriam completado no decorrer deste ano. Trata-se da de Cajuru: O jornal O Estado
de S. Paulo de 25/9/1911 escrevia que "já estão
iniciados os trabalhos do nivelamento do terreno em que será
construída a estação da Companhia Mogyana nesta
cidade (de Cajuru)". Realmente, a estação foi
inaugurada
em 8 de dezembro de 1912, como ponta do ramal. Durou cinquenta anos
funcionando: foi
fechada em 16/9/66, com o fim do trecho do
ramal
entre Amália e Cajuru. Depois disso, foi
totalmente descaracterizada, numa reforma que a transformou
na estação
rodoviária da cidade.
A estação
de Frigorífico foi aberta como um posto telegráfico
em 1912
e transformada em estação em 10/3/1921. Da estação saía
um ramal
de bitola larga, pertencente ao Frigorífico Anglo, com 4 km
divididos
em sub-ramais para o transporte de gado e de carne. Este
ramal deu
o nome para a estação. Em 1957, esse frigorífico abatia "a
quase totalidade do gado produzido em um raio de mais ou
menos 500
km, o que tornou necessário o desenvolvimento de invernadas
de engorda para o gado levado a pé para o mercado de
Barretos
(por toda essa distância)". Os trilhos dos desvios
ainda existiam em fins de 1999, em pequena parte de seu percurso, cobertos
pelo mato. Nesse dia em que estive lá e fotografei,
somente sobravam
a plataforma e as fundações da estação, já tomadas pelo
mato. Ao lado,
um trator recolhia entulho e tijolos deixados pela provável
demolição
recente de alguma casa remanescente da antiga vila. Em 2004,
a variante
construída fora de Barretos, em 2003, eliminando os
trilhos da área urbana da cidade, tirou o velho pátio da linha.
A estação
de Guaranésia era a primeira do ramal de Passos,
distando
15 quilômetros da estação inicial do ramal de Guaxupé.
Foi inaugurada em junho de 1912, permanecendo por dois ou
três
meses como ponta do ramal, até ele ser prolongado até
Catitó. Maurício
Torres, em 2001, contava que "Guaranésia é a cidade
onde meu pai nasceu. Embarquei e desembarquei nessa estação
muitas vezes. Minha familia é original de Três Pontas,
MG. Meus bisavôs Andre Torres (português) e Elisa
Becker (alemã) tiveram 5 ou 6 filhos, entre eles meu avô,
Pedro. Quando meu avô ainda era pequeno, a família foi
tentar a vida em Ipaussu, SP. Meu bisavô, alarmado com a
alta
incidência do que eles chamavam de "maleita" (malária),
resolveu retornar para Minas, mas não para Três Pontas
e sim para Guaranésia, que na ocasião ainda se chamava
Santa Bárbara das Canoas (antes de 1901, portanto). Meu pai
Dorivaldo, o último de uma fila de 10 irmãos, nasceu
em 3/10/1930, dia da eclosão da revolução que
acabou com a República Velha e instaurou o governo de
Getulio
Vargas. Como Guaranésia está a poucos quilômetros
da divisa com São Paulo, a cidade foi rapidamente tomada por
tropas revolucionárias mineiras; a população
em pânico se escondeu onde era possível e minha avó
deu a luz a meu pai no porão da casa. Houve correrias e
tiros
foram trocados entre os revolucio-nários e a incipiente
guarnição
policial local. Um dos tiros passou pela janela do porão
onde
minha família se escondia e quase acertou minha tia Alice,
ainda bem pequena, abrindo um rombo na parede, logo
atrás
dela. Segundo meu avô, a Mogiana chegou em Guaranésia
no mesmo ano em foi inaugurada a energia elétrica, fornecida
pela usina hidrelétrica de Caconde, SP. Na inauguração
da estação houve os festejos de praxe e o primeiro trem,
procedente de Guaxupé, trazia o Eng. André Reboucas
à frente da locomotiva, em pé sobre o parachoques. A
rua que liga o centro da cidade à estação tem,
por isso o nome de Avenida Rebouças. Meu avô era
proprietário
de uma mercearia ("venda", como são chamados estes
estabelecimentos no interior) e sempre mencionava o fato de
que grande
parte dos produtos manufa-turados que ele vendia vinham de
trem. Era
comum ir de carroça até a estação para
receber as mercadorias despachadas pelos fornecedores, cujos
pedidos
eram tirados pelos vendedores ("viajantes"), que passavam
por lá uma vez por mês, também com o trem. Interessante
notar que na época as garrafas de cervejas e refrigerantes
(já da Antarctica) vinham embaladas em caixas de madeira,
protegidas
individualmente por folhas de palha de milho. Estas bebidas
eram vendidas
a temperatura ambiente, pois eram raros os estabelecimentos
que possuíam
algum tipo de refrigeração. Como Guaranésia
sempre foi uma cidade muito pequena, as escolas locais
somente proporcionavam
ensino ate o nível ginasial. Um irmão menor de meu pai,
o único de todos que conseguiu freqüentar a universidade
onde se tornaria médico teve que cursar o colegial na cidade
vizinha de Guaxupé. Ele diariamen-te tomava o trem pela
manha
e retornava à tarde, utilizando os passes mensais que a
Mogiana
vendia. Como as perspectivas de melhoria de vida eram
muitíssimo
limitadas em Guaranésia, era muito comum os mais jovens
deixarem
a cidade para tentar a vida em São Paulo, Campinas ou
Ribeirão
Preto, no Estado de São Paulo. Isso acontecia com
freqüência,
a exemplo de minha família, onde somente um de meus tios
permaneceu
por lá. Assim, alguns matutos ao virem para São Paulo,
muitas vezes viajavam de trem pela primeira vez na vida.
Houve casos
de passageiros que na hora de fazer a baldeação em Casa Branca se
equivocavam e tomavam o trem que voltava para Passos (ao
invés
do trem para Campinas), e após muitas horas de viagem
estavam
de volta em Guaranésia... De um bando de primas que meu pai
tinha, a única que conseguiu se casar morreu logo depois
juntamente
com o marido, quando o carro em que estavam foi colhido por
um cargueiro
da Mogiana, numa passagem de nível perto da cidade.
A primeira vez em que fui à estação foi em 1971,
ainda como Mogiana. Depois de muito insistir, meu tio me
levou ate
lá para ver a chegada do trem da tarde, que vinha de Casa
Branca,
Campinas e São Paulo. Era uma composição de três
carros de madeira (primeira, com buffet, segunda e
carro-bagagem)
rebocados por uma GL8. Nada impressionante em termos
ferro-viários,
mas, enfim, era a Mogiana, ao vivo e em cores. A viagem de
São
Paulo a Guaranésia tinha cerca de 350 km e durava
aproximadamente
oito horas. Circulavam pelo ramal de Passos quatro trens de
passageiros
por dia, um diurno e um noturno em cada sentido. Também
havia
duas litorinas, mas estas somente iam até Guaxupé. Nos
trens diurnos, havia baldeações em Campinas (da Mogiana
para a Paulista) e Casa Branca-nova, do tronco para o ramal.
Nos trens
noturnos havia baldeação somente em Campinas, uma vez
que o trem do ramal de Passos (NP1) já saía de lá
ligado na cauda do N1, que era o noturno que corria no
tronco, de
Campinas a Araguari. Em Casa Branca-nova as composições
eram separadas. Também corria um carro dormitório de
Campinas a Guaxupé, que foi suprimido logo apos a criação
da Fepasa, em fins de 1971. Originariamente as composições
do ramal eram compostas de carros de madeira, sendo
posteriormente
substituídos por carros de aço pintados de azul
e branco, da Fepasa. Estes carros de aço eram aqueles
construídos
pela Mogiana, embora tenham circulado por lá alguns "Ouro
Verde" ex-Sorocabana, igualmente pintados de azul e branco. É
interessante mencionar que havia um carro Ouro Verde,
ex-restaurante,
transformado pela Fepasa em carro de primeira com buffet,
especialmente
para circular nesse ramal. A tração ficava sempre a
cargo das GL8, já que as G12 eram muito pesadas para aquela
linha. Em 1976 a Fepasa suprimiu boa parte dos trens de
passageiros
dos ramais, e ali passaram a circular somente os noturnos.
Em 1977,
uma pequena ponte próxima a São José do Rio Pardo
foi destruída pelas chuvas e este fato foi usado como
pretexto
para interromper de uma vez o tráfego no ramal. Desde então,
o ramal ficou praticamente abandonado, circulando apenas os
trens
de cimento entre S.Sebastião do Paraíso e Itaú
de Minas, procedentes de Ribeirão Preto, pela linha da
antiga
São Paulo-Minas. Em 1985, na última vez que estive na
cidade, a estação de Guaranésia estava totalmente
abandonada, porém ainda com os trilhos. Todas as passagens
de nível dentro da cidade já haviam sido asfaltadas
pela prefeitura local. Nessa mesma época, a estação
de Guaxupé ainda estava ativa, porém despachando cargas
via rodoviária, já que a mesma estava isolada pela via
ferroviária. O pátio estava abandonado, assim como o
depósito de locomotivas que lá havia" (Maurício
Torres, 12/2001). Os trilhos foram retirados por volta
de 1990.
"A estação hoje está abando-nada. uma
senhora que mora na vizinhança me disse que lá funciona
uma creche, um tipo de centro de recreação para tirar
as crianças das ruas; isso explica as traves de futebol
improvi-sadas.
mas um ex- telegrafista da fepasa, hoje aposentado, que mora
em frente
à estação, disse que não é bem
assim a casa é ocupada por andarilhos ocasionalmente,
mas está abandonada; o centro de recreação quase
não funciona, é mais uma desculpa, uma tentativa da
comunidade de preservar o local como seu patrimônio. está
em mau estado de conservação, com portas e janelas
quebradas,
e está sem trilhos" (Rossana Romualdo, 07/2001).
A estação
de Catitó foi inaugurada em 1912 e recebeu o nome da fazenda dentro
da qual se situa até hoje. A estação
foi desativada em 1976, quando por ali passou o
último
trem de passageiros do ramal, porém sempre esteve
bem
conservada. Ali fica hoje o escritório da fazenda,
um depósito e também serve de moradia para uma
família. Embora a estação ainda tenha
trilhos à sua frente, eles são apenas decoração;
todo o restante foi retirado.
Como estará
o prédio hoje?
A estação
de Itiguassu foi inaugurada em 1912, permanecendo
como ponta
de ramal por alguns meses, até que se inaugurasse a estação
de Monte Santo, quatorze quilômetros à frente.
Em 4/5/1968, a Mogiana fechou a estação e a transformou
em parada. Em 1986, a estação já estava em péssimas condições. Hoje,
serve de moradia; em 2003, o mato que cresce em volta quase
tomava conta
da velha plataforma, mas o prédio continuava firme, apesar de
um pouco descaracterizado. Maria Tereza Paulino Costa contava em 2004 que
"meu avô, e depois meu pai, tinham uma serraria bem em
frente
à estação de Monte Santo e eu tinha um prazer enorme em ver
os trens
chegando. Quando tinha uns 12 anos, minha prima e eu
comprávamos um
bilhete até a estação Itiguaçu, que era na fazenda do pai
dela, lá
desciamos e caminhávamos até a sede para passar o dia".
domingo, 9 de dezembro de 2012
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Daqui a pouco mais de 4 meses, no dia 17 de abril de 2013, a antiga estação ferroviária de Itu completará 140 anos, certamente sem festas, sem Trem Republicano (eu nunca gostei muito dessa ideia, mas de qualquer maneira seria a reocupação de um espaço importante), sem nada. As reformas das estações ferroviárias de Itu e de Salto, depois de um lento avanço, foram paralisadas. Grande parte da cobertura da plataforma da estação de Itu foi retirada para a reforma e não recolocada. A estação de Salto, em 2012, foi alvo de um incêndio em parte de suas instalações.
ResponderExcluirV. está falando de qual estação de Salto? E de Itu? Das antigas? O tal do trem republicano, do qual eu tb sou totalmente contra, não rodaria entre as duas estações novas, de 1987?
ExcluirO projeto turístico Trem Republicano ligará as cidades de Salto e Itu através do traçado original da Ytuana/Sorocabana, reativando as antigas estações das duas cidades, que completarão 140 anos de existência em 2013. Os trilhos já foram recolocados em dois trechos: da antiga estação de Salto até a ponte sobre o Rio Tietê, e da margem esquerda do rio até a rodovia Salto-Itu. Mas as obras estão paradas, e as estações ficaram ainda piores com essa paralisação.
ResponderExcluirAs estações de Salto e Itu na Variante Boa Vista-Guaianã têm uso bem diferente. Em Itu a estação está impecável e é utilizada pela concessionária ALL, enquanto a de Salto está em ruínas. A nova estação de Itu viu passageiros (turistas) no fim do século passado com os trens que seguiam de Campinas para Peruíbe nos fins de semana. A variante está sendo duplicada. Há obras em Salto, Indaiatuba e Campinas. As fundações de viadutos e pontes estão em andamento, além da terraplanagem nas margens do leito atual. Obviamente, para uso exclusivo de grandes comboios de carga com destino ao Porto de Santos.