(Folha da Manhã, 1/2/1948)
Era o início de maio do ano de 1948. A rodovia Anhanguera, que seria inaugurada no dia 23 desse mês, já estava funcionando a todo o vapor - mesmo sem ter sido inaugurada - e podia-se ir de São Paulo a Jundiaí em asfalto. Aliás, ndesde há muitos meses trafegava-se pela estrada: quando a primeira camada de asfalto, muito tempo antes da inauguração, somente havia chegado ao Gato Preto (atual km 36) e ao Taboão (atual Jordanesia, km 38), caminhões e automóveis já lotavam a estrada, rumo ao interior. Ou seja, era uma estrada de real necessidade já antes mesmo de estar pronta.
Afinal, encurtava a distância até Jundiaí. Antes, para chegar a esta cidade, devia-se pegar o trem da Santos-Jundiaí ou, de automóvel e ônibus, a estrada velha de Campinas, existente desde os anos 1910, não asfaltada e calcada praticamente todo o seu percurso no antigo caminho dos Goiazes, aberto ainda em tempo dos bandeirantes.
Era fácil de se ler nos jornais no "incremento do transporte rodoviário, com todas as suas vantagens sobre a locomoção por estrada de ferro. O erro começou cedo. Hoje sabemos que ninguém previra os problemas do transporte rodoviário quando houvesse transporte individual barato. Quando isto começou a acontecer, começaram os congestionamentos nas rodovias, ao mesmo tempo em que deixava-se de investir no transporte coletivo ferroviário. Na inauguração do dia 23, o secretário da viação afirmava categoricamente que "a capacidade de transporte das vias Anhanguera e Anchieta correspondiam a 5 vezes a capacidade somada de todas as ferrovias que tinham acesso so porto de Santos". Hoje vemos o resultado de tudo isso.
Para a cidade de Jundiaí, o problema começou cedo. Numa época em que as rodovias entravam e saíam das cidades, ou seja, não passavam ao largo delas, como o faz a Anhanguera hoje, os prefeitos achavam ótimo esse fato, pois achavam que os carros dos viajantes passando pelas ruas centrais das cidades encheriam os olhos dos motoristas e encheriam os bolsos dos comerciantes das ruas principais. Mudaram facilmente de ideia quando a Anhanguera abriu.
Como era a penas o primeiro trecho aberto de uma longa estrada ainda em construção, a Anhanguera acabava por terminar também dentro da cidade, mas agora em asfalto e comportando uma quantidade muito maior de veículos. Por um bom tempo, as ruas centrais de Jundiaí, que abrigavam com facilidade quem vinha pela estrada velha, tinham agora de aguentar carros demais. Somente livraram-se deles quando algum tempo depois a Anhanguera foi aberta até Campinas.
Falta de planejamento já existia naquele tempo e hoje continua da mesma forma.
Do outro lado da Capital, a via Anchieta havia sido aberta também nesse mesmo ano de 1948. Esta tinha um posto de pedágio no trecho que passava por Riacho Grande, um pouco além de onde o Caminho do Mar sai para seguir para a Serra Velha. Eu me lembro desse posto, até os anos 1960 pagava-se pedágio ali e eu passei com meus pais muitas vezes por ali. O posto funcionava desde a abertura da rodovia, sob muitos protestos, como hoje. Mal sabia esse pessoal o que esperava seus filhos e netos nas estradas de hoje, com um posto de pedágio a cada 20, 30 quilômetros.
Nessa época, setenta e cinco anos atrás, a abertura da estrada trouxe um problema quilômetros além desse posto, já na baixada santista, em Cubatão: havia um posto policial nesse local que adorava parar todos os carros para "verificação de documentos", fonte inesgotável de multas na época. Com o aumento do número de carros pela nova rodovia, filas enormes passaram a se formar dos dois lados da pista. A solução foi eliminar o posto e a farra das multas, pois, serra acima, o pedágio passou a se incomodar com isso e a arrecadação.
Mas havia outros gargalos. A Anchieta saía (e até hoje sai) no final da rua do Bom Pastor. Sem as avenidas que existem naquela baixada onde acaba uma e começa outra, o fluxo de veículos era grande para atingir a nova rodovia. A rua do Bom Pastor não estava dando conta. Pavimentada (com paralelepípedos), mas cheia de buracos e estreita com as suas duas mãos de direção na época, o problema se agravou no Sacomã. Ali perto, outro acesso que poderia ser usado para a Anchieta era a estrada do Vergueiro, mas esta não era pavimentada, além de ser cheia de curvas e estreita.
Para quem não sabe, a estrada do Vergueiro era a continuação da rua Vergueiro, que tinha este nome até a rua Conde de Irajá. Depois, era estrada e a pavimentação acabava (e não era asfalto, eram pedras, como na Bom Pastor). A solução foi, logo depois, pavimentar a estrada. Nos anos 1970, rua e estrada foram unificadas como somente rua Vergueiro.
No Brasil, para as soluções chegarem (quando chegam), espera-se primeiro o caos acontecer. Nada se planeja.
É interessante notar também que nessa época, tanto Anhanguera quanto Anchieta tinham pista única.
sexta-feira, 19 de outubro de 2012
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Ralph;
ResponderExcluirO Pedágio da Anchieta fica no Rio Grande, que hoje se chama Riacho Grande, distrito daqui de S.Bernardo do Campo. Aliás, o distrito mudou o nome para Riacho Grande justamente para não ser confundido com Rio Grande estação, que passou a ser Rio Grande da Serra em 1969, após a emancipação.
Contam que quando a Anchieta foi inaugurada, o movimento no Caminho do Mar (que em S.Bernardo era a Rua Marechal Deodoro, principal rua de comércio do centro da cidade) caiu tanto, que era possível deitar no meio da rua por longos períodos, algo impensável antes da Via Anchieta, que acabou com muita coisa na cidade, mas que permitiu o crescimento vertiginoso que ela teve a partir dos anos 50.
Verdade, era Riacho Grande mesmo, e mesmo eu que sabia disso me confundi quando escrevi. Vou corrigir no texto mesmo.
ExcluirSegundo ainda Carlos Augusto Leite Pereira, entre S.Paulo e Jundiaí também havia um posto de pedágio. Ficava onde hoje fica uma balança, em frente ao posto da polícia rodoviária na região de Gato Preto, pouco antes da saída para Campo Limpo Paulista. Eles também davam um recibo de papel parecido com aquele da Anchieta. Para quem ia até Campinas era entregue um outro recibo, de maior valor, e que deveria ser entregue no segundo posto. Ou seja, o pagamento era feito uma única vez. Era um papelzinho muito ordinário, não tinha segurança gráfica nenhuma. Parecia ingresso de circo! Qualquer gráfica faria um igual. Devia haver uma enorme evasão de receitas...
ExcluirEu tinha um tio que morava em Rio Claro-SP e viajava muito de carro para a Capital, nos anos 40, pela Estrada do Governo, como era chamada a precursora da Anhanguera/W.Luiz. Ele dizia que a estrada era asfaltada até o monumento rodoviário que fica até hoje na Anhanguera no acesso para Santana do Parnaíba. Segundo ele, o grande desafio entre os motoristas da época era vir de Rio Claro até S.Paulo em menos de 2 horas. Hoje, com todo o transito, radares e pedágios, continua sendo um desafio fazer a viagem no mesmo tempo!,