sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

MORTE NA FERROVIA (1923)

Em notícia de 11/3/1923, o jornal O Estado de S. Paulo publicou a morte de um senhor, próxima à estação de Viradouro - comunicado da época, quando esta ferrovia ainda era um ramal pertencente à então ainda existente, Cia. Ferroviária São Paulo-Goiaz.

Três anos mais tarde e o trecho em que estava a estação citada foi comprada pela Cia. Paulista de Estradas de Ferro. Em 1923, a estação de Viradouro (extinta nos anos 1960) ainda estava num ramal da EFSP-GO.

História à parte, o infeliz italiano que estava a andar ou a atravessar a linha foi apanhado pela locomotiva, matando-o.

Ele trabalhava numa colônia ali perto, de nome Água Limpa e tinha 50 anos de idade. Deixou uma viúva e diversos filhos. 

Minhas condolências ao Signore Pedro Montagnara, morto há cem anos num acidente no meio do nada. Eram 8 da noite. Já deveria estar escuro... bem escuro. Será que a locomotiva estava com o farol desligado? Os trilhos não existem mais na região. Haveria alguma cruz perdida por ali, fincada no solo?

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

JUÓ BANANERE (1923)




O engenheiro Alexandre Ribeiro Marcondes Machado era também poeta e jornalista. Viveu nos anos 1920 em São Paulo em meio a uma multidão de imigrantes italianos e criou para si um pseudônimo - Juó Bananére - para seus escritos no jornal satírico Diário do Baixo Piques.

Um de seus versos, criados no idioma chamado por muitos da época como "idioma macarrônico", era uma mistura do italiano com o português falados na cidade de São Paulo por algumas pessoa, algo que hoje talvez pudéssemos comparar com o já famoso "portunhol", falado por diversos turistas brasileiros que visitam principalmente a Argentina, o Paraguay e o Uruguay na esperança de se comunicar com seus habitantes que nos olham com olhos espantados...

No texto publicado no Diário acima citado, o satirizado era meu avô Sud Mennucci.

Num recorte de papel que sobreviveu cem anos, parte no acervo de Sud quanto no meu, Sud aparece como "Sub" Mennucci e seu rosto era a cabeça do boneco que parecia discursar como cabo eleitoral de alguém, enquanto uma senhora parecia observá-lo com alguma ressalva...

O que chamou minha atenção era que meu avô, nesse distante ano de 1923, tinha um problema sério: sua filha estava internada no hospital Santa Catarina e minha avó Maria era a sua acompanhante de quarto. Eles na época residiam em Piracicaaba, onde meu avô era delegado regional de ensino, o que fazia com que ele tivesse viajar muito entre as duas cidades. E o casal não tinha moradia na Capital.

Onde teriam eles morado nesse período? (Astarté, a filha, acabaria infelizmente falecendo no inicio de 1924). Hotel? Casa de amigos ou parentes? Nunca tive a resposta para isto...

Por outro lado, a maior presença dele em São Paulo abriria mais caminhos para outros interesses dele. E, bem sabemos, críticas vieram quando sua presença tornou-se mais constante. Daí uma provável sátíra no recorte. 

Sud detestava ser chamado de "italianinho", apelido dos imigrantes italianos na época. E Baixo Piques  era um local específico na região do largo do Piques, local que não existe mais desde os anos 1930 e que se localizava mais ou menos onde hoje está o viaduto das Bandeiras, no começo da atual rua Santo Antonio, junto ao famoso Bixiga, hoje o bairro paulistano da Bela Vista.

Finalmente, eu não sei italiano suficiente para tentar entender muito do que está escrito no curioso  recorte.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

TRENS METROPOLITANOS DO RIO GRANDE DO NORTE

Em São José do Mipibu, agora ponta de linha na linha Sul da CBTU/Natal, o povo aguarda pelo primeiro trem em quarenta anos, com a ferrovia passando no mesmo nível das ruas. Não há proteção de via. Mas o povo certamente não se importa. Com educação, tudo se resolve. 

Verdade seja dita, o Brasil é enorme, muito mais do que a gente acredita que seja. 

Eu, que nasci em São Paulo, Capital, e não viajei pouco nestes meus setenta anos, já visitei os Estados Unidos, o Canadá e diversos países da Europa, não conheço todos os Estados do Brasil. As regiões que menos conheço são a Nordeste e a Norte do país.

Um dos Estados dos quais não conheço presencialmente nenhum local, é o Rio Grande do Norte.

Nas últimas semanas, no entanto, tenho estudado geograficamente as ferrovias deste Estado tão afastado daqui (ou nós é que estamos longe dele?). Também me embrenhei na história dos últimos 120 anos do Estado potiguar.

O Rio Grande do Norte teve ferrovias, sim, e desde 1906. Foi crescendo, entretanto, lentamente sua rede, até que, nos anos 1960, essa expansão cessou e começou o processo de abandono de suas linhas. Até aí, nenhuma grande novidade: essa retração existiu no país inteiro.

Em 1982, os trens de passageiros, que ligavam o Estado à Paraíba e também a Pernambuco, deixaram de ter trens de passaageiros e o movimento de carga, que era pequeno, desapareceu nos últimos anos do século XX.

No mesmo ano, 1982, em que os trens para os Estados vizinhos acabaram, surgiu, das entranhas da RFFSA, uma outra empresa para operar trens metropolitanos no Brasil: a Companhia Brasileira de trens urbanos, cuja sigla era (e ainda é) CBTU.

Em São Paulo, por exemplo, a CBTU passou a operar as linhas de subúrbio da E. F. Santos a Jundiaí  também a E. F. Cantral do Brasil. A CBTU tomou conta das linhas de diversos Estados também.

Voltando ao RN, duas linhas passaram a operar esss trens, substituindo os que já circulavam, com alguns percalços, as linhas Sul (Natal a Parnamirim e a Norte (Natal a Ceará-Mirim). Não eram as linhas em todo os trechos anteriores: Parnamirim a Nova Cruz e Ceará-Mirim a Macau e Oscar Nelson ficaram de fora. Ao contrário do que s esperava, no entando, a eletrificação do trecho jamais foi implantada e os trens diesel foram mantidos, com locomotivas do tipo IRFA.

Durante este período de 1982 a hoje, houve a criação de diversas estações intermediárias nas duas linhas, sendo que a linha Sul atual sofreu recentemente uma expansão, com os trens, agora novos, com aspecto mais moderno e confortável, chegando até a estação de São José do Mipibu, retornando à cidade depois de 40 anos. As estações que foram construídas para atender ao trecho são bem mais confortáveis, embora muitas sejam bastante pequenas.

Enfim, o governo potiguar parece que relmente se importa com o transporte por trens. É clro que, comparando-e o qu há lá com o que é hoje a CPTM aqui em São Paulo, que opera os modais e estações gigantescas, nem sempre, talvez, necessárias. Mas mostra que o governo potiguar se importa com a mobilidade do povo, o que não é tão frequente nos dias de hoje.

O Estado é relativamente pequeno e a população, em consequência, não muito grande, mas vem-me a pergunta: será que um dia o trem retornará a Macau e a Nova Cruz para atender ao povo de duas das maiores cidades de lá?

Agradeço ao João Rodrigues Lanza e também ao João Santos, este do exceleente blog Cronicas Tapuienses, que me forneceram muitas informações sobre o Estado e suas ferrovias.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

OS DRAMAS DO TREM PARIS-LONDRES (2023)

 

                              

Transcrito do Jornal O Globo, via Revista Ferroviária, em Notícias da Imprensa, 6/2/2023:

Para uma geração, o trem de alta velocidade Eurostar que cruza o fundo do Canal da Mancha foi o retrato elegante e engenhoso de um novo nível de proximidade entre o Reino Unido e a Europa; agora, porém, ele corre o risco de se tornar o símbolo das tensões geradas pela separação via Brexit.

Até dois anos atrás, era possível apenas exibir o passaporte para uma inspeção rápida, mas desde 2021, depois da cisão, o passageiro britânico que vai ou vem precisa carimbar o documento. Enquanto a pandemia mantinha as viagens em um nível mínimo, o tempo mais longo exigido pela operação não fazia muita diferença, mas de uns meses para cá, com o aumento no volume de usuários, as filas – e a espera – ficaram mais longas.

A solução encontrada pela Eurostar foi limitar o número de pessoas nos trens, preferindo assim deixar centenas de assentos vagos em algumas linhas em vez de correr o risco dos atrasos gerados pela verificação. Naqueles que normalmente levariam até 900 passageiros, a capacidade foi reduzida para 600. A medida entrou em vigor há alguns meses, mas só começou a chamar a atenção de verdade na última semana, quando foi anunciada pelos meios de comunicação britânicos.

Embora os efeitos do Brexit na economia britânica ainda sejam objeto de estudos e debates, algumas consequências concretas já estão ficando claras. De fato, para os críticos, o problema com a Eurostar é apenas mais uma prova exasperante de que o país jamais deveria ter saído do bloco.

“Todo dia se apresentam, das mais variadas formas, provas de que o Brexit está deixando o país mais pobre, mais fraco, menos eficiente e menos respeitado no mundo. Foi o maior ato de autoflagelação nacional até hoje, e só começaremos a nos recuperar quando admitirmos isso”, escreveu Alastair Campbell, antigo assessor do ex-primeiro-ministro Tony Blair, no Twitter.

Em meados de 2022, quando as longas filas de veranistas aguardavam a verificação dos documentos no porto de Dover para poder embarcar nas balsas que cruzam o canal, as autoridades britânicas culparam os franceses pela demora, acusando-os de não reforçar o pessoal do controle alfandegário. O ministro dos transportes francês, Clément Beaune, rebateu: “A França não é responsável pelo Brexit.”

Mark Smith, ex-chefe de estação e fundador de um site que dá dicas de viagens férreas aos britânicos, conta que foi um dos primeiros a andar no trem que faz o percurso entre Paris e Londres, lançado pela Eurostar em 1994.

– No começo, ele saía da estação Waterloo, mas em 2007 mudaram para o terminal de St. Pancras, novinho em folha. O lançamento teve até champanhe, e foi considerado prenúncio de uma nova proximidade entre os dois países, mesmo com a empresa servindo outras cidades europeias, tipo Amsterdã e Bruxelas – diz. – A verdade é que seus terminais foram projetados para uma Europa aberta, onde o viajante pode se movimentar sem dificuldade entre um país e outro. Dava para fazer Londres-Paris em duas horas e 15 minutos, por exemplo. Não é um sistema para situações de limitações, cortinas de ferro e tal. Não funciona com Brexit porque, por definição, o movimento criou uma barreira entre a França e o Reino Unido bem no meio do canal.

Os cidadãos da União Europeia podem se movimentar livremente de um Estado-membro para outro e ali permanecer indefinidamente, mas quem vem de outras partes do mundo, incluindo agora o Reino Unido, tem prazo de permanência. Como resultado, a polícia alfandegária francesa tem de carimbar o passaporte dos britânicos – que representam cerca de 40% do movimento da empresa – na ida e na volta, para mostrar quando entraram no bloco e quando voltaram para casa. O Reino Unido ainda não impôs exigência semelhante aos europeus que pegam o trem, o que lhes facilita um pouco a viagem.

Por e-mail, um representante da Eurostar diz que os atrasos e as limitações de capacidade são consequência da falta de agentes e de espaço para a expansão da infraestrutura alfandegária em seus terminais, principalmente na estação de St. Pancras em Londres e na Gare Du Nord em Paris.

O governo francês informa que, entre 2020 e 2021, colocou mais 15 agentes no terminal da Eurostar na estação parisiense para agilizar a verificação, mas não revela se fez o mesmo do lado londrino. Segundo Matthieu Ellerbach, assessor do Ministério do Interior francês, a polícia de fronteira francesa está “inteiramente mobilizada” para enfrentar os picos de fluxo, e novos oficiais assumirão a tarefa nos próximos meses.

A Eurostar revela que está trabalhando na instalação de estações de checagem de passaporte mais automatizadas, mas no momento atual o nível máximo de capacidade entre as estações está 30% abaixo do nível de 2019; mesmo com a ocupação integral de todas as cabines, hoje St. Pancras consegue processar 1.500 passageiros por hora, no máximo, 700 a menos do que em 2019.

–Estamos a par dos problemas e em contato constante com a Eurostar e as autoridades francesas, que estão trabalhando para garantir a agilização do processo – explica o representante do governo britânico.

Os passageiros da Eurostar com passaporte da União Europeia, da Islândia, de Liechtenstein, da Noruega e da Suíça geralmente só precisam apresentá-lo nas catracas eletrônicas, em um processo normalmente ágil. Até o Brexit, os britânicos faziam o mesmo, com os oficiais verificando apenas a data de validade e se pertencia à pessoa que o portava. Desde janeiro de 2021, porém, eles ficaram obrigados a fazer um controle mais minucioso, inclusive carimbando o documento.

No início da pandemia, quando os lucros da Eurostar caíram 95%, a empresa suspendeu o serviço para duas estações menores no sudeste da Inglaterra, entre Londres e o canal; agora a demanda se recuperou e já está entre 75% e 80% do volume pré-Covid, mas, ainda assim, o serviço dessas duas unidades não será reativado.

Em carta ao comitê parlamentar britânico para justificar a decisão, Jacques Damas, CEO da companhia na época, disse que a reabertura só agravaria a situação, já que tiraria agentes de Londres para atuar em unidades menores.

– É somente graças ao fato de a Eurostar manter o limite de capacidade dos trens e ter reduzido significativamente os horários em relação aos de 2019 que não há filas diárias em Londres semelhantes àquelas nos portos do canal – comentou, referindo-se aos engarrafamentos de passageiros e de carga nos portos britânicos pós-Brexit. – Essa é uma situação que tem consequências comerciais óbvias e não é sustentável em médio e longo prazo, mas a consequência imediata é que atualmente não temos condições de atender à alta demanda na rota que liga as duas capitais.

Fonte: https://oglobo.globo.com/boa-viagem/noticia/2023/02/como-o-brexit-transformou-a-viagem-de-trem-entre-londres-e-paris-num-longo-tunel-de-burocracia.ghtml