quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

DESCENDO A REBOUÇAS E PENSANDO

Avenida Rebouças. Data e autor desconhecidos. A pista da esquerda sobe, a da direita desce. A rua que sai em diagonal é a rua Melo Alves
.
Não se trata de uma velha música do Ronnie Cord (Alguém se lembra? Alguém conheceu esta figura da Jovem Guarda dos anos 1960?), onde ele cantava: "Subi a rua Augusta a 120 por hora, botei a turma toda do passeio pra fora" e por aí afora.

Trata-se de descer a Rebouças nos anos 2010, mais precisamente, no ano 2014 e, mais especificamente ainda, ontem. E enquanto Ronnie Cord subia (ou descia) a Augusta, a cinco quarteirões da Avenida Rebouças, de carro, eu desci de ônibus. E de dentro dele, em pé, na ladeira entre a rua da Consolação e a Henrique Schaumann, quem corria mais era o ônibus.

A faixa exclusiva, no meio da pista, junto ao canteiro central, feita como deve ser e não como aquelas feitas nas coxas e do lado direito das ruas pelo cidadão que ocupa o Gabinete do Prefeito já há dois anos fazendo bobagens atrás de bobagens - com o nosso dinheiro, claro - , essa faixa permite que os ônibus sejam os únicos que desçam e subam a avenida a uma velocidade decente - talvez próxima de 50 e 60 por hora. 

Deu desespero ver os automóveis nas duas ou três faixas que lhes sobram parados quase todo o tempo, de vez em quando andando a 2-3 km para avançar alguns metros, ou mesmo centímetros. É evidente que a faixa os atrapalha, pois toma-lhes espaço. Porém, essa faixa realmente facilita o tráfego do transporte coletivo. Certamente desci a Rebouças muito mais rápido do que se estivesse de carro e praticamente na mesma velocidade do metrô que passa muito próximo dali, por baixo da terra (linha 4, Luz-Butantan).

No lado contrário da avenida, os ônibus subiam rapidamente também e os automóveis conseguiam ter mais liberdade de ação. Subiam a, digamos, 20 a 30 km/hora, sem grandes paradas, exceto pelos semáforos. De qualquer forma, a situação da Rebouças era triste e posso garantir que na mesma hora (cerca de 4 da tarde), várias outras ruas e avenidas estavam na mesma situação que a pista descendente onde eu estava.

Então, pergunto: o que pensavam o inventor do automóvel, ou os inventores, cem, cento e dez anos atrás, quando os lançaram no mercado? Em glória? No futuro da humanidade com eles? Em dinheiro? Teriam eles certeza de que o automóvel iria ser um sucesso e não um fracasso? Certamente pensavam em glória e em ganhar dinheiro. Tinham eles condições de prever os congestionamentos do futuro? E, se tivessem, preocupar-se-iam com isso? Se se preocupassem (o que, pelo meu modo de pensar, era pouco provável), teriam eles vindo a pensar o que fazer para evitar o caos nas grandes cidades que existe hoje?

Na verdade, embora todos gostem de seu carro e deter um, e de sempre querer ter um melhor, mais novo e, se possível, mais caro e potente, é meio ridículo olhar 'a vota e perceber que a maioria dos automóveis têm apenas uma pessoa dentro, mas ocupa o lugar de pelo menos oito? (embora isso não seja o que aconteça, como cabem duas sobre o capô e mais duas sobre o capô traseiro, podemos pensar nas oito pessoas - quando não nove.)

Se tivermos o mesmo número de pessoas que ocupam um carro - e aí vamos falar no máximo que podem ocupar internamente, o que geralmente são cinco - e pusermos-las na rua, andando, o espaço vai ser menor do que os ocupados pelos carros - e elas vão andar em uma velocidade baixa - no máximo, 5 km por hora sem correr - mas não estarão satisfeitos, porque vão se cansar. Porém, chegarão antes no seu objetivo do que se estivessem dos carros.

O correto seria tentar evitar tudo isso, não se permitindo (de que forma? Sei lá!) que cidades como São Paulo, ou mesmo menores, fossem formadas. A alta concentração de pessoas por metro quadrado, ou por quilômetro quadrado, que seja, já provou não trazer grandes vantagens, pelo menos para a grande maioria das pessoas que nelas vivem.

Seria o ideal que isto houvesse sido previsto e que se estabelecessem determinadas normas que limitariam as cidades a áreas específicas não muito grandes e com no máximo um determinado número de habitantes? (300 mil no máximo?)

Enfim, algo tarde para se pensar - mas as pessoas que vão mudar os próximos cem anos com novas invenções, sejam lá o que for, podiam pelo menos tentar fazer. É extremamente difícil prever o futuro, mesmo o muito próximo, qualquer um sabe disto. Mas pode-se tentar pensar mais em possíveis consequências do que fazemos para "melhorar o mundo".

Seria difícil para nós se subitamente fomos transportados de volta para 1880. Porém, o ambiente era muito menos poluído, em todos os termos que você pode imaginar para poluição. A terra era muito menos impermeabilizada - muito pouco, mesmo, com ruas de terra, casas que nem piso tinham, jardins imensos, fazendas imensas. Havia suas vantagens. Afinal, o ser humano já existe há (é isso mesmo?) milhões de anos e sobreviveu a todas as ameaças.

A avenida Rebouças existia há 400 anos atrás e era a Trilha Tupiniquim, Caminho para Sorocaba, Caminho para Pinheiros. Pense nisso. (Nota: lembre-se que quando falo no velho caminho de Pinheiros, falo da trilha que seguia pela atual Rebouças, entrava pela rua de Pinheiros e seguia pela rua Butantan, cruzando o rio e entrando pela atual Vital Brasil, Corifeu de Azevedo Marques etc. A Rebouças como existe hoje não existia há cem anos atrás. O que existia era apenas o trecho rua da Consolação-rio Verde, ou seja, o cruzamento dela com a rua Henrique Schaumann).

Chega de filosofia barata por hoje.

Um comentário:

  1. Filosofia.. precisamos dela pra pensar soluções. Mas quando a doença é grave como a que acomete São Paulo - talvez maior metrópole 3º mundista - outros ramos do conhecimento são necessários, como urbanismo, medicina, psicologia, lógica, ética... tudo enfim. Desinchar a mancha urbana é por onde deveria passar a filosofia... Acelerar tremendamente as intermináveis linhas de metrô, iniciar outras 4 a 5 linhas de metrô, enfim, triplicar as linhas, revolucionar a indústria de automóveis, incentivando carros pequenos e elétricos, isso só para falar de mobilidade... Chegaremos a um ponto em que essas questões serão tão dramáticas (infelizmente até lá o sofrimento talvez seja excessiva para muitos), tão dramáticas, que pediram que essas medidas sejam feitas à força. Discutir esse tema a fundo pediria uma mesa de bar, umas cervas e um método de discussão... Valeu!

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