sexta-feira, 28 de julho de 2023

UMA CASA NO MORRO DO CHÁ (1917)

 

Foto publicada no jornal O Estado de S. Paulo em 21/1/1917

O ano era 1917. Mais precisamente em janeiro, data da publicação da fotografia de uma casa de fotografias (desculpem-me a redundância) situada na rua Barão de Itapetininga, 25, na capital paulista.

Era uma residência assobradada, situada nesta rua, do lado esquerdo de quem segue do Viaduto do Chá para a Praça da República.

Com numeração antiga, somente alterada posteriormente, nos anos 1920, sabe-se pouco sobre esta construção. Terá anteriormente sido usada como residência? Em 1917, tinha uso comercial, pelo menos em seu andar térreo, como mostra a fotografia. Alguém ainda viveria no segundo andar nessa época?

A foto, infelizmente bastante ruim, mostra uma raridade, pelo menos para mim: um sobrado naquela época, numa rua ainda predominantemente residencial como era essa importante artéria do bairro do Chá, ou Morro do Chá, como queiram.

Onde seria a sua localização hoje, numa rua cheia de todos os tipos de prédios, praticamente todos de arquitetura mais recente e com diversos andares?

quinta-feira, 20 de julho de 2023

A AGONIA DO TREM DA CANTAREIRA (1964)

 

Carros de passageiros, antes cheios, estavam assim em setembro de 1964 no
embarque no Areal (Diario Popular, 28/9/1964)

O trem da Cantareira foi um dos trens de subúrbios que serviam às cidades de São Paulo e de Guarulhos, entre 1917 e 1965. Ele operou a partir do centro de São Paulo, quando, nos anos 1890, precisou-se transportar material para a construção da represa da Cantareira, que supriria água (até hoje) para boa parte do município de São Paulo.

Enquanto ainda transportava materiais, houve pedido de populares para que fosse disponíveis trens de passageiros, para que nos finais de semana, as pessoas pudessem ser levadas para aquela região e fazer piqueniques, muito populares já naquela época.


Com o fim das obras, o trem de passageiros foi mantido e passou a operar entre o rio Tamanduateí,no Parque Dom Pedro II. Com a construção de um novo ponto de saída na rua João Teodoro, o trem passou a operar diariamente, transformando-se num verdadeiro trem de subúrbios.

Os carros de passageiros ficaram vazios com as decisões equivocadas da ferrovia. Levaram 20 a 30 anos para que isso fosse solucionado pelo Metrô (Diario de S. Paulo, 28/9/1964)

A região onde ele trafegava era carente de meios de transporte. Porém, como a cidade cresceu para todos os lados, o chamado Tramway da Cantareira não acompanhou o seu desenvolvimento. Sua anexação pela Estrada de Ferro Sorocabana, em 1940, bem como a sua ligação entre a estação do Areal (ou Areial), esta em 1917, e a estação de Guarulhos foram tentativas para tentar prover melhores serviços.

Mas não foram suficientes. Pretendia-se eletrificar a linha, o que nunca aconteceu. O que ocorreu realmente foi o aumento da bitola, de 60 centímetros para bitola métrica, de forma a poder operar com trens da Sorocabana, ocorreu somente em parte da linha. Finalmente, sucessivos prejuízos obrigaram a estrada a piorar o serviço nos trens. 

Os trens pararam de circular por trechos, nos anos 1960. Em janeiro de 1965, os trens acabaram, depois de quedas de barreiras nas estações de Villa Mazzei e de Tucuruvi. Como muitas estradas de ferro naquela fatídica década de 1960, interrupções serviram como desculpas para desativações definitivas.

Meio ano antes, reportagens em diversos jornais relatavam o iminente fim do tramway.

Os prejuízos aumentaram com o fechamento do trecho de Joâo Teodoro ao Areal, obrigando os trens a partir desse ponto, desativando o acesso deles até a rua João Teodoro. Areal não tinha estrutura para receber o movimento que se esperava dela. Os passageiros que iam para Guarulhos perceberam isto e sumiram, preferindo os ônibus para partir dali para outros locais. Os trens saíam dali a cada três minutos e lotados. O número de passageiros passou a ser de 15 pessoas, incluindo os funcionários da estrada. As filas para obter passagens desapareceram. Trens passavam pelos mesmo local com horas de diferença. Enfim, decisões erradas e má vontade dos empregados acabaram com algo que poderia, com alguns investimentos, ter sobrevivido até hoje.

O que substituiu os trenzinhos de madeira demorou anos para chegar e não foi pelo percurso inteiro: a linha 1 do Metrô, em 1978. E aquele túnel por onde segue hoje essa linha somente foi aberto em 1998. 

Pela rua da Cantareira e a avenida Cruzeiro do Sul, segue hoje o Metrô de São Paulo. Mesmo trecho do tramway.

quinta-feira, 29 de junho de 2023

A VILA MARIANA EM 1917

 


O Estado de S. Paulo. 3/1/1917

O relato de umn morador publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo em 1917 dá uma ideia do que era a região central do bairro de Vila Mariana nesse já longínquo ano.

A rua Domingos de Moraes continua completamente despoliciada, a iluminação pública é péssima, correndo parelhas, em primitividade, com o desasseio da rua. 

Quando chove, esta rua é uma lagoa e quando faz bom tempo está constantemente sob nuvens de pó.

Passando à rua Fontes Junior (hoje é a rua Joaquim Távora - nota deste autor), a garotada pratica ali tais façanhas que já não é possível contê-la.

A avenida Stella (hoje é a rua Estela - nota deste autor) ainda não é calçada. 

O Largo Anna Rosa, onde há o imponente edifício do Instituto (hoje, com o prédio do século XIX já demolido, é o local onde há uma construção dos anos 1940 ocupado por diversos comércios - nota deste autor), está transformado num verdadeiro pântano.

Há toda conveniência em que o policiamento seja feito por praças de cavalaria.

Acrescenta ainda este autor que já nessa época havia trilhos de bondes elétricos na Domingos de Moraes e que o largo Ana Rosa já era bem mais estreito do que é hoje, devido à duplicação da rua Vergueiro, resalizado por volta de 1970.

Já os trilhos de bonde foram retirados no final dos anos 1960.




quinta-feira, 22 de junho de 2023

EMAS: SOLIDÃO E ABANDONO DE UMA EX-ESTAÇÃO (2022-23)

 


ACIMA: Restos do prédio da estação de Emas em 22 de junho de 2022.
Foto Carlos Otávio Nunes da Silva

O relato abaixo foi-me enviado no dia 22 de junho de 2022, exatamente um ano atrás. O relato ficou perdido entre outros textos salvos no computador na mesma época e agora o encontrei, procurando outra coisa - como sói acontecer.

Segue, então. A história mostrava a situação lamentável de uma antiga estação ferroviária de nome Emas - próxima à Cachoeira de Emas, no rio Mogi-Guaçu,no município de Pirassununga, SP. Quem escreveu e me enviou foi o Carlos Otávio Nunes da Silva, oficial da Aeronáutica.

A estação de Emas, da antiga Companhia Paulista de Estradas de Ferro, está localizada no ramal de Santa Veridiana, entre as estações de Laranja Azeda e de Baguaçu, aberto em 1886 e  desativado em 1976.

Hoje, um ano depois, como estará a estação e seus arredores? Não sou nada otimista, deve haver maior deterioração e mato. Vale pena reproduzir o que Carlos escreveu:

"Eu me chamo Carlos e sou oficial da Aeronáutica, atualmente servindo na Academia da Força Aérea em Pirassununga, SP.

Uns meses atrás tive a curiosidade de pesquisar a respeito da antiga estação de trem que existe próximo à Vila dos Oficiais aqui dentro da AFA e cheguei ao seu site.

Antes de mais nada, parabéns pelo trabalho! Fiquei horas e horas navegando entre as estações próximas aqui da região e as identificando no Google Maps. Espetacular!

Hoje decidi aproveitar a manhã de pedal e fui de bicicleta até a estação. Infelizmente o cenário é até pior do que eu imaginava.

O prédio está totalmente abandonado e faz tempo, muito pior do que as últimas fotos que o senhor postou no site. 

O mato e a vegetação invadiram tudo. No trecho por onde passavam os trilhos ainda há um caminho, talvez mantido por um trator que deve passar por ali de tempos em tempos sabe-se lá porquê.

Do lado oposto ao armazém já é tudo cana de açúcar e se passar pelo caminho paralelo ao dos trilhos, pelo meio da cana, como fiz por engano ao chegar, mal dá para ver o prédio.

O edifício da estação sobrevive, graças à robustez das construções da época e também um pouco devido à reforma que foi feita nos anos 1980 pelo pessoal da Fazenda de Aeronáutica. O telhado ainda existe, ainda que cheio de buracos. No interior, a maioria das salas sequer tem piso. Em alguns pequenos trechos ainda resiste uma parte do parquet original, logicamente em péssimo estado.

Já no armazém, como não fez parte da última reforma, sobraram só as paredes, e mesmo assim já quase ruindo.

Existe ainda uma terceira construção próxima à estação, talvez a casa do chefe, mas o mato alto tomou conta do acesso e não estava preparado para esse tipo de "incursão".

Novamente parabéns pelo trabalho.

Em breve vou tentar chegar até a estação Baguassu, se possível cruzando o rio Mogi pela antiga ponte de ferro da Companhia Paulista.

Quem sabe mais à frente eu faça o caminho até Santa Silvéria e Santa Veridiana.

Um abraço, Carlos".


terça-feira, 13 de junho de 2023

NEM RECLAMANDO PARA O BISPO (1948)

 


O cidadão de Serra Azul, município próximo a Ribeirão Preto, SP, parecia estar desesperado com os fatos que aconteciam na sua cidade. 

Pelo visto ele já havia reclamado muito antes de tomar esta atitude. Parece que alguém tê-lo-ia sugerido para reclamar com o bispo. Mas a cidade não tinha bispo, e ele achou que a solução seria reclamar com alguém famoso, mesmo fora da cidade.

Sobrou para meu avô, Sud Mennucci. Mas será que ele era tão famoso assim? O fato é que Luiz Antonio, o reclamante, achava que sim, e mandou-lhe esta carta, que segue abaixo, cheia de erros, alguns corrigidos, outros até difíceis de corrigir:

"Serra Azul, 9 de maio de 1948

Ilmo. Sig (sic) Diretor (ilegível) Sud Menucci (sic):

Esta reclamação le (sic) envio a V. S. não sabendo qual é o departamento apropriado.

Nesta pequena localidade de um simples Posto Policial que se acha ocupado por um carcerero (sic) de nome Antonio com um péssimo comportamento.

Cercando moças das roças e professoras rurais de venda a venda, de bar em bar, interessando-se da vida particular.

Portanto com esta peço o favor desta reclamação a ser enviada ao Departamento apropriado ser recolhido.

Pedindo desculpas e agradecendo do gentil favor me firmo V. S. criado,

Luiz Antonio da Silva".

Apesar dos erros de português e de daligrafia, etc. acho que dá para entender o que Luiz Antonio queria e pedia.

Nos áureos dias de Sud, não tão distante assim da carta, ele leria, escreveria algo na carta e endereçá-la-ia a quem de respeito.

O que Luiz Antonio certamente não sabia era que Sud estava acamado, recebendo pouquíssimas visitas e proibido de ler o que fosse por seu médico. Ele morreria menos de sessenta dias mais tarde, em 22 de julho.

Porém, a carta chegou a minhas mãos, aberta provavelmente por um de seus filhos. Não acredito que Luiz Antonio tenha recebido nenhuma resposta e o "assistante de cafageste" talvez jamais tenha sido punido por seus atos.

quarta-feira, 7 de junho de 2023

UM DESVIO FERROVIÁRIO PARA O PRESIDENTE EM AGUDOS (1908)

 


Em 1908, viajar de trem era uma necessidade. As linhas férreas no Estado de São Paulo eram as mais confiáveis do País e pertenciam ainda a particulares (como a Paulista, a Mogiana, a Noroeste e a Sorocabana, além da São Paulo Railway, esta de capital inglês e que mais tarde se tornou a E. F. Santos a Jundiaí), ou ao governo estadual (como a Sorocabana) ou federal (a Central do Brasil). Havia outras menores.

Nesse ano, o presidente Affonso Penna viajou para conhecer as linhas operacionais de São Paulo, usando  a cidade de São Paulo como ponto de partida e de chegada, aonde chegou pela linha da E. F. Central do Brasil, que ligava a capital ao Rio de Janeiro, esta na época a Capital Federal.

O texto publicado abaixo do mapa que está reproduzido da Revista da Semana, semanário que durou até os anos 1950, mostra o percurso. O texto da revista original foi também copiado com alguns cortes desnecessários aqui..

Percurso feito pelo Presidente da Republica, Ministro da Indústria e Comitiva, pelas linhas da Sorocabana, Noroeste e Paulista (...) no Ramal de Itararé foram até a estação de Acarassu (o nome correto era Aracassu), entrando na estação de Boituva, onde está o entroncamento (Boituva não está marcada no mapa, mas fica entre Sorocaba e Tatuí). Na Estrada de Ferro Noroeste foi S. Exa. até ao quilômetro 125, cuja estação teve o nome de Presidente Penna e fica, mais ou menos, no ponto accentuado (sic) pelo sinal x (que afinal não foi desenhado nessa cópia do mapa, mas ficaria muito à frente do tal km 125 - a estação que recebeu o nome do presidente acabou ficando bem à frente, com o nome Penápolis, e isto somente em 1909). 

Alguns comentários deste autor sobre o mapa: A Noroeste começava em Bauru. O trecho entre esta cidade e Botucatu era linha da Sorocabana. Como eram linhas de bitola métrica, o mapa provavelmente se esqueceu do detalhe. A linha da Sorocabana vinha de São Paulo, passava por São Roque, Sorocaba, Botucatu, São Manoel e Agudos, só para citar as estações mostradas no mapa e terminava, nessa época, em Bauru.

Em Botucatu, na época, havia uma linha que seguia até Avaré, que depois passou a ser o tronco da Sorocabana. O trecho de Boituva a Faxina (hoje Itapeva) ainda não estava pronto, por isso o presidente foi e voltou em Aracassu, como citado mais acima. 

Em Agudos, o comboio foi feita uma "chave" especial, para que o trem pudesse evitar a baldeação para Rio Claro, trecho ainda de bitola métrica da Paulista e que passava por Dois Córregos, Brotas e Anápolis (hoje Analândia).

Muitos detalhes causam alguma confusão, inclusive o da "chave" em Agudos, que não é suposição deste autor, pois foi relatado no artigo. Este desvio (ou "chave") unindo as duas estações da cidade por trilhos teria durado muito tempo? Hoje os trilhos da Paulista nem passam pela cidade, somente os da Sorocabana.

quarta-feira, 31 de maio de 2023

UBIRAJARA, EX-CAÇADOR (1944-5)

 
                            

Acima: Sud Mennucci (ao centro, de terno cinza) e seus anfitriões em frente ao Grupo Escolar em 23/9/1944

A localidade de Caçador (hoje Município de Ubirajara) era, em agosto de 1944, um distrito do município de São Pedro do Turvo, no Estado de São Paulo. Como muitos outros bairros rurais na época, tinham intenções separatistas.

Meu avô Sud Mennucci trocou várias correspondências entre 1944 e 1945 com diversos cidadãos da localidade. O nome Caçador surgia em algumas destas cartas, às vezes chamado por este nome, às vezes como Ubirajara. 

Uma das cartas, de 1944, era bem típica da época:

Ilmo. Sr. Prof. Sud Mennucci:

Com bastante alegria escrevemos hoje ao senhor.

Estamos de parabéns e devemos tudo isso à sua bondade.

Recebemos o novo instrumental oferecido pelo senhor ao nosso grupo escolar.

Como ele é lindo! Vamos inaugurá-lo dia 19 do corrente às 19 horas.

Temos o prazer de convidá-lo a essa solenidade. 

Levaremos uma festinha simples nesse dia. Continuamos a trabalhar com vontade. Todas as instituições de nosso grupo vão progredindo sempre.

Queremos, se for possível, muito breve levar nossa banda a Santa Cruz do Rio Pardo. Esperamos que o senhor aceite o nosso convite. (...) 

(a) Benedito de Faria Filho, pelos alunos do Grupo Escolar de Ubirajara. 

                                          

Houve várias cartas trocadas, entre Sud e Benedito Faria Filho, além de Eunice Figueira, esta a diretora estagiária do Grupo e também Ailton Amaral... gente que lutava na época por uma emancipação.

Sud era na época a mais importante pessoa no Estado na área de educação, abaixo apenas do Diretor Geral da Educação em São Paulo e também estava ligado a uma equipe de redefinição das fronteiras e de criação de novos municípios.

Fotos do grupo ao lado de meu avô foram tomadas em 23 de setembro de 1944 em frente ao Grupo Escolar local - um galpão de madeira.

                                           

Hoje, praticamente setenta e oito anos depois, as fotos são reproduzidas aqui. A cidade de Ubirajara pouco cresceu. O último censo (1920) registrou 4.780 habitantes para a cidade, que em 1949 foi transformada em município, desmembrando-se do de São Pedro do Turvo.

Não conheço pessoalmente a cidade, mas fica aqui a minha homenagem a ela e a Sud.