quarta-feira, 31 de maio de 2023

UBIRAJARA, EX-CAÇADOR (1944-5)

 
                            

Acima: Sud Mennucci (ao centro, de terno cinza) e seus anfitriões em frente ao Grupo Escolar em 23/9/1944

A localidade de Caçador (hoje Município de Ubirajara) era, em agosto de 1944, um distrito do município de São Pedro do Turvo, no Estado de São Paulo. Como muitos outros bairros rurais na época, tinham intenções separatistas.

Meu avô Sud Mennucci trocou várias correspondências entre 1944 e 1945 com diversos cidadãos da localidade. O nome Caçador surgia em algumas destas cartas, às vezes chamado por este nome, às vezes como Ubirajara. 

Uma das cartas, de 1944, era bem típica da época:

Ilmo. Sr. Prof. Sud Mennucci:

Com bastante alegria escrevemos hoje ao senhor.

Estamos de parabéns e devemos tudo isso à sua bondade.

Recebemos o novo instrumental oferecido pelo senhor ao nosso grupo escolar.

Como ele é lindo! Vamos inaugurá-lo dia 19 do corrente às 19 horas.

Temos o prazer de convidá-lo a essa solenidade. 

Levaremos uma festinha simples nesse dia. Continuamos a trabalhar com vontade. Todas as instituições de nosso grupo vão progredindo sempre.

Queremos, se for possível, muito breve levar nossa banda a Santa Cruz do Rio Pardo. Esperamos que o senhor aceite o nosso convite. (...) 

(a) Benedito de Faria Filho, pelos alunos do Grupo Escolar de Ubirajara. 

                                          

Houve várias cartas trocadas, entre Sud e Benedito Faria Filho, além de Eunice Figueira, esta a diretora estagiária do Grupo e também Ailton Amaral... gente que lutava na época por uma emancipação.

Sud era na época a mais importante pessoa no Estado na área de educação, abaixo apenas do Diretor Geral da Educação em São Paulo e também estava ligado a uma equipe de redefinição das fronteiras e de criação de novos municípios.

Fotos do grupo ao lado de meu avô foram tomadas em 23 de setembro de 1944 em frente ao Grupo Escolar local - um galpão de madeira.

                                           

Hoje, praticamente setenta e oito anos depois, as fotos são reproduzidas aqui. A cidade de Ubirajara pouco cresceu. O último censo (1920) registrou 4.780 habitantes para a cidade, que em 1949 foi transformada em município, desmembrando-se do de São Pedro do Turvo.

Não conheço pessoalmente a cidade, mas fica aqui a minha homenagem a ela e a Sud.


quarta-feira, 24 de maio de 2023

MAIS UMA ESTAÇÃO FERROVIÁRIA FOI DEMOLIDA NO BRASIL (2023)

 


Acima: Surge a cidade de Cianorte em anúncio da época publicado na Folha da Manhã, de SP

Mais uma estação ferroviária foi demolida neste mês de maio de 2023. Era uma das mais novas do Paraná, tendo sido inaugurada em 1972, com estrutura de concreto típica na época, para uma estação.

Durou pouco em funcionamento: deixou de operar para trens de passageiros em 1982, portanto onze anos depois de inaugurada.

A cidade de Cianorte passou a existir em 1953, loteada que foi pela Cia. Melhoramentos do Norte do Paraná. A estação começou a funcionar quase que imediatamente, na época como estação terminal do ramal que ligava Ourinhos, em São Paulo, a ela. Havia perspectivas de ligação com o rio Paraná, próximo a Guaíra. Porém, isto não aconteceu.

O prédio e a vila ferroviária, depois de sua desativação, foram sendo ocupados por órgãos ligados à cultura da cidade, até 2012, quando a prefeitura deu sinais de que pretendia arrancar os trilhos e a demolir o que existia, já que os cargueiros já não mais atingiam a cidade.

Somente agora veio a demolição e a retirada dos trilhos. O tráfego de cargueiros no ramal nessa região havia sido extinto.   

Enfim, a memória ferroviária paranaense e brasileira foi, mais uma vez, apunhalada pelas costas.

Veja também: https://blogdogiesbrecht.blogspot.com/2013/03/a-efemera-ferrovia-de-cianorte-pr.html 

terça-feira, 16 de maio de 2023

PELOS SERTÕES DO NORDESTE BRASILEIRO (1937)

 

Não podia faltar a foto com um jegue. Maria, de pé, e uma amiga professora,
America Monteiro, esta em cima do animal.

O texto abaixo, escrito por meu avô, Sud Mennucci, em dezembro de 1937, foi reproduzido parcialmente mais abaixo para mostrar a aventura que deveria ser viajar de São Paulo, a Juazeiro do Norte, cidade do Cariri cearense. O artigo original foi publicado por um jornal da Paraíba cujo nome acabou se perdendo nos colossais arquivos de Sud.

Sud e sua esposa Maria saíram da estação da Luz em 26 de novembro de 1937, em São Paulo, para chegar ao porto de Santos, onde tomaram o navio para João Pessoa e depois um automóvel para o interior da Paraíba e do Ceará para chegar na escola normal rural que para lá foram inaugurar. Em Juazeiro ficaram de 5 a 8 de dezembro.

Vale ressaltar que a ligação por trem entre o sul e o Norte brasileiro era impossível nessa época; a aviação era praticamente não existente e o passeio tinha de ser feito da forma que foi – primordialmente de navio e por automóvel por primitivas estradas de rodagem.

Hoje não temos trem de passageiros nem navegação de cabotagem. Ou seja, para fazer um “passeio” como este, o mais simples (e caro) mesmo é por avião e em alguns trechos por automóvel. Ou ônibus, viagem longuíssima e cansativa.

O trecho a seguir e que está entre aspas e letras em itálico tem Sud como autor. Mantive o português da época.

“Acabo de fazer uma viagem pelo Nordeste, das mais instructivas, das mais empolgantes, das mais educativas de minha vida. Para meu espírito de brasilidade, considero-a a mais emocionante que já me foi dado realizar. Para meu apostolado da “ruralização do ensino”, aquella activa campanha que eu tive a fortuna de reabrir em 1930, com o meu livro “A Crise Brasileira de Educação”, que a Academia Brasileira de Letras homologou e ratificou, concedendo-lhe o Premio Alvares de 1933, essa viagem foi decisiva e definitiva.

Tendo partido acompanhado por minha esposa e da distinctíssima professora parahybana d. America Monteiro de Araújo, desta cidade de João Pessoa, seguimos pela grande rodovia tronco da Parahyba, até a cidade de Lavras, no Ceará.

De Condado em diante tivemos a companhia solicita do ilustre agrônomo dr. Carlos de Basto Tigre, chefe do posto agrícola existente naquele açude. Dirigimo-nos ao cariry cearense, onde me chamava um generoso convite. Voltamos, dias depois, para atingir Orós, e, a seguir, Fortaleza. E regressamos, enfim, pelo caminho de Mossoró, Assú e Santa Cruz, no Estado do Rio Grande do Norte, entrando, de novo, na Parahyba, pela povoação de Tacima.

Em resumo, um authentico ‘raid’ automobilístico de mais de 2 mil quilômetros de percurso, através dos tres estados mais duramente atingidos pelo phenomeno climatérico das seccas. (...)”

A viagem de São Paulo a Juazeiro do Norte, CE, foi longa e durou dez dias, com saída em 26 de novembro e chegada no Rio de Janeiro, onde chegou com o trem Cruzeiro do Sul no dia 27 e embarque no navio Prudente de Moraes às 14 horas do mesmo dia.

Dali seguiu no mesmo navio com paradas em Vitoria, Salvador, Maceió, Recife e finalmente em João Pessoa, em 4 de dezembro, de onde partiu de automóvel para Campina Grande, onde almoçou com a comitiva. Às cinco da tarde estava já na cidade de Condado (um distrito da cidade de Sobral) e, às 11 da noite, em São Gonçalo, ainda Paraíba, e à beira do açude do mesmo nome.

As grandes estradas troncos, já entregues ao publico, representam a maior conquista sertaneja. A de João Pessoa a Fortaleza, com mil kms de trajecto, praticamente terminada até Sobral, com 850 kms de extensão utilizavel, e com apenas duas interrupções entre Russas e Mossoró e entre Angicos e Pedra Branca (que apesar de tudo, dão passagem) e a grande transnordestina Fortaleza-Salvador da Bahia, constituem espinhas dorsaes da zona sertaneja, servindo as glebas mais desoladas da natureza basílica, imprimem às populações uma noção completamente inedita de segurança, de agilidade, de desembaraço nos seus movimentos , libertando-as da sensação de degredo de outros tempos (...)."

Enfim, Sud passou por inúmeras cidades do sertão nordestino numa época em que isso era uma verdadeira aventura, especialmente para um paulista filho de pais italianos. Viajou de trem, navio e automóvel, este, trafegando pela Paraíba e Ceará. Ele certamente adorou a viagem. Já sua esposa, minha avó Maria, pelo que conheci dela, não deve ter tido a mesma opinião.

sexta-feira, 12 de maio de 2023

FORMOSA, GO E A FERROVIA NORTE-SUL DO BRASIL (1950)

 


A fotografia acima, que apareceu na Internet outro dia sem menção de autor ou data (parece ser nos anos 1950), traz de volta a menção da Ferrovia Norte-Sul do Brasil.

No final dos anos 1940, a ligação Norte-Sul do Brasil foi completada, ligando a Central do Brasil, que terminava no norte de Minas Gerais, na estação de Monte Azul, não muito longe da divisa com a Bahia, na cidade de Contendas, na linha sul da E. F. Leste Brasileiro,que ligava Salvador a esta cidade.

Havia, no entanto, uma ligação na Paraíba, entre as cidades de Patos e Campina Grande, que fazia parte da ligação e somente seria entregue em 1957. E foi, realmente.

Em teoria, a partir de então a cidade de Santana do Livramento, na divisa do Rio Grande do Sul com o Uruguai, estava ligada por trilhos com a cidade de São Luís, no Maranhão, com mudanças de bitolas e baldeações várias. 

Em termos de transporte de cargas, tornava-se pouco viável por causa disto. E, com relação ao transporte de passageiros, idem. O que eram utilizados eram alguns trechos que as compunham.

A união dos trilhos de Monte Azul a Contendas foi, então, bastante comemorada pela imprensa na época. 

Houve várias outras Norte-Sul projetadas antes disso. A primeira, pela Cia. Mogiana de Estradas de Ferro, que, em 1896, chegou a Araguari, no triângulo mineiro, com intenções de prosseguir com a linha até Belém do Pará. Alguns anos depois, desistiu e passou a concessão à Estrada de Ferro de Goiás, que chegaria a Goiânia e Anápolis, mas pararia por aí mesmo.

Na mesma época, a Central do Brasil, que chegou em 1922 com a sua linha a Pirapora, em Minas Gerais e às margens do rio São Francisco, anunciava que iria ela mesma construir a linha para Belém, passando por Formosa, em Goiás. Essa era o motivo da fotografia no topo desta página. 

No final das contas, como disse mais acima, em termos práticos, não havia ligação Norte-Sul nenhuma.

Até que, em 1986, no governo do presidente Joaé Sarney (que é maranhense) anunciou a construção de uma ligação que uniria o Maranhão a Estrela do Oeste, no noroeste do Estado de São Paulo. Com as enormes demoras de construção de ferrovias comuns a este país, os prolongamentos foram sendo construídos pouco a pouco e somente em 2022 a ligação esperada ficou pronta.

É uma linha cargueira que já tem movimento, maior ou menos, dependendo dos trechos utilixados pelos trens.

Nota: a ligação entre trens entre Santana do Livramento e São Luís hoje em dia não pode ser trafegada, graças à destruição e desativação de alguns trechos, como em Pernambuco, Alagoas e Paraíba.

Nota deste autor: há alguns outros textos e citações que falam sobre as Norte-Sul neste blog.