quarta-feira, 22 de abril de 2020

FAROESTE NA MOGIANA (1891)


Carta publicada em 11/1/1891 no jornal O Estado de S. Paulo:

"Anteontem 70 praças que em direção a Goyaz desembarcaram em Campinas para tomar o trem da Mogyana fizeram grandes desturbios ameaçando as pessoas presentes na gare e desrespeitando ao proprio commandante, que para manter a ordem, foi obrigado a ameaçal-os com um revolver.

Alguns viajantes receiosos de outras desordens durante a viagem deixaram de embarcar. As praças, mesmo depois de estarem dentro dos vagões ainda cometteram trepolias tomando dos vendedores as fructas e doces que lhe estavam em alcance das mãos.

Proximo à estação de Jaguary uma das praças disparou um tiro em direção a machina, não attingindo porem pessoa alguma.

Ao chegar á estação da Ressaca um dos mais exaltados attirou-se contra a janela ignorando até agora o destino que levou.

As praças parece que se achavam embriagadas, mas cumpre notar que não é essa a primeira vez se verifica um facto desta ordem".

A questão continuava 2 dias mais tarde, em outra carta publicada em 13/1/1891 no mesmo jornal.

"A respeito do facto por nós noticiado de disturbios provocados pelas praças que embarcaram ha dias na Estrada de Ferro Mogiana, em direcção a Goyaz, sabemos que as desordens continuaram em quasi todo o trajecto, disparando os soldados tiros nas pessoas que viam pela estrada e ameaçando-se mesmo reciprocamente.

Na estação de Jaguary insultaram todas as pessoas que se achavam na gare.

Ao partir o trem d'aquella estação uma das praças deixou-se ficar, tendo depois sendo presa e remettida para Mogy Mirim em virtude de desordens que alli praticou.

A imprensa do Interior notticiando esses factos commenta-os, pedindo energicas providencias contra aquelles que deviam ser os primeiros a manter a ordem."

Bom, algumas curiosidades: (1) A estação de Jaguary é hoje a de Jaguariúna. (2) A escrita foi feita em português da época, com poucos acentos e letras duplas, por exemplo. (3) A estação de Ressaca é hoje a de Posse da Ressaca. (4)"Praças", na época, eram soldados e curiosamente era um substantivo feminino e não masculino, sabe-se Deus por que, já que, se havia mulheres na função, eram bem poucas.

Finalmente, imaginem os leitores fazer uma viagem dessas com a polícia armada e bêbada por todo o percurso, já que esse trem deveria seguir até Casa Branca, onde, nessa época, trocava-se de trem para seguir até Ribeirão Preto. Notem que até Jaguary somente um deles foi detido. O que aconteceu com os outros? Seceram em Jaguary e fugiram?

domingo, 19 de abril de 2020

O PROBLEMA DOS NOMES NA HISTÓRIA DAS FERROVIAS BRASILEIRAS (2020)


Acima: estação de Guaiaúna em 1924, durante a revolução desse ano (O Malho).

Um dos maiores problemas no estudo da história das ferrovias e estações  (e também das cidades, municípios, distritos, vilas, bairros, ruas) no Brasil é a constante mudança de nomes nas localidades durante o passado.

Para piorar o cenário, os jornais e mesmo relatórios, principalmente no século XIX e por metade do século XX, é a citação de nomes de sem que sejam indicadas as suas localizações.

No caso das estradas de ferro, vamos fazer uma relação de lugares e de suas mudanças de nomes, nesta primeiro artigo, das estações da velha Central do Brasil no Estado de São Paulo para termos uma ideia de como localizá-las em artigos publicados na imprensa, principalmente. Vamos lá.

A Central teve diversas linhas no Estado paulista: o ramal de São Paulo, que ligava o Rio a São Paulo, parte dele (de Estudantes ao Braz) hoje linha 11 da CPTM - o resto dela (Estudantes-Queluz-Japeri, esta no Rio), linha cargueira. No Estado do Rio, o trecho Pedro II-Japeri também se tornou linha de subúrbios; a variante de Poá, toda ela hoje linha 12 da CPTM; os ramais da Penha, de Piquete e de Bananal, hoje desaparecidos.

Vamos analisar hoje o trecho paulista do ramal de São Paulo, estação por estação. Partindo de São Paulo:

Braz - Já foi Estação do Norte (da E. F. do Norte, que ligava São Paulo a Cachoeira), depois Roosevelt a partir de 1945; desde o advento da CPTM voltou ao nome de Braz e fundida com linha do Metrô e a da ex-Santos-Jundiaí, esta também do Metrô.

Engenheiro São Paulo (entre a Segunda e a Terceira Paradas), do engenheiro da Central. Desaparecida, inicialmente era chamada de Norte-cargas.

As seis paradas (Primeira a Sexta) - todas desaparecidas. As duas únicas que adotaram novos nomes foram a Quarta Parada, que virou Clemente Falcão (diretor de diversas ferrovias) nos anos 1940, e a Sexta Parada, que virou Engenheiro Sebastião Gualberto (engenheiro da Central), ambas desaparecidas também.

Carlos de Campos - Era Guaiaúna até os anos 1960. O Presidente do Estado de S. Paulo (governador) Carlos de Campos usou-a como quartel-general em 1924.

Vila Matilde - Sempre teve este nome até ser suprimida em 2000. Nome do bairro a que atendia.

Patriarca - no seu início, nos anos 1920, era "km 488". Nome do bairro Cidade Patriarca.

Artur Alvim - No início, Engenheiro Artur Alvim, engenheiro da Central.

Itaquera - até mais ou menos 1900 chamava-se São Miguel, nome do bairro a que atendia. Quando o povoado de Itaquera ficou mais habitado, passou ao nome deste. Hoje a estação e a linha da atual CPTM foram transferidas para a estação do Metrô, mais ao sul.

XV de Novembro - Também era chamada de Parada 15. O nome deriva de homenagem ao dia da proclamação da República. Depois a estação nomeou um dos bairros próximos (Parada 15).

Guaianazes - No início era Lageado, depois passou a Carvalho Araújo (diretor da Central) em 1924. Lageado era o nome do bairro em 1875. Em 1946 passou a se chamar Guaianazes, nome novo do bairro.

Gianetti - Foi aberta já no tempo da CPTM (1998), com o nome de Lageado, lembrança do bairro antigo. Logo mudou para Antonio Gianetti Neto.

Ferraz de Vasconcellos - O nome do chefe de distrito da Central substituiu já na sua construção em 1928 o nome do bairro, Romanópolis.

Poá - O nome sempre foi Poá.

Calmon Vianna - O nome do diretor da Central nunca foi alterado.

Suzano - Chamou-se Piedade (1875), depois Guaió (1890), depois o atual (1907), nome de um diretor da Central. Há quem diga que também se chamou Campos da Mirambava e também Concordia.

Jundiapeba - Aberta em 1914 como Santo Ângelo, nome de um hospital aberto na mesma época. Nos anos 1940 passou a se chamar pelo nome atual.

Braz Cubas - A dúvida aqui é o ano de abertura da estação (1914, 1928 ou 1929), que sempre teve o mesmo nome. O homenageado fundou Mogi das Cruzes e também Santos.

Mogi das Cruzes - Um dos municípios mais antigos do planalto, somente São Paulo é mais antigo. A estação nunca mudou de nome.

Estudantes - Estação fundada já na época da RFFSA. Atende a duas universidades da cidade de Mogy, daí o nome.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

ANEL VIÁRIO DE SÃO PAULO (1891)

Google Maps - desenho livre sobre mapa de 2020

Em junho de 1891 (faz tempo!), foi anunciado nos jornais paulistanos o projeto de uma ferrovia de bitola métrica que circundaria a parte central e mais populosa da cidade de São Paulo.

Tentei com as indicações fazer um mapa para essa região imprecisa (falava em Anhangabaú, Braz, Campos Elisios e Consolação, além de cruzamentos com as ferrovias da época (Estrada de Ferro do Norte, Sorocabana, São Paulo Railway e o Tramway de Santo Amaro.

Não foi fácil, com os dados imprecisos da reportagem, mas saiu esse mapa aí de cima.

Estranho, não? Porém, a interpretação pode ser de cada um que o lê e tenha um mapa de São Paulo na cabeça ou na escrivaninha.

Ali dizia que a ferrovia tinha de sair do vale do Anhangabaú e retornar a ele. Por isso aquela penetração da linha para a região do vale. 

Mesmo assim, basta pensar numa ferrovia que circundaria o Anhangabaú, passando pela periferia dos bairros citados mais acima.

De qualquer forma, não saiu anel ferroviário nenhum e os engenheiros, que "já se achavam nesta capital" iriam fazer um tour pelo roteiro da linha futura-que-nunca-foi.

Mais de cem anos se passaram e outros anéis foram sugeridos e não projetados, que, embora algumas partes tenham sido construídas durante os anos em pontos bem mais distantes do centro da Capital, jamais se "fecharam".