sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

UMA AVENTURA NO TREM: MATÃO A RANCHARIA EM 1923

A estação de Assis, no caminho entre Botucatu e de Rancharia, ainda era assim no ano da viagem.

Participei outro dia uma de pequena troca de e-mails numa lista de discussão ferroviária, sobre o tempo em que viajar de trem era não somente uma necessidade, mas também uma aventura.

Depois de o Adriano enviar uma fotografia da estação ferroviária de Matão, em seu estado atual, para a lista, o Thomas acabou por contar que o bisavô dele – Avelino Accorsi, já falecido, foi dessa cidade a Rancharia, fundada pouquíssimos anos antes, para lá se instalar com a família lá pelos idos de 1923 – oitenta e seis anos atrás.

Ele não tinha quase detalhes sobre a viagem, mas fomos desenterrando alguma coisa. Comentamos que essa viagem, naquele tempo, deve ter sido feita de trem, ao que eu acrescentei que, mesmo de trem, devia ter sido uma poeirada só. Fora que a viagem deveria ter sido bastante demorada, com pelo menos quatro baldeações pelo caminho: Araraquara (mudança de bitola e de ferrovia: E. F. Araraquara, na época bitola métrica para a Paulista, já bitola larga), São Paulo (mudança da Paulista para a Sorocabana e novamente de bitola larga para a métrica em estações diferentes, Luz e São Paulo, o atual “prédio do DOPS” – o nome ainda não era Julio Prestes) e Botucatu (a linha principal era SP-Bauru) e ali se mudava de trem até a Alta Sorocabana, na época ainda um conjunto de pequenas cidades e vilarejos em volta das estações ainda bastante novas.

Aí, o Thomas disse que podia não ter sido necessariamente esse o trajeto, pois sua avó sempre dizia que passaram por Itu. Isto significa que “cortaram caminho” por Campinas, ainda então na estação de Guanabara, seguindo pela linha que ligava esta cidade a Mairinque, já à frente de São Paulo. Mas cortar-se-ia caminho mesmo por ali? Ou fizeram-no por ser mais barato – se é que o era? Difícil de saber... O fato é que isso aumentava o numero de baldeações: mantinha-se as de Araraquara e de Botucatu, mas não se passava pela Capital: mudava-se de linha e de bitola (Paulista para Sorocabana, larga para métrica) em Guanabara e depois em Mairinque (sem mudar de bitola, passava-se do ramal para o tronco da Sorocabana).

A “grande poeira” devia estar, realmente, no trecho depois de Botucatu, assim como há relatos dessa poeira também na Noroeste ainda nessa época. A Noroeste e a Alta Sorocabana não tinham tanta diferença em termos de matas.

Isso tudo era uma aventura. Os Accorsi foram uma das famílias que ajudaram a povoar a “região desconhecida e povoada por índios” mostrada em mapas do Estado de São Paulo de até 1920. Cada um desses mapas mostra povoados nessa região com nomes diferentes entre si e completamente diferentes dos locais que existem hoje. É fascinante. A vida devia ser muito difícil. Essas pessoas foram os “pioneiros” da época, comparando-se com os desse nome (Pioneers) que povoaram o oeste norte-americano no século 19. Ou também podem ser comparados aos bandeirantes, que não povoaram o oeste paulista, mas que por lá passaram com inúmeras dificuldades com o objetivo de capturar índios ou de ir pelo rio Paraná para combater os espanhóis no oeste dos atuais três Estados do Sul brasileiro.

Os bandeirantes pelos rios e a pé pela famosa trilha dos tupiniquins, origem de inúmeras estradas e mesmo de ruas urbanas em São Paulo e “construída” em tempos imemoriais pelos indígenas. Os Pioneers com os famosos carroções americanos lá nos atuais Estados Unidos. Os Accorsi e inúmeras outras famílias com os trens.

Quando será que algum corajoso se atreverá a escrever um livro e/ou um filme sobre esse povoamento paulista em pleno século 20? Como perdemos oportunidades, para escrever e filmar bobagens...

Em tempo: O trajeto via Itu, supondo verdadeiro o trecho feito por eles (Matão-Araraquara-Campinas-Mairinque-Botucatu-Bauru) demoraria pelo menos 29 horas, sem contar pelo menos três pernoites. A distância por trilhos era de 994 quilômetros. Por São Paulo deveria durar menos, provavelmente um pernoite a menos, mas o tempo de viagem em si era praticamente igual. A distância era de 1056 quilômetros. Referência: Guia Levi de 1932 (9 anos mais tarde).

3 comentários:

  1. Olá Sr. Ralph, boa noite.
    Algum fragmento de história dessa colonização do oeste paulista pode ser verificada no livro de Fernando Morais, "Corações Sujos" (2.000). Em verdade, trata da história de um grupo de japoneses que se negavam a creditar na derrota japonesa em 45, e autor trata an passant sobre a história de cidades do oeste paulista, sobretudo aquelas de forte imigração japonesa. abçs

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  2. Na verdade existem várias partes dessa história em vários livros diferentes, especialmente dos das histórias das cidades dessa região. Uma visão conjunta, entretanto, seria fundamental para a boa compreensão desse processo.

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  3. Ola Ralph gostei muito de saber dessa história ai.. sou um Accorsi também e sou de Rancharia. Morei em frente a estaçao ferroviaria por 17 anos. Meu avô era sobrinho do Senhor Avelino Accorsi.
    Parabens pelo post.

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