segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A GRANDE SÃO PAULO D’ANTANHO

Acima, Santana de Parnaíba em 1939. As outras cidades da Grande SãoPaulo
nao eram muito diferentes em tamnho nessa época.

Fico imaginando como seria a Grande São Paulo se ela existisse como entidade anos atrás. Recuando quase quatrocentos anos, ela teria apenas três municípios em 1625: São Paulo, Parnaíba e Mogi das Cruzes. Todas as outras 37 cidades que existem hoje dentro da área metropolitana estariam inseridas dentro dessas três. Praticamente nenhuma outra existia nem como bairro: apenas Barueri e Carapicuíba, que se tornariam municípios séculos depois, estavam ali, e, mesmo assim, os atuais centros dessas cidades não estão onde eram nessa época.

Somente como curiosidade: mesmo depois da criação do distrito de Carapicuíba, em 1949 (a área era um bairro de Santana de Parnaíba e com a criação do distrito foi subordinado ao novo município de Barueri, criado também nesse ano), a Aldeia de Carapicuíba, do século XVI, pertencia a Cotia. Somente em 1963, com a criação do município, desmembrado de Barueri, a Aldeia foi incorporada ao município que levava seu nome. Aliás, levava o nome não por causa da aldeia, mas por causa da fazenda onde o atual centro da cidade se formou, em volta da estação ferroviária criada nos anos 1920.

De qualquer forma, a região metropolitana de São Paulo somente foi formada quando se viu a necessidade de tal medida. Não sei a data, creio que foi no final dos anos 1960 – alguém me corrija se for o caso. No século 19, embora (obviamente) as distâncias entre os centros das cidades que hoje a formam fosse o mesmo, era tudo mais longe, considerando o tempo para alcançar cada uma delas, com estradas muito ruins e falta de meios de transporte rápidos. Andava-se muito a cavalo, carro de boi e mesmo a pé. Com a chegada da ferrovia, a partir dos anos 1860, não somente se criaram novos núcleos, sendo que alguns passariam mais tarde a municípios, como também se desenvolveram os já existentes.

Quem ficou fora delas não teve a mesma sorte: Santana de Parnaíba, por exemplo, que já vivia em isolamento antes, teve o seu isolamento aumentado e é hoje, dentro das cidades da Grande São Paulo, uma cidade diferenciada, onde se respira séculos passados. Compare-a com Cotia, por exemplo: esta também não tinha via férrea, mas a proximidade com a estrada para Curitiba – hoje Raposo Tavares – acabou por dar-lhe um desenvolvimento maior, embora enfeiando a cidade.

Em 1850 a inexistente Grande São Paulo tinha apenas cinco municípios — São Paulo, Parnaíba, Mogi das Cruzes, Santa Isabel e o já desaparecido Santo Amaro —, que já haviam se transformado em oito, em 1877 — a eles se adicionaram Itapecerica, Cotia e Santa Isabel. Todas cidades pequenas e pobres, com exceção da Capital, que, afinal, tinha, no mínimo, as atividades da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e as funções administrativas do Governo da Província. Com o café e as linhas férreas, a população de São Paulo já havia duplicado em 1880; neste ano, a emancipação de Guarulhos e, pouco tempo depois, de Juqueri e São Bernardo elevaria o número das cidades da “Grande São Paulo” para onze. Destas onze cidades, apenas São Paulo, Mogi das Cruzes, Parnaíba, Juqueri (hoje Mairiporã), São Bernardo e Cotia tinham ferrovia, sendo que nas quatro últimas, ela passava a uma distância demasiado grande (mais de dez quilômetros) da sede das vilas. Nestes quatro casos, mais tarde todas as estações afastadas tornaram-se novos municípios – respectivamente, Barueri, Franco da Rocha, Santo André e Itapevi.

Os desmembramentos dentro da futura área metropolitana e no Estado criaram força a partir dos anos 1930: de nove municípios na virada do século, hoje são quarenta. Osasco, Santo André e Guarulhos são as maiores cidades, fora São Paulo – lembrando sempre que tamanho de cidade se conta não em área, mas em população.

Hoje, a Grande São Paulo tem diversos municípios conurbados, pouca área rural, esta existente somente nas regiões mais distantes da Praça da Sé, e uma dificuldade de governabilidade muito grande. E olhe que, nos anos 1930, era muito comum se alardear na imprensa que a tendência seria que em pouco tempo os municípios ao redor de São Paulo seriam incorporados à Capital, “para facilitar as coisas”. Deus me livre!!! Somente Santo Amaro foi encampado, em 1934.

domingo, 30 de agosto de 2009

OBRAS E PROJETOS, SONHOS E MENTIRAS

Nos últimos dias houve notícias sobre a suspensão das obras (que, aliás, nem haviam começado) do trem do Aeroporto em São Paulo, a ser implantado pela CPTM. A notícia foi que, bem, a suspensão foi revogada. Bom saber, mas quando começarão efetivamente as obras?

No metrô de Fortaleza, suspenso também desde junho, a suspensão das obras também foi revogada e as notícias são que foram retomadas. Nos outros projetos, tudo continua mais ou menos igual: no que ainda não começou, muito se fala e pouco ou nada se faz (metrô de Curitiba, linha 3 do metrô em Niterói, prolongamento da Ferroeste, prolongamento da Ferronorte, a Leste-Oeste na Bahia, Transnordestina, VLTs em diversas cidades). No que está já em obras, parece que a coisa vai seguindo normalmente, como as linhas do metrô em São Paulo e a Norte-Sul em Tocantins.

No norte do Paraná, a movimentação das cidades no eixo Londrina-Maringá para ter de volta um trem de passageiros que ligue essa cidade é surpreendente, pois já se fala nisso há anos e nunca dá em nada. Será agora mais uma sessão de papo furado? Afinal, quando a linha de passageiros foi suspensa em março de 1981, pouca reclamação houve. Está certo que o serviço estava jogado às traças, mas de qualquer forma, bem ou mal, ele existia.

É curioso ver como a história dos “papos-furados” mostra que o meu pessimismo tem fundamento (embora, repito, quisera eu estar erradíssimo sobre isto). Desenterrei aqui nos meus arquivos uma reportagem publicada em 2003 com o título de “País deve ganhar 10 ferrovias turísticas em 2004”. Ou seja, no ano seguinte. Pois bem: dessas dez linhas, somente uma vingou: a Ouro Preto-Mariana, em Minas Gerais. O resto (que nem vale a pena citar quais são) ficou no esquecimento mesmo.

Seria melhor que não se publicasse notícia alguma, deixando os interessados trabalhar sozinhos, no anonimato e sem alarde. Assim, quem se interessa em que elas sejam implantadas não se frustra. Aliás, foi curioso um dos comentários na mesma notícia: “(o Governo) aposta, inclusive, que as linhas inicialmente lançadas para o turismo acabarão dando lugar a um fluxo regular de passageiros que ajudará a melhorar o trânsito em áreas metropolitanas”. Belos sonhos.

E para os saudosos dos tempos em que existiam trens de passageiros em São Paulo, preparei uma pequena página em meu site de estações ferroviárias sobre o assunto “Trens da Fepasa”. Não eram grandes coisas, mas como hoje em dia até dos trens da “Velha Fepa” sentimos saudades... Vai mal a coisa. Para vê-la, eis aqui o link. Ainda tem pouca coisa.

Por falar em novas obras, acabo de receber a informação de que o trem Santa Cruz a Itaguaí (de fato um prolongamento do trem Deodoro-Santa Cruz, subúrbios cariocas) será reativado em 2010. Para isso, será preciso retirar barracos de cima da linha, reconstruir a linha e construir uma nova estação em Itaguaí. A mesma notícia diz que em 2010 o trecho estará reativado. Façam suas apostas. Quanto à foto acima, é de Jorge Cialowski, mostra um trem da Noroeste em 1987.

sábado, 29 de agosto de 2009

ANTIGOS CARTÕES DE VISITA














Acima, diversos cartões de visitas ou mesmo as abreviaturas que alguns colocavam no canto direito superior de cartas ou de cartões de visitas. São todos do acervo de meu av^Sud Mennucci (1892-1948), que, aliás, é o dono da abreviatura SM em azul. HS é de Horácio Sabino e AA de Altino Arantes.
Aqui aparecem os nomes de escritores, governadores, jornalistas, professores, desenhistas, prefeitos... gente que virou em geral nomes de ruas em São Paulo e em outras cidades. Alguns foram amigos, outros conhecidos e outros, apenas gente que agradecia alguma remessa de meu avô - geralmente seus livros.
São hoje parte da História do Brasil.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

AINDA SOBRE OS FUSOS HORÁRIOS

Carlos Augusto Leite Pereira mandou-me hoje um e-mail esclarecendo sobre os fusos horários no Brasil, que transcrevo a seguir:
"Antigamente não havia fusos horários. Havia apenas a hora local. Nos países cristãos era a igreja matriz de cada cidade que determinava a hora daquela cidade. As demais seguiam a matriz. O relógio da matriz era acertado pela passagem meridiana do sol. Como a Terra gira 360º em 24 horas, a cada 15º há uma diferença de uma hora, ou 4 minutos por grau. Assim, S.Paulo que fica 46º 38' W e o Rio a 43º 10' W têm uma diferença de aproximadamente 3,5º ou 14 minutos (3,5 x 4). De Recife (34º 53') ou Porto Alegre (51º 15') a diferença para o Rio é de aproximadamente 8º o que dá uma diferença de aproximadamente 32 minutos para mais e para menos respectivamente. De Brasília (47º 52') para o Rio a diferença é de quase 5º ou 20 minutos. Muita gente pensa que a hora de Brasília é determinada pelo meridiano que passa por lá. Não é. Pela convenção dos fusos horários ficou determinado que o meridiano central de cada fuso é o meridiano múltiplo de 15º contados a partir do meridiano de Greenwich, o fuso teria 7,5º a leste e 7,5º a oeste deste fuso central. Assim, a hora de Brasília é determinada pelo meridiano 45º W (este meridiano passa perto de Ubatuba e Cachoeira Paulista, em S.Paulo, e dentro de Lavras em Minas Gerais), e a faixa do fuso vai de 37,5º W a 52,5º W. Foi por isso que com a mudança da Capital Federal do Rio para Brasília não houve mudança de hora. As 2 cidades estão dentro do mesmo fuso. Se fosse seguir com rigor os limites de cada fuso, as Capitais nordestinas da costa leste teria a hora de Fernando de Noronha e não Brasília.
A ABERT está tentando unificar todos os fusos do Brasil para aumentar a audiência dos programas de TV. Já colocaram o Acre num eterno horário de verão. Se unificarem, o sol vai nascer em Cruzeiro do Sul (AC) (72º 38') 2 horas e meia depois de Recife. Um absurdo, mas a Globo é poderosa
".

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

FUSOS HORÁRIOS

Em um Guia do Estado de S. Paulo publicado em 1912, descobri o que não sabia: como eram os fusos horários no Brasil e na Europa nessa época (ver figura acima). Aí, saí a procurar alguma coisa para esclarecer quando foram estabelecidos os fusos da forma que são hoje. Na Internet, forma mais rápida, mas também repleta de erros potenciais.

Em 1912, São Paulo e Rio de Janeiro tinham uma diferença de 13 minutos. Na Europa, a diferença em termos de minutos também existia de uma capital a outra – basta ver a figura acima. Na Internet, li que a diferença de horários das cidades de Porto Alegre e do Recife em relação ao Rio de Janeiro, então Capital Federal, eram de respectivamente 28 minutos para menos e 33 minutos para mais.

Há vários anos, li sobre os fusos horários nos Estados Unidos em um livro americano de curiosidades: lá, as diferenças de minutos foram eliminadas em alguma época da segunda metade do século 19 por pressão das operadoras de linhas ferroviárias, depois de diversos acidentes, inclusive colisões, de trens, devido à diferença extremamente complexa e confusa. Na Internet, esse ano é citado como sendo 1883.

Também na Internet encontrei que os fusos horários no mundo foram estabelecidos em 1913 – sem maiores explicações. Na verdade, parece ter sido esse o ano em que os países (todos?) concordaram em estabelecer sempre diferenças em horas para regiões bem mais amplas do que a de uma cidade.

Enfim, há muitas dúvidas sobre como isso foi feito e quanto tempo isso teria demorado para ser implantado. O fato é que o Brasil, pelo menos desde os anos 1960, tempo mais remoto que me recordo de ter ouvido falar sobre isso, tinha quatro fusos horários: Brasília e a maior parte (leste) do Brasil; Fernando de Noronha, com uma hora a mais; Amazonas, metade do Pará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Roraima com uma hora a menos, e Acre e uma parte no sudoeste do Amazonas, com duas horas a menos.

Isso até 2008, quando o Acre e o pedaço do Amazonas foram também incorporados à porção de uma hora a menos – ou seja, o País passou a ter três fusos horários apenas. E tem mais: há um projeto de lei correndo no Congresso para reduzir o número de fusos para apenas um, para o País inteiro.

Não me parece uma boa ideia, mas quem sou eu para discutir com os nossos probos Congressistas (perdão pela palavra chula)?

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

O CRESCIMENTO DAS CIDADES


Há alguns dias O Estado de S. Paulo publicou uma reportagem sobre cidades pequenas (pequenas em população). Citou como exemplo o município de Borá, em São Paulo, e o de Serra da Saudade, em Minas, cada um com pouco mais de 800 habitantes. Sem dúvida, a calma impera nesses lugares, longe das capitais e fora de áreas metropolitanas.

O que dizer-se, porém, das cidades na área metropolitana de São Paulo – 40 ao todo – que crescem, crescem, crescem em população e a área continua a mesma, claro. Afinal, por que as cidades querem crescer? Não estaria na hora de pararem de crescer?

Na verdade, o número de habitantes do município de São Paulo cresceu relativamente pouco nos últimos anos – hoje tem por volta de 11 milhões de pessoas – mas a quantidade de construções, casas, prédios, galpões etc. aumenta a cada dia. É bastante possível (não tenho nenhum número que comprove isto) que se fossem reformadas todas as construções abandonadas ou em mau estado que existem na cidade, descontando-se, claro, as favelas, daria para abrigar todas as pessoas que saem comprnado apartamentos a cada lançamento de novos prédios, pombais de luxo.

E ai do prefeito que quiser parar com as construções. Os interesses por trás disso são enormes. O que acarreta esse crescimento desvairado? Caos no trânsito, violência, crimes, mortes, falta de infraestrutura em muitos lugares, a busca de água cada vez mais longe dos pontos de recebimento etc. etc. etc.

Por outro lado, demoramos demais para tentar solucionar os problemas. O investimento em trens, metrô, VLTs, corredores de ônibus (sim, eles funcionam: na Rebouças, Santo Amaro e outros lugares) é feito sempre com enorme atraso. O metrô de São Paulo e o da Cidade do México começaram na mesma época (1968). Hoje, a cidade do México tem pelo menos três vezes mais linhas que São Paulo.

As obras nas vias rápidas – ou melhor, que um dia foram rápidas – como as Marginais e o rodoanel demoraram muito mais do que deveriam. Fala-se do rodoanel pelo menos desde o início dos anos 1970. Tenho mapas publicados em jornais daquela época não somente com o rodoanel previsto então como do plano de avenidas dentro da cidade que jamais chegou a se concretizar. Atualmente o Estado está fazendo obras de monta na Marginal do Tietê. Devem ajudar o trânsito, mas por quanto tempo? O número de carros aumenta a cada dia. O rodoanel, no trecho que realmente ajudaria a Marginal do Tietê, continua na espera das obras e brigando com ecochatos.

O trânsito caótico na Marginal do Tietê vem de anos e anos. Há vinte anos já era ruim. Nada se fez. Somente agora estão fazendo. Para se chegar ao mais movimentado aeroporto do País, rápido mesmo só se você morar em Guarulhos. Saia de casa 4 ou 5 horas antes do horário oficial para chegar ao aeroporto, senão você corre um enorme risco de perder o avião. E o trem para o aeroporto, de que se fala há anos, continua com as obras ainda por começar, com entraves jurídicos etc.

Terrenos poluídos e contaminados por antigas fábricas e depósitos existem por toda a cidade. A região da Mooca é uma das piores da Capital. O que fazer? Gasta-se milhões para limpar, porque se quer... construir prédios, e não parques. É bom lembrar, também, que os parques, com arvores plantadas, por exemplo, vão trazer a contaminação para elas. Se forem frutíferas, contaminarão os incautos que comerem seus frutos e os pássaros que as bicarem.

Enquanto isso, as cidades da área metropolitana continuam desejando crescer: a filosofia é a mesma. A noroeste da Grande São Paulo, o município de Santana de Parnaíba, por exemplo, ainda tem mais de 50% do seu território como área rural. Acham que serão preservadas? Duvido. Olhe uma mapa de Parnaíba e veja algo muito similar a um mapa da cidade de São Paulo cem anos atrás: bairros afastados ligados ao centro por estradas radiais. Os maus exemplos serão seguidos até que toda a região metropolitana fique inabitável daqui a não tantos anos quanto podemos imaginar. Todos perderão.

A foto acima mostra o crescimento populacional de um bairro (Caetetuba) na cidade de Atibaia, já fora da área metropolitana, mas não tão afastada assim para não sofrer seus efeitos. Vejam a diferença do número de habitações entre a foto preto-e-branco (autor: Daniel Sperandelli), de 1962, e a do Google, em 2009.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

MEMÓRIA PERDIDA

Durante anos, desde 1996, eu fiz pesquisa de estações ferroviárias in loco. É claro que, tendo listado até agora 4.500 estações pelo Brasil todo, eu não teria condições de conhecê-las todas. Devo ter chegado a umas 600, talvez – número totalmente “chutado”, já que nunca contei a quantas estações fui. O problema não é somente o tempo de viagem até chegar aonde elas estão – mas também encontrá-las.

Se há alguma placa de indicação para a vila onde elas estão, fica mais fácil; porém, muitas vezes não há nenhuma indicação. E não é fácil encontrar pessoas nas estradas rurais; atualmente, é tudo um deserto humano. Quando encontra, tem de ser alguém mais velho – os mais novos não têm geralmente a menor ideia de onde fica uma estação que eles jamais precisaram usar.

Já usei diversas formas para encontrá-las: placas de indicação, perguntas aos mais velhos, pergunta aos choferes de táxis da praça principal da cidade, pergunta na Prefeitura...

Em São José do Rio Pardo, peguei um motorista de táxi e levei-o comigo. Ele conhecia mesmo as estações: e como elas ficavam dentro de fazendas, ele mesmo abria e fechava as porteiras. Não havia indicação nenhuma, mas ele conhecia. Fomos até Guaxupé. Em São Simão, encontrei um velhinho num posto de gasolina onde eu havia parado para perguntar onde era a estação de Sucuri. O velhinho se ofereceu para me levar. E olhe: eu jamais haveria conseguido chegar, o caminho era confuso demais. Mas chegamos.

Em Piracicaba, perguntei onde era a estação de trens da Paulista. Resposta: “tem trem por aqui?”, dada por uma jovem policial de trânsito. Na mesma cidade, tentei achar a estação Barão de Rezende. Ninguém sabia. Sabia que era no bairro do mesmo nome, mas, demolida há anos, ninguém lembrava exatamente onde era. Em vilas muito menores, pergunto às pessoas mais velhas. Elas geralmente sabem. Às vezes, não. Como em Cândia, perto de Pontal: “ali na rua de baixo tem um lugar que os pessoar diz que foi estação”... havia, realmente, a plataforma da estação; o prédio já havia sido demolido.

Muitas estações jamais foram encontradas por mim. Geórgia (perto de Cândia), Azevedo Marques (perto de Viradouro), Santa Irene (perto de Bebedouro), Pântano (perto de Descalvado), Engenheiro Vazquez (perto de Itatinga), Chave Macaia (próxima a Nova Europa) e Joá (perto de Guariba) são exemplos. Talvez já tenham sido demolidas, mas o fato é que ninguém as conhece – ou eu, claro, não encontrei as pessoas corretas. O fato é que a memória destes locais se perdeu quase que completamente. Às vezes a vila inteira desaparece sob um canavial. Como a Colônia da Fazenda Palmeiras, perto da estação ferroviária de Remanso, estação entre Cordeirópolis e Araras, que essa sim, sumiu “inundada” por um deles. Quando a visitei, estavam demolindo as casinhas da colônia (veja foto acima, de 1996) – a estação já tinha ido para o saco há muito mais tempo – e a igreja estava sendo “desmontada” para ser transferida para uma fazenda, como de fato o foi logo depois. Essa eu presenciei, mas e as outras inúmeras que desapareceram? Joá, citada acima, parece ter sido outro caso desses, pois o leito da antiga linha (ramal de Jaboticabal, desativado em 1969) passava onde hoje está um imenso canavial.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

VIA ANHANGUERA - ANOS 1940

No mapa acima, publicado em um jornal não identificado (possivelmente O Estado de S. Paulo) da primeira metade dos anos 1940 - quando a via Anhanguera já estava em construção - mostra a rodovia entre São Paulo e Jundiaí, que, aliás, foi o primeiro trecho a ser entregue pelo Estado. Notar a comparação da rodovia com a "estrada atual" - a Estrada Velha de Campinas, ao sul, e as linhas da SPR, da Sorocabana e da E. F. Perus-Pirapora.

Não há maiores comentários a ser feitos; a grande modificação que ocorreu neste mapa, além do absurdo adensamento populacional na área (que não é mostrado nesse mapa), foi a construção da Via Norte, depois chamada de Rodovia dos Bandeirantes, nos anos 1970, que nesse trecho foi construída entre as duas rodovias acima, cruzando a Anhanguera em Jundiaí.

Notar o número de curvas existentes na Estrada Velha.

domingo, 23 de agosto de 2009

A MENINA QUE SORRIA

Quando o mundo era em preto e branco, nos idos de 1914, quase cem anos atrás, ninguém sorria nas fotografias. Aliás, podemos dizer que ninguém sorria desde o advento da fotografia. Por que era assim? Não sei, talvez para indicar um sentimento de seriedade. Posar para fotografias era coisa séria, um retrato para a posteridade. As pessoas estavam sempre sérias, pareciam todas tristes, sérias, assustadas, amedrontadas. Não sei quando as pessoas começaram a sorrir para as fotografias. É difícil dar uma data, um ano exato, para dizer que a partir de agora, as pessoas se soltaram. Passaram a dar leves sorrisos. Talvez no inicio dos anos 1930, talvez um pouquinho antes...

Naquela foto que a revista A Cigarra tirou na Praça da República, ou próximo a ela, em São Paulo, aquela menina se atreveu a sorrir. Talvez tenha sido pega de surpresa pelo fotógrafo. Talvez ela tenha visto o fotógrafo e arriscado um sorriso. Ela era bonita, seu sorriso era bonito. Estava indo para a Escola Normal da Praça, ou seja, a Caetano de Campos, nome posterior. Suas amigas estavam ao seu lado, mas, embora bonitas também, não sorriram. Todas o eram, mesmo com aquelas saias pretas compridas e botinas abotoadas por zagaias. Quantos anos a menina teria? Se iam para a Escola Normal, teriam por volta de 15, 16, 17 anos. Teriam nascido ali por 1897, 98, 99. Meu Deus, quanto tempo! Seriam pouco mais jovens que minha avó. Poderiam ser minhas avós.

Quais teriam sido as conseqüências do seu sorriso? Teria ela sido repreendida quando os pais e amigos viram a fotografia na revista? Teria ela sido castigada, ou ficado falada na pequena cidade de São Paulo de então? Teria ela se arrependido do pecado, ou ficado traumatizada? O fotógrafo teria sido repreendido, ou sido congratulado pelos colegas por uma foto tão rara? O editor teria tido problemas por divulgar nas páginas da revista algo tão escandaloso? E a menina? Quem era ela? O que foi feito dela? Terá se casado, tido filhos, sido avó, bisavó? Seria de família rica? Onde morava? Enfim, o que terá acontecido com a primeira moça que ousou sorrir numa fotografia, mesmo que tenha sido sem perceber que estava sendo fotografada? A resposta provavelmente nunca será conhecida.

sábado, 22 de agosto de 2009

E SE?...

E se a E. F. Perus-Pirapora tivesse realmente chegado a Pirapora e construído o ramal para Parnaíba, como aparecem em mapas do final dos anos 1910?

A EFPP acabou parando no Entroncamento e jogando um ramal industrial para o Gato Preto em 1914, e descobriu – ou já sabia – que as minas de calcário ali eram suficientes para gerar lucros com a ferrovia. Por isso, não teria continuado a linha, que deveria continuar costeando o rio Juqueri-Guaçu mesmo depois do Entroncamento. Mas não deveria ter sido mau negócio se o fizesse. A quantidade de minas de pedra calcária no Vau, local pouco à frente seguindo o rio, era grande – imensa, aliás, como ainda o é hoje.

Tanto que entre o final da linha e o Jundiuvira, bairro pouco antes de Pirapora onde a ferrovia tinha o seu ponto final no projeto, instalaram-se diversas caieiras. A maior delas foi a da Matarazzo, no local chamado Vau Novo, a partir de 1939. Se todas essas caieiras quisessem utilizar os trilhos da EFPP caso eles chegassem até elas, certamente seria um bom investimento.

Mas, como em 1925 os Beneduce e sócios venderam a ferrovia para a empresa canadense de cimento Portland, que inauguraram a fábrica em Perus em 1926, parece que qualquer prolongamento se tornaria inútil, pois as caieiras do Gato Preto, somadas às pedreiras da Água Fria e dos Pires, para onde os trilhos foram esticados respectivamente em 1925 e em 1929, era suficiente para abastecer a nova fábrica, na época uma das únicas do Brasil e de longe a maior de todas.

As caieiras além EFPP, no Vau e no Jundiuvira, inclusive as da Matarazzo, certamente tinham de enfrentar péssimas estradas para carregar sua produção para o maior mercado consumidor, que era a cidade de São Paulo em franco crescimento. Porém, as saídas tanto por Perus (pela estrada Parnaíba-Perus, hoje Tenente Marques) e para alcançar, do outro lado, a Marechal Rondon (hoje Estradas dos Romeiros) eram praticamente planas, pelo menos.

Quanto ao ramal para Parnaíba, este sim, não deveria ter atrativo nenhum: a cidade não tinha cargas que justificassem o ramal e a passagem do mesmo pelo morro do Vacanga deveria ser um verdadeiro desastre para uma pequena ferrovia com 60 cm de bitola. Para se ter uma idéia, a descida do Vacanga para a cidade é cheia de curvas na Tenente Marques. Imagine uma ferrovia. A alternativa seria a passagem do ramal pelo vale do rio Jaguari (afluente do Juqueri), acompanhando a estrada do Jaguari, mas, após chegar ao bairro do mesmo nome, uma outra subida na estrada do Ipanema levariam também os trilhos a galgar rampas bastante acentuadas – e depois descer mais forte ainda no sentido da ponte sobre o Tietê. Não é a toa que o ramal nunca foi construído.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

O NOME DO RIO

Você sabe qual o nome daquele riozinho que passa perto da sua casa? Ora, em São Paulo e nas cidades vizinhas certamente há um córrego perto da sua casa. O que pode acontecer é que você não saiba que ele está lá, pois ele foi canalizado e está escondido dentro de uma galeria de águas pluviais. Sujo, com certeza: repare nas bocas de lobo que existem nas guias das calçadas a quantidade de sujeira – folhas, galhos, papéis, plásticos, objetos em geral – que estão presos na entrada delas. Se essas peças não conseguiram entrar por serem grandes, imagine a quantidade das que eram menores e passaram. Fora a imensa quantidade de poeira e terra.

Basta olhar para um mapa da cidade datado de 1920, por exemplo. Há nesses mapas uma imensa quantidade de córregos que na época estavam a céu aberto, com muito mais água do que hoje e certamente muito mais limpos. Ainda com suas matas ciliares e muito pouco assoreados, pois as matas seguravam o avanço da terra das margens.

Debaixo da Nove de Julho, o Saracura. Da 23 de Maio, o Itororó. Do Anhangabaú, o córrego do mesmo nome, que seguia pela atual Carlos de Souza Nazareth para a foz no Tamanduateí. Varias avenidas tomaram o nome dos córregos que taparam, pelo menos temporariamente: avenida Sumaré, Traição (Bandeirantes), Águas Espraiadas (Roberto Marinho), Cupecê, Água Preta (Nicolas Bôer, na Pompéia), Jaguaré...

Eu mesmo não sabia que o pequeno córrego, escondido no matagal e que cruzava a baixada da rua Capitão Cavalcanti, na Vila Mariana, era o córrego do Sapateiro, que é um dos formadores do lago do Ibirapuera.

Em Santana de Parnaíba, a mesma coisa, só que a maioria dos córregos ainda está aparente, embora com pouca mata ciliar, pouca água e sujos de tudo que é porcaria que se possa imaginar: pneus, sofás, garrafas PET. Um deles, muito bonito, com uma cachoeira em pedra, no Parque Santana, ninguém sabe mais o nome. Mas não é difícil descobrir em anotações antigas que o seu nome é córrego do Lajeado. O rio Jaguari – um pouco maior, já tem o nome de rio – deságua no Juqueri-Guaçu, na Fazendinha sofreu uma limpeza que o desassoreou há cerca de três meses, pela Prefeitura. Só que largaram toda a terra nas margens. Obviamente ela voltará para o leito do rio e terá sido trabalho desperdiçado.

Bom seria que se “urbanizasse” esse rio – que passa pelo bairro do Jaguari (como mostra a foto acima, tirada por mim em 2007) e depois acompanha a estrada do mesmo nome até a Estrada Tenente Marques. Em minha visão, significa limpar as margens e cuidar da vegetação que se plante ao longo dele de forma que ele possa ser visto em seus meandros. E, claro, impedir que se jogue toda sorte de material dentro dele. Esta parte é ainda mais difícil.

Mas este procedimento não deveria ser feito somente para ele, e sim para todos os córregos a céu aberto. E também seria muito interessante que se colocassem pequenas placas junto às passagens do rio cruzando as estradas para que todos se lembrassem de seus nomes. Hoje detalhe menos importante, outrora eram esses pequenos fios de água que dividiam propriedades com seus nomes muitas vezes históricos: Cachoeira, Vacaria, Sitio do Morro, Santo André, Excomungado, Lajeado, Passa-Dois, Alípio, Paiol Velho, Itaim-Mirim, Itaim-Guaçu, Votucavaru, Garcia, Barreiro ou Portão da Telha... são nomes dos córregos aqui em Santana de Parnaíba cujos nomes hoje não são lembrados por praticamente ninguém.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

DINHEIRO PELO RALO

Na história das ferrovias brasileiras, há episódios tristes de gastos de dinheiro para construções e investimentos que se provaram totalmente inúteis em pouco tempo. É impressionante o número de casos. Para citar apenas alguns, seguem:

A construção das linhas do Tronco Principal Sul, trechos Apucarana a Ponta Grossa e Mafra a Lajes, além de ter tomado muito mais tempo do que o razoável (o primeiro foi iniciado em 1949 e entregue em 1975, com diversas paralisações que levaram à reconstrução de trechos prontos), teve todos os pátios de estações construídos com uma estação e em media doze casas para funcionários. Todas excelentes construções. Só que a maioria não serviu para nada. Em 1975, já não se empregavam tantos funcionários como antes, mas somente os planejadores não perceberam isso. Essas casas permaneceram vazias e abandonadas por toda a sua existência.

Na linha Mafra-Lajes, iniciada em 1938 e finalizada em 1965, a mesma coisa. As estações ainda chegaram a ser usadas no atendimento de passageiros, pois, durante cerca de 15 anos, a linha teve trens de passageiros; as casas de turma em grande parte se deterioram com o tempo e vandalismo. Na foto acima, tirada por João Paulo em 2003, casas de funcionários no pátio da estação de Itaiópolis, Santa Catarina.

Os ramais de Cangussu, no Rio Grande do Sul, e de Conceição do Almeida, na Bahia, foram construídos nos anos 1950 e desativados em menos de dez anos. A linha Iaçu-Bonfim, também na Bahia, foi terminada em 1951 (a construção começou em 1917) e em 1978 já não mais funcionava.

A segunda estação ferroviária da cidade de Cambuquira, em Minas, construída para substituir a anterior, foi desativada no mesmo ano em que foi inaugurada.

O ramal de Dourados, da Sorocabana, foi terminado em 1965 e em 1978 foi desativado.

A eletrificação do Corredor de Exportação na linha retificada da antiga Mogiana foi entregue em 1985 e jamais foi utilizada. Em 1999 a fiação foi arrancada. Conta-se (não sei se é rigorosamente verdadeiro) que as locomotivas francesas compradas para o ramal não podiam trafegar por ele pois as plataformas das estações impediam a sua passagem. De qualquer forma, essas locomotivas jamais foram montadas depois que chegaram em caixas (com exceção de duas) e estão até hoje encaixotadas em Campinas (as caixas já estiveram em outros locais anteriormente).

As locomotivas Mallet compradas pela Estrada de Ferro de Goiás nos anos 1930 jamais puderam trafegar por suas linhas pois não cabiam nas mesmas, por serem muito grandes e as curvas de raio muito fechado.

A Companhia Paulista comprou as linhas da E. F. do Dourado e da Cia. E. F. São Paulo-Goiaz em 1949 e 1950 respectivamente e imediatamente começou a reforma total da via permanente, com a substituição de trilhos, empedramento e dormentes. O trabalho havia acabado de ficar pronto em 1961, quando houve a desapropriação da empresa pelo Governo de Carvalho Pinto. Em 1969 as linhas foram desativadas.

O VLT de Campinas, implantado em 1991, funcionou de graça até 1995 e foi desativado, tendo todas suas instalações sido abandonadas.

E a Ferrovia do Aço?? Quantos anos demorou?

Mas impostos o Governo cobra cada vez mais de você, pois precisa saldar os rombos que as ferrovias deixaram com investimentos inúteis. Isso só com as ferrovias. Imagine o montante em outros setores.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

ADEUS A PARAPUÃ

Hoje tive a notícia de que mais uma estação histórica do Estado foi demolida. Ela ficava na cidade de Parapuã, Alta Paulista, entre as cidades e estações de Iacri e Osvaldo Cruz. Era uma estação construída em madeira, como muitas da Alta Paulista, pois madeira existia em quantidade na região.

A estação foi aberta em 1949, e tinha o estilo comum na época às pequenas estações da Companhia Paulista nessa região. No meu site www.estacoesferroviarias.com.br há até uma fotografia da estação ainda em construção. O fato é que a estação foi praticamente a origem da cidadezinha do mesmo nome, como também o foram diversas outras da mesma linha. Era uma época de desbravamento das “terras desconhecidas e povoadas por índios”, como diziam os mapas do Estado anteriores a 1920.

Foi em 1923 que a Paulista começou a avançar com a linha do então chamado ramal de Agudos para além da cidade de Piratininga, antiga Santa Cruz dos Enforcados. Até então o ramal parava nessa estação desde 1905. Numa região ainda sem povoações, a empresa decidiu-se por dar nome às estações em ordem alfabética. A primeira depois de Piratininga chamou-se América, nome depois alterado para Alba.

Seguiram-se Brasília, Cabrália, Duartina, Esmeralda, Fernão Dias, Gália, Garça, Jafa, Vera Cruz (na origem, Kentucky), Lácio, Marília (diz a história que de “Marilia de Dirceu”), Padre Nóbrega, Pompéia, Paulópolis, Quintana, Parnaso, Herculândia (no início, Santana), Tupã e Universo. Houve duplicações de letras e mudanças, mas basicamente era o alfabeto e não era coincidência. Depois de Universo, a regra acabou e as estações foram sendo batizadas de acordo com outros motivos.

Na verdade, até Marília, as cidades desenvolveram-se a partir das estações; após, dado o sucesso da colonização, os aldeamentos foram se adiantando à chegada da linha – por onde ela passaria, as cidades se estabeleciam, já deixando até o ponto para a passagem da linha e da construção da estação. Mesmo assim, pode-se considerar que as cidades surgiram por causa da ferrovia e que as estações eram, se não o mais velho, certamente um dos mais velhos prédios da cidade.

Quem pôs fogo e posteriormente demoliu o que restou em Parapuã certamente não pensou nisso. Se sabia da história, pouco ligou para ela. Em novembro de 2008, a estação ainda estava de pé. Em agosto, sobrou apenas a plataforma e a sua cobertura de telhas. A mesma coisa havia acontecido com a estação de Pacaembu, há cerca de dois anos, e de Adamantina, em 2000: todas derrubadas, com incêndio supostamente acidental (Adamantina) ou à força.

São pedaços da história que se vão, graças à falta total de educação das gerações atuais, pobres de espírito e sem esperança. A foto acima e a notícia da derrubada são de Artur Silva, em 14/8/2009.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

HISTÓRIAS MAL CONTADAS

A Transnordestina, antiga CFN, concessionária das linhas do Nordeste desde 1996, afirma que ontem concluiu as desapropriações para construir a linha de Salgueiro até o porto de Suape, próximo ao Recife.

Muito bem. Só que essa ligação – que por sua vez será uma continuação do trecho Missão Velha, no Ceará, e Salgueiro, a oeste de Pernambuco – está para ser iniciada já há pelo menos cinco anos e não sai do papel. Não sei, nunca vi um mapa detalhado do traçado dessa ferrovia, mas sei que basicamente ela seria apenas a antiga “linha do Centro” da Rede Ferroviária do Nordeste, herdeira da inglesa Great Western.

Porem, como toda linha antiga, o traçado tornou-se obsoleto, principalmente na parte central da linha, que faz uma curva para o norte, encosta na divisa com a Paraíba e depois volta para o sul para seguir novamente o seu curso leste-oeste para Salgueiro. Aliás, a cidade de Salgueiro somente foi alcançada pela linha nos anos 1960, enquanto o trecho próximo ao Recife é de 1884, que depois foi avançando lentamente. A tal curva citada acima não será reproduzida, pois sempre foi considerada absurda: foi fruto de interesses e pressões dos coronéis da região.

Para piorar, nem dá para aproveitar partes da linha (suponho que partes do leito, sim, para diminuir as desapropriações), pois esta está abandonada desde a privatização. Trilhos roubados, aparelhos e estações destruídas, aquelas coisas a que quem acompanha a história das ferrovias brasileiras principalmente nos últimos 30 anos já está acostumado a ver.

Agora, é saber se as obras vão mesmo ser iniciadas e um dia teremos de volta a linha do Centro em nova versão. Aliás, esta deveria também alcançar o sul do Ceará, exatamente em Missão Velha, nos tempos da RFFSA. Nunca foi construída, e agora dizem que “desta vez, vamos”. Só para cargueiros, lógico.

Esta linha possivelmente decretará o abandono da linha que hoje é utilizada para cruzar o nordeste de Recife a Fortaleza, que passa por Campina Grande, na Paraíba, e encontra a linha do Ceará um pouco mais ao norte de Missão Velha. Como a linha é em parte do século XIX e somente o trecho Patos-Campina Grande é mais recente (1958), ou ela arranja cargas para se manter ou vai para o saco dando lugar à linha de que aqui falamos.

Como nas ferrovias brasileiras, nada é, tudo “vai ser”, só mesmo vendo para crer. E ver pode levar muito tempo. No mapa acima, a linha, em vermelho, juntamente com outras linhas do Nordeste (Extraído da Wikipedia em 18/8/2009).

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

O PATO DONALD

Desde pequeno leio revistas em quadrinhos. Eu disse “leio”: ou seja, nunca parei de ler. Uma das primeiras revistas que comprei foi O Pato Donald nº 322 em 7 de janeiro de 1958. Era uma terça-feira. A revista nessa época era semanal e saía todas as terças-feiras, impreterivelmente. Eu estava em Santos, passando férias no apartamento que minha família tinha no Embaré. Como fiquei lá o mês inteiro, comprei também os três números seguintes. Com quatro edições, resolvi, em meus seis anos de idade, começar uma coleção.

Embora eu comprasse outras revistas – Mickey, Mindinho, Tom e Jerry, Vida Infantil, O Tico-Tico (ainda existia o Tico-Tico, em fim de linha!) e outras, meu xodó era mesmo O Pato Donald. Com o tempo, fui conseguindo os números atrasados – os primeiros vinte e um números, no entanto, somente os consegui em 1973. Essas revistas eram em tamanho grande e eram mensais, tendo sido lançadas nos anos de 1950, 1951 e 1952.

Colecionei “O Pato” até mais ou menos o número 1.600, que saiu quando eu já era adulto, no final dos anos 1970. Eu aguardava as terças-feiras para ir à banca e comprá-los, mas o grande prazer de fazer isso acabou mesmo foi muito antes, no final dos anos 1960, quando o maior desenhista da família Pato deixou de desenhar: Carl Barks.

Ele era o autor das histórias longas do Tio Patinhas, que ia com seus sobrinhos combater os Irmãos Metralha e a Maga Patalógica, além do Pão-Duro Macmonei, nos confins da Terra. Belas histórias, inteligentes, na verdade, histórias mais para adultos do que para crianças, dadas as ironias e as críticas sociais que somente Barks com seus argumentos e desenhos conseguia produzir. Como o célebre diálogo na história “O elemento mais raro do mundo”, publicada no Brasil em 1958: “Eu ofereço seis milhões de cruzeiros pelo Bombastium” – ao que o bandido responde: “Eu ofereço a mesma quantia mais todas as pias de cozinha do povo feliz da Brutópia!” Patinhas então lhe pergunta quantas pias de cozinha tinha “o seu povo feliz”, e o bandido responde: cinco. Tio Patinhas, então, oferece, seis milhões de cruzeiros mais seis pias de cozinha – e leva o Bombastium. Brutópia, claro, era a União Soviética, em plena Guerra Fria.

Não posso também me esquecer da viagem do Tio Patinhas ao Vietbang, capital Bangsoc. Carl Barks também escreveu e desenhou histórias que mais tarde serviriam de inspiração para Steven Spielberg nos filmes de Indiana Jones, inventando as armadilhas das quais os patos sempre escapavam e que Indiana Jones acabou também por escapar... das mesmas.

Sem Barks, a qualidade das histórias do Pato caiu muito. Por ser teimoso, continuei comprando as revistas por muito tempo, até que parei de vez. Não leio mais O Pato, mas leio revistas da DC Comics com Superman e seus “amiguinhos”. E olhe que faz tempo: desde 1961 até hoje. E li muito Asterix, claro.

Vale a pena. Histórias em quadrinhos “limpam” o cérebro, embora tragam diversas bobagens. São bobagens mais adequadas do que as que a gente tem lido nos jornais de hoje.

domingo, 16 de agosto de 2009

NOMES DE RUAS

É incrível como mudam os nomes de ruas na cidade de São Paulo. Não sei se é assim em todos os países, mas no Brasil exageram. Não é à toa que quando se citam os projetos de leis da Câmara Municipal, a denominação de ruas aparece sempre em primeiro lugar. É mesmo não ter o que fazer.

A troca de nomes de ruas não somente atrapalha a localização das mesmas como também acaba com nomes tradicionais às vezes centenários. Em vários casos tal mudança gerou protestos por parte dos moradores, mas na esmagadora maioria das situações não houve volta.

Olhando para mudanças mais antigas, basta observar os mapas de ruas da Capital da primeira metade do século – e até mesmo mapas mais recentes. A rua Oscar Freire se chamava alameda Iguape. Nenhuma surpresa se notarmos que o loteamento da vila América (era como se chamava o bairro, depois passou a Cerqueira César, nome também hoje em desuso) tinha nomes de ruas paralelas à avenida Paulista homenageando cidades do Estado. Nos anos 1920 trocou-se o nome para Oscar Freire somente dessa rua, que saiu da regra do bairro, portanto.

Na Vila Mariana, o trecho final da Lins de Vasconcellos chamava-se rua São Jorge. Depois que uniram a avenida que vinha do Cambuci à rua São Jorge, unificaram o nome. A rua Estado de Israel era a rua do Tanque. A Diogo de Faria, rua do Gado. A avenida Jabaquara tornou-se, durante a era Vargas, avenida Presidente Vargas, voltando ao nome original somente porque os paulistas jamais engoliram o ditador.

A estrada velha para Campinas (ou Jundiaí) saía do centro da cidade. Era o nome do que hoje é a sequencia da rua das Palmeiras, General Olimpio da Silveira, o trecho inicial de dois quarteirões da Cardoso de Almeida, seguindo pela rua Turiassu, Carlos Vicari, Guaicurus e Felix Guilhem, cruzando o rio por uma ponte que não mais existe e encontrando a avenida Raimundo Pereira de Magalhães. Todos esses nomes vieram mais tarde e seccionaram a estrada original, dificultando as localizações.

Há casos piores, em que não se mudou o nome das ruas, mas se deram nomes diferentes para diferentes trechos de uma rua que não tinha nome. Caso das duas avenidas Marginais, do Tietê e do Pinheiros. Olhem nas placas: são diversos nomes, nunca “Marginal”. Por mais feio que o nome “Marginal” possa parecer, é ele o nome tradicional que todos conhecem. Experimente dizer a alguém que um imóvel fica na avenida Condessa Elisabeth Robiano ou Engenheiro Billings para ver se ela localiza. Há trecho em que a Marginal do Pinheiros tem dois nomes: rua Hungria e Nações Unidas, entre as pontes da Cidade Jardim (que, aliás, se chama oficialmente Engenheiro Roberto Zuccolo) e da Eusébio Matoso.

Os novos nomes que se dão às ruas hoje em dia têm outros problemas: um, são compridos demais: dificultam a memorização, pois coloca-se o nome inteiro da pessoa homenageada (além do título, “engenheiro”, “prefeito”, “vereador”). Por outro lado, qualquer pedaço de entroncamento com um jardinzinho no meio virou praça com um nome. As placas colocadas nas esquinas em que isso ocorre mostram esses nomes, que ninguém conhece, e não os nomes das duas ruas que se encontram ali. Meu Deus, como isso complica a nossa vida.

Lembro-me quando, nos anos 1970, mudaram o nome da Estrada dos Zavuvus, em Santo Amaro, para “Comendador Yervant Kissajikian”. Adivinhem quem sabia pronunciar o nome. E ali está até hoje. Na mesma época, um número enorme de ruas que ficavam originalmente no antigo município de Santo Amaro, incorporado à Capital em 1934, mudaram de nome justamente por causa de terem nomes em duplicidade com outras ruas da Capital. Exemplo: a rua Prudente de Morais, no Campo Belo, mudou o nome para Antonio de Macedo Soares. E muitas outras.

Portanto, não saia de casa sem seu guia na mão, pois, por mais que v. conheça a cidade, pode ser surpreendido com um novo nome em lugar daquele que v. estava careca de conhecer. Na foto acima, tirada por mim em 2003, a placa (que já não está mais lá) na rua Itapaiúna, no Morumbi, mostrando ainda o nome original dali: Estrada Velha do Morumbi.

sábado, 15 de agosto de 2009

EXISTE VIDA INTELIGENTE (EM CURITIBA)

A nota abaixo foi transcrita literalmente e foi escrita pelos signatários ao final da nota. Mostra que a mudança de leitos de linha não precisa ser necessariamente seguida do arrancamento dos trilhos, de acordo com o que pelo menos eu tenho me posicionado neste blog. (Nota: a foto acima, de Luis Bassetti, mostra o trem da ALL na Colônia Argelina, bairro do Bacacheri, Curitiba, no ramal de Rio Branco do Sul)

Nota de Entidades sobre o novo Contorno Ferroviário de Curitiba
Instituto Reage Brasil, SINDIMAFER E SENGE se posicionam.

Em matéria publicada no dia 06 de agosto do corrente, no Jornal Gazeta do Povo, sob o título “Contorno Ferroviário Aprovado”, do Jornalista José Marcos Lopes, sobre o andamento do 5º projeto do Contorno Ferroviário - reivindicado pela Prefeitura de Curitiba desde 2002 - onde se destaca a proposta do projeto apresentada pelo Presidente do IPPUC, Cléver Teixeira, que prevê a desativação de ramais ferroviários existentes no perímetro central das cidades, inclusive Curitiba, substituindo-os por obras de paisagismo, ajardinamento e/ou viárias, e o novo traçado que desloca a malha viária para regiões como Cidade Industrial de Curitiba (CIC), para o perímetro Urbano de Almirante Tamandaré, paralelamente aos traçados dos Contornos Norte e Sul, chegando ao antigo ramal que liga Curitiba a Araucária, ou seja, áreas cuja densidade populacional obrigará nova readequação em curto período, o Instituto Reage Brasil, Sindimafer (Sindicato dos Maquinistas e Ferroviários do Paraná e Santa Catarina), e o Sindicato dos Engenheiros do Paraná (SENGE), representados pelas pessoas que subscrevem esta, vem a público posicionar-se:
A) Favoravelmente à desativação do Transporte ferroviário de Cargas do Ramal Curitiba/Rio Branco do Sul;
B) Contrários ao projeto apresentado pelo IPPUC que prevê a retiradas dos trilhos desse ramal ferroviário;
C) Pela manutenção de estações de trens de passageiros da Região Central da cidade;
D) A favor do aproveitamento dos trilhos atuais para implantação imediata de um sistema de transporte de passageiros de superfície do tipo VLT - Veículo Leve Sobre Trilhos, de menor custo e breve circulação, dotado de redutor de ruídos e sinalização automatizada de passagens em nível;
E) Contrários à solução apresentada pela Prefeitura de Curitiba no Plano Multimodal de Logística que retira um trecho de ferrovia em área urbana e constrói dois ramais em outras duas regiões em atual expansão da ocupação residencial o que acarretará, à curto prazo, nova transferência das linhas ou seja necessidade de novas obras num horizonte próximo;
F) Sobre a necessidade de considerar a compatibilidade do projeto com estudo para implantação do TGV (Trem de passageiros de Alta Velocidade Curitiba/São Paulo), já incluído no Plano de Viação do Ministério dos Transportes;
H) Sobre a necessidade do projeto contemplar nos estudos a nova logística com os projetos de expansão da Ferroeste na Região Metropolitana, já anunciado pelo Presidente Lula;
I) Contrários ao Plano da Prefeitura que retira, da região central, o embarque de passageiro do Trem de Passageiros para Paranaguá, dificultando o acesso oferecido atualmente aos turistas e usuários;
J) A favor de uma ampla discussão técnica do IPPUC, COMEC, CREA - PR, Instituto de Engenharia do Paraná, SENGE-PR, ABENC-PR, Ministério das Cidades, CBTU, DNIT, Instituto Reage Brasil, representantes dos Cursos de Engenharia e Arquitetura das Universidades locais, e outras entidades que manifestarem interesse em debater democraticamente o contexto de soluções propostas de Transportes de Passageiros, com o aproveitamento de linhas e faixas atuais da ferrovia;
K) Promoção de debates em Fórum Técnico sobre o custo das obras: se está ou não compatível com os preços praticados pelo mercado, já que o valor do novo ramal foi anunciado em R$ 400 milhões, ou seja, teve o seu valor multiplicado por quatro em relação a proposta anterior, posicionada em área rural entre as bacias do rio Passaúna e Verde, cujo valor orçado era de R$ 80 milhões.

L) Contra obras com prazos impostos em virtude da realização dos jogos da Copa do Mundo, como ajardinamentos com efeitos meramente estéticos ao longo dos ramais e outras que possam justificar investimentos financeiros do Poder Público, sem que haja uma solução para os graves problemas viários da Capital Paranaense, com planejamento adequado;

Os abaixo-assinados, representantes das entidades, requerem junto aos órgãos públicos municipais, estaduais e federais, Audiências Públicas sobre o Projeto do Contorno Ferroviário de Curitiba e Região Metropolitana , ao mesmo tempo que estarão convocando à sociedade civil organizada para a realização de debates sobre o assunto, levando em consideração, de forma ampla:
1) Que o Sistema Ferroviário Nacional precisa com urgência de investimentos em melhorias das linhas e modernização da frota de locomotivas, o que não vem ocorrendo no período pós-privatização mesmo com os aportes benevolentes do BNDES para os Concessionários privados;
2) Que a Matriz de Transportes do Brasil precisa priorizar os modais de menor custo operacional , mais eficiência e menos queima de combustíveis;
3) Que com a Mudança Climática Global devem ser priorizados transporte de massa com velocidade e conforto que atraiam o usuário individual de veículos;
4) Que as obras de infraestrutura devem contemplar um horizonte com vida útil superior a 30 anos;
5) Que não se pode buscar solução isoladas para a cidade de Curitiba sem análise do contexto da Região Metropolitana;
6) Que precisamos buscar solução racional equacionando técnica, custos e impacto ambiental;

Dra. Clair da Flora Martins - Instituto Reage Brasil - Contato: (41) 91031226
José Carlos Rodrigues – Sindimafer - Contato: (41) 96057413
Paulo Sidnei Carreiro Ferraz – SENGE - Contato: (41) 84061971
Assessoria de Imprensa Instituto Reage Brasil
Jornalista: Marcos H. Guimarães - Contato (41) 8443-7224
www.institutoreagebrasil.com.br

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

RURALISMO NO BRASIL

Nos últimos anos, quando lemos ou ouvimos sobre ruralismo no Brasil, vemos o que se refere aos ruralistas, ou bancada ruralista do Congresso: deputados ou senadores (desculpe os palavrões) que defendem seus negócios em áreas rurais que eles ou seus amigos possuem pelo País afora.

Porém, 60-70 anos atrás, a palavra tinha outro significado, bem mais singelo. Meu avô Sud Mennucci foi uma das pessoas que lutou pelo ruralismo no País. Até escreveu livros sobre o assunto. Do que versavam estes livros? Ora, percebendo antes de muita gente que o êxodo rural era uma catástrofe para qualquer País numa época em que apenas 30% dos habitantes moravam em zonas urbanas, ele tratou de minorizar a fuga dos campos.

Hoje em dia, mais de 80% das pessoas do Brasil moram em áreas urbanas, gerando a favelização e a violência urbana, com a consequente queda da qualidade de vida nas cidades, que incham cada vez mais. No seu livro (1930) “A Crise Brasileira de Educação” Sud escrevia que as escolas rurais deveriam ter em seu currículo matérias que versassem sobre a vida rural e não sobre a vida urbana, pois isto levaria as crianças a desejar mais e mais migrar para as cidades. E olhem que, como falei, o problema não era tão grave assim na época.

Lutou por isso sua vida inteira, principalmente depois da boa repercussão do livro, fácil de ler e de entender. Porém, teve pouco sucesso. Tanto que as poucas escolas rurais que foram criadas com esse objetivo foram fechadas definitivamente com a reforma escolar de 1970.

É verdade que hoje em dia existem televisão (esta, já há um bom tempo) e a Internet (esta, não há tanto tempo assim) que atrapalhariam e muito os planos de Sud para as escolas. Mas nem no tempo em que estas facilidades não existiam Sud conseguiu gerar o interesse suficiente, tendo morrido frustrado em 1948. O êxodo rural explodiu no País e deu no que deu.

Eu rodei muito pelas áreas rurais de São Paulo e de outros Estados nos últimos quinze anos em minhas pesquisas ferroviárias. Uma das maiores dificuldades que existem hoje é justamente encontrar pessoas nas estradas ou junto a elas para fornecerem informações de localização. Não há mais ninguém, é tudo um deserto de pessoas. A fuga causada pela mecanização e por outros fatores é um fato. As moradias abandonadas são comuns.

Em 1932 foi criada na Capital a primeira escola rural nos meios pensados por Sud: a Escola Rural do Butantan, localizada em terras do Instituto Butantan. Afinal, nessa época, o bairro era zona rural de São Paulo. Aliás, em mapas de 1920, onde ainda se acha a divisão oficial de área central, área urbana, área suburbana e zona rural, percebemos que bairros como a Vila Pompéia e mesmo os Jardins eram considerados zona rural. Podemos imaginar o que era São Paulo na época.

A professora Elisa Rocha vem tentando coletar a memória da Escola do Butantan, fechada há anos. Ela, inclusive, trabalha no próprio prédio, que era a casa de Vital Brasil, doada por ele para a instalação do Grupo Escolar. Ela conta que a dificuldade de se obter dados sobre essa escola é grande. E também não é tão fácil achar dados sobre o ruralismo em geral.

Muitas vezes quando comento isto com amigos, alguns deles dizem que “o Brasil ser o celeiro do mundo é coisa do passado”. Acho que confundem as coisas. Morar na área rural não significa impedir que haja industrialização. Tirem suas conclusões.

Na foto acima, do acervo deixado por meu avô, uma foto de crianças em atividade na Escola Rural do Butantan.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

PLACAS DE AUTOMÓVEIS

Pesquisando sobre o município de Santana de Parnaíba, encontrei há alguns tempos uma indicação de como seriam as placas de licenças de automóveis nos idos de 1925 e mais para a frente.

Jamais pesquisei a fundo sobre o assunto, mas vale aqui colocar o que achei e as lembranças que tenho de como o sistema evoluiu, pelo menos no Estado de São Paulo.

Em 1926, no registro de um acidente ocorrido em Parnaíba, havia um automóvel Ford nº. placa 31 Parnahyba, um auto-caminhão nº. 3357 São Paulo e um auto Chevrolet nº. 22 Santo Amaro. As placas eram dadas pelos municípios (Santo Amaro era município nessa época), pois a regulamentação do trânsito era municipal. São Paulo tinha bem mais automóveis que as outras duas cidades e o número alto já era justificável. Carro de boi também tinha chapa. Em 1938, registra-se a existência do carro 51 Parnahyba. Seria a numeração seqüencial com a dos veículos automotores?

A mudança para o sistema de números, apenas, para veículos do Estado de São Paulo (e o resto do Brasil) deu-se durante a era Vargas. Cada Estado tinha sua numeração. No final dos anos 1950, quando meu pai comprou um Studebaker 1951 verde, a chapa era 5-99-98. Ou seja, 59.998, mas o número era sempre escrito de dois em dois e os hífens. Não havia, nessa época, carros com numeração superior a 100.000.

Eu e minha irmã ficávamos olhando pela janela do carro de meu pai quando ele nos levava e buscava da escola para ver carros com placas baixas, com um, dois e três números. Não era tão difícil assim achá-los. O número 341, por exemplo, era escrito 3-41. Bom mesmo era encontrar carros com dois ou um algarismo. Dizia-se que o carro nº. 1 era dos Matarazzo. Nunca o vi. Mas vi os carros de nº. 4 e 9. O 4 ficava sempre estacionado numa garagem aberta na esquina de uma ruazinha que saía da rua Alagoas, em frente à FAAP. Já o 9 era encontrado algumas vezes circulando – o que significava que ele deveria ser de alguém que morava no caminho entre minha casa e a escola.

Logo apareceram carros com chapas de 6 algarismos. E, creio, chegou a haver sete, mas foi quando, se não me engano no início dos anos 1970, mudou-se a numeração para a letra S mais o número, para carros da Capital, e para SS mais o número, para o interior do Estado. Não durou muito. Logo veio a numeração, também estadual, de duas letras e quatro algarismos: BQ-3589, por exemplo. O problema era que ela se repetia para os outros Estados, ou seja, poderia haver, com o mesmo número, 23 carros diferentes, somente variava a sigla do Estado com o nome da cidade, da mesma forma que é hoje.

Nos anos 1990 surgiram as placas como são hoje: o sistema é nacional, ou seja, as placas não se repetem, e têm três letras e quatro números. Como o Paraná foi o primeiro Estado a adotar o sistema, a maioria dos carros com a letra A que se encontra são de lá. São Paulo veio em seguida e ficou com a letra B até H, mais ou menos. E assim por diante. Como a placa pertence ao carro (antigamente pertencia à pessoa, que podia leva-la de um carro para o outro quando trocava o veículo), se o carro muda do Paraná para São Paulo, a letra A aparece em São Paulo.

São memórias, sem nenhuma pesquisa mais a fundo. Pode haver algum engano. Mas vale o registro. Na foto, o Citroën de meu avô Hugo, em 1950. A placa era 4-06-22.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

CUIDADO – ONÇAS NA PISTA


Carlos Latuff, o caçador de estações perdidas. O cartunista mora no Rio de Janeiro e vira-e-mexe sai de ônibus (ele não dirige) e mesmo a pé e vai caçar estações ferroviárias perdidas no meio do mato. Ele tem um blog que mostra essas expedições. E me avisa quando fez uma, de forma a que eu possa aproveitar parte das fotos e textos.

A última foi em Sabará, Minas. Aproveitando a visita a um congresso em Belo Horizonte, ele resolveu buscar notícias in loco sobre quatro estações do antigo ramal de Nova Era, que sai de Sabará – ou melhor, saía. Os trilhos já foram arrancados e o mato tomou conta de túneis, pontes e estações.

No caso, o desaparecimento do ramal foi devido a variantes construídas nos anos 1990 pela RFFSA e pela Vale do Rio Doce. O velho ramal completaria cem anos neste ano. O surpreendente é como os lugarejos onde estavam as velhas estações desapareceram por completo.

Caso da estação de Mestre Caetano, a uns 20 quilômetros de Sabará. Basta ver as duas fotos acima.

Outra coisa que acontece é que a invasão do mato traz a pobreza local para o que é invadido. O que não é pelo mato é pelas pessoas sem nada. Porém, não somente as pessoas chegam. A vida animal parece que volta para os lugares que lhes foram tirados. Sem o trem para assustá-las, as onças voltam.

Latuff foi avisado por gente que encontrou no caminho sobre o perigo da onça. Ele não ligou. Acabou não sendo atacado por nenhuma, mas pode ter-se arriscado muito.

É incrível como a natureza volta a ocupar o espaço que um dia já havido sido dela. O mato, os animais de todo porte, tudo parece que volta, ou tenta voltar, ao que era. O mato invade rapidamente os locais não usados. Por outro lado, velhos caminhos tão dificilmente traçados são abandonados e muitas vezes desaparecem.

Por outro lado, se analisarmos em termos de dinheiro – nós sempre pensamos em dinheiro, não é mesmo? – toda essa área invadida pelo mato, imóveis, caminhos, leitos, pontes, túneis, era do Governo federal. Era e continua sendo. Vão vender o quê hoje? E sempre devemos nos lembrar que dinheiro do governo é dinheiro nosso.

Não faz mal, eles inventam mais impostos e tudo se resolve.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

LEMBRANÇAS DO CIENTÍFICO

Para quem não sabe, “curso científico” era como se chamava o Segundo Grau nos anos 1960, pelo menos no Colégio Visconde de Porto Seguro, onde estudei. Havia também o clássico, ou “Línguas Modernas”, que era frequentado pelas moças. Assim como nele havia poucos homens, no Científico havia poucas moças. Fiz o primeiro ano em 1967 e terminei em 1969.

O Colégio nessa época ainda ficava na Praça Roosevelt, onde estava desde 1913. Saíram lá por 1972 para o Morumbi, creio. Depois instalou-se lá o Colégio Caetano de Campos, que (não sei se ainda mantendo o nome) usa o prédio até hoje.

Boa época. Muitos dos meus colegas são meus amigos até hoje. Lembro-me do segundo ano, onde as duas classes do científico e a do clássico foram instaladas no prédio anexo (à direita de quem olhava da rua), alugado pelo Porto Seguro para esse ano, pelo menos. Como ele ficava fora do pátio do prédio maior, era acessado por uma escadaria e tinha um portão próprio para a rua. A liberdade dos alunos era maior, a bagunça era maior. O prédio foi devolvido pelo Colégio e hoje está em ruínas. Não sei quem é o dono. Uma pena, é um belo casarão do início do século 20 (veja a fotografia acima, tirada por mim em 2008).

Como havia um ou dois dias em que tínhamos uma aula à tarde, íamos almoçar na cidade. Íamos a pé pela rua da Consolação até o largo do Paissandu e entrávamos na rua Antonio de Godói. Lá havia a Casa Italiana, que funcionou até uns anos atrás, com muito boa comida, uma pizza deliciosa e preços baratos. Não havia nenhum problema em andar pelo centro. Não havia os drogados e mendigos de hoje. Até a passagem subterrânea da rua Xavier de Toledo, em frente ao Mappin e ao Municipal, estava aberta. Geralmente parávamos lá para ver as exposições fotográficas que a Prefeitura tinha ali embaixo. Hoje está fechada e abandonada.

Aproveitando ainda o intervalo entre as aulas da manhã e da tarde, também íamos às lojas e comprávamos os discos (elepês) novos que saíam na época. Foi uma verdadeira festa quando um de nós comprou e trouxe para a aula da tarde o Sergeant Pepper´s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, hoje um elepê lendário.

Depois das aulas da tarde, íamos para casa, mas como havia tempo, também muitas vezes percorríamos a pé parte do caminho, acompanhando alguns colegas que moravam não muito longe da escola. Um deles morava numa casa na própria rua Augusta, a duas quadras da praça Roosevelt, num lugar que ainda não era deteriorado como hoje. Outra morava numa travessa mais acima, a Fernando de Albuquerque.

Grande parte morava no Campo Belo e no Brooklyn. Esses iam tomar o ônibus na avenida Nove de Julho ou na rua Augusta, para depois tomar o bonde de Santo Amaro. Depois que ele acabou, em março de 1968, ficaram órfãos e passaram a se virar de outro jeito. Nota: esse pessoal era geralmente de famílias abastadas, mas nem por isso deixavam de usar ônibus e bondes. Bem diferente de hoje.

Também durante a maior parte do tempo em que fizemos o Científico tivemos de aguentar as obras na Praça Roosevelt. De um grande “campo” asfaltado que era, que abrigava uma feira livre todas as quartas-feiras e sábados, tornou-se no início de 1970 uma praça horrenda coberta de concreto. As obras seguiram exatamente durante o tempo em que fiz os três últimos anos. O principal problema era o ruído do bate-estacas, que prosseguia manhã e tarde sem parar. Também havia um problema na saída das aulas, porque a cerca de tábuas da obra invadia a rua Olinda (hoje Guimarães Rosa) e estreitava a passagem para aquele monte de alunos que deixavam ao mesmo tempo a escola por volta do meio-dia. Quem esperava os filhos de carro tinha de parar na rua Gravataí.

Bons tempos.

domingo, 9 de agosto de 2009

O FIM DOS TRENS DE PASSAGEIROS NO BRASIL

Os trens de passageiros no Brasil acabaram. Todo mundo sabe disso – ou quase todo mundo. Sobraram somente os trens metropolitanos em algumas capitais, os trens da Vale – Carajás, Vitória-Minas e Drummond-Ipatinga –, o trem da E. F. Amapá (sim, existe e funciona!) e os trens turísticos, sendo diários o Curitiba-Paranaguá e o da E. F. Campos do Jordão.

E agora? Eles voltarão? Muita gente me pergunta isso e os jornais às vezes debatem a matéria. Muita gente sente saudades do tempo em que podia andar de trem, culpando o governo pelo seu fim – mas ninguém se lembra que a reação dos usuários pelo final desses trens foi praticamente nula.

Eles foram acabando a partir dos anos 1960 e terminaram de vez – fora as exceções citadas acima – em março de 2001, em São Paulo. Aliás, desde meados de 1998 que somente São Paulo os possuía. Em meados de 1996, existiam as seguintes linhas de passageiros regulares no Brasil, todas em São Paulo (repito, as exceções citadas acima funcionavam): Júlio Prestes-Presidente Epitácio, Santos-Juquiá, Luz-Barretos, Luz-Panorama, Campinas-Araguari e Luz-Santa Fé do Sul. Ou seja, as linhas-tronco das antigas Sorocabana, Paulista, Mogiana e E. F. Araraquara, mais a “linha do litoral” da Sorocabana.

Eram trens em mau estado de conservação e serviço cada dia pior. Aos poucos todos foram se acabando. Quando acabaram de vez em 2001, eram apenas três das linhas citadas acima e, mesmo assim, não com o percurso completo que tinham ainda em 1996.

Quem se utilizava desses trens eram gente muito simples e andarilhos, além de uma minúscula parcela de fanáticos por trens, gente que teimava em viajar para ainda sentir o restinho do que eles foram até vinte, trinta anos antes. Passagens baratíssimas, com preços irreais. E este é o problema hoje.

Quando se pergunta para as pessoas que morrem de saudades dos trens se elas voltariam a usa-las, elas dizem que sim, principalmente porque “eles sempre foram um meio de transporte barato”, comparando com as passagens de ônibus. E aí o problema pega. Se reativarmos qualquer linha, ela terá um preço muito mais caro do que antes, pois não se reativariam as mesmas porcarias que existiram no “fim dos tempos”. E aí, as pessoas usariam mesmo os trens, caros?

Outro dia vi um incauto reclamar do preço do trem turístico São Paulo-Jundiaí que corre todos os sábados pela CPTM desde o mês de abril. 28 reais. Caro? Se 28 reais é caro para fazer esse percurso, imagine-se quanto custaria para fazer São Paulo-Barretos, por exemplo.

A retomada dos trens regulares de passageiros, em qualquer ponto do País, não significaria apenas reformar linhas, locomotivas e carros, ou mesmo comprá-los novos. Significaria também a restauração de inúmeros pontos de embarque – leia-se estações ferroviárias – no seu percurso. Locais que hoje estão em sua grande maioria completamente deteriorados (mesmo que o prédio da estação em si tenha sido reformado) e que afugentam, por razões de segurança, as pessoas interessadas em tomar os trens para fazer suas viagens. Tais condições não afugentavam pessoas simples e andarilhos, mas com certeza seriam um empecilho para as pessoas mais abastadas que agora se disporiam a utilizar um trem mais caro do que ele era.

Enfim, as condições para se restaurarem as linhas que jamais deveriam ter sido abandonadas pela FEPASA e RFFSA não são fáceis de serem cumpridas. Por isso, a enorme dificuldade em se reativarem essas linhas – fora a falta de empenho do Governo em oferecer condições para tal.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

O FIM DE MAIS UMA LINHA FÉRREA HISTÓRICA

Mais um trecho de ferrovia em São Paulo vai desaparecer. A velha linha da Central do Brasil, que desde 1925 corria por São José dos Campos, junto à encosta do Banhado, vai ser arrancada para que se construa uma (argh) avenida. Avenida que, diga-se de passagem, é praticamente inútil e somente vai servir para que se estrague o belo local que é o Banhado.

Era perfeitamente possível que se mantivessem os trilhos, ou no canteiro central, ou na lateral, como um símbolo do poderio que teve a ferrovia nos tempos áureos. Mas que nem se pense nisso, ninguém está ligando para ela. Na foto acima, a linha, vista da via Dutra, sentido Banhado. A foto é de 2001.

Essa linha foi abandonada em 1996, quando deixou definitivamente de ser usada devido à construção da variante do Parateí, que passa junto ao rio Paraíba, quilômetros à frente. Na verdade, a variante existia desde 1952, mas os trens de passageiros Rio-São Paulo continuavam utilizando a linha de 1925. Com o fim destes no início dos anos 1990, a linha foi abandonada de vez.

Em Jacareí, já haviam-na arrancado “na marra”, há uns cinco anos atrás. O trecho em São José, no entanto, se manteve (com exceção do pequeno trecho cortado pela avenida do córrego do Vidoca, onde também foram arrancados os trilhos para permitir o cruzamento da avenida).

Aliás, bem “nos antigamentes”, entre 1875 e 1925, a linha passava mesmo era pelo centro da cidade, subindo a encosta do Banhado e descendo mais à frente. Problemas com uma curva malfeita na descida para o vale, onde constantemente ocorriam descarrilamentos, levaram a Central a modificar o trajeto da linha para o Banhado no início dos anos 1920. Isto levou a estação da cidade do local onde hoje está a SABESP para o local atual, em frente à Tecelagem Paraíba.

A manutenção da linha ao lado da avenida teria como função apenas manter a memória da cidade; poderia, também, fazer ver a alguma alma iluminada que a passagem de um VLT seria possível aproveitando-se o seu leito. Mas parece que isso é pedir demais a administrações que somente enxergam avenidas (e nada mais) como palco de suas obras. Conheço bem São José dos Campos. Não há trânsito, em hora nenhuma do dia, que justifique a passagem de uma avenida por ali.

A notícia que chegou foi seca: “O Governo Federal liberou um trecho de 13,6 quilômetros do ramal ferroviário desativado da antiga Central do Brasil em São José dos Campos para que a prefeitura da cidade possa implantar novos corredores viários no município. Em São José, o ramal margeia a orla do Banhado, corta a Via Oeste (que liga o Jardim das Indústrias ao Colinas) e atravessa glebas no bairro Limoeiro até atingir o município vizinho de Jacareí”. E só. No fim, ninguém reclama: só eu.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

ESTAÇÕES DEMOLIDAS

Entre todas as 4.500 estações que existem (ou existiram) no País, várias delas já foram. Com exceção das que o foram por ter sido substituídas por outra no mesmo local (há vários exemplos), há aquelas que foram demolidas por não ter mais uso — embora nem sempre isso justificasse o desmanche.

Os piores casos são os das estações que deram origem às cidades onde se encontravam. Sabemos que muitas estações foram construídas no meio do nada, sendo o ponto central das cidades que se formaram posteriormente à sua volta. Há muitos exemplos, mas podemos citar dois: Leme e Brodowski, em São Paulo, ambas hoje sem os trilhos da linha que as construiu (respectivamente, ramal de Descalvado, da Cia. Paulista, e linha do Rio Grande, da Cia. Mogiana), mas em pé. É certo que a de Leme está fechada e meio largada, mas ninguém a derrubou. Já a de Brodowski é hoje um pequeno museu ferroviário.

Pode-se dizer que praticamente todas as cidades na linha da Paulista após Bauru, na da Araraquarense após São José do Rio Preto, da Noroeste inteira e da Sorocabana após Avaré, surgiram ou das estações ou pouco antes de a linha chegar — justamente no aguardo da ferrovia.

No entanto, cidades como Pinhalão, no Paraná, e, em São Paulo, Duartina, Ouro Verde, Corumbataí e mesmo outras que, embora tenham sido construídas depois de algum tempo de a cidade estar estabelecida tiveram uma importância muito grande para o seu surgimento. Neste último caso, estamos falando de cidades da Alta Paulista, que se estabeleciam alguns anos antes da chegada da linha do trem, já sabendo que passaria por ali — e, quando a linha chegava, trazia sua estação. Adamantina e Pacaembu, ali situadas, tiveram seus prédios destruídos por negligência.

Outras cidades em praticamente todos os Estados brasileiros também tiveram sua estação histórica demolida. Uma lástima, realmente. Os exemplos não são poucos, mas preferi me ater aos que me lembrei primeiro, já citados acima. Na foto, o aspecto desolador da estação demolida em Pacaembu (2006 - foto Artur V. da Silva).

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

RESTAURANDO VELHAS ESTAÇÕES FERROVIÁRIAS

As notícias hoje são duas em relação a restaurações de estações do Brasil.

Uma vem de Araraquara, onde o Prefeito anterior fez o favor de estragar o belo saguão de entrada após restaurar a estação central colocando uma escada para cadeirantes de metal no centro do saguão. Para fixá-la, ele serrou a grade de madeira de 1915 (foto acima, de autoria de Geraldo Godói) no andar de cima. Além do mais, colocou ao lado um elevador. Pode?????

Não pode, e o Prefeito atual percebeu isso e consertou. Mudou o elevador para a sala da bilheteria, onde pelo menos quem vem de fora não nota se não entrar nela, e mandou a escada para outro lugar (lixo???), consertando e recolocando no andar de cima a parte que havia sido retirada da grade de madeira (Graças a Deus não tinha ido para o lixo).

É verdade que há méritos do Prefeito anterior por ter a iniciativa de recuperar o prédio, abandonado havia anos, mas colocar aquelas aberrações quase acabou com a iniciativa. Graças a Deus o atual prometeu e cumpriu, recuperando tudo. A estação está servindo desde janeiro como museu ferroviário da ABPF.

Falta, agora, a Prefeitura recuperar o pátio da estação do Ouro, jogada ao mato, às traças e a tudo quanto é tipo de inseto, juntamente com a sua subestação elétrica, antes que o tempo e os vândalos levem tudo. Aqui, porém, o caso é mais difícil, dado o isolamento do local. A velha escolinha do local, bonita e simples, já caiu, assim como outras casas.

Notícias de Ponta Grossa, Paraná, terra de meu saudoso pai, dizem que a estação ao sul da cidade, no bairro rural do Guaragi, vai ser reconstruída pela ALL. Era uma pequena estação de madeira, destruída por um incêndio em 2004. A ALL foi processada pelo Ministério Público por não ter cuidado do prédio, que estava sob sua tutela – embora ela tenha alegado que realmente usou o prédio por algum tempo, mas antes do incêndio devolveu-a à já defunta RFFSA, por não ter mais interesse.

Bom, esperar que a inventariança da RFFSA cuide de alguma coisa já é querer demais; a ALL acabou tendo de pagar pelo fato. Acertou com a Prefeitura de Ponta Grossa que vai reconstruir o prediozinho, mas em outro local a ser escolhido. Para mim, solução chinfrim – pois reconstruir um prédio de madeira histórico (e que era tombado pelo Estado), ainda mais em local diferente, pouquíssimo representa. Enfim...

Está certo que a preocupação com a memória nacional aumentou muito nos últimos vinte anos, mas ainda falta muito para que cheguemos a um ponto decente quanto a isso. Enquanto não tivermos seriedade com as aulas de História do Brasil nas escolas, e também batermos na tecla de se preservar a memória e o patrimônio, não vamos conseguir avançar com a rapidez necessária. Enquanto isso, dia a dia mais patrimônio se perde vítima do descaso ou da ganância.