terça-feira, 9 de outubro de 2012

RIO CASCA E SEU PADRE MILAGREIRO

A fotografia do jornal Folha da Manhã parece mostrar o padre no oval; no entanto, é apenas o delírio de um fiel. O padre já era bem mais velho
Eu jamais ouvi falar do tal padre Antonio Pinto, milagreiro e curandeiro na cidade de Rio Casca. Onde fica Rio Casca, afinal? Bem, o nome somente soou familiar quando eu estava fuçando em jornais velhos do ano de 1947 por que era o nome de uma estação da Leopoldina. Mais precisamente, no trecho entre Ponte Nova e Caratinga, parte final da linha que unia o Rio de Janeiro a Caratinga, a última a ser entregue (1930) e a primeira a ser eliminada (anos 1970). Os trilhos já se foram há tempos para além de Ponte Nova.

Bom, cidade pequena, pobre, numa região também pobre, a ponto de imaginar o que a Leopoldina pensava quando construiu essa parte da linha. Lugar bom para se "cultivar" curandeiros. Antonio Pinto era padre nos idos dos anos 1940 e, subitamente no final de 1947 começou a ganhar fama como tal. E por isso surgiu uma leva de romeiros loucos para conhecê-lo e curar suas misérias.

Pelo menos três edições do jornal Folha da Manhã no mês de outubro desse ano falaram sobre o padre, inclusive dando dicas de como chegar à cidadezinha, para quem estava a mais de quinhentos quilôemtros dela, na capital paulista. Sim, por aqui ele também tinha seus fãs. E num artigo inicial sobre o padre, dava a dica de como chegar lá - pelos trens da Central do Brasil, partindo da estação Roosevelt às 7h 20 da manhã e, depois de baldear - com esperas - em Barra do Piraí, Conselheiro Lafayette, São Julião (hoje Miguel Burnier) e Ponte Nova, onde nesta se tomava o trem da Leopoldina que vinha do Rio de Janeiro via Três Rios e Ubá, chegava-se finalmente a Rio Casca às 20h50... do dia seguinte da partida.

Por Cr$ 231,00 ia-se de primeira classe. Por menos, 170 cruzeiros, de segunda. Não devia ser uma viagem agradável. O próprio jornal, alguns dias depois, contava que era uma viagem que era "penosíssima, no mais absoluto desconforto, promiscuidade e falta de higiene, o que, aliás, é inevitável, dada a fluência de romeiros". Mas quem for, "viaja barato e chega a Meca mineira mais morto que vivo. Quem não for precavido e levar matula, jejuará compulsoriamente desde Ubá até a cidade dos milagres". E que, no último trecho percorrido, exatamente o trecho da Leopoldina,  "avançava com lentidão incrível, apinhado de passageiros, com gente pelas plataformas e mesmo na cobertura dos carros".

Os repórteres da Folha que foram a Ponte nova foram de avião. Cara para a época (Cr$ 2.200,00 por pessoa, ida e volta), a viagem São Paulo-Ubá foi mesmo foi de teco-teco, uma "casca de avelã" por uma hora de voo, por 700 cruzeiros. Já a estrada de rodagem que ligava Ponte Nova era um lodaçal só.

Tudo isso para ver as costumeiras cenas de histeria coletiva por alguns dias. Não vale a pena aqui entrar em detalhes de o que os repórteres viram por lá. Nem sei o que foi feito com o padre depois de seus quinze minutos de fama. Porém, o relato do jornal mostra o que era viajar pelo sertão mineiro no final dos anos 1940... e o que era a Leopoldina nesses tempos, ainda uma estrada inglesa com seus carros de madeira.

5 comentários:

  1. Caro Ralph
    Nasci em Ponte Nova e passei boa parte da minha infância/adolescência viajando de trem nesta região.Baseado na minha convivência, nas décadas de 50 e 60, com as romarias ao Padre Antônio Ribeiro Pinto em Urucânia (então distrito de Ponte Nova) e na história do mesmo, gostaria de fazer algumas considerações:
    Rio Casca nunca foi o local das romarias ao Padre Antônio, cidade esta da qual ele foi pároco somente de 1915 a 1917. Pode-se pesquisar na internet sobre a história de Rio Casca e não se encontrará nenhuma referencia as romarias ao Padre Antônio nesta cidade.
    De 1917 a 1921 ele foi pároco na freguesia de Rio José Pedro (atual Ipanema). De 1921 a 1946 foi vigário de Santo Antônio do Grama, na época distrito de Abre Campo. Em 1947 o Padre Antônio foi para Urucânia e lá permaneceu até sua morte em 1963. Neste último período é que se deu as romarias. http://padreantonioribeiropinto.wordpress.com/
    Nesta época, os romeiros que vinham de trem do Rio de Janeiro, Belo Horizonte ou São Paulo, chegavam a Ponte Nova pela Leopoldina (via Ubá) ou Central do Brasil (Ramal de Ponte Nova), daí se deslocando para Urucânia nas jardineiras do sr. Geraldo "percata" (alpercata), caminhões ou, os mais abonados, de carros de praça (taxi).
    Portanto deduzo, e eu mesmo custo a acreditar, que as informações prestadas pela Central do Brasil, através da Folha da Manhã em sua edição de 15/10/1947, estavam equivocadas pois o destino dos romeiros era Urucânia e não Rio Casca. A estação mais próxima de Urucânia (5 km) era a de Bandeiras, da EFL, 3ª estação após Ponte Nova e 3ª antes de Rio Casca, mas certamente a estação Bandeiras, que ficava no meio do nada, não tinha estrutura para transportar os passageiros até o destino. Fico imaginando a confusão que se estabelecia quando o romeiro, desavisado, chegava a Ponte Nova e era informado do local correto das visitas ao Padre Antônio. Abraço

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  2. As noticias, pelo menos em SP, falavam de Rio Casca e Urucania e diziam que Urucania era um distrito de Rio Casca. Os reporteres foram de avião para lá e desceram em algum lugar por ali. Veja que o local podia ser outro, mas o municipio era P. Nova. A Central baseava-se nisso, claro.

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  3. Mas veja também que a Central via somente seus interesses e não os dos passageiros. Seria muito mais confortável e rápido que o passageiro vindo de São Paulo fizesse a baldeação em Três Rios, para a Leopoldina, e seguisse direto até Ponte Nova.

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    1. Sem dúvida, Marcos, foi essa a primeira coisa que pensei e certamente ocorreu. No entanto, seria mesmo melhor tomar a Leopoldina em Tres Rios direto para Rio Casca? Ferrovia métrica, antiga, cheia de curvas,,, deveria demorar mais, apesar das baldeações. Não fui conferir horários no Levi, mas foi assim que pensei.

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  4. Veja Ralph
    Além de duas baldeações a mais, ir pela Central até Ponte Nova equivaleria viajar em torno de 150 km a mais. Conforme falei no meu comentário inicial Rio Casca não era ponto de chegada dos romeiros que vinham de trem, pois não tinha nenhum sentido viajar 1 ou 2 hrs a mais até esta e depois voltar até Urucânia que era distrito de Ponte Nova. Esta tinha linha de ônibus regular para Urucânia que era um de seus distritos a época além de uma estrutura maior. Convivi, nesta época, com o grande movimento dos romeiros em Ponte Nova.

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