sexta-feira, 2 de junho de 2017

PORTUGUÊS D'ANTANHO


Eu tinha seis, sete anos de idade e ia constantemente à casa de minha avó na Vila Mariana. Como meus leitores já sabem, meu avô era escritor e a quantidade de livros na sua casa era impressonante. Ele já havia falecido então, mas havia livros por todos os cantos... inclusive livros infantis, que haviam sido dados a minha mãe, tio e tias quando eram crianças e moravam ali.

Esses livros haviam sido escritos em português antigo. Eu via aqueles textos escrito de uma forma diferente das que eu estava aprendendo na escola e fui perguntar a meus pais. Eles haviam aprendido esse português quando eram pequenos, então eles o conheciam.

Mostraram-me um dicionário, atual, mas que, entre parenteses, mostrava como era escrita aquela palavra no "português antigo". Eu adorei aquilo, e comecei a fuçar nesse dicionário. Aprendi, então, que havia pouquíssimos acentos, havia letras duplas, ph, y, w e k na língua portuguesa.

Não sei se meus colegas da época haviam passado pela mesma experiência em suas casas. Provavelmente, alguns sim, outros não... não me lembro de ter discutido isto com meus amigos e colegas.

O fato é que somente muito mais tarde, eu voltei a ver esses textos "antigos"; descobri que houve uma reforma ortográfica nos anos 1930 que somente foi confirmada por volta de 1943; os jornais dos anos 1930 ainda mostravam essa velha ortografia e nos últimos vinte anos, em minhas pesquisas, tenho lido bastante deles - e de relatórios antigos, também.

Houve outra reforma ortográfica em 1971, que eliminou uma série de acentos, principalmente. Com esta eu convivi. Nesta, os acentos diferenciais foram eliminados (acentos que eram usados para diferenciar uma palavra de outra escrita da mesma forma, mas com significados diferentes). Os exemplos dados eram sempre as duas palavras que tinham acento e pouca gente sabia por que, já que as palavras "iguais" era pouquíssimo usadas. Eram mêdo e tôda, para diferenciar de medo (indivíduo do povo medos) e de toda (um pássaro).

Também em 1971 eliminou-se o acento grave dos adjetivos, quando tinham um acento e a eles era agregado o sufixo -mente, o que as transformava em advérbios: fácil = fàcilmente; difícil = difìcilmente e por ali vai.

O fato é que, pelo que tenho percebido, a maioria das pessoas hoje não sabem de tudo isto e, quando descobrem uma palavra escrita de jeito estranho em um texto antigo, ficam surpresas. No fim, tudo isso virou uma curiosidade.

Dou abaixo alguns exemplos de palavras e como elas eram escritas até 1943:

chimica; machina (mas se pronunciava como hoje, onde nelas é usada o "q"); registo (não tinha o "r" entre o "t" e o "o"); Nictheroy; augmentar; á (em vez de à;ou seja, a crase era com o acento agudo); official; soffrer; cavallo; estrella; bella; collaborar; ella; elle (verificar que em línguas outras, essas palavras são sempre parecidas e mantém os dois "ll"); Butantan (hoje Butantã); fractura; fracção; victima; producção; immigração; colonisar; mobilisar (hoje com z e não s); suppor; desapparecer; occultar; poude (o passado do verbo poder - depois da reforma passou a ser pôde e hoje perdeu o acento); Jahu; Tatuhy (estas palavras perderam o h e ganharam um u ou i com acento agudo); pharmacia; phosphoros; telephonema; phase; phantastico; idea; supplemento; acção; accionista; actual; activo; technica; commercial; anno; annual; funccionario; prompto soccorro; hontem; herva; extincto; accidente; britannico; apparelho; kilometro; hydro-avião; wagão ou wagon. E muitas outras,

Ainda havia o caso de plurais como jornaes; mortaes; casaes; e também a ênclise nos verbos, que era, por exemplo: recebel-o em vez de recebê-lo.

Quanto aos acentos, eram bastante raros; o acento ^ não era utilizado e o agudo era bem raro. Palavras proparoxítonas, que hoje obrigatoriamente têm acento, não o usavam.

Eu acho que como era antes de 1943 era melhor, pelo fato de quase não se usasse acentos...

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